MARIA PERDOA PEDRO
Que o perdão de Maria sirva de
exemplo para todos aqueles que se sentem atemorizados pelos pecados,
supostamente imperdoáveis que cometeram, deixando por isso de pedir perdão. (Antonio)
“E Maria, com doçura: “Simão de Jonas
vem.” E nada. “Simão Pedro, vem.” Nada. “Pedro de Jesus e de Maria, vem.”
Ouve-se um áspero frouxo de choro. Mas ele não entra. Maria se levanta, deixa o
manto sobre a mesa, e vai até à porta.
Lá fora está Pedro, agachado. Está
como um cão sem dono. E chora tão forte e sem parar, que nem ouve o barulho da
porta que se abre chiando, nem os passos dados por Maria. Ele só percebe que
ela está ali, quando ela se inclina para pegar-lhe uma das mãos, que está
apertada sobre os olhos, e o faz levantar-se. Maria entra no quarto, puxando-o
atrás de si, como se faz com um menino. Ela fecha a porta com o trinco e o
ferrolho e, encurvada pela dor, e ele pela vergonha, e volta ao seu lugar.
Pedro vai pôr-se aos pés dela, de
joelhos, e chora desenfreadamente. Maria o acaricia por sobre seus cabelos grisalhos
e suados pela dor. Nada mais além dessa carícia, até que ele fique mais calmo.
Depois afinal, Pedro diz: “Tu não me podes perdoar. Por isso, não me acaricies.
Porque eu o reneguei.”
Então Maria lhe diz: “Pedro, tu o
renegaste. É verdade. Tiveste a coragem de nega-lo em público. A coragem
covarde de fazer isso, os outros... todos, menos os pastores, Manaém, Nicodemos
e João, somente tiveram só a covardia, todos o renegaram, homens e mulheres de
Israel, com exceção de umas poucas mulheres... Eu não cito os sobrinhos nem
Alfeu de Sara. Esses eram parentes e amigos!... E nem mesmo tiveram a coragem
satânica de mentir para se salvarem, nem a coragem espiritual de se
arrependerem do que fizeram e chorar, nem ainda a mais alta de reconhecer
publicamente o seu erro. Amanhã serás um santo, mas, mesmo que não o fosse como
és, eu te teria perdoado do mesmo modo. Pois eu teria perdoado até o Judas,
contanto que ele salvasse o seu espírito. Porque o valor de um espírito, ainda
que seja um só, merece todo esforço contra repugnâncias e ressentimentos, até
que eles sejam despedaçados. Lembra-te disso, Pedro. Eu te repito: o valor de
uma alma é tão grande, que mesmo as custas de morrer alguém, pelo esforço que
se faz pata tê-la perto, temos que fazê-lo assim, com ela entre os braços, como
eu tenho a tua cabeça escarnecida, quando se espera que, fazendo assim se pode
salvá-la. É assim. Como uma mãe que, depois do castigo que o pai deu, pega
sobre o seu coração a cabeça do filho culpado e, mais com as palavras de seu
coração atormentado, diz com amor e com dor, do que com batidas do pai, ele se
arrepende e se corrige. Ó Pedro do meu Filho, ó pobre Pedro, que estiveste,
como todos, na mão de Satanás, naquela hora tenebrosa, e sem o perceberes,
achas que fizeste tudo por ti mesmo, vem cá, vem cá sobre o coração da Mãe dos
filhos do meu Filho. Aqui Satanás não pode mais fazer-te mal. Aqui se acalmam
as tempestades, e estamos à espera do Sol, que é o meu Jesus, que ressuscitará
para dizer-te: “A paz ao meu Pedro!”, e surge a estrela da manhã, pura, bela,
fazendo ficar puro e belo tudo o que ela beija, como acontece com as águas
puras do nosso mar, nas frescas manhãs da primavera. Por isso eu fiquei tanto
tempo te esperando aos pés da cruz, eu estava sendo martirizada por ele e por
vós e como foi que não o percebeste? E chamava os vossos espíritos com voz tão
alta, que eu acho que eles vieram realmente a mim. E, fechados em meu coração,
ou melhor, colocados sobre o meu coração, como os pães da proposição, Eu os
segurei sob o banho do seu Sangue e do seu pranto. Eu o podia fazer, porque
Ele, na pessoa de João, me fez Mãe de toda a sua Prole... Quanto eu te
desejei!... Naquela manhã, naquela tarde e em cada novo dia. Porque é que tu
fizeste uma mãe esperar, pobre Pedro ferido e pisado pelo demônio? Eu te
conduzo a Jesus. Tu o quererias Ver? Quererias ver o seu sorriso, para te
persuadires de que Ele te ama ainda? Sim? Então afasta-te do meu pobre seio de
mulher, e vai pousar a tua fronte sobre a fronte dele coroada, e tua boca sobre
sua boca ferida, e beija ao teu Senhor.”
“Ele morreu. Eu nunca mais poderei
fazer.”
“Pedro, responde-me: Qual achas que
tenha sido o último milagre do teu Senhor?”
“O da Eucaristia. Talvez não. Talvez
tenha sido o do soldado ferido lá... lá... Oh! Não me faças ficar recordando!”
