DISCURSO DE JESUS AOS CIDADÃOS DE GERASA
Diz Jesus:
“Esta cidade é muito
bonita, fazei que ela seja bonita também por sua justiça e santidade. As
colinas, o riacho, a planície verde, são coisas que Deus vos deu. Roma vos está
ajudando agora, dando-vos casas e belas construções. Mas depende de vós dar à
vossa cidade o nome de cidade santa e justa.
A cidade é o que dela
fazem os seus habitantes. Porque a cidade é uma parte da sociedade, fechada
dentro de muros. Contudo, os que constituem a cidade são os cidadãos. A cidade,
por si mesma, não peca. Não podem pecar o riacho, nem a ponte, nem as casas,
nem as torres. Tudo isso é matéria, não tem alma. Mas quem pode pecar são os
que estão fechados dentro dos muros da cidade, nas casas, nas lojas comerciais,
os que passam pela ponte e vão banhar-se no rio. Costuma-se dizer, quando se
fala de uma cidade facciosa e cruel: “É uma cidade péssima.” Mas está mal
falado. Não é a cidade. São os cidadãos que são péssimos.
São cada um deles, um
por um, que se tornam, quando se unem uma só coisa multiforme, que se chama
cidade. Então, escutai agora. Se em uma cidade dez mil habitantes são bons, e
só mil não o são, poder-se-ia dizer que aquela cidade é má? Não. Não se poderia
dizer isso. Também, se em uma cidade de dez mil habitantes houver muitos
partidos, e cada um deles procurar só o benefício de si mesmo, poder-se-ia
dizer que aquela é uma cidade unida? Não. Não se pode dizer isso. Mas, pensai
vós que aquela cidade irá para a frente? Não irá.
Vos de Gerasa estais
agora todos unidos com a intenção de fazer da vossa cidade uma grande coisa. E
o conseguireis, porque todos quereis a mesma coisa, e porfiais um com o outro,
para chegardes a esta meta. Mas, se amanhã entre vós surgissem partidos
diferentes, e um deles dissesse: “Não. É melhor fazer a cidade crescer para o
ocidente”, e um outro partido: “Nada disso! Vamos fazê-la crescer para o norte,
onde está a planície”, e um terceiro dissesse: “Nem uma coisa nem outra. Unidos
no centro, queremos ficar é perto do rio”, que aconteceria? Aconteceria que as
obras começadas iriam ficar paradas, que os que nos emprestaram os capitais se
afastaram, e os que pensavam em vir estabelecer-se nela iriam para outra
cidade, cujos habitantes fossem mais unidos. E o trabalho, que já tinha feito,
ficaria perdido, por ser deixado exposto às intempéries, sem ter podido ser
acabado, por causa das discussões acerbas dos cidadãos. É ou não é assim? Vós
estais dizendo que é assim, e dizeis bem. Portanto, é necessário que haja
concórdia entre os cidadãos. Porque o bem da sociedade existe, quando existe o
bem-estar dos cidadãos, porque na sociedade o bem dela existe quando existe o
bem-estar dos que a compõem.
Mas o que existe não é
somente a sociedade como a entendeis, a sociedade dos concidadãos, ou dos que
pertencem à mesma nação, ou a pequena e querida sociedade da família. Existe uma
outra sociedade muito mais extensa, infinita: a sociedade dos espíritos.
Todos nós que vivemos
temos uma alma. Essa alma não morre com o corpo, mas sobrevive a ele, para
sempre. A idéia de Deus Criador, que deu ao homem uma alma, foi que todas as
almas dos homens se reunissem em um único lugar, o Céu, constituindo o Reino
dos Céus, cujo monarca é Deus, e cujos súditos felizes teriam sido os homens,
depois de uma vida santa e uma morte tranqüila. Satanás veio para dividir e
subverter, para destruir e desagradar a Deus e aos espíritos. E introduziu o
pecado nos corações, e com ele trouxe a morte no fim desta existência,
esperando poder dar a morte também aos espíritos. A morte destes é a
condenação, a qual é existir, sim, mas uma existência privada do que é a
verdadeira Vida e alegria eterna, isto é, da visão beatífica de Deus e de sua
posse eterna nas luzes eternas. E a Humanidade se dividiu em suas vontades,
como uma cidade dividida por partidos contrários. E, assim agindo, caminhou
para sua ruína.
