Via Sacra com as revelações feitas por Jesus a Maria Valtorta
Para que não
digam depois, quando estiverem diante de Deus no juízo final, que não sabiam,
mas sim, que não quiseram ouvir as canções e lamentações do Verbo de Deus à
seus instrumentos na terra. Que são os avisos e as recomendações vindas do Céu,
para que nós pudéssemos nos defender das ciladas do Enganador. Porque quem é
verdadeiramente de Deus, sabe quando é Deus quem fala.
Muito embora as
correspondentes passagens nos Evangelhos estejam referenciadas, optou-se por
ilustrar cada Estação da Via Sacra com as revelações feitas por Jesus a Maria Valtorta, onde os detalhes da
Paixão de Nosso Senhor favorecem a um profundo mergulho naqueles mistérios tão
caros para nossa salvação.
(O texto abaixo
reproduzido, bem como os demais, foram extraídos da obra de Maria Valtorta, dos
livros “ O Evangelho como me foi Revelado.”)
Acusado, condenado e
morto. Traído, renegado e vendido. Abandonado até por Deus, porque sobre Mim
estavam os delitos que Eu havia assumido. Mergulhado na lama de todos os vossos
pecados, fui jogado à profundeza escura da dor, sem ver mais a luz do Céu, que
correspondesse ao meu olhar de moribundo, nem a voz divina que respondesse à
minha última invocação.
Isaías nos diz qual
a razão de tão grande dor: “Verdadeiramente Ele tomou sobre si os nossos males
e suportou as nossas dores”.
As nossas dores!
Sim. Foi em lugar de vós que as suportei. Para aliviar as vossas, para
amenizá-las, para anulá-las, se me tivésseis sido féis. Mas não quisestes
sê-lo. Mas, como é que não
vistes Deus que brilhava na luz de sua infinita misericórdia, com aquela veste
posta sobre sua santidade em vosso favor?
Teria bastado um meu
olhar para reduzir a cinzas tanto os juízes, como os carrascos. Mas Eu havia
vindo voluntariamente para consumar o sacrifício, como um cordeiro, pois Eu era
o Cordeiro de Deus, e continuo a sê-lo eternamente, e me deixei levar para ser
despojado e morto, e para fazer de minha Carne a vossa Vida.
Quando fui levantado
na cruz, eu já estava acabado pelos sofrimentos sem nome, e tratado com todos
os nomes. Eu comecei a morrer desde Belém, ao ver a luz da terra tão cheia de
angústia e diferente para Mim, que era a Vida do Céu. Continuei a morrer na
pobreza, no exílio, na fuga, no trabalho, na falta de ser compreendido, nas
torturas, nas mentiras, nas blasfêmias. Estas coisas foram as que me foram
dadas pelo homem a Mim que tinha vindo para uni-lo com Deus!
Eu sou o Rei da dor, e
virei falar-te da minha dor com a minha veste real. Acompanha-me, não obstante
a tua agonia. Eu saberei, pois Eu sou Piedoso, pôr diante dos teus lábios,
intoxicados pela minha dor, também o mel perfumado de contemplações mais
serenas. Mas, por enquanto, deves ter preferência por estas de sangue, porque
por estas tu tens a Vida, e com elas levarás outros à Vida. Beija a minha mão
ensanguentada, e vigia, meditando sobre Mim Redentor. (p. 10-11)
Estações da Via Sacra
Primeira
Estação
† Jesus ora no Horto de
Getsêmani, Monte das Oliveiras
Mt
26,36-46; Mc 14, 32-42; Lc 22,39-46; Jo 18,1
Simão, chegou a hora de minha Paixão. E,
para torná-la mais completa, o Pai me retira a luz aos poucos, à medida que ela
se aproxima. Daqui a pouco só terei trevas e a contemplação do que são as
trevas, isto é, de todos os pecados dos homens.Tu não sabes, vós não podeis
entender. Ninguém, a não ser quem for chamado por Deus para alguma missão
especial compreenderá esse sofrimento dentro do grande sofrimento que é a Paixão
e, visto que o homem é material tanto no
amar como no meditar, haverá quem chore e sofra pelas pancadas por Mim
recebidas, pelas torturas do redentor, mas não medirá esta tortura espiritual
que – acreditai-o, vós que me ouvis – será a mais atroz de todas... (p. 16-17)
Ele faz uma longa e ardente oração,
uma verdadeira conversação com o seu Pai. "Tu o sabes... Eu sou o teu
Filho... Tudo, mas ajuda-me... A hora chegou... Eu não sou mais desta
terra. Eu te peço tua piedade... Será que Eu os farei salvos? Isto Eu quero: que do imundo os salves, da
carne, do demônio... Peço pelo homem, que é tua criatura, e que quis
transformar em barro até sua alma. Eu jogo na minha dor e no meu Sangue este
barro, a fim de que os tornem a incorruptível essência do espírito por Ti
amado. Ele [o demônio] é o rei nesta tarde. Tanto no palácio real, como nas
casas, por entre as milícias, no Templo... A cidade está cheia deles, e amanhã
será um inferno..." (p. 23)
É amargo demais este cálice! Afasta
isto do teu Filho! Mas, meu Pai, não dês
ouvidos à minha voz, se ela pede o que for contrário à tua vontade. Não te
lembres de que Eu sou teu Filho, mas somente teu servo. Não a minha vontade,
mas a tua seja feita.
Jesus fica assim por algum tempo. É um farrapo de homem sobre o qual pesam todos
os pecados do mundo, sobre o qual pesa toda a Justiça do Pai, sobre o qual
descem a escuridão, e aquela tremenda, mais que tremenda, tremendíssima coisa que é o abandono por Deus,
enquanto Satanás nos tortura... É a asfixia da alma. Isto é o Inferno...
Jesus geme, entre os estertores e
suspiros próprios da agonia: "Nada!... Nada!... Fora! Faça-se a vontade do
Pai. Ela! Só ela!..." Eu só tenho
um Senhor: Deus Santíssimo. Uma só Lei: a obediência. Um amor: a redenção....
Tenho por Mãe a Humanidade. E a amo até morrer por ela. A vida, Eu a entrego a
quem ma deu, e ma pede, o Supremo Senhor de todos os viventes. A Divindade, Eu
a afirmo, ao ser capaz desta expiação. A missão, Eu a cumpro com a minha morte.
Não tenho mais nada, a não ser fazer a vontade do Senhor, meu Deus. Vai para trás, Satanás. Eu sou de Deus."
