“NO TERCEIRO DIA, UMA LUZ VINDA DOS CONFINS DO UNIVERSO, COMO UM METEORO, VAI DIRETO ATÉ O SEPULCRO, QUANDO UM ESTRONDO SACODE A TERRA, AFASTANDO A ENORME PEDRA QUE O SELAVA, E OS GUARDAS ROMANOS FICAM ATORDOADOS. A LUZ ENTÃO ENTRA NO CORPO INERTE DE JESUS, QUE EM SEGUIDA LEVANTA, TRANSPASSANDO OS PANOS DA MORTALHA COM SEU CORPO IMATERIAL FULGURANTE. RESSUSCITANDO DOS MORTOS COM UMA MATÉRIA INCORPÓREA DE INTENSA LUZ, CONHECIDA APENAS POR DEUS, DE UMA BELEZA INDESCRITÍVEL.”

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

JESUS E O MENDIGO OGLA


JESUS E O MENDIGO OGLA


Jesus continua indo para a frente, a fim de ir tomar uma refeição em alguma pequena praça de segunda classe, já na periferia da cidade, que está toda ensombreada pelo entrelaçamento dos ramos de árvores de várias espécies. Tenho a impressão de que seja aqui uma parte do morro que, há pouco tempo teria sido incluída dentro dos limites da cidade, e que por isso conserva ainda aquela lembrança do seu estado nativo.
O primeiro a aproximar-se de Jesus, que está comendo pão com azeitonas, é um pobre homem andrajoso. Ele lhe pede um pouco de pão. E Jesus lhe dá o seu, junto com todas as azeitonas que tem na mão.
“E Tu? Estamos sem dinheiro, e Tu sabes disso?, observa Pedro.
“Deixamos tudo com o Ananias.”
“Não importa. Eu não estou com fome. Com sede, sim...”
O mendigo diz: “Aqui atrás há um poço. Mas, porque me deste o pão todo? Podias ter-me dado a metade dele... Se não tiveres nojo de recebê-lo de volta...”
“Come, come. Eu posso ficar sem ele. Mas, para que não fiques pensando que Eu tenha nojo de ti, dá-me com as tuas mãos, somente um pedaço. E Eu o comerei para ser teu amigo...”
O homem, com um rosto triste e sombrio, procura mostrar um sorriso mais pasmado, e diz: “Oh! É esta a primeira vez, desde que eu me tornei o pobre Ogla, que alguém me diz querer ser meu amigo!”, e dá o pedaço de pão a Jesus. E lhe pergunta: “Quem és Tu? Como te chamas?
“Sou Jesus de Nazaré, o Rabi da Galiléia.”
“Ah! Já ouvi outros falarem de Ti... Mas... não és Tu o Messias?”
“Eu o sou.”
“E Tu, Messias, és tão bom assim com os mendigos? O tetrarca faz que seus servos batam em nós, se nos vir andando pelo caminho...”
“Eu sou o Salvador. Não bato, mas amo.”
O homem olha para Ele com um olhar parado. Depois começa a chorar.
“Por que estás chorando?”
“Porque eu quereria ser salvo... Não estás mais com sede, Senhor? Eu Te levaria ao poço, e lá te falaria...”
Jesus percebe que o homem lhe quer confidenciar alguma coisa, e se levanta, dizendo: “Vamos.”
“Eu também vou!”, deixa escapar Pedro.
“Não. Eu volto logo por outro lado... É preciso que se tenha amor a quem se arrepende.”
Vai com o homem para trás de uma casa, depois da qual se estende a campina.
“Ali está o poço... Bebe, e depois me escuta.”
“Não homem. Desabafa-te antes comigo da tua ansiedade e depois Eu beberei. E talvez ficarei tendo uma fonte até mais doce do que a água da terra, para matar a minha sede.”
“Que fonte é, Mestre?”
“O teu arrependimento. Vamos lá para debaixo daquelas árvores. Aqui as mulheres nos ficam observando. Vem”, e lhe põe a mão sobre o ombro, e o faz andar para a frente, para debaixo de umas viçosas oliveiras.
“Como sabes que eu sou culpado, e que estou arrependido?”
“Oh! Podes falar. E não fiques com medo de Mim.”