Eu já disse isso aos
que me acusavam de expulsar os demônios com a ajuda de Belzebu: “Todo reino
dividido contra si mesmo irá para a ruína.” De fato se Satanás se expulsasse a
si mesmo, ele e seu reino tenebroso se arruinariam. Eu, pelo amor que Deus tem
para com a Humanidade por Ele criada, vim para fazer lembrar que só um Reino é
Santo: o dos Céus. E vim para pregá-lo, para que os melhores o procurem. Oh! Eu
quereria que todos, até os piores, viessem a se converter, livrando-se do
demônio que, evidentemente, nas possessões corporais, além de nas espirituais,
ou secretamente naquelas que são completamente espirituais, os conserva
escravizados. Por isso, Eu vou curando os doentes, expulsando os demônios dos
corpos dos possessos, convertendo os pecadores, perdoando em nome do Senhor,
instruindo sobre o Reino, realizando milagres para persuadir-vos do meu poder e
de que Deus está comigo. Porque não se pode fazer milagre, se não se tiver a
Deus como amigo. Por isso, se Eu expulso os demônios com o dedo de Deus, e curo
os doentes, se limpo os leprosos, converto os pecadores, anuncio o Reino e
instruo sobre ele, se chamo para ele em nome de Deus, e se somente os inimigos
desleais é que podem dizer o contrário, é sinal de que o Reino de Deus chegou
ao meio de vós, e de que ele está constituído, porque esta é a hora de sua
fundação.
Como se funda o Reino
de Deus no mundo e nos corações? Com a volta à Lei de Moisés, ou com o
conhecimento exato dela, quando não se conhece, mas, sobretudo, com a aplicação
total da Lei em si mesmos em todos os acontecimentos e momentos da vida. Qual é
essa Lei? Ela é uma série de dez preceitos santos e fáceis, dos quais até o
homem moralmente bom, verdadeiramente bom, sente a necessidade, mesmo se ele
estiver sepultado sob o denso teto vegetal das mais impenetráveis florestas da
misteriosa África. Essa Lei diz:
-Eu sou o Senhor teu Deus, e não há outro Deus fora de Mim.
-Não tomes o Nome de Deus em vão.
-Respeita o Sábado, conforme a ordem de Deus, e a necessidade
da criatura.
-Honra a teu pai e a
tua mãe, se queres viver longamente, e ter o bem na terra e no Céu.
-Não mates.
-Não furtes.
-Não cometas adultério.
-Não levantes falso testemunho contra o próximo.
-Não desejes a mulher do próximo.
-Não cobices as coisas alheias.
Qual é o homem que, se
for bom de coração, ainda mesmo sendo ele um selvagem, e que volvendo o olhar
para o tudo o que o circunda, não chegue a dizer: “Não era possível que tudo
isso se fizesse por si mesmo. Por isso existe Um mais poderoso do que a
natureza e do que o próprio homem, que fez tudo isso.” E adora esse Poderoso,
do qual ele saiba, ou não saiba o Nome Santíssimo, mas que ele percebe que
existe. E tem para com esse Ser uma tão grande reverência, que, ao pronunciar o
nome que lhe deu, ou que lhe foi ensinado dizer, para nomeá-lo, treme de
respeito, e percebe que está em oração, só por dizer o Nome de Deus com a
intenção de adorá-lo e de fazê-lo conhecido pelas pessoas que o desconhecem.