(p. 26-27)
Depois não fala mais nada, a não ser
para dizer, com sua respiração entrecortada: "Deus! Deus! Deus!" E o
chama a cada batida do coração, e parece que a cada batida, o sangue
extravase. Mas uma claridade mais viva
se forma sobre sua cabeça, suspensa a mais ou menos um metro acima dele. Ele
levanta a cabeça. A lua brilha sobre o seu pobre rosto, mas ainda brilha mais a
luz angelical. E aparece toda a tremenda agonia no sangue que transpira pelos
poros. No rosto somente as lágrimas já
fazem dois riscos bem visíveis, ao longo da máscara vermelha. (p. 27-28)
Segunda
Estação
† Jesus, traído por Judas, é aprisionado
† Jesus, traído por Judas, é aprisionado
Mt
26,47-56; Mc 14,43-52; Lc 22,47-53; Jo 18,2-12
Judas se aproxima, suportando o
olhar de Jesus, que está com um daqueles olhares lampejantes dos seus melhores
dias. E não abaixa o seu rosto. E Judas se aproxima de Jesus com um sorriso de
hiena, e lhe dá um beijo na face direita.
“Amigo, que vieste fazer? Com um
beijo me trais?”
“A quem procurais?”, pergunta Jesus,
de modo calmo e solene.
“A Jesus de Nazaré.”
“Sou Eu. ”Sua voz foi como um
trovão.
E, como um feixe de espigas cortadas, todos
caem no chão. Ficam de pé somente Judas, Jesus e os apóstolos.
Mas, enquanto Jesus está falando, o
Pedro se aproxima do homem que está espichando umas cordas para amarrar Jesus e
dá um golpe desajeitado com a espada. Assim o que ele fez foi quase lhe arrancar a
orelha, que ficou pendurada com um grande gotejar de sangue.
“Guardai vossas armas. Eu vos mando.
Se Eu quisesse, teria os anjos do Pai para me defenderem. E tu, fica são.
Primeiro na alma, se podes.” E, antes de estender as mãos para as cordas, toca
no orelha, e a torna sã.
Os apóstolos dão uns gritos
desordenados. E quem não grita, foge.
E Jesus fica sozinho... Ele com os
esbirros... E começa o caminho... (p. 29-31)
Terceira Estação
† A condenação de Jesus perante o Sinédrio
† A condenação de Jesus perante o Sinédrio
Mt
26,57-68; Mc 14,53-65; Lc 22,54-55.63-71; Jo 18,13-14.19-24
[Na casa de Anás – p. 44-45]
De que me acusas?"
"Por teres inventado uma
doutrina nova."
"Ó sacerdote! Israel já está
cheio de novas doutrinas. Mas Eu, não. Eu tenho restabelecido a espezinhada fé
de meu Pai, o Deus Eterno, e simplesmente voltei a ensinar as dez proposições
do Decálogo, gastando todas as forças dos meus pulmões para fazer que elas
entrassem nos corações que não as conheciam mais."
"Que horror! Que blasfêmia! Não existe um Templo em Jerusalém?
Seremos agora como os desterrados da Babilônia? Responde."
"É isto mesmo que sois. E mais
ainda. Aqui há um Templo. Sim. Um edifício. Deus não está nele. De lá Ele
fugiu, diante da abominação que se pratica em sua Casa. Mas, por que é que me
fazes tantas perguntas, se minha morte já é uma coisa decidida?"
[À casa de Caifás – p. 46-49]
[o rabino Gamaliel] “Quem és tu? Dize-o a mim”. E Jesus docemente
lhe responde: “Lê os Profetas e neles encontrarás resposta. O primeiro sinal
está neles. O outro está para vir.”
"Se eu falei bem, por que é que
me bates? E, se Eu falei mal, por que é que não me dizes onde é que está o meu
erro? Eu repito: Eu sou o Cristo, o Filho de Deus. Não posso mentir. O Sumo Sacerdote, o
Eterno Sacerdote, sou Eu. Somente Eu é que trago o verdadeiro Racional, sobre o
qual está escrito: Doutrina e Verdade. É a estas que Eu sou fiel. Até à morte,
que é ignominiosa aos olhos do mundo, mas santa aos olhos de Deus e até à feliz
Ressurreição. Eu sou Ungido Pontífice e sou Rei. E já estou para segurar o meu
cetro, e com ele, como com uma peneira, Eu quero limpar a minha eira. Este
Templo será destruído e ressurgirá, novo e santo. Porque este atual é
corrompido, e Deus o entregou ao seu destino."
"Blasfemador!", todos
gritam em coro. "Seja réu de morte!"
E, com gestos de desprezo e de
escândalo, eles saem da sala, deixando Jesus à mercê dos esbirros e do
populacho. Assim passam as horas.
Jesus é levado de novo para o
tribunal. E todos, em coro, lhe repetem a pergunta capciosa: "Em Nome do
Deus verdadeiro, dize-nos: és tu o Cristo?"
E, tendo recebido a mesma resposta
de antes, eles o condenam à morte, e dão a ordem de conduzi-lo a Pilatos.
Quarta Estação
† As negações do Apóstolo Pedro
† As negações do Apóstolo Pedro
Mt
26,69-75; Mc 14,66-72; Lc 22,54-62; Jo 18,15-18.25-26
A aurora vem chegando com
dificuldade e esverdeada. Foi dada uma ordem, que levem o prisioneiro para o
Salão do Conselho, para um processo mais legal.
É nesse momento que Pedro nega
pela terceira vez conhecer o Cristo, quando este passa, já bem marcado pelos
sofrimentos. E à luz esverdeada da aurora, sua lividez parece ainda maior,
sobre o seu rosto de cor térrea, com os olhos mais fundos e vidrados, um Jesus
desfigurado pelas dores que lhe causa o mundo. E, precisamente no momento em
que aparece Jesus, não se ouve outra coisa, senão a voz rouca do Pedro,
dizendo: "Eu juro, mulher, que não o conheço." Suas palavras são
secas, cortantes, e foi a elas que o galo respondeu, também com palavras secas,
cortantes, como que brincando com elas, como se o fizessem pensar em alguma
coisa, e lha lançasse no rosto.
Então Pedro sentiu um
estremecimento. Girou sobre si mesmo, querendo fugir, mas foi logo dar de
frente com Jesus, que está olhando para ele com uma grande compaixão, com uma
dor tão amarga e intensa que me rasga o coração, como se, depois dela, tivesse
que se dissolver, e para sempre, o meu Jesus. Pedro dá um soluço, e sai de lá,
caindo em si, mas cambaleando como um ébrio. Ele foge atrás de dois servos que
aparecem na estrada e desaparecem, descendo, pela estrada ainda meio escura.
(p. 49-50)
Quinta Estação
† Jesus entregue a
Pilatos
Mt
27,11-26; Mc 15,2-15; Lc 23,1-5.13-25; Jo 18,28-40–19,1-16
[De volta a Pilatos, depois de Jesus
ter sido desprezado e tratado como um “doido” por Herodes]
“Hebreus, escutai. Vós me trouxestes
este homem como um incitador do povo. Diante de vós, eu o examinei, e não achei
nele nenhum dos delitos de que o acusais. Mas, para não desagradar-vos, tirando-vos este
passatempo, vos darei em troca Barrabás. E a Ele mandarei dar quarenta varadas.
