A cura de uma filha endemoninhada a pedido de sua mãe.
Mas
vem vindo também uma que não é da casa. É uma pobre mulher chorosa,
envergonhada... Ela vem andando encurvada, quase se arrastando e, tendo chegado
perto do grupo, em cujo centro está Jesus, ela se põe a gritar: “Tem piedade de
mim, ó Senhor, Filho de Davi! Minha filha está sendo muito atormentada pelo
demônio, que a faz praticar coisas vergonhosas. Tem piedade, porque eu sofro
muito, e todos zombam de mim por isso. É como se minha filha tivesse culpa pelo
que ela faz... Tem piedade, Senhor, Tu que tudo podes. Levanta a tua voz e a
tua mão, e dá ordem ao espírito imundo para que saia da Palma. Eu só tenho essa
filha, e sou viúva... Oh! Não te vás, Senhor! Tem piedade! Jesus, de fato,
tendo acabado de abençoar um por um dos membros da família, depois de ter
repreendido os adultos por terem falado de sua vinda, --- e depois deles se
desculparem, dizendo: “ Não fomos nós que o falamos, podes crê-lo, Senhor!” Ele
se vai inexplicavelmente severo para o lado da mulher, que vai-se arrastando
sobre os joelhos, com os braços estendidos em um gesto de súplica, ansiosa,
enquanto vai dizendo: “Eu, eu te vi, quando estavas atravessando a torrente, eu
ouvi que alguém te chamou: “Mestre”. Então, eu vim vindo atrás de Ti, por entre
as moitas, e ouvi as conversas deles. E fiquei sabendo quem és... E esta manhã
eu vim, mas como era ainda noite para estar aqui, fiquei na soleira como um
cachorrinho, até que Sara se levantou e me fez entrar. Oh! Senhor, tem piedade!
Piedade de uma mãe e de uma menina!”
Mas
Jesus vai andando ligeiro, surdo a todo chamado. Os da casa dizem a mulher:
“Resigna-te! Ele não quer te ouvir. Ele disse: é para os de Israel que Ele
veio...”
Mas
ela se levanta, desesperada e, ao mesmo tempo, cheia de fé, e responde: “ Não.
Eu tanto hei de pedir que Ele me ouvirá.” E se põe a acompanhar o Mestre,
sempre gritando em suas súplicas, que atraem para as portas das casas da vila
todos os que já despertaram e que, como os da casa de Jonas, se põem a
acompanhá-lo, para verem como vai terminar aquilo.
Enquanto
isso, os apóstolos olham atônitos uns para os outros, e murmuram: “Por que será
que Ele faz isso?” Ele nunca o fez!...”. E João diz: “ Em Alexandrecene,
contudo, Ele curou aqueles dois.”
“Mas
eles eram prosélitos”, responde Tadeu. “E esta vai tratar de que agora?”
“Ela
também é prosélita”, diz o pastor Anás.
Oh!
Mas quantas vezes ele curou também aos gentios ou pagãos! E a menina Romana,
então?”, diz desconsolado André, que não se conforma com a dureza de Jesus para
com a mulher Cananéia.
“Eu
vou dizer-vos porque é” exclama Tiago de Zebedeu. “É porque o Mestre foi
desdenhado. Sua paciência tem limites, diante de tantos ataques da maldade
humana. Não estais vendo como Ele está mudado? Ele tem razão! De agora em
diante, Ele vai dedicar-se somente àqueles que Ele conhece. E faz bem.”
“Sim.
Mas, por enquanto, essa aí vem gritando atrás de nós e um grande acompanhamento
de pessoas vem atrás dela. Se Ele quiser passar por inobservado, achou agora o
meio de chamar a atenção até das plantas...”, resmunga Mateus.
“Vamos
dizer-lhe que a mande embora... Olhai daqui que belo cortejo vem vindo às
nossas costas! Se chegarmos assim à estrada consular, estamos bem arranjados! E
esta mulher, se Ele não a mandar embora, não nos vai deixar...” diz Tadeu,
importunado, que também se vira, e intima à mulher: “Cala-te, e vai-te embora!”