“Uma mulher fiel, amorosa, foi para
perto dele no Calvário, e enxugou seu rosto. E Ele, para ensinar quanto pode o
amor, gravou seu rosto sobre o linho. Ei-lo aqui, Pedro. Isto conseguiu uma
mulher, na hora daquelas trevas infernais e da ira divina. Só porque Ele amou.
Lembra-te disso, Pedro. Durante as horas em que te parecer que o demônio seja
mais forte do que Deus, Deus estava sendo prisioneiro dos homens, já oprimido,
condenado, flagelado, moribundo...
Contudo, já que entre as mais duras
perseguições, Deus é sempre Deus, aos negadores, aos incrédulos, aos homens dos
estultos “porquês”, dos culpados que dizem: “Isso não pode ser”, dos sacrílegos
que falam: “o que eu não compreendo não é verdade”, a eles responde sem
palavras, mas com este linho, olha para ele. Um dia tu me disseste, e tu
disseste a André: “O Messias vir manifestar-se a ti?, Isso não pode ser
verdade!” E depois a tua pobre razão humanidade, dobrar-se à força do espírito
que via o Messias lá onde a razão não o via. Outra vez, sobre o mar
tempestuoso, tu perguntaste: “Posso ir Mestre?”, e depois sobre as águas, já no
meio do caminho, sobre as águas agitadas, tu duvidaste dizendo: “A água não me
pode sustentar”, e, com tua dúvida como pretexto, por pouco te afogavas. Somente
quando contra a razão prevaleceu o espírito, que soube crer, e pudeste ainda
achar a ajuda de Deus. Outra vez tu disseste: “Se o Lázaro já morreu há quatro
dias, que é que viemos fazer aqui? Para morrer inutilmente.” Porque não podias,
com a tua razão humana, achar outra solução. E a tua razão foi desmentida pelo
espírito que, mostrando-te com o ressuscitado a glória do Ressuscitador, te
mostrou que não foi inutilmente que tínheis ido. Outra vez ainda, e mais
outras, tu disseste, ao ouvir o Senhor falar da morte, e de uma morte atroz:
“Isto não te acontecerá nunca!” E tu viste que desmentido a tua razão recebeu.
Eu agora fico esperando ouvir a palavra do teu espírito neste último caso...”
“Eu perdôo.”
“Não isto. Uma outra palavra.”
“Eu creio.”
“É uma outra palavra.”
“Não sei.”
“Eu amo Pedro, ama. E sereis
perdoado. Crerás. Serás forte. Serás o Sacerdote, e não o fariseu, que só tem
formalismos e não uma fé ativa. Olha para Ele. Coragem, e olha para Ele. Todos
olharam para Ele e o veneraram. Até Longino. E tu não saberias? No entanto,
soubeste renega-lo. Se não o reconheceres agora, através do fogo de minha
materna e amorosa dor, que vos une, vos dá a paz, então não poderás mais. Ele
ressurge. Como poderás olhar para Ele, em seu novo fulgor, se não sabes como é
o seu rosto de mestre, mas que se converterá em rosto de Triunfador? Porque a
dor, toda a Dor dos séculos e do mundo, Ele trabalhou com escopo e macete
naquelas horas que vão desde a véspera da quinta feira, até a hora da
sexta-feira. E mudaram o seu rosto. Antes era somente Mestre e Amigo. Agora é
Juiz e Rei. Ele subiu para a sua Cátedra, a fim de julgar. E cingiu-se com a
coroa. E assim ficará. Com a diferença de que, depois da gloriosa Ressureição,
será não mais o homem Juiz e Rei. Mas o Deus Juiz e Rei. Olha para Ele. Olha,
enquanto sua humanidade e sua dor o velam, a fim de que possa ser visto, quando
Ele triunfar em sua Divindade.
Pedro levanta finalmente a cabeça do
colo de Maria, e fica olhando para ela, com seus olhos avermelhados pelo
pranto, em um rosto de velho menino desolado e espantado pelo mal que faz e
pelo bem que encontra feito. Maria o obriga a olhar para seu Senhor. E então,
enquanto Pedro, vendo diante de si um rosto vivo, geme dizendo: “Perdão,
perdão. Não sei como foi. O que foi. Não era eu. Era alguma coisa que me fazia
não ser eu. Mas eu te amo. Jesus! Eu te amo Mestre meu! Volta! Volta! Não te
vãs embora assim, sem me dizeres que me entendeste!” Maria repete o ato já
feito na Câmara sepulcral. Com os braços estendidos e de pé, parece uma
sacerdotisa, no ato de fazer a oferta.
E, como lá ela ofereceu a Vítima sem
mancha, aqui ela oferece o pecador arrependido. Pois ela é a Mãe dos Santos e
dos pecadores.
Depois ela levanta Pedro. E torna a
consolá-lo. E lhe diz: “Agora estou contente. Sei que estás aqui. Agora, vai.
Com as mulheres e João. Vós estais precisando de repouso e alimento, vai e sê
bom...”, como se fala a um menino.
(O Evangelho como me foi Revelado-
Maria Valtorta- Vol 10, pg. 201 a 205)
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