E isso basta.”
"Não. Não. Barrabás, não. A
Jesus, a morte. E uma morte horrenda! Livra Barrabás, e condena o
Nazareno."
"Mas, ouvi bem. Eu disse
varadas. Não basta? Então, o farei flagelar. Isso é atroz, sabeis? Pode ser que
morra durante o ato. Que foi que Ele fez de mal? Eu não acho nenhuma culpa
nele. E o libertarei."
"Crucifica-o! Crucifica-o!
Mata-o!
"Seja flagelado", ordena
Pilatos a um centurião.
"Quanto?"
"Quanto te parecer. E assim
esta tarefa termina. Eu já estou aborrecido. Vai".
[Depois da flagelação e da coroação
de espinhos]
Jesus é levado de novo para o átrio.
Está ainda com a coroa, a clâmide [manto dos antigos gregos] e o caniço.
“Eis aqui o homem. O vosso rei. Ainda não
basta?”
Eles gritam, mostram os punhos, exigem
morte...
Jesus continua de pé. E eu lhes
asseguro que Ele nunca mostrou a nobreza desta hora. Nem mesmo quando Ele fazia
os mais estupendos milagres. A nobreza da dor. E, de tal modo divino, que
bastaria para pôr-lhe o nome de Deus. Mas, para dizer esse Nome é preciso que
se seja, pelo menos, homens. E Jerusalém hoje não tem homens, só tem demônios.
Jesus passa o olhar sobre a
multidão, procura e encontra, no meio dos rostos odientos, os rostos amigos. Menos de vinte amigos, no meio de milhares de
inimigos... E Ele inclina a cabeça entristecido pelo abandono. Uma lágrima
cai... depois outra... e mais outra. A vista do seu pranto não gera piedade,
mas ódio ainda mais feroz.
Pilatos está andando sobre espinhos.
Quereria e não quereria. Tem medo do castigo de Deus, tem medo do de Roma, e
tem medo das vinganças dos judeus. Por um momento o que vence é o medo de Deus.
E assim vai para a frente do átrio e troveja: “Ele não é culpado.”
“Se dizes isso, és inimigo do César.
Quem se torna réu é inimigo dele. Tu queres libertar o Nazareno. Nós vamos
fazer que o César fique sabendo disso.”
Pilatos se vê tomado pelo medo do homem.
“Quereis vê-lo morto, então? Que o
seja. Mas que o sangue deste justo não esteja em minhas mãos”. E, tendo feito
que lhe levassem uma bacia lavou as mãos na presença do povo, que parece estar
tomado por um frenesi, enquanto grita: “Sobre nós caia, sobre nós o sangue
dele. Caia sobre nós e sobre nossos filhos. Nós não temos medo. Seja
crucificado! Seja crucificado!”
Pôncio Pilatos manda que se escreva :
“Jesus Nazareno, Rei dos Judeus”.
“Não, Assim não. Não escrevas rei
dos judeus, mas que ele disse que seria rei dos judeus”, gritam muitos.
“O que escrevi, está escrito”, diz
com dureza Pilatos. “Que vá para a cruz. Soldado, vai. Prepara a cruz.” (p.
59-65)
Sexta
Estação
† A flagelação e a coroação de espinhos de Jesus. Ludíbrio.
† A flagelação e a coroação de espinhos de Jesus. Ludíbrio.
Mt
27,24-25; Mc 15,15; Lc 23,22; Jo 19,1
Eles estão armados com o flagelo feito com
sete tiras de couro ligadas a um cabo e terminando em um pequeno martelo de
chumbo. De modo ritmado, como se fosse um exercício, eles começam a bater. Um
na frente, e o outro atrás, de tal modo que o tronco de Jesus fica dentro de
uma roda de azorragues e flagelos.
E eles se enfurecem especialmente contra o
tórax e o abdome, mas não deixam de bater nas pernas e nos braços, e finalmente
na cabeça, para que não fique nenhum espaço da pele sem dor. E não se ouve
nenhum lamento... Se Ele não estivesse seguro pela corda, cairia. Mas Ele não
cai, nem geme. Somente sua cabeça é que fica pendente, depois dos golpes e mais
golpes recebidos no peito, como nos desmaios.
"Cuidado! Pára aí! Para Ele ser
morto, precisa ainda estar vivo", grita gracejando um soldado.
"Espera. Os judeus querem um
rei. Pois agora vamos dar-lhe. É aquele", diz um soldado,
E ele sai correndo para fora,
e vai a um pátio que fica mais atrás, e do qual volta com um feixe de ramos de
pilriteiro selvagem. Na frente eles põem um cordão de espinhos triplicemente
trançado. E atrás, onde as extremidades dos três ramos se cruzam, forma-se um
verdadeiro nó de espinhos, que penetram na nuca.
"Salve, ó Rei dos Judeus", e quase
se arrebentam de tanto rir.
Sétima
Estação
† Jesus carrega a Cruz
† Jesus carrega a Cruz
Mt
27,31; Mc 15,20; Jo 19,16-17
Já vão levando as cruzes. As dos
dois ladrões são mais curtas. A de Jesus é muito maior. Eu acho que a peça
vertical não tem menos de quatro metros. Eu vejo a cruz, quando ela já foi formada
e vai sendo levada. Eu estou vendo uma
verdadeira cruz, já bem armada, e bem reforçada com pregos e parafusos com
porcas. Antes de entregarem a cruz a Jesus, penduram-lhe ao pescoço a tabuinha
com estes dizeres escritos: "Jesus Nazareno, Rei dos Judeus." E a
corda que a prende se embaraça na coroa, que fica se movendo e arranhando por
onde ainda não foi arranhado, e os espinhos vão penetrando em novos pontos,
causando novas dores, e fazendo o sangue escorrer de novo. O povo se ri, com
uma alegria cheia de sadismo, e o insulta, dizendo blasfêmias contra Ele.
Agora estão prontos para sair. E
Longino [o centurião que comandou a crucificação] dá ordens para se porem a
caminhar. Na frente vai o Nazareno. Atrás dele os dois ladrões .”
E logo se torna evidente que Jesus está com
uma grande fraqueza.
Os judeus se riem ao vê-lo como um
embriagado, que vai cambaleando, e gritam, aos soldados: "Batei nele!
Fazei-o cair. Que caia na poeira o blasfemador!" Mas os soldados só fazem
o que lhes foi mandado, isto é, ordenam ao condenado que vá pelo meio da
estrada, e caminhe. Tem início a subida
do Calvário. É um caminho nu, sem nem um fio de sombra, calçado com pedras
soltas, que formam a subida.
Ele vai contra uma pedra saliente e,
enfraquecido como está, levanta o pé muito pouco, tropeça nela, e cai para o
lado do joelho direito, conseguindo, porém, ir-se levantando, apoiando-se na
mão esquerda. O populacho grita de alegria... Afinal, Ele se levanta. E
continua a andar. Sempre mais inclinado e ofegante, congestionado, febril...