“Senhor, nós éramos sete irmãos, filhos de um mesmo pai, mas eu tinha nascido da mulher que meu pai havia desposado quando ele ficou viúvo. E eu era odiado pelos outros seis. Meu pai, ao morrer, fez a partilha dos bens entre todos, com uma medida igual. Mas, depois que ele morreu, os seis corromperam os juízes, tiraram-me todos os bens e me expulsaram, a mim e à minha mãe, fazendo acusações infames contra nós. Minha mãe morreu, quando eu estava com dezesseis anos... e morreu de tanto sofrer. E, desde aquele tempo, não tive mais ninguém que me amasse...”, e chora com muito sentimento.
Depois ele se controla, e continua: “Os seis, ricos então e felizes, prosperaram com o que era meu também, e eu ia morrendo de fome porque havia ficado doente, ao ver que dar assistência a minha mãe consumida... Mas Deus os feriu um por um. Eu os amaldiçoei tanto, e tanto os odiei, que as minhas pragas caíram sobre eles... Estava eu fazendo mal? Com certeza. Eu sei disso. E o estava sabendo. Mas, como poderia eu deixar de odiá-los e de amaldiçoá-los? O último deles, que na realidade era o terceiro nascido, resistia a todas as maldições, e até vivia na prosperidade, com os bens dos outro cinco, e dos quais se havia apropriado legitimamente para os três menores, que morreram sem mulher, pois a mulher do primogênito morreu sem deixar filhos, mas fraudulentamente quanto ao segundo, a cuja mulher e aos filhos ele havia, por meio de enganos e empréstimos, tomado grande parte do que era do pai. E, quando ele, por acaso, se encontrava comigo em alguma das feiras e que eu ia como servo de um homem rico, para vender alguma mercadoria, ele me insultava e me dava bordoadas... Certa tarde eu me encontrei com ele... Ele estava sozinho. Estava sozinho e um pouco embriagado pelo vinho. E eu já estava embriagado por recordações e pelo ódio. Fazia dez anos que minha mãe havia morrido. E ele me insultou, ao insultar a falecida... Ele a chamou de “cadela imunda”, e me chamou de “filho da hiena”... Senhor, se ele não tivesse tocado em minha mãe... eu o teria tolerado. Mas ele a insultou... Eu o peguei pelo pescoço. E lutamos. Eu queria somente dar-lhe uma surra... Mas ele escorregou no chão, e o chão estava coberto de uma erva escorregadia, e em declive... Abaixo daquele ponto havia um despenhadeiro e uma torrente... E ele rolou, embriagado como estava, e caiu lá embaixo. E, depois de tantos anos, ainda o procuram... Mas ele ficou certamente sepultado por entre as grandes pedras e as areias de alguma das torrentes que vêm do Líbano. Ele não voltou mais a Cesaréia de Panéades. E eu saí de onde estava já sem paz... Ah! A maldição de Caim! Medo de viver... e medo de morrer... Diziam que Tu vias por dentro o coração do homem. Mas, são tão maus os rabinos de Israel! Não sabem o que é ter piedade. Tu, que és o Rabi dos Rabis, eras o meu terror... E, ao ver-me diante de Ti, eu procurava fugir. Contudo, eu quereria ser perdoado...” E chora agachado no chão.
Jesus olha para ele, e murmura: “Vamos pegar e por sobre Mim também estes pecados! Meu filho! Escuta: Eu sou a Piedade, não o terror. Também por ti é que Eu vim. Não te envergonhes por causa de Mim... Eu sou o Redentor. Queres ser perdoado de quê?
“Do meu delito. Queres saber qual? Matei o meu irmão.”
