A morte de Joaquim e de Ana foi suave
depois de uma vida de sábia fidelidade a Deus nas provações
31
de agosto de 1944.
Jesus
diz:
“Como
um rápido crepúsculo de inverno, no qual o vento forte com neve acumula nuvens
pelo céu, assim, a vida dos meus avós conheceu rapidamente o chegar da noite,
depois que o sol deles se deteve, brilhando na sagrada cortina do Templo. Mas,
foi dito: “A Sabedoria inspira vida aos seus filhos, toma sob a sua proteção os
que a procuram... Quem ama a sabedoria, ama a vida, e quem fica vigilante para
adquiri-la, haverá de gozar de sua paz. Quem a possui, terá como herança a
vida... Quem a serve, obedecerá ao Santo, sendo muito amado por Deus... Se crer
nela, a terá por herança, confirmada pelos seus descendentes, porque ela o
acompanha nas provações. Antes de tudo, o escolhe, depois enviará sobre ele
todos os temores, medos e provações, atormentando-o com o açoite de sua
disciplina, para prová-lo em seus pensamentos e adquirir confiança nele. Depois
lhe dará estabilidade, voltando a ele por um caminho reto e o fará contente.
Ela lhe descobrirá os seus segredos, porá nele tesouros de ciência e de
inteligência, que se manifestarão em obras de justiça. Sim, tudo isso foi dito.
Os livros sapienciais são aplicáveis a todos os homens que neles encontram um
espelho para o seu comportamento e sua guia. Mas felizes aqueles que podem ser
identificados entre os amantes espirituais da Sabedoria.
Eu
me fiz rodear de sábios, que foram meus parentes mortais. Ana, Joaquim, José,
Zacarias e ainda mais, Isabel, e depois o Batista. Acaso não são eles
verdadeiros sábios? Não falo de minha mãe, na qual a Sabedoria fez sua morada. Da
juventude até o túmulo, a sabedoria tinha inspirado uma vida agradável a Deus
aos meus avós, protegendo-os do perigo de pecar, como uma tenda que protege da
fúria dos elementos. O santo temor de Deus é base para a planta da sabedoria, a
qual lança todos os seus ramos, até atingir, no seu vértice, o amor tranqüilo,
na sua paz, o amor pacífico, na sua segurança, o amor seguro, na sua
fidelidade, o amor fiel, na sua intensidade, enfim, o amor total, generoso e
ativo dos santos.
“Quem
ama a sabedoria, ama a vida, e terá a Vida como herança”, diz o Eclesiástico.
Isto está ligado à minha Palavra: “Aquele que perder a vida por amor de Mim,
salvá-la-á”. Porque não se trata da pobre vida desta terra e, sim, da vida
eterna; não se trata das alegrias de um momento, mas das alegrias imortais. Foi
neste sentido que Joaquim e Ana amaram a sabedoria. E ela esteve com eles nas
provações. Quantas provações! Vós que, por não serdes completamente maus,
desejaríeis não ter nunca que chorar e sofrer! Imaginem, estes justos quantas
dessas provações tiveram, embora merecessem ter Maria por filha! A perseguição
política que os expulsou da terra de Davi, empobrecendo-os grandemente. A
tristeza de ver reduzir-se a nada os anos que iam passando, sem que uma flor
lhes dissesse: “Eu serei a vossa continuação”. E, depois, o receio de tê-la
conseguido já na idade em que não tinham nenhuma certeza de chegarem a vê-la
mulher. Além disso, o dever que teriam de cumprir, de afastá-la de seus
corações, para a colocarem sobre o altar de Deus. Ainda mais: tiveram que viver
num silêncio bem mais pesado; depois de estarem já habituados com o arrulhar de
sua pombinha, com o rumor de seus passinhos, os sorrisos e beijos de sua
filhinha, ficaram agora esperando apenas, por entre recordações, a hora de
Deus. E muitas outras coisas. Doenças, calamidades do tempo, prepotência dos
poderosos, quantos duros golpes assestados contra o frágil castelo de sua
modesta propriedade. E ainda não basta. O sofrimento da filha, que está longe
deles, que vai ficar sozinha e pobre, apesar de todos os cuidados e
sacrifícios, não tendo mais do que as sobras dos bens paternos. Como irá esta
filha encontrar essas sobras, se ficarem por muitos anos sem serem cultivadas,
imobilizadas, à sua espera? Temores, medo, provações e tentações. E fidelidade,
fidelidade, fidelidade sempre, a Deus. E a tentação mais forte: que não se lhes
negasse o conforto de terem sua filha junto a eles quando já estivessem bem
idosos. Mas, os filhos são de Deus, antes de serem dos pais. E cada filho pode
dizer isto que Eu disse à minha mãe: “Não sabes que Eu devo tratar dos
interesses do Pai do Céu?” E cada mãe, cada pai deve aprender o que fazer,
olhando Maria e José no Templo, ou Ana e Joaquim na sua casa de Nazaré, cada
vez mais despojada e mais triste, embora possua algo que não diminui nunca,
crescendo sempre mais: a santidade de dois corações, a santidade de um
casamento.