O cartaz que vai balançando à sua
frente lhe perturba a visão, e sua veste longa, agora que Ele vai inclinado, se
arrasta pelo chão, e para a frente lhe torna difícil dar o passo. Ele torna a
tropeçar, e cai sobre os dois joelhos, ferindo-se de novo onde já estava
ferido, e a cruz escapa de suas mãos e cai, depois de ter-lhe dado uma forte
pancada no dorso, obrigando-o a inclinar-se para levantá-la e a cansar-se para
pô-la de novo no ombro. E, enquanto Ele faz isso, aparece claramente visível
sobre o seu ombro direito a chaga feita pela cruz ao cair, e que reabriu as
feridas feitas pelos flagelos, unindo-as todas em uma só.
É nesse momento que torno a ver o
grupinho dos pastores. Eles estão desolados, perturbados, com roupas rasgadas,
e chamam para si, com a força dos seus olhos, os olhares de seu Mestre. E Ele
vira a cabeça e os vê: e olha para eles, como se eles tivessem uns rostos de
anjos. Parece que Ele mata a sua sede, e se sente fortalecido com o pranto
deles, e sorri...
Depois, em seguida, vem a dor da
terceira queda, que é completa. Mas desta vez não foi por haver tropeços. É que
Ele caiu por uma repentina falta de forças, uma síncope. Ele cai logo todo
estendido, batendo o rosto sobre pedras soltas, e ficando na poeira, por
debaixo da cruz que caiu em cima dele. Os soldados querem levantá-lo. Mas, como
Ele parece estar morto, vão dizê-lo ao centurião. Mas, enquanto eles vão e vem,
Jesus volta a si e, lentamente, com a ajuda de dois soldados, enquanto o outro
ajuda o Condenado a pôr-se de pé, e Jesus volta ao seu lugar. Mas Jesus já está
extenuado.
"Fazei que Ele não morra, a não
ser na cruz!", grita a multidão.
"Se o fizerdes morrer antes,
prestareis contas disso ao Procônsul, lembrai-vos disso. O réu deve chegar vivo
ao suplício", dizem os chefes dos escribas aos soldados. (p. 95-100)
Oitava
Estação
† Jesus e Simão Cirineu
† Jesus e Simão Cirineu
Mt
27,32; Mc 15,21; Lc 23,26
Longino o está observando [o
Cireneu]. Ele pensa que o homem lhe possa ser útil, e lhe ordena: "Homem,
vem cá!" O Cireneu faz de quem não ouviu. Mas com Longino não se brinca.
"Estás vendo aquele
homem?", pergunta-lhe ele. E, ao dizer isso, vira-se para mostrar Jesus, e
vê Maria, que está suplicando aos soldados que a deixem passar. Ele fica com dó
dela, e grita: "Deixa passar a mulher." Depois ele torna a falar ao
Cireneu: "Ele não pode mais andar com toda aquela carga. Tu és um homem
forte. Toma a cruz dele, e leva-a para ele até lá em cima."
Ele chega até perto de Jesus,
justamente no momento em que Jesus está se virando para a Mãe, que só agora é
que Ele pôde ver, vindo ao seu encontro, pois Ele ia andando tão inclinado, e
com os olhos quase fechados, como se estivesse cego e grita: "Minha Mãe!'
Esta é a primeira palavra dele,
desde que Ele foi torturado, a fim de que possa exprimir o seu sofrimento.
Porque naquele grito está a confissão de tudo e de cada uma das tremendas dores
do seu espírito, de seu moral e de sua carne. É um grito dilacerado e
dilacerante de um menino que está morrendo sozinho, e que quer a mamãe, a mamãe, porque só o seu
beijo amoroso pode acalmar o ardor de sua febre, e só a voz dela espanta os
fantasmas, só o abraço dela torna a morte menos amedrontadora...
Maria leva a mão ao seu coração,
como se tivesse recebido uma punhalada, e sente uma leve vacilação. Mas Ela se
reanima, apressa o passo enquanto vai com os braços estendidos na direção do
seu Filho. Ela grita, dilacerada pela dor: "Meu Filho!"
E o Cireneu tem esta compaixão... ,
e se apressa em levantar a cruz, fazendo isso com uma delicadeza de pai, a fim
de não esbarrar na coroa nem ficar roçando nas feridas. Agora, atrás de Jesus, está o Cireneu com a
sua cruz. E Jesus, livre daquele peso, pode andar melhor. Ele está arquejando
fortemente, mas já está podendo caminhar
melhor. (p. 105-107)
Nona
Estação
† O encontro de Jesus com as mulheres de Jerusalém
† O encontro de Jesus com as mulheres de Jerusalém
Lc
23,27-32
Elas se aproximam de Jesus,
chorando, e se ajoelham a seus pés, enquanto Ele, ofegante, pára,... e sabe até
sorrir ainda para aquelas almas piedosas e para o homem que as escolta, Jônatas. Mas a este os guardas não deixam
passar. Somente as mulheres.
Uma outra mulher, tendo perto de si
uma menina que a serve, com um cofrezinho nos braços, abre o cofrezinho, tira
de lá um pano de linho muito fino, como um lenço, e o oferece ao Redentor. E
Ele o aceita. Mas visto que Ele não pode só com uma mão fazê-lo por Si mesmo, a
piedosa mulher o ajuda, tomando cuidado para não esbarrar na coroa, que lhe vem
caindo sobre o rosto. E Jesus aperta o linho fresco sobre sua pobre face, e lá
o segura, como se nele encontrasse um grande conforto. Depois Ele lhe entrega o
linho, e fala: "Obrigado. Mas... não choreis... por Mim... filhas de
Jerusalém... mas pelos pecados... os vossos e os... da vossa cidade... Dá
graças a Deus... Joana... por não teres... mais filhos... Vê... é piedade de
Deus... não... não ter filhos para que sofram com isso. E vós... Mães... chorai
sobre... os vossos filhos, porque esta hora não passará sem castigo... E que
castigo... se assim fazem... com o Inocente... . As mães... de então...
chorarão... porque... em verdade Eu vos digo... que será feliz... quem,
então... cair... debaixo dos escombros... em primeiro lugar. Eu vos abençôo...
Ide... para casa... rezai... por Mim. Adeus, Jônatas... Leva-as embora..."
(p. 102-103)
Décima
Estação
† A crucificação de Jesus
† A crucificação de Jesus
Mt
27,33-44; Mc 15,22-32; Lc 23,33-38; Jo 19,16-24
Quatro homens musculosos, que pelo
aspecto me parecem judeus, e judeus dignos da cruz mais do que os condenados. Estão vestidos com umas túnicas curtas e sem
mangas, e vêm trazendo nas mãos os cravos, os martelos e as cordas que eles,
dizendo chalaças, mostram aos três condenados. Enquanto isso, a multidão se
agita em um delírio cruel.
