O BATISMO DE JESUS
“João estava no meio de uma condenação ainda mais veemente dos
crimes da humanidade, pois era homem que não tinha paciência com o menor dos
pecados e pouca compaixão havia em sua alma, quando, subitamente, Jesus
apareceu acima dele, no barranco do rio. Que fez o povo levantar
instantaneamente a cabeça e olhar para Ele, com súbito silêncio? Estava de pé
no barranco do profundo rio verde, e um feixe de luz solar fazia com que
brilhassem seu cabelo e sua barba dourados. Olhava para João e para o povo
soluçante com Seus piedosos olhos azuis.
Ezequiel contou-me que Ele tinha a majestade de um rei, o
esplendor de um grande potentado, a glória de um profeta, a autoridade de um
Moisés, ali, de pé, com suas roupas de camponês e seus pés descalços. Sentia-se
que uma visão aparecera, e mesmo os que O conheciam sentiam-se tomados de
respeitoso temor, pois nunca tinham visto envolvido em poder sobrenatural.
Vendo-o, João parou sua fala de censura, e chorou, estendendo
as mãos para seu parente. Então, Jesus no meio daquele silêncio inexplicável,
desceu o barranco e pediu que João O batizasse. João ficou horrorizado. Cruzou
os braços sobre o peito, depois de tocar na testa com os dedos. E disse, em voz
fraca. “Mas eu é que devia ser batizado por Ti.” Jesus sorriu meigamente e
olhou para o rosto das pessoas que ali estavam. Inclinou a cabeça, entrou na
água e esperou, calmamente. O povo tomava completamente os barrancos. Alguns de
Nazaré murmuravam para seus vizinhos: “Mas é Jesus, nosso vizinho, nosso
carpinteiro, o filho de Maria e José, que conhecemos!” Ficavam a olhar para os
dois homens no rio, um de aparência tão selvagem, o outro tão silencioso e tão
cheio de dignidade. E assim João batizou-O, erguendo a água verde em suas mãos
trêmulas, o rosto maravilhosamente humilde, e com lágrimas nos olhos. As
árvores espessas e as moitas lançavam sombras esmeraldinas sobre os dois, e
ainda assim a barba e a cabeça de Jesus pareciam douradas.
Foi imediatamente depois do batismo que uma coisa estranha
aconteceu, embora tivesse havido certa discussão quanto aos pormenores. Jesus
ficou subitamente luminoso, como se as árvores se houvessem afastado
bruscamente a fim de deixar passar o sol e sua luz rigorosa, e fosse
deslumbrador demais aquele momento ppara que se pudesse olhar para Ele. Um
pássaro branco surgiu, não se saberia dizer de onde, e pousou-lhe no ombro. E
uma grande Voz foi ouvida, saindo do céu: “Tu és aquele meu Filho especialmente
amado e em Ti é que tenho posto toda a minha complacência.”
Ezequiel jura que isto aconteceu, meu caro Lucano --- disse
Isaque, enxugando as lágrimas de seus velhos olhos com a manga de sua veste
---, e Ezequiel jamais mentiu em sua vida. Voltou para Nazaré muito agitado e
contou-me, explodindo depois em soluços. “Eu ouvi a voz de Deus!”, exclamava e
tornava a exclamar, tapando os ouvidos com as mãos, como se tentasse reter
aquele som. Estava fora de si de arrebatamento e medo, e ele é, habitualmente
um jovem de muita compostura.
Quando nossos conterrâneos nazarenos voltaram para casa,
muitos deles estavam nas condições de Ezequiel. Aglomeravam-se em torno da casa
humilde de Maria e Jesus, onde eles viviam sozinhos desde a morte de José.
Gritavam que Jesus viesse falar com eles, e finalmente Jesus saiu pata o limiar
da porta, e as pessoas caíram prostradas diante Dele, que as abençoou,
sorrindo, com aquele seu sorriso bondoso e compassivo. Conhecia sua gente e
sabia quanto eram pobres aquelas pessoas, como eram desprezadas pelos levitas e
fariseus, como eram oprimidas pelos impostos romanos, como eram sem defesa.
Amava-as; eram sua gente.
(do Livro: Médico de
Homens e de Almas – A história de São Lucas – Taylor Caldwell – Editora Record –
Rio de Janeiro – 2014- pgs. 688 a 689)
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