TERCEIRO
ANO DA VIDA PÚBLICA DE JESUS
EU SOU A FONTE DA ÁGUA VIVA
Enquanto isso, a multidão vai aumentando, sempre mais. Jesus
levanta a cabeça e fica olhando. Como o pórtico está alguns degraus mais acima,
Ele mesmo que esteja sentado no chão, pode dominar uma boa parte do Pátio por
aquele lado, e vê rostos e mais rostos.
Ele se põe de pé, e diz em alta voz, com toda aquela sua voz
trovejada e forte: “Quem tem sede, venha a Mim, e beba. Do seio daqueles que
crêem em Mim jorrarão rios de água viva.”
Sua voz enche o amplo pátio, atravessa as esplêndidas séries
de pórticos, e certamente também as
deste lado, propaga-se para além delas, domina qualquer outra voz, como um
trovão harmonioso e todo cheio de promessas. Ele fala depois se cala por alguns
instantes, como se tivesse querido somente anunciar qual vai ser o assunto do
sermão, e dar tempo a quem não sente interesse de ouvi-lo, para que se vá
embora, e não fique perturbando depois. Os escribas e os doutores estão
calados, isto é, abaixaram suas vozes, até chegarem a um sussurro que com
certeza é maldoso. Não estou vendo Gamaliel.
Jesus vai para a frente, atravessando o semicírculo, que se
abre à sua chegada, para fechar-se logo as suas costas, transformando-se de um
semicírculo em um anel. Ele vai caminhando devagar, com majestade, Parece ir
deslizando por sobre os mármores multicores do pavimento, com o seu manto um
pouco afrouxado, que vai fazendo atrás dele uma espécie de cauda. Levanta o
braço direito, no seu gesto habitual de quando vai começar a falar, e, ao mesmo
tempo, com a esquerda espalmada sobre o peito, acomoda em seu lugar o manto.
Ele repete as palavras iniciais: “Quem tem sede, venha a Mim,
e beba. Do seio daqueles que crêem em Mim jorrarão rios de água viva! Aquele
que viu a teofania do Senhor, o grande Ezequiel, sacerdote e profeta depois de
ter visto como profeta os atos impuros na casa profanada do Senhor, depois de
ter sempre profeticamente, visto que só os assinalados com o Tau é que serão os
viventes da verdadeira Jerusalém, enquanto que os outros só conhecerão uma e
uma carnificina, só uma e uma condenação, um só e um castigo—o tempo está
perto, ó vós que ouvis, está perto, mais perto do que vós pensais, e por isso
Eu vos exorto, como Mestre e Salvador, a não tardardes a por em vós o Sinal que
salva, a não tardardes a pôr em vós a Sabedoria, a não tardardes a
arrepender-vos e a chorar por vós e pelos outros, a fim de poderdes salvar-vos.
Ezequiel, depois de ter visto tudo isso, e mais ainda, fala de uma terrível
visão. A dos ossos ressequidos.
Um dia virá em que, sobre um mundo morto, sob um
firmamento apagado, aparecerão, ao toque da trombeta dos anjos, ossos e mais
ossos dos mortos. Como um ventre que se abre para parir, assim a terra expelirá
de suas vísceras todos os ossos dos homens que morreram sobre ela, e foram
sepultados no seu barro, desde Adão até o último homem. E, então, será a
ressurreição dos mortos, pelo grande e supremo julgamento, depois do qual, como
uma maça de Sodoma, o mundo se esvaziará, tornando-se um nada, e terá fim o
firmamento com os seus astros. Tudo terá fim, menos duas coisas eternas,
distantes, que estão nas extremidades de dois abismos de uma profundidade
incalculável, e, uma antítese total, na forma e na aparência, e no modo com que
neles se prosseguirá para sempre o poder de Deus: o Paraíso, que é luz,
alegria, paz e amor. E o Inferno, trevas, dor, horror e ódio.
Mas acreditais vós que, visto que o mundo ainda não
morreu, e as trompas dos anjos ainda não tocaram a recolher e que o imenso
campo da terra não esteja já coberto dos ossos sem vida, excessivamente
dessecados, separados e mortos, bem mortos? Em verdade Eu vos digo que assim é
entre os viventes, porque eles ainda respiram, inumeráveis são os que são
semelhantes a uns cadáveres, aos ossos áridos que foram vistos por Ezequiel.
Quem são eles? São aqueles que não têm em si a vida do espírito.
Há desses em Israel, como em todo o mundo. E que,
entre os gentios e idólatras não haja mais do que mortos, que estão esperando
receber a Vida, é uma coisa natural, e preocupa somente aqueles que possuem a
verdadeira Sabedoria, pois esta os faz compreender que o Eterno criou as
criaturas para Ele, e não para as idolatrias, e se aflige por ver tantos deles
na morte. Mas, se o Altíssimo tem essa preocupação, que já é tão grande, quanto
maior não será a dor que sofre por aqueles do seu povo que são uns ossos
esbranquiçados, sem vida, sem espírito?
Os eleitos, os prediletos, os protegidos, os
nutridos, por Ele diretamente instruídos, ou por seus servos os profetas,
porque haverão de ser, culpavelmente, uns ossos áridos, quando para eles sempre
correu um fio de água vital, vindo do Céu e que os abeberou de Vida e Verdade.
Por que eles ficaram assim dessecados, plantados que foram na terra do Senhor?