O centurião oferece a Jesus a
ânfora, para que Ele beba uma mistura anestésica de vinho com mirra. E Jesus a
rejeita. Mas os ladrões bebem bastante dela.
É dada a ordem aos condenados para
que se dispam. Os dois ladrões logo o fazem, sem nenhum pudor.
Jesus vai-se despindo lentamente, por causa do
espasmo que lhe causam as feridas, e os recusa. Talvez Ele pense em conservar
as ceroulas curtas, com que Ele estava durante a flagelação. Mas, quando lhe
foi dito que as tirasse também, Ele estende a mão, para pedir como esmola o
trapo aos carrascos, a fim de proteger sua nudez.
Mas Maria viu aquilo e foi tirando o
seu longo e leve pano branco, que lhe cobre a cabeça e está por baixo do manto
escuro sobre o qual Ela já derramou tantas lágrimas. E Ela o tira, sem deixar
cair o manto, entrega-o a João para que o passe a Longino a fim de que o
entregue ao seu Filho. O centurião pega o véu, sem criar dificuldades, e,
quando vê que Jesus está para desnudar-se completamente, estando Ele virado,
não para a multidão, mas para o lado onde não está o povo, lhe estende o pano da Mãe. E Jesus o
reconhece. E se envolve com ele, dando muitas voltas ao redor do abdome, e
atando-o bem, para que não caia. E sobre aquele linho, que até agora só foi
molhado pelo pranto, caem as primeiras gotas de sangue.
Depois chegou a vez de Jesus. Ele se
estende mansamente sobre o madeiro. Ele
se agacha e enfia a cabeça, por onde eles dizem que deve fazê-lo. Ele abre os
braços, como eles lhe ordenam e estende as pernas como eles mandam.
Dois carrascos se assentam sobre o
peito dele, para segurá-lo quieto. Um terceiro lhe segura o braço direito
segurando-o com uma mão sobre a primeira parte do antebraço, e com a outra, na
parte dos dedos. O quarto, que já tem na mão o longo cravo aguçado na ponta, e
terminando do outro lado em uma chapa redonda e chata, da espessura de uma
moeda dos tempos passados. Olha se o buraco que já foi feito na madeira vai dar
certo com o ponto da juntura raio ulnar do pulso. Tudo bem? Aí o carrasco apóia
a ponta do cravo no pulso, e dá a primeira batida.
Jesus estava com os olhos fechados,
ao sentir aquela dor aguda, solta um grito e faz uma contração, arregala os
olhos, que estão nadando em lágrimas.
Maria responde ao grito do seu Filho
torturado com um gemido segurando a cabeça entre as mãos. Jesus, para não
torturá-la, não grita mais. Mas os golpes continuam, compassados, ásperos, de
ferro contra ferro...
A mão direita já está pregada.
Passa-se para a esquerda. O buraco não está no rumo do carpo. Então, eles
apanham uma corda, a amarram no pulso esquerdo e puxam, até que se desloque a
articulação e se arranquem os tendões e os músculos, além de lacerar a pele, já
cortada pela corda da captura. Também esta outra mão deve estar sofrendo, pois
está esticada para o rumo oposto, e, ao redor do seu cravo, vai-se alargando o
buraco. Por enquanto, ficam apenas no começo do metacarpo, isto é, entre o
polegar e os outros dedos justamente no centro do metacarpo, junto ao pulso.
Aqui o cravo entra mais facilmente, mas produzindo um maior espasmo . Mas Jesus
não grita mais, tem somente um lamento rouco, atrás dos lábios fortemente
fechados.
Agora é a vez dos pés. A uns dois
metros, ou mais, da ponta da cruz, há uma pequena cunha, que dá somente para um
pé.
Agora aqueles que estavam sentados
no peito de Jesus se levantam, e vão colocar-se sobre os joelhos, visto que
Jesus fez um movimento involuntário para encolher as pernas, ao ver brilhar ao
sol um cravo muito comprido. Eles põem os seus pesos sobre os joelhos esfolados
e fazem compressão sobre as pobres canelas contundidas, enquanto os outros dois
executam a operação, muito difícil, de pregar um pé sobre o outro, procurando
combinar as duas articulações dos tarsos sobrepostos.
Por mais que eles fiquem olhando, e
segurando com firmeza os pés, ao baterem o martelo sobre os dedos contra a
cunha, o pé que fica por baixo muda de lugar por causa da vibração do cravo, e
eles precisam quase arrancá-lo, porque ele, depois de ter entrado nas partes
moles, já sem ponta por ter perfurado o pé direito, deve ter-se deslocado um
pouco para o centro. E eles batem, batem, batem... Só se ouve o atroz rumor
feito pelo martelo sobre a cabeça do cravo, pois todo o Calvário está com seus
olhos e ouvidos atentos para apreciarem as ações e o rumor, e se divertirem com
aquilo...
Ao som áspero do ferro se une o
lamento de uma pomba, à surdina: é o gemido rouco de Maria que, cada vez mais
inclinada, a cada batida, como se o martelo estivesse ferindo a Mãe Mártir. E
Ela tem razão de parecer estar perto de ser despedaçada por aquela tortura. A
crucifixão é uma coisa tremenda.
Agora a cruz está sendo arrastada
para o buraco, e vai baqueando, sacudindo o pobre crucificado, pois o chão é
muito acidentado. Por fim, é levantada a cruz, que por duas vezes escapou das
mãos dos que a estavam levantando, tornando a cair, uma vez, de repente, e
outra sobre o braço direito da mesma, causando um áspero tormento a Jesus,
porque uma sacudida repentina move de lugar os membros feridos.
Finalmente, a cruz é firmada no
terreno, e não há outro tormento, se não o de ficar pendurado. Jesus está
calado. A multidão não se cala mais. Mas até recomeça aquele vozerio infernal.
Agora o alto do Gólgota tem o seu
troféu e sua guarda de honra. No ponto mais alto está a cruz de Jesus. De um e
do outro lado dela, estão as outras duas. (p. 110-115)
Décima
Primeira Estação
† Jesus e o bom ladrão
† Jesus e o bom ladrão
Lc
23,39-42
... o ladrão da esquerda, lá de sua
cruz continua a insultar. Parece que ele se tornou agora o maior colecionador
de todas as blasfêmias dos outros.
O outro ladrão, que está à direita,
e tendo Maria quase a seus pés, olha para Ela quase mais do que para Cristo, há
alguns momentos que vem murmurando: "É a Mãe", e diz ao companheiro:
"Cala-te! Não temes a Deus, nem mesmo agora que estás sofrendo este
castigo? Por que é que insultas a quem é bom? Ele está passando por um suplício
maior do que o nosso. E nunca fez nada de mal."
Mas o ladrão continua com suas
imprecações.
