“NO TERCEIRO DIA, UMA LUZ VINDA DOS CONFINS DO UNIVERSO, COMO UM METEORO, VAI DIRETO ATÉ O SEPULCRO, QUANDO UM ESTRONDO SACODE A TERRA, AFASTANDO A ENORME PEDRA QUE O SELAVA, E OS GUARDAS ROMANOS FICAM ATORDOADOS. A LUZ ENTÃO ENTRA NO CORPO INERTE DE JESUS, QUE EM SEGUIDA LEVANTA, TRANSPASSANDO OS PANOS DA MORTALHA COM SEU CORPO IMATERIAL FULGURANTE. RESSUSCITANDO DOS MORTOS COM UMA MATÉRIA INCORPÓREA DE INTENSA LUZ, CONHECIDA APENAS POR DEUS, DE UMA BELEZA INDESCRITÍVEL.”

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

O NINHO CAÍDO


A LETRA E O ESPÍRITO DA LEI

Estou vendo Jesus vestido de branco e com o seu manto azul escuro, jogado sobre os ombros, e que vai indo por um caminho, pelo meio de um bosque. É como um bosque, porque de um e do outro lado, há árvores e arbustos. Muitas veredas cortam o emaranhado verde. Mas não deve ser este um lugar solitário, longe dos povoados, porque frequentemente se encontram outras pessoas. Dir-se-ia que é um caminho que une dois povoados próximos, passando através das propriedades dos moradores. O lugar é quase plano, vendo-se dele, ao longe, uns montes. Não sei que lugar seja este.
Jesus, que estava falando com os discípulos, para, e fica escutando, correndo o olhar ao redor, depois entra por uma pequena trilha, pelo meio da folhagem, e se põe a procurar. E encontra.
Não sei se o ninho foi derrubado por alguma tempestade, como me está fazendo pensar o solo úmido e os ramos que ainda estão gotejando, como se um temporal ou algum homem p tivesse jogado ali, antes de ser surpreendido com a ninhada na mão, isto eu não sei. Estou vendo apenas um pequeno ninho, feito com feno entrelaçado e cheio de pequenas folhas secas, de penugens tiradas das árvores ou de fiapos dela, no meio das quais se movem piando cinco pequeninos passarinhos de poucos dias, vermelhinhos, peludos, ainda feios por causa de seus bicos muito abertos e de seus olhos salientes. Lá no alto, no galho de uma árvore, os pais deles piam desesperadamente.
Jesus apanha com cuidado o pequeno ninho. Segura-o no côncavo da mão, e olha, procurando ver o lugar onde ele estava, ou então, onde poderá encontrar para ele um lugar seguro. Encontra um cruzamento de ramos de abrunheiro bravo, tão perto uns dos outros, que parecem formar um cestinho, e tão escondido no meio da moita, que só poderá ficar bem seguro. Sem se importar com os espinhos, que lhe arranham os braços, Jesus, depois de ter entregue o ninho ao Pedro — e o apóstolo, já tão adulto e robusto, está muito curioso, ao ver-se com aquele ninhozinho entre suas curtas e calosas mãos, arregaça suas largas e longas mangas, e trabalha para tornar ainda mais bem defendido e côncavo o cruzamento dos ramos do abrunheiro espinhoso. E, ei-lo pronto. Jesus torna a pegar o ninho e coloca lá no centro, fazendo-o ficar mais firme, tendo arrancado uns fios de umas ervas cilíndricas e compridas, que parecem uns juncos muito leves. Agora está seguro.
Jesus se afasta e sorri.
Ele se vira para voltar à estrada mestra, enquanto os pais dos passarinhos, com gritos de alegria, se precipitam sobre o ninho que foi recuperado.
Um pequeno grupo de homens está parado na beira da estrada. Jesus está à frente e olha para eles. O sorriso desaparece de seu rosto, que se torna muito severo, eu diria cor de cinza, pois estava antes muito cheio de piedade, quando estava apanhando o ninho, e tão feliz quando o viu refeito. Jesus para. Mas continua a olhar para as suas inesperadas testemunhas. Parece estar olhando para os pensamentos escondidos deles. Jesus não pode ir para a frente, porque aquele pequeno grupo está fechando-lhe o caminho. Mas fica calado.
Contudo Pedro não se cala. “Deixai passas o Mestre”, diz ele.
“Cala a boca Nazareno”, responde-lhe um do grupo. “Como o teu Mestre se permitiu entrar no meu bosque, e realizar trabalho braças em dia de sábado?”
Jesus olha diretamente para ele, com uma expressão estranha. É e não é um sorriso. Certamente não é um sorriso de aprovação. Pedro está para rebater. Mas Jesus toma a palavra: “Quem és tu?”
“O dono desta propriedade. Jocanã Bem Zacai.” “Um ilustre escriba.”
“De que é que me acusas?”
“De teres violado o sábado.”
“Jocanã Bem Zacai, conheces o Deuteronômio?”
“A mim o perguntas? A mim, um verdadeiro rabi de Israel?”
“Eu sei o que queres dizer: que Eu, visto que não sou um escriba, mas um pobre Galileu, não posso ser “rabi”. Mas Eu te pergunto de novo: “Conheces o Deuteronômio?”
“Certamente mais do que Tu.”
“Literalmente... pode ser. Mas, tu o conheces no seu verdadeiro significado?”
“O que foi dito, dito está. Não há outro significado.”
“De fato, só há um significado. É um significado de amor. E, se não queres chamá-lo amor, chama de misericórdia, e até mesmo, se te incomoda chamá-lo de amor, dize então: de humanidade. Pois o Deuteronômio diz: “Se vires extraviar-se a ovelha ou o boi do teu irmão, ainda que ele não seja teu vizinho, não irás para adiante. Mas os levarás a ele, ou tomarás conta deles, até que ele venha apanhá-los.” Diz também: “Se vires um asno ou um boi de teu irmão cair, não fiques parecendo não ter visto, mas ajuda-o a levantá-lo. E diz ainda: “Se encontras sobre uma árvore, ou no chão um ninho, com a mãe, que está chocando os ovos, ou já com os pequeninos nascidos, tu não tentarás pegar a mãe, pois ela é necessária para a procriação, mas apanharás somente os pequeninos.”
Eu vi no chão um ninho, e uma mãe que estava chorando sobre ele. E fiquei com dó, porque era uma mãe. E lhe entreguei seus pequeninos. Não achei, que estava violando o sábado, por ter consolado uma mãe. Não se há de permitir que fique extraviada a ovelha do irmão, e não diz a Lei se é culpa levantar um asno em dia de sábado. Ela só diz que se use de misericórdia para com o irmão, e de humanidade para com o asno, criatura de Deus. Eu pensei que Deus havia criado aquela mãe para que procriasse, e que ela havia obedecido à ordem de Deus, e que impedi-la de criar sua prole era criar um obstáculo à sua obediência a uma ordem divina. Mas tu não compreendes estas coisas. Tu e os teus guardais a letra, mas não o espírito. Tu e os teus não pensais que estais violando duas vezes, e até três vezes aviltando a palavra de Deus até à mesquinhez da mentalidade humana, pondo obstáculos a uma ordem de Deus, e faltando com a misericórdia para com o vosso próximo. Para ferirdes com a censura, não julgais que é um mal mover a língua sem necessidade. Isto, que também é um trabalho, e que não é nem necessário, nem bom, isto não vos parece uma violação do sábado.
Jocanã de Zacai, escuta-me. Como hoje tu não tens dó de uma toutinegra e, pela prática farisaica a farias morrer de dor e de aflição, farias perecer a prole dela, deixada ao alcance da áspide e do homem perverso, assim também amanhã não terás dó de uma mãe, e a farias morrer de dor ao fazeres matar sua prole, dizendo que é bom que assim se faça, por respeito à tua lei. Não à de Deus. Aquela que tu e os teus pares fizestes para oprimir os fracos e para triunfantes vós, os fortes. Mas, estás vendo? Os fracos sempre acham um salvador. Enquanto que os soberbos, os fortes segundo a lei do mundo, ficarão esmagadas pelo peso de sua própria e pesada lei.
Adeus Jocanã Bem Zacai. Lembra-te desta hora, e toma cuidado para não violares tu um outro sábado, com a complacência de um delito praticado.”
E Jesus, fazendo cintilar suas pupilas sobre o rosto cheio de ira do velho irado, olhando para ele de alto a baixo, pois o escriba é baixo e gordo, e Jesus parece uma palmeira, em comparação com ele, passa para a frente, tendo que pisar sobre a grama, porque o escriba não saiu do caminho.