O
que resta a Joaquim, já enfermo, e o que resta à sua sofredora esposa, nas
longas e silenciosas tardes de velhos a caminho da morte? Os vestidinhos, as
primeiras sandalinhas, os pobres brinquedos de sua pequenina, que agora está
longe deles, e sempre as lembranças. E, com as lembranças, uma paz que lhes
nasce no coração, quando cada um pode dizer: “Estou sofrendo, mas cumpri o meu
dever de amor para com Deus”. Estamos, pois, diante de uma alegria sobre
humana, que brilha com uma luz celestial, desconhecida aos filhos do mundo, e
que não perde o brilho ao cair, como pálpebra pesada sobre dois olhos
moribundos, mas que, na sua última hora, resplende ainda mais, evidenciando
verdades ocultas durante toda a vida, fechadas como borboletas em seus casulos,
que só davam sinal de sua presença por movimentos suaves, enquanto que agora
podem abrir suas asas douradas, mostrando as palavras que as adornam. A luz de
suas vidas vai-se apagando no conhecimento de um futuro feliz para eles e para
sua estirpe, com um louvor ao nome do Senhor sobre os lábios. Assim foi a
morte dos meus avós, justamente pela santa vida que tiveram. Por sua santidade
eles mereceram ser os primeiros guardiães da amada de Deus, e, somente quando
um sol maior se mostrou no ocaso de suas vidas, eles entenderam claramente a
graça que Deus lhes havia concedido. Por sua santidade, Ana não passou pelos
sofrimentos da mulher que dá à luz, mas, sim, pelo êxtase de quem trazia
consigo aquela que é a sem culpa. Para os dois não houve aflições de agonia,
mas uma languidez que foi-se desvanecendo, assim como docemente vai se apagando
uma estrela, à medida que o sol vem surgindo com a aurora. Eles não tiveram o
conforto de ter-me consigo, Sabedoria Encarnada, como pôde José; no entanto, Eu
era a invisível Presença que, inclinada sobre o travesseiro deles, fazendo-os
adormecer em paz, na esperança do triunfo, lhes dizia sublimes palavras. Há
quem diga: “Por que não tiveram que sofrer para gerar, nem para morrer, sendo
eles também filhos de Adão?”. Eu respondo: “O Batista foi pré-santificado só
por ter chegado perto de Mim, quando estava no ventre de sua mãe, tendo sido
ele também filho de Adão, concebido com o pecado original; não teria recebido
nenhuma graça a santa mãe daquela que não teve mancha, preservada por Deus, por
trazer o próprio Deus no seu espírito quase divino e no seu coração
embrionário, sem nunca de Deus se separar, desde que foi pensada pelo Pai,
concebida num ventre, tornando a possuir Deus plenamente no céu por uma
eternidade gloriosa? E ainda respondo: “A reta consciência dá uma morte serena,
e as orações dos santos vos alcançam tal morte”.
Joaquim
e Ana deixaram atrás de si uma vida inteira vivida numa consciência reta, que
surge então como plácido panorama, servindo-lhes de guia para o Céu. Eles
tinham a santa, em oração pelos seus pais que estavam longe, diante do
Tabernáculo de Deus, pais colocados por ela em segundo lugar depois de Deus,
que é o Bem supremo, mas que eram amados, como a lei e o sentimento o exigiam,
com um amor sobrenaturalmente perfeito”.
(
De Jesus à Valtorta – O Evangelho como me foi Revelado – V0l. 1)
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