O outro ladrão, que está olhando,
sempre com maior compaixão para com a Mãe, que está chorando, o censura, quando
percebe que nos insultos Ela também é alvejada. "Cala-te. Lembra-te que
nasceste de uma mulher. As nossas mães
morreram... Eu gostaria de poder pedir perdão a elas. Mas, será que poderei? A
minha era uma santa... Eu a matei com a dor que lhe causava... Eu sou um
pecador... Quem é que me perdoa? Ó Mãe, em nome do teu Filho moribundo, reza
por mim."
A Mãe levanta, por um momento, o seu
rosto angustiado e olha para ele, para aquele infeliz que, por causa da
lembrança da mãe, e da contemplação da mãe, está a caminho do arrependimento, e
parece desejá-lo, com aquele seu olhar de arrependimento.
Dimas chora bem alto. Isso excita
ainda mais a zombaria da multidão e do seu companheiro. A multidão grita:
"Bravo! Toma essa aí por tua mãe. Assim ela ficará com dois filhos
delinqüentes!" E o outro insiste: "Ela te ama, e te ama, porque tu és
uma cópia imperfeita do seu bem-amado."
Jesus fala, então, pela primeira
vez: "Meu Pai, perdoa-os porque eles não sabem o que estão fazendo!"
Esta oração venceu todo o temor de
Dimas. E ele ousa olhar para o Cristo e dizer: "Senhor, lembra-te de mim,
quando estiveres no teu reino. Que eu sofra, é justo. Mas, dá-me misericórdia e
paz, depois desta vida. Uma vez eu ouvi a tua palavra e, como um doido, eu a
repeli. Mas agora eu me arrependo dos meus pecados, arrependo-me deles diante
de Ti, ó Filho do Altíssimo. Eu creio que Tu vens de Deus. Eu creio no teu
poder. Creio na tua misericórdia. Cristo, perdoa-me em nome de tua Mãe e do teu
Pai Santíssimo."
Jesus se vira para ele, olha-o com
profunda piedade, e ainda tem um sorriso muito bonito em sua pobre boca
torturada. E diz: "Eu te digo: hoje mesmo estarás comigo no Paraíso."
O ladrão arrependido fica calmo e,
não se lembrando mais das orações aprendidas quando menino, repete-as, como uma
jaculatória: "Jesus de Nazaré, rei dos judeus, eu espero em Ti. Jesus
de Nazaré, rei dos judeus, eu creio em tua Divindade."
O outro continua blasfemando. (p.
118-121)
Décima
Segunda Estação
† Maria Santíssima e o Apóstolo João ao pé da Cruz de Jesus
† Maria Santíssima e o Apóstolo João ao pé da Cruz de Jesus
Jo
19,25-27
Longino, ao olhar, vê Maria,
justamente abaixo da saliência do terreno, onde está o seu Filho, para o qual
está virado o seu rosto angustiado. Ele chama um dos seus soldados, que estão
jogando com dados, e lhe diz; "Se a mãe quiser subir com o filho que a
acompanha, pode ir. E tu, escolta-a, e a ajuda."
E Maria, com João, que Longino pensa
ser filho dela, sobe pela escadinha cavada na rocha tufosa, ao que me parece, e
passa para ver o seu Jesus. A multidão o que lhe oferece imediatamente são os
mais vergonhosos insultos, fazendo-a participar de todas as blasfêmias
dirigidas ao seu Filho. Mas Ela, com os lábios trementes e embranquecidos,
procura somente confortá-Lo com um sorriso amargurado, sobre o qual se enxugam as lágrimas, que
nenhuma força de vontade consegue deter em seus olhos. (p. 116)
Jesus parece ir empalidecendo
sinistramente. Ele murmura o nome que antes dizia apenas no fundo do seu
coração: "Minha Mãe!", "Minha Mãe!" Ele o murmura em voz
baixa, como num suspiro, como se estivesse já em um leve delírio que o
impedisse de ocupar-se com tudo aquilo que sua vontade quisesse. E Maria, cada
vez que isso acontece, faz o gesto irrefreável de estender os braços para
socorrê-lo.
E aquela gente cruel se ri dos espasmos
de quem está morrendo.
... muitos começam a ficar
impressionados com a luz que está envolvendo o mundo, e já alguns estão com
medo.
É sob esta luz crepuscular e medonha
que Jesus dá Maria a João, e João a Maria. "Mulher, eis aí o teu filho.
Filho, eis aí a tua Mãe."
Maria está com o rosto ainda mais
desfeito, depois destas palavras que são o testamento do seu Jesus, que não tem
nada para dar a sua mãe, a não ser um homem, Ele que, por amor do Homem a priva
do Homem Deus, nascido dela. Mas a pobre Mãe procura não chorar, a não ser em
silêncio, porque não pode, não pode deixar de chorar... (p. 121-122)
A escuridão se torna ainda mais
completa. Do meio daquela luz vem a voz
lamentosa de Jesus: “Tenho sede!”
Um soldado vai buscar um vaso no
qual os verdugos puseram vinagre com fel, para que ele com o seu amargor
aumente a saliva dos supliciados. Depois ele pega uma esponja, que está
mergulhada no líquido, coloca-a na ponta de um caniço leve, e levanta a esponja até o Moribundo. Jesus se
vira com avidez para a esponja que lhe oferecem. Parece um menino faminto que
procura o peito materno.
Maria, que está vendo aquilo, e que
certamente se põe a pensar, dá um gemido, ao apoiar-se em João, dizendo:
"Ó seio meu, por que não produzes leite? Ó meu Deus, por que, por que é
que assim nos abandonas? Faze um milagre para o meu Filho. Quem é que me ajuda
a dessedentá-lo com o meu sangue, já que leite eu não tenho?..."
E, cada vez mais enfraquecido, Ele
vai voltando a emitir um lamento infantil, ouvindo-se a invocação:
"Mamãe!" E a infeliz murmura: "Sim, meu Filho, eu estou
aqui."
É uma tristeza... E João chora sem
preocupar-se. (p. 125-127)
Décima
Terceira Estação
† A morte de Jesus
† A morte de Jesus
Mt
27,45-56; Mc 15,33-41; Lc 23,44-49; Jo 19,28-30
Os sofrimentos são sempre mais fortes. O corpo tem os
primeiros arqueamentos próprios da tetania, e todos os clamores da multidão os
exasperam.
Com grande dificuldade, apoiando-se
mais uma vez sobre os pés torturados, encontrando para isso força em sua
vontade, e somente nela, Jesus se ergue sobre a cruz. Ele grita em alta voz :
"Eloi, Eloi, lamma sabactani" (foi assim que eu o ouvi falar). Ele
deve perceber que está morrendo, absolutamente abandonado pelo Céu, só
confessar com estas palavras o abandono do Pai.