Diz Jesus:
“Eu quis elevar o teu espírito com uma visão verdadeira, ainda que não tenha sido contemplada nos Evangelhos. Para ti o ensinamento é este: que Eu tenho muito dó dos passarinhos sem ninho, mesmo quando em vez de terem o nome de toutinegra, se chamam Maria e João. E trato logo de dar-lhes de novo um ninho, quando algum acontecimento os despojou dele.
Para todos o ensinamento é este. Que são muitos os que conhecem as palavras da Lei, e muitos mais, e que ainda são poucos, visto que todos deveriam conhecê-las. Mas conhecem apenas as palavras. E não vivem as palavras. Eis o erro.
O Deuteronômio prescrevia leis de humanidade, porque os homens daquele tempo eram, por sua infância espiritual, uns seres brutais, uns selvagens. Tinham que ser guiados pela mão, pelos caminhos floridos da piedade, do respeitado amor para com o irmão, que perde um dos seus animais, e para com o animal que cai, para com o passarinho que está chocando. Para ensiná-los a se elevar na prática de uma piedade, um respeito e um amor mais altos. Mas, quando Eu vim, aperfeiçoei as normas mosaicas e abri horizontes mais amplos. A letra já não era mais o “tudo”. O espírito é que se tornou o tudo. Acima do pequeno ato humano, a favor de um ninho e dos que moravam nele, é preciso ver o significado oculto daquele meu gesto: inclinar-me Eu, o Filho do Criador, diante da obra do Criador. Pois até aquela ninhada é obra dele.
Oh! Felizes aqueles que em todas as coisas sabem ver a Deus e servi-lo com um espírito de reverente amor. E ai daqueles que, como uma serpente, não sabem levantar a cabeça acima de sua lama, e, não podendo ter um canto de louvor a Deus, que se nos mostra nas obras dos irmãos, morde, a estes, com a grande abundância do veneno que os sufoca. Há muitos demais desses, que torturam os melhores, dizendo, para justificarem sua perversidade, que é bom fazer isso em respeito à Lei. Em respeito à lei deles. Não é de Deus, Pois este, se não pode impedir as obras más deles, contudo sabe vingar os seus pequeninos.
E isto serve para aqueles a quem foi dado.
A minha paz, que te vigia, esteja sobre ti.


(de Jesus à Valtorta, Vol. 6, pgs. 475 a 479)  

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