“Tu disseste: “Eu queria somente dar-lhe uma surra”, porque naquele momento estavas ofendido e irado. Mas, quando tinhas ódio e maldiçoavas não a um, mas os seis irmãos, não estavas sendo ofendido, nem irado. Tu o fazias como quem respira. Era uma coisa espontânea. O ódio e a maldição, e a alegria por vê-los castigados era o teu pão espiritual, não é verdade?”
“Sim, Senhor. Durante dez anos esse foi o meu pão.”
“Pois bem, na realidade, o maior delito tu o começaste, desde o momento em que odiaste e amaldiçoaste. És homicida de teus irmãos seis vezes.”
“Mas, Senhor, eles me haviam arruinado e odiado... E minha mãe morreu de fome...”
“Queres dizer que tinhas razão ao tirares vingança?”
“Sim, Quero dizer isso.”
“Não tens razão. Deus é que devia punir. Tu devias amar. E Deus teria te abençoado na Terra e no Céu.”
“E, então? Ele não me abençoará nunca mais?”
“O arrependimento traz consigo de volta a bênção. Mas, que dor, que aflição procuraste para ti mesmo. Muito mais do que as que te davam os teus irmãos, foram as que deste a ti mesmo com o teu ódio.”
“É verdade! É verdade! É um horror que já vem durando vinte e seis anos. Oh! Perdoa-me em nome de Deus. Tu estás vendo como eu sinto em mim a dor pela culpa! Eu nada peço para a minha vida. Eu sou mendigo e doente. Mas assim eu quero ficar, para sofrer e expiar. Dá-me, pois a paz de Deus! Tenho feito sacrifícios no templo, sofrendo até fome, para ajuntar algum dinheiro para o holocausto. Mas eu não podia falar em meu delito, e não sei se terá sido aceito o sacrifício.”
“Foi nulo. Ainda que cada dia tivesses oferecido um, que te adiantaria isso, se o imolavas com mentira? Rito supersticioso e inútil é o que não é precedido por uma sincera confissão da culpa. Uma culpa se ajuntava a outra e, por isso era mais do que inútil. Era uma oferta sacrílega. O que tu dizias ao sacerdote?”
“Eu dizia: “Pequei por ignorância, fazendo coisas proibidas pelo Senhor, e quero fazer expiação por elas. Eu pensava: “Eu sei em que foi que eu pequei, e Deus também o sabe. Mas a um homem eu não posso falar com clareza. Deus, que tudo vê, sabe que eu estou pensando é no meu pecado.”
“Estas são restrições mentais, umas escapatórias indignas. O Altíssimo odeia tais coisas. Quando se peca, procura-se fazer expiação. Não faças mais assim.”
“Não, Senhor. E estarei perdoado? Ou deverei ir confessar todas as coisas uma por uma? Ou pagar com a vida, a vida que eu tirei? A mim me basta morrer com o perdão de Deus.”
“Estas vivo para expiar. Não poderias dar de novo o marido a viúva, nem o pai aos filhos... Antes de matar, antes de deixar que o ódio se torne dono de nós, teria sido preciso pensar! Mas, levanta-te, e caminha pelo novo caminho. Ao ires andando, encontrarás os meus discípulos, Os montes da Judéia, se fores de Tecué até Belém, certamente estão sendo percorridos Poe eles. Dize-lhes que Jesus te mandou, e diz que, antes do Pentecostes, Ele subirá de novo para Jerusalém, passando por Betsur e Beter. Procura Elias, José, Levi, Matias, João, Benjamim, Daniel, Isaque. Será que te lembrarás destes nomes? Dirige-se a eles em particular. E agora vamos.”
“E Tu, não bebes?”
“Eu bebi o teu pranto. Uma alma que volta para Deus! Nada existe mais remunerador para Mim.”
“Então, eu estou perdoado? Pois Tu disseste “Volta para Deus...”
“Sim, Estás perdoado. E não odeies mais.”
O homem se inclina de novo, pois se havia posto de pé, e beija os pés de Jesus.


(De Jesus à Valtorta, Vol. 6, pgs.188 a 192) 

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