Repetem-se os ataques de dor, uma
dor sem consolo, como a que já o havia atribulado no Getsêmani. Voltam as ondas
dos pecados de todo o mundo a pesar sobre o pobre náufrago inocente e a
submergi-lo em sua amargura. Volta especialmente a sensação que crucifica mais do
que a cruz, mais desesperadora do que qualquer outra, de que Deus o abandonou e
que a Ele não chega sua oração...
A escuridão se torna ainda mais
completa. Do meio daquela luz vem a voz
lamentosa de Jesus: "Tenho sede!" Jesus, que chupou com avidez aquela
áspera e amarga bebida [o fel], vira a cabeça, envenenado pelo gosto dela. Ela
deve ser como um líquido corrosivo sobre os lábios feridos e trincados.
Silêncio. Depois, bem claras no meio
da escuridão total, ouvem-se estas palavras: "Tudo está terminado!",
e depois, com a respiração cada vez mais estertorosa, e com umas pausas de
silêncio, entre um estertor e outro, cada vez mais prolongadas.
As Marias estão chorando, com a
cabeça sobre uma elevação do terreno. E ouve-se bem o choro delas, porque agora
toda a multidão está calada de novo para assistir aos estertores do Moribundo.
Ainda estão fazendo silêncio.
Depois, pronunciada com uma grande doçura, e com uma ardente oração, ouve-se
esta súplica: "Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito!"
Continua o silêncio. Também os
estertores estão diminuindo. Só há um curto sopro nos lábios e na garganta.
Depois vem o último espasmo de
Jesus. Uma convulsão atroz, que parece querer arrancar o corpo que está pregado
com os três cravos no madeiro, vai subindo por três vezes, dos pés até a
cabeça, depois dá um grito muito forte, e fere o ar dando o "grande grito"
do qual falam os Evangelhos, e que é a primeira parte da palavra "Mamãe...
E nada mais..."
A cabeça torna a cair sobre o peito,
e o corpo para a frente, o frêmito cessa, cessa a respiração... Ele expirou...
A terra responde ao grito do que foi
matado com um estrondo pavoroso. Os
raios são a única luz descontínua que permite ser vista. E depois a terra
estremece em um turbilhão de vento em ciclone. O terremoto e o vento se unem
para darem um castigo apocalíptico aos blasfemadores. Longino vai pôr-se bem
diante do crucificado, estuda bem o golpe, e depois o vibra. A longa lança
penetra profundamente de baixo até em cima e da direita para a esquerda.
Da ferida sai muita água e um
fiozinho apenas de sangue, já começando a coagular-se.
"Que coisas tremendas! Eu
[Gamaliel – o rabino] estava no Templo. Este foi o sinal! O Templo desaprumado!
O véu de púrpura e jacinto está todo rasgado e pendurado! O Santo dos santos
está aberto! O anátema caiu sobre nós." "Estas pedras tremerão às minhas últimas
palavras! Ele o havia prometido!..."
Ele [Gamaliel] se põe de joelhos,
estende os braços, e chora: "Eras Tu! Eras Tu! Não podemos mais ter
perdão. Nós tínhamos desejado o teu Sangue sobre nós. E isso brada ao Céu, e o
Céu nos amaldiçoa... Oh! Mas Tu és a Misericórdia!... Eu te digo, eu, o aniquilado rabi de Judá:
Venha o teu sangue sobre nós, por piedade..." E ele chora. "Neste meu
velho pensamento, prisioneiro de umas fórmulas, penetra Tu, ó Libertador.
Isaías o diz: ‘... Ele pagou pelos pecadores, e tomou sobre Si os pecados de
muitos.’ Oh! Os meus também, ó Jesus de Nazaré..." (p. 120-134)
Décima
Quarta Estação
† Jesus deposto no sepulcro
† Jesus deposto no sepulcro
Mt
27,55-61; Mc 15,40-47; Lc 23,49-56; Jo 19,38-42
Os quatro carrascos quereriam também
ocupar-se com Jesus, despregando-o da cruz. Mas José e Nicodemos não lhe
permitem.
Agora Ele está no colo da Mãe... E
ela o chama... Chama com uma voz cheia de dor.
Então, a socorrem, a confortam.
Querem tomar dela o Morto divino, visto que Ela está gritando: "Onde, onde
te colocarei, em que lugar que seja seguro e digno de Ti!" O José, todo
inclinado, em uma inclinação reverente, com a mão aberta posta sobre o peito,
diz: "Conforta-te, ó Mulher! O meu sepulcro está novo e digno de um
grande. Eu o dôo à Ele.
O pequeno cortejo, depois de ter
descido do Calvário, encontra, cavado na base do mesmo, no calcário do monte, o
sepulcro de José de Arimatéia. Num ato de piedade eles entram nele com o Corpo
de Jesus.
Entram também João e Maria. Não
entram outras pessoas, porque a câmara é pequena.
Os dois portadores descobrem o corpo
de Jesus. Enquanto eles preparam as faixas e os aromas em um canto da mesa, à
luz de duas tochas, Maria se inclina sobre o corpo de seu Filho, e chora. E de
novo o enxuga com o véu que ainda está nas costas de Jesus. É o único banho que
toma o Corpo de Jesus esse das lágrimas de sua Mãe.
Os lamentos dela me fazem sentir-me
mal.
"Mas Tu te lembras, meu Filho,
daquela sublime veste esplendorosa que tudo vestiu, enquanto o teu sorriso
nascia para o mundo? Estás lembrado daquela luz beatífica que o Pai mandou dos
Céus para envolver o mistério do teu nascimento, e para fazer-te achar menos
repelente este mundo escuro, para Ti, que eras a Luz, e vinhas da Luz do Pai e
do Espírito Paráclito. E agora?... Agora tudo escuro e frio... Que
frio!...Quanto frio. Mas eu te amarei
por duas: por estes que amaram tão pouco, a ponto de te abandonarem na hora da
tua dor. Eu te amarei por aqueles que te odiaram. Por todo o mundo eu te
amarei, meu Filho."
Os pastores adoraram o Salvador em
seu sono de criança. Vós adorais o Salvador em seu sono de Triunfador sobre
Satanás. Por isso, como os pastores, ide dizer ao mundo: "Glória a Deus! O
pecado morreu! Satanás está vencido! Que haja paz na terra e no céu entre
Deus e os homens!" Preparai os caminhos para a sua volta. Eu vos mando Eu,
que a maternidade constituiu a Sacerdotisa do rito. Então, não vos lembrais?
"A esta geração má e adúltera, que me pede um sinal, não lhe será dado
outro, senão o sinal de Jonas... E assim o Filho do homem estará por três dias
e três noites no coração da Terra." Não vos lembrais? "O Filho do
homem está para ser entregue nas mãos dos homens, que o matarão, mas no
terceiro dia ressurgirá." Não vos lembrais? "Destruí este Templo do
Deus verdadeiro, e Eu, depois de três dias o reerguerei." O Templo era o
Corpo dele, ó homens.
