TERCEIRO
ANO DA VIDA PÚBLICA DE JESUS
O EX-LEPROSO JOÃO TORNA-SE DISCÍPULO
29 DE
JUNHO DE 1946
“O meu Senhor!, grita o ex-leproso, jogando-se
de joelhos, logo que vê Jesus aparecer na charneca, que fica perto do rochedo
onde viveu durante tantos anos. E depois levantando-se, grita de novo: “Como?
Estás voltando a mim?”
“Para
dar-te uma provisão de palavras, depois de ter-te dado a de saúde.”
“A
provisão se dá a quem vai viajar, e, de fato, vou viajar esta tarde para as
purificações... Mas parto, para voltar e unir-me aos discípulos, se Tu me
quiseres acolher. Não tenho mais casa nem parentes, Senhor. Já estou velho para
exercer qualquer atividade,e assim poder viver. Far-me-ão a reintegração dos bens,
mas, como estará a casa, se há quinze anos nela não morou ninguém? O que
encontrarei nela? Talvez as paredes derrubadas... Eu sou um passarinho sem
ninho. Deixa que eu me ajunte à fileira dos que te seguem. Afinal, eu não
pertenço mais a mim mesmo, porque, por aquilo que me deste, eu sou teu, não
pertenço mais ao mundo que me separou do seu convívio, justamente por ser eu um
impuro, e por tanto tempo. Agora sou eu que acho que o mundo é impuro, depois
de ter-te eu conhecido, e fujo do mundo para vir a Ti.”
“E Eu
não te rejeito. Mas Eu re digo que quereria que fizesses uma parada nesta
região. Aera e Arbela têm o seu filho discípulo, que está evangelizando. Que tu
faças o mesmo em Hipo, Gamala, Afeca e lugares vizinhos. Eu, daqui a pouco
desço para a Judéia, e não voltarei mais a estes lugares. Mas quero ter neles
meus evangelizadores.”
“A Tua
vontade me torna querida qualquer renúncia. Farei o que Tu queres. E o farei
logo que completar as purificações. Eu tinha pensado que não teria que cuidar
mais de minha casa. Agora, ao contrário, eu digo que a reaverei, de tal modo
que possa morar nela e acolher nela, durante o inverno, as almas desejosas de
ter notícia de Ti, e pedirei a alguns dos discípulos que te seguem que venham
ficar comigo, porque se Tu queres que eu seja um pequeno mestre, eu preciso ser
instruído por alguém que saiba mais do que eu. E na primavera irei com os
outros pregar o teu Nome.”
“Teu
pensamento é bom. E Deus te ajudará a realizá-lo.”
“Eu já
comecei a destruir pelo fogo tudo o que me pertencia, Isto é, a pobre enxerga e
os pobres móveis que eu usava, a veste com que eu estava até ontem, tudo aquilo
em que eu havia tocado com meu corpo doente. A gruta em que eu vivia está
preta, por causa do fogo que eu nela acendia para incinerar coisas e purificar
o ambiente. Ninguém ficará contaminado, se entrar lá para refugiar-se em alguma
noite de tempestade. E depois eu tinha um velho cofre, já bem velho, todo
encarunchado... parecia que a lepra o tivesse corroído também... Mas para
mim... ele era mais precioso do que as riquezas do mundo... Dentro dele estavam
minhas coisas queridas... lembranças de minha mãe... o véu de núpcias da minha
Ana... Ah! Quando eu o tirei, todo feliz, naquela tarde de núpcias, e
contemplei aquele rosto tão belo, e puro como um lírio, quem me poderia ter
dito que, poucos anos depois, eu o haveria de ver como uma chaga só! E... as
roupas dos meus meninos, os seus brinquedos... seguros entre suas pequenas
mãos, enquanto elas puderam segurar alguma coisa... e... É uma grande dor...
perdoa o meu pranto... A chaga dói fortemente, agora que eu tive que queimá-las
com razão... sem podê-las beijar... porque eram de leprosos. Mas Tu compadeces
de mim. Eu destruí as últimas lembranças deles... e agora estou com alguém que
se perdeu no deserto...”
O homem
se agacha chorando junto ao montão de cinzas que é a lembrança do seu
passado...
“Não
estais perdido, João, nem estás sozinho. Eu estou contigo. Aqueles restos que
te faziam lembrar-te dos que tinham ficado desfigurados pela doença, ou bonitos
e cheios de saúde, antes daquela ventura. Tudo são lembranças de dores.
Deixa-os entre as cinzas do fogo. Destrói-os com a certeza que Eu te dou: de
que os reencontrarás belos e felizes na alegria do Céu. O passado morreu, João.
Não chores mais por ele. A luz não para a fim de ficar olhando as trevas da
noite, mas fica alegre por separar-se dela e poder brilhar, à medida que vão
subindo para o céu com o sol de cada manhã. E o sol não fica parado no oriente,
mas se ergue, voa para a frente, até chegar ao alto do firmamento. A tua noite
terminou. Não fiques mais pensando nela. Sobe para lá com o seu espírito, para
onde Eu, que sou a Luz, te levo. Pela doce esperança e pela fé. Lá sim,
encontrarás alegria, porque a tua caridade poderá encontrar-se com Deus e com
os teus queridos, que te estão esperando. Não é mais do que uma rápida subida,
e logo estarás lá no alto com eles, Esta
vida é um sopro. A eternidade é um eterno presente.”
“Tens
razão, Senhor. Tu me confortas e me ensinas como superar esta hora com justiça.
Mas Tu és o sol para estares perto de mim, enquanto te for concedido. Retira-te
Mestre. Já me deste o suficiente. Poderia fazer-te mal este sol, que já está
bem forte.”
“Eu vim
para estar contigo. Todos nós viemos para isso. Sai de onde estás, vem para o
lado das árvores, e estaremos juntos sem perigo.”
O homem
obedece, deixando o penhasco, a cujos pés está o montão de cinzas, o passado, e
ele vai na direção do lugar para onde Jesus se dirige, e onde estão comovidos
os apóstolos, as mulheres, os moradores do povoado e aqueles que vieram da
cidade para ouvirem o Mestre.
“Acendei
o fogo, para cozinhar o peixe. Repartiremos o alimento em um banquete de amor”,
ordena Jesus.
Sem comentários:
Enviar um comentário