Assim, pois, só por
prudência moral todo homem percebe que deve conceder um descanso aos seus
membros, a fim de que eles resistam até o fim da vida. Com mais razão, este
repouso animal o homem que não ignora o Deus de Israel, o Criador e Senhor do
Universo, percebe que o deve consagrar ao Senhor, para não ficar semelhante ao
jumento que, quando cansado, repousa sobre sua cama de palhas, e fica quebrando
com seus fortes destes os grãos dos cereais.
Também o sangue exige
amor por aqueles dos quais ele veio, e vemos isso até no potrinho da jumenta
que, correndo e zurrando, vai ao encontro da mãe, quando ela esta voltando das
feiras. Ele estava brincando no meio dos outros, quando a viu e lembrou-se de
que havia mamado nela, e que ela o havia lambido com amor, o havia defendido e
aquecido, e estais vendo como, com seu focinho macio ele lhe coça o pescoço,
esfregando suas ancas contra o lado de sua mãe.
Amar os pais é um
dever e um prazer. Não há animal que não ame a quem o gerou. E, então? Será o
homem inferior ao verme, que vive na lama da terra?
O homem moralmente bom
não mata. A violência lhe causa aversão. Ele sabe que não é lícito tirar a vida
de ninguém. E que só Deus, que no-la deu, é que tem o direito de tirá-la. E
evita o homicídio.
Igualmente quem é
moralmente são não se apodera das coisas alheias. Prefere o pão comido com uma
consciência tranqüila, junto a uma fonte prateada,a um suculento assado, feito
de uma criação furtada. Ele prefere dormir no chão, com a cabeça sobre a pedra
e as estrelas amigas acima de sua cabeça, derramando paz e consolo em sua
consciência honesta, a um sono perturbado em uma boa cama, mas apanhada em
algum furto.
E, se ele é moralmente
são, não vive cobiçando mais mulheres, que não são suas, nem penetra, como um
vil emporcalhador, no leito conjugal de outro. Mas na mulher do seu amigo ele
vê uma irmã, e não tem para com ela os olhares e os desejos, que para com uma
irmã não se têm.
O homem de coração
reto, ainda que só naturalmente reto, sem ter outro conhecimento do Bem, a não
ser o que lhe vem de sua boa consciência, nunca toma a liberdade de dar
testemunho de uma coisa que não é verdade, pois isso lhe parece coisa
semelhante a um homicídio e a um furto, e de fato assim é. Mas ele tem lábios
honestos, como honesto ele tem o coração, e com eles tem honestos também os
seus olhares, com os quais ele não cobiça as mulheres dos outros. E ele nem
mesmo as deseja, porque tal desejo é o primeiro estímulo para o pecado. Não
inveja. Porque é bom. Quem é bom não inveja nunca. Fica tranqüilo com o que
tem.
Parece-vos que esta
Lei é tão intransigente, que não se pode praticar? Não vos enganeis. Eu estou
certo de que não vos enganareis. E, se não vos deixardes enganar, fundareis o
Reino de Deus em vós, e em vossa cidade. E vos reencontrareis um dia, felizes,
com aqueles que amastes e que, como vós, conquistaram o Reino eterno, nas
alegrias sem fim do Céu.
Mas no vosso próprio
interior, estão as paixões, como outros tantos cidadãos fechados e cercados
pelos muros da cidade. É preciso que todas as paixões do homem, queiram a mesma
coisa, isto é, a santidade. Se assim não for, é inútil que uma parte se incline
para o Céu, se depois uma outra deixa sem guardar as portas, deixando penetrar
o sedutor e neutralizando, por meio de discussões e da preguiça, os esforços de
uma parte dos cidadãos, que tratam de coisas espirituais, fazendo assim que
pereça a cidade interior e que ela fique abandonada ao reino das urtigas, dos
tóxicos, das gramíneas, das serpentes, escorpiões, ratos, chacais e corujas,
isto é, das más paixões e dos anjos de Satanás. É preciso velar, sem cessar,
como sentinelas colocadas sobre os muros, para impedir que o Maligno entre onde
nós queremos construir o Reino de Deus.