“Pai, tem piedade dos que não têm
fé! Dá-lhes, Pai Santo, dá-lhes por esta vítima sacrificada e por mim, vítima
que se sacrifica ainda, dá-lhes a tua fé aos que não têm fé!"
A Mãe se arruma. Ela infunde
respeito. É verdadeiramente a sacerdotisa ao altar, a sacerdotisa no ato do
ofertório: "Oferecemos estes teus dons, que a nós foram dados, como uma
vítima pura, uma vítima santa, uma vítima sem mancha..."
Depois Ela se vira: "Podeis
fazer. Mas ele ressurgirá. É inútil que desconfieis do que eu digo, e fiqueis
cegos diante da verdade, que Ele vos disse. É inútil que Satanás tente armar
ciladas contra a minha fé. Para redimir o mundo falta ainda a tortura a ser
dada ao meu coração por Satanás, que acabará sendo vencido. Eu estou passando
agora por ela, e a ofereço pelos que vierem depois de mim. Adeus, meu
Filho! Adeus... Santo... Bom... Amantíssimo! Amável... Beleza... Alegria....
Fonte de Salvação... Adeus... Aos teus olhos... Aos teus lábios... aos teus
cabelos dourados... aos teus membros gelados... Ao teu coração traspassado...
recebe o meu beijo... o meu beijo... Adeus... Adeus... Senhor! Tem piedade de
mim!" (p. 136-146)
Décimo
Quinto Mistério:
† A Ressurreição
Mt
28,1-15; Mc 16,1-8; Lc 24,1-12; Jo 20,1-10
Ele se mostra esplêndido em sua veste de uma
substância imaterial, sobrenaturalmente belo e majestoso. Está tão diferente de
tudo o que nossa mente possa esperar ver. Ele está tão bem arrumado, que nele
não se vêem feridas nem sangue, mas somente uma luz fulgurante, que sai a
jorros das cinco chagas e emana de todos os poros de sua epiderme.
... então, realmente é a Luz que
tomou um corpo.
Não é a pobre luz desta Terra, não é
a pobre luz dos astros, não é a pobre luz do Sol. Mas é a Luz de Deus: todo o
fulgor do Paraíso, que se reúne em um só Ser .
Quando Ele se move de um lugar para
outro, indo no rumo da saída, e os olhos podem ver para lá dos seus fulgores,
eis que umas luminosidades belíssimas, mas parecidas a estrelas, sem comparação
com o sol, aparecem-me uma de lá e outra de cá, prostradas em adoração ao seu
Deus, que vai passando envolvido em sua luz.
[Jesus Ressuscitado aparece à Mãe]
Maria agora está prostrada com o rosto por terra.
A janela fechada se abre, com um
barulhento abalo dos pesados batentes, e, com o raio do sol, entra Jesus.
Maria levantou a cabeça e vê seu
Filho irradiando luz: Ele está belo, infinitamente mais belo do que antes de
ter padecido, sorridente, vivo, luminoso mais do que o sol, vestido de um
branco que parece uma luz tecida, e que vem andando para o lado dela.
Ela se põe de joelhos e ajuntando as
mãos cruzadas sobre o peito, diz com um soluço, que é de sorriso, e pranto:
"Senhor, meu Deus!" E fica assim arrebatada, ao contemplá-lo
com o rosto banhado em lágrimas, mas que ficou sereno, acalmado em seu sorriso
e pelo êxtase.
Mas Ele não quer vê-la assim, sendo
Ela a sua Mãe, de joelhos, como uma serva. Por isso, a chama, estendendo-lhe as
mãos, de cujas feridas saem raios que fazem ficar mais luminosa a sua Carne
gloriosa, e lhe diz: "Minha Mãe" mas já não é mais a palavra aflita
dos colóquios e das despedidas de antes da Paixão, nem são como aquela
lamentação dilacerante do encontro sobre o Calvário e a da agonia. Mas um grito
de triunfo, de libertação, de festa, de amor, de gratidão. E Ele se inclina
sobre sua Mãe, e lhe põe as mãos por baixo dos cotovelos dobrados, e a põe de
pé, aperta-a sobre o coração, e a beija.
"Tudo está acabado, minha Mãe.
Agora não tens mais que chorar por teu Filho. A prova terminou. A Redenção chegou.
Minha Mãe, obrigado por me teres concebido, criado, ajudado na vida e na morte.
Eu ouvi quando chegaram a Mim as tuas orações. Elas foram a minha força na dor,
as minhas companheiras na minha viagem sobre a Terra e para lá da Terra. Elas me acompanharam na Cruz e no
Limbo. Elas eram o incenso que ia à frente do Pontífice, que ia chamar os seus
servos para levá-los ao Templo que não morre: ao meu Céu. “
Agora Eu vou para o Pai com a minha
veste humana. O Paraíso precisa ver o Vencedor em sua veste de Homem, com a
qual Ele venceu o Pecado do Homem. Mas depois, Eu voltarei ainda. Eu devo confirmar na Fé os
que não crêem ainda e que precisam crer para levarem os outros a crer.
Depois Eu subirei ao Céu. Mas Eu não
te deixarei sozinha, Minha Mãe. Estás vendo aquele véu? Eu, no meu
aniquilamento, usei ainda do poder de fazer um milagre para Ti, a fim de dar-te
algum conforto. Mas para Ti Eu vou fazer um outro milagre. Tu me terás no Sacramento, tão real,
como quando Tu me levavas contigo. Nunca estarás sozinha. Nestes dias passados, Tu ainda
estiveste. Mas, para minha Redenção, era necessária também esta dor. Muitas coisas andam continuamente
juntas com a Redenção, porque muitas coisas de pecado serão continuamente
criadas. Eu chamarei todos os meus servos para esta co-participação redentora.
Tu és aquela que, sozinha, farás mais do que todos os santos juntos. Por isso é que era necessário
também esse longo abandono.
Mas agora não o é mais. Eu não estou separado do Pai. Tu não
estarás, separada do Filho. E, tendo o Filho, tens a nossa Trindade. Como um Céu vivo, Tu levarás por
sobre a Terra a Trindade entre os homens, e santificarás a Igreja, Tu, a Rainha
do Sacerdócio, e Mãe dos Cristãos. Depois Eu virei para levar-te. E não serei mais Eu em Ti, mas Tu em
Mim, no meu Reino, a fim de tornar mais belo o Paraíso. Agora Eu me vou, minha Mãe. Vou
para fazer feliz a outra Maria [Madalena]. Depois subirei ao Pai. E de lá Eu
virei aos que não crêem.
Minha Mãe. Dá-me o teu beijo como benção.
E que a minha Paz seja a tua companheira. Adeus.”
E Jesus desaparece no sol, cujos
raios descem a jorro do céu, nesta manhã serena. (p. 217-223)
(Fonte base-
evangelismopresente.blogspot.com.br)
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