SE O HOMEM SOUBESSE “DOMINAR”...
5 de março de 1944.
Jesus diz:
“ Não se lê no Gênesis
que Deus fez o homem para dominar tudo o que havia sobre a terra, ou seja,
tudo, com exceção de Deus e dos seus ministros angélicos? Não se lê que fez a
mulher para ser companheira do homem na alegria e na dominação de todos os
seres vivos? Não se lê que eles podiam comer de tudo, menos da árvore da
ciência do Bem e do Mal? Por quê? O que está subentendido nas palavras “para
que domines”? O que está sub-entendido na árvore da ciência do Bem e do Mal?
Nunca vos fizestes tais perguntas, vós que viveis perguntando tantas coisas
inúteis, mas não indagam vossa alma a respeito das verdades celestes? A vossa
alma, se estivesse viva, vos responderia. Quando ela está na graça de Deus, está
bem segura, como uma flor entre as mãos do vosso anjo. Quando está na graça de
Deus, é como uma flor beijada pelos raios do sol, borrifada por um orvalho do
Espírito Santo, que a aquece e ilumina, que a irriga e adorna com suas luzes
celestes. Quantas verdades vos diria a vossa alma, se soubésseis conversar com
ela, se a amásseis, como se ama alguém que voz faz semelhantes a Deus, que
também é Espírito. Que grande amiga teríeis, se amásseis a vossa alma, em vez
de odiá-la, ao ponto de matá-la? Que grande e sublime amiga com a qual
poderíeis falar das coisas do céu, vós que gostais tanto de falar, e vos
arruinais reciprocamente, com amizades que, se não são indignas, pelo menos são
quase sempre inúteis, transformando-se num vazio vão e nocivo de palavras, totalmente
terrenas. Não disse Eu: “Quem me ama
guardará a minha palavra e meu Pai o amará, e viremos a ele e faremos nele
morada?” A alma no estado de graça possui o amor, possuindo então Deus, ou
seja, o Pai que mantém esta alma, o Filho que a ensina, o Espírito que a
ilumina. Possui, portanto, o Conhecimento, a Ciência, a Sabedoria. Possui a Luz.
Pensai, então, nas conversações sublimes que vossa alma poderia entabular
convosco. São os diálogos que encheram os silêncios dos calabouços, das celas,
dos ermos, dos aposentos dos enfermos santos. Souberam confortar os que estavam
encarcerados, à espera do martírio, os enclausurados por amor à busca da
Verdade, os ermitãos ansiosos pelo conhecimento antecipado de Deus, os enfermos
pela suportação. Em suma, souberam ensinar o amor à cruz. E se soubésseis fazer
perguntas à vossa alma, ela vos diria que o significado verdadeiro, exato, vasto como a criação, da
palavra “domina” é este:
“O homem deve dominar tudo, em todos os estados: o estado
inferior, que é o animal; o estado mediano, que é o moral e o estado superior,
que é o espiritual. O homem usa os três estados para atingir um único fim, que
é possuir a Deus”. Merecer isto através deste férreo domínio, que subjuga as
forças do eu, tornando-as escravas deste único objetivo: merecer a possessão de
Deus. Vossa alma vos diria que Deus proibira o conhecimento do Bem e do Mal,
porque o Bem tinha sido dado por Ele ás suas criaturas gratuitamente, mas Ele
desejava que o Mal vós não conhecêsseis, porque é um fruto doce ao paladar, mas
que, descendo para o sangue, desperta uma febre que mata, produzindo uma tal
ardência, que quanto mais se bebe daquele suco mentiroso, mais se tem sede
dele. Vós me objetareis: “Então, por que o Mal foi colocado diante de nós?”. Porque é uma força que nasceu por si mesma,
como nascem certos males monstruosos até nos corpos mais sadios.
Lúcifer era um anjo, o mais belo dos anjos. Espírito
perfeito, inferior somente a Deus. No entanto em seu ser luminoso nasceu uma
sombra de soberba, que ele não tratou de dispersar, mas, ao contrário, procurou
condensar, incubando-a. Dessa incubação, nasceu o Mal. Este existia, antes que
o homem fosse criado. Deus havia precipitado o maldito incubador do Mal para
fora do Paraíso, que tinha se maculado com este Mal. Não podendo mais sujar o
Paraíso, o eterno incubador do Mal sujou a Terra. A planta metafórica quer
demonstrar esta verdade. Deus tinha dito ao homem e à mulher: “Vós conheceis
todas as leis e os mistérios da criação. Mas não queirais usurpar-me o direito
de ser o Criador do homem. Para propagar a raça humana, bastará o meu amor, que
circulará entre vós, sem libido de sensualidade, mas pelo impulso da caridade,
que suscitará novos Adãos. Tudo eu vos dou. Só me reservo este mistério da
formação do homem”. Satanás quis tirar esta virgindade intelectual do homem e,
com sua língua serpentina, aplacou, acariciando membros e olhos da Eva, fazendo
surgir neles reflexos e sagacidades, que antes não tinham, quando a malícia não
os tinha intoxicado ainda. Ela “viu”. E quis experimentar. A carne foi
despertada. Oh! se tivesse chamado por Deus! Se tivesse corrido para ir
dizer-lhe: “Pai, eu estou doente. A Serpente me acariciou, e estou perturbada”.
O Pai a teria purificado, e curado com o seu hálito, que podia infundir-lhe
novamente a inocência, como lhe havia infundido a vida, fazendo-a esquecer-se
do tóxico da Serpente, colocando nela a repugnância por ela, como acontece com
aqueles que foram assaltados por algum mal, guardando uma instintiva
repugnância dele. Mas Eva não foi ao Pai. Ela voltou à Serpente. Aquela
sensação foi doce para ela: “Vendo que o fruto da árvore era bom para se comer,
bonito de se ver e agradável ao aspecto, foi apanhá-lo, e comeu”. E
“compreendeu”. A malícia já tinha começado a morder-lhe as entranhas. Ela
passou a ver com outros olhos, e a ouvir com outros ouvidos, os usos e as vozes
dos irracionais. Passou a desejá-los com uma louca cobiça. Ela iniciou sozinha
o pecado. E o terminou com o seu companheiro. Por isso é que sobre a mulher
pesa uma pena maior. Foi por meio dela que o homem se tornou rebelde a Deus e
que ele conheceu a luxúria e a morte. Foi por ela que ele não soube mais
dominar os três reinos: do espírito, porque permitiu que o espírito desobedecesse
a Deus; da moral, porque permitiu que as paixões o dominassem; e da carne,
porque o aviltou, submetendo-o às leis instintivas que regem os brutos. “A
Serpente me seduziu”, diz Eva. “A mulher me ofereceu o fruto, e eu o comi”, diz
Adão. A tríplice concupiscência rouba os seus três reinos do homem. Somente a
Graça pode desacorrentar o homem preso àquele monstro impiedoso. Mas, se a
Graça é viva, mantida sempre assim pela vontade do filho fiel, ela chega a
destroçar o monstro, e não é preciso temer mais nada: nem os tiranos internos,
isto é, a carne e as paixões; nem os tiranos externos, ou seja, o mundo e os
poderosos dele. Nem as perseguições. Nem a morte. É como diz o Apóstolo Paulo:*
“Nenhuma destas coisas eu temo, nem amo a minha vida mais do que a mim mesmo,
contanto que eu leve a bom termo a minha carreira e o ministério que recebi do
Senhor Jesus, que é o de dar testemunho do Evangelho da Graça de Deus”.
(O Evangelho como me foi Revelado – Maria Valtorta, Vol. 1)
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