Em verdade, Eu vos digo que, enquanto o homem forte e armado
guarda a entrada de sua casa, ele dá segurança a tudo o que está dentro dela.
Mas, se chegar um outro mais forte do que ele, ou se ele deixar descuidada a
porta, então o mais forte o vence e o desarma, e ele, ficando sem suas armas,
nas quais ele confiava, se enche de medo, e se entrega, e o forte o faz
prisioneiro e se apodera dos despojos do vencido. Contudo, se o homem vive em
Deus, por meio da fidelidade à Lei a à Justiça santamente praticada, Deus está
com ele, e nada de mal pode acontecer-lhe. A união com Deus é uma arma que
nenhum forte pode vencer. A união comigo é segurança de obter vitória e de
arrebatar presas de guerra, que são as virtudes eternas pelas quais será dado
para sempre um lugar no Reino de Deus. Mas, quem de Mim se afasta ou de Mim se
torna inimigo, repele, por conseqüência as armas e a segurança da minha
palavra. Quem repele o Verbo, repele a Deus. Quem repele a Deus, chama Satanás.
Quem chama Satanás destrói tudo o que tinha para conquistar o Reino.
Portanto, quem não está comigo, está contra Mim. E quem não
cultiva o que Eu semeei, vai recolher o que o inimigo semeia. Quem não ajunta
comigo, espalha, e, pobre e nu, haverá de chegar diante do Juiz supremo, que o
mandará para o patrão ao qual ele se vendeu, preferindo Belzebu a Cristo.
Cidadãos de Gerasa,
edificai em vós e em vossa cidade o Reino de Deus.
Uma voz cantada de
mulher se faz ouvir límpida, como canto da cotovia, por sobre o sussurro da
multidão admirada, e ela canta uma nova felicidade, que é a glória de Maria: “Feliz
o seio que te trouxe, e o peito em que Tu sugaste.”
Jesus se vira para a
mulher, que exaltou sua Mãe, por admirar-lhe o Filho. Ele sorri, porque lhe é
agradável o louvor dado à sua Mãe. Mas depois Ele diz: “Mais felizes ainda
aqueles que ouvem a palavra de Deus e a praticam. Faze tu isto, ó mulher.”
Depois Jesus dá a sua
benção e se encaminha para a campina, acompanhado pelos Apóstolos que lhe
perguntam: “Por que disseste isso?”
“ Porque em verdade, Eu vos digo que no Céu não se mede com
as medidas da terra. E a minha própria Mãe será feliz, não só por sua alma
imaculada, mas por ter ouvido a palavra de Deus e a ter posto em prática, pela
obediência. Aquela palavra “que seja feita sem culpa a alma de Maria” é um
prodígio do Criador. A Ele, pois, é que se deve louvor. Mas aquela palavra “que
se faça em mim segundo a tua palavra” é prodígio de minha Mãe. Por isso, pois,
é grande o merecimento dela. Tão grande que, só por aquela capacidade de ouvir
a Deus, que lhe falou pela boca de Gabriel e pela sua vontade de pôr em prática
a palavra de Deus, sem ficar a medir as dificuldades e as dores que lhe viriam
logo e no futuro, e que desta adesão dela agora haveriam de provir, é que veio
o Salvador do mundo. Vós, pois, vede que ela é a minha feliz Mãe, não só porque
me gerou e amamentou, mas porque ouviu a palavra de Deus e a pôs em prática
pela obediência. Mas agora, vamos para casa. Minha Mãe sabia
que Eu estaria fora por pouco tempo, e poderia ficar preocupada, vendo que Eu
estava demorando. Estamos em uma região semi-pagã. Mas em verdade é melhor do
que outras. Então, vamos. E vamos dar uma volta por detrás dos muros, para
escaparmos da multidão, que me quereria deter ainda. Vamos descer depressa por
detrás destas moitas frondosas.”
(O Evangelho como me
foi Revelado – Maria Valtorta – Vol. 4. Pg. 428 a 433)
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