Por que o espírito deles há de ser morto, quando o Espírito Eterno pôs à
disposição deles um tesouro espiritual, para nele se abeberassem, e vivessem? E
eles, com que prodígio poderão voltar à Vida, se deixaram de lado as fontes, as
pastagens, as luzes dadas por Deus, e ficam tacteando na escuridão, bebendo da
água de fontes não puras, e comendo de pastagens não santas?
Não voltarão nunca mais a ser vivos? Sim. Em nome
do Altíssimo Eu o juro. Muitos ressuscitarão. Deus já preparou o milagre, e ele
já está em ação, já foi operado sobre alguns, e alguns ossos ressequidos já
foram revestidos de vida, porque o Altíssimo, ao qual nada é proibido, manteve
sua promessa, e a mantém, e cada vez mais a completa. Ele, do alto dos Céus,
grita a esses ossos que estão esperando: “Eis que Eu vou infundir em vós o
espírito, e vivereis.” E lançou mão do seu Espírito, Lançou mão de Si mesmo, e
formou uma carne para revestir a palavra, e a mandou a esses mortos, a fim de
que, falando a eles, de novo se infundisse neles a Vida.
Quantas vezes, durante séculos, Israel gritou:
“Nossos ossos ficaram ressequidos, nossa esperança morreu, estamos segregados!”
Mas toda promessa é sagrada, toda profecia é verdadeira. Eis chegado o tempo,
no qual o Enviado de Deus abre as tumbas, para tirar delas os mortos e dar-lhes
vida de novo, para levá-los consigo para o verdadeiro Israel, para o Reino do
Senhor, o Reino do Pai meu e vosso.
Eu sou a ressurreição e a Vida! Eu sou a luz que
veio para iluminar aos que jaziam nas trevas! Eu sou a fonte da qual jorra a
Vida Eterna. Quem vem a Mim, não conhecerá a Morte. Quem tem sede de vida,
venha e beba. Quem quer possuir a Vida, isto é, Deus, creia em Mim, e do seu
seio jorrarão, não umas gotas, mas rios de água viva. Porque quem crê em Mim,
formará comigo o novo Templo, do qual nascerão as águas salutares de que fala
Ezequiel.
Vinde a Mim, ó povos! Vinde a Mim, ó criaturas!
Vinde para formar um único Templo, porque Eu não repilo a ninguém, mas, por
amor vos quero comigo, no meu trabalho, nos meus merecimentos, na minha glória.
“E eu vi as águas, que nasciam por debaixo da porta
da casa, do lado do oriente... E as águas desciam pelo lado direito, ao sul do
altar.”
Aquele Templo são os que crêem no Messias do
Senhor, no Cristo, na Lei Nova, na Doutrina do tempo da Salvação e da paz.
Assim como de pedras são formadas os místicos muros do Templo, assim de
espíritos novos serão formados os místicos muros do Templo, que não morrerá
nunca, e que da terra se elevará ao Céu, como o seu Fundador depois da luta e
da prova.
Aquele altar do qual jorram as águas, aquele altar
do lado do oriente, sou Eu. E as minhas águas brotam do lado direito, porque o
lado direito é o lugar dos que foram eleitos para o Reino de Deus. Brotam de
Mim, para se derramarem nos meus eleitos, e os tornarem ricos das águas vitais,
e portadores delas, espalhadores delas para o norte e para o sul, para o
oriente e para o ocidente, para darem vida à terra, em seus povos, que estão
esperando a hora da Luz, a hora que está para chegar, que infalivelmente virá
para todos os lugares, antes que a Terra deixe de existir.
Jorram e se espalham as minhas águas, misturadas
com as que Eu mesmo dei, e darei aos meus seguidores, e, ainda que sejam
espalhados para beneficiar a terra, estarão unidas em um só rio da Graça,
sempre mais profundo, sempre maior, crescendo cada dia mais, passo a passo, com
aquelas águas, que são os novos seguidores, até se tornarem como um mar, que
banhará todos os lugares, a fim de santificar toda a terra.
Deus quer isso. E Deus faz isto. Um milagre. Um
dilúvio já lavou o mundo, dando morte aos pecadores. Um dilúvio, com outro
líquido que não é a chuva, lavará o mundo, dando-lhe Vida. E, por uma
misteriosa ação de graças, os homens poderão ser uma parte daquele dilúvio
santificador, unindo suas vontades à minha, suas fadigas à minha, seus
sofrimentos aos meus. E o mundo conhecerá a Verdade e a Vida. E quem quiser
participar delas poderá. E somente quem não quiser ser nutrido pelas águas da
vida, se tornará um lugar brejento e pestilencial, ou permanecerá assim, e não
chegará a conhecer as gordas colheitas dos frutos da graça, da sabedoria, da
salvação, que irão conhecer aqueles que viverem em Mim.
Em verdade Eu vos digo, mais uma vez, que quem tem
sede e vem a Mim, beberá e não terá mais sede, porque a minha Graça fará nascer
dele fontes de rios de água viva. E quem não crê em mim perecerá, como numa
salina, onde a vida não pode subsistir.
Em verdade Eu vos digo que, depois de Mim, não
cessará a fonte, porque Eu não morrerei, mas viverei, e depois que Eu me tiver
ido embora, ido embora, e não morrido, para abrir as Portas dos Céus, um outro
virá, que é igual a Mim, e que completará a minha obra, fazendo-vos compreender
o que Eu vos disse e incendiando-vos para fazer de vós “luzes”, visto que
tereis recebido a Luz.”
Jesus se cala.
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