E a mesma coisa faz Tiago de Zebedeu. Mas ela não se impressiona com as ameaças
e as injunções, e continua a suplicar.
“Vamos
dizer ao Mestre que a expulse, visto que Ele não a quer atender. Assim não pode
continuar!”, diz Mateus, enquanto André murmura: “Pobrezinha!”, e João fica
repetindo sem parar: “Eu não estou entendendo... Eu não estou entendendo...”
João está atordoado com o modo de agir de Jesus.
Mas,
apressando o passo, eles já alcançaram Jesus, que vai indo ligeiro como um
perseguido.
“Mestre!
Por favor, manda embora aquela mulher! É um escândalo! Ela vem gritando atrás
de nós. Está mostrando com o dedo a todos nós. A estrada está ficando sempre
mais cheia de passantes, e muitos vão-se colocando atrás dela. Dize a ela que
se vá embora.”
“Dizei-o
vós. Eu já dei resposta.”
“Ela
não escuta. Vamos, fora! Dize-lhe assim Tu. E com severidade.”
Jesus
pára e se vira. A mulher entende que isto é um sinal d que vai ser atendida e
acelera o passo, levanta o tom, já agudo, de sua voz, com um rosto que empalidece,
por causa da esperança que cresce.
“Cala-te,
mulher. E volta para tua casa. Eu já te disse: “Eu vim para as ovelhas de
Israel.” Para curar os doentes, e ir buscar as perdidas. Tu não és de
Israel...”
Mas
a mulher já está a seus pés, e os beija, adorando-o, segurando-o pelos
tornozelos, como se ela fosse uma náufraga, que encontrou um penhasco de
salvação, e que geme: “Senhor, ajuda-me! Tu o podes, Senhor. Dá ordem ao
demônio, Tu que és santo...Senhor, Senhor. Tu és o dono de tudo, da graça e do
mundo. Tudo te está sujeito, Senhor. Eu o sei. Eu o creio. Lança mão, pois do
que é o teu poder, e usa dele em favor de minha filha.”
“Não
fica bem tomar o pão dos filhos da casa e jogá-los aos cães da rua”
“Eu
creio em Ti. E crendo, de cão da rua eu me tornei um cão da casa. Eu te disse:
Eu vim antes da aurora deitar-me na soleira da porta da casa onde estavas e, se
tivesses saído por lá, terias tropeçado em mim. Mas Tu saíste pelo outro lado,
e não me viste. Não viste este pobre cão torturado, cheio de fome da tua graça,
que esperava entrar, rastejando para onde Tu estavas para beijar-te os pés e
assim pedir-te que não o rejeitasses...”
“Não
fica bem jogar o pão dos filhos aos cães”, repete Jesus.
“Mas
os cães entram na sala, onde o dono da casa está, e comem com os filhos, comem
o que cai da mesa ou os restos do que eles dão aos familiares e que não vai
mais ser usado. Eu não te pelo que me trates como filha nem que me faças
sentar-me à tua mesa. Mas dá-me pelo menos as migalhas...”
Jesus
sorri. Oh! Como se transfigura o seu rosto neste sorriso de alegria! As
pessoas, os apóstolos, a mulher olham, admirados para Ele, percebendo que
alguma coisa está para acontecer. E Jesus diz: “Oh! Mulher! Grande é a tua fé!
E com ela tu consolas o meu espírito. Vai, pois, e que seja feito como queres.
Desde este momento, o demônio saiu de tua filhinha. Vai em paz. E, visto que de
um cão perdido, soubeste querer passar a ser um cão da casa, que saibas, por
isso no futuro ser filha, sentada à mesa do Pai. Adeus.”
Oh!
Senhor! Senhor!... Eu quereria sair correndo para ir ver a minha Palma
querida... E, quereria ficar contigo, seguir-te! Ó Bendito! Ó Santo!”
“Vai,
vai mulher. Vai em paz.”
E
Jesus retoma o seu caminho, enquanto a cananéia, mais ligeira do que uma
menina, vai correndo pela estrada por onde veio, acompanhada pela multidão
curiosa por ver o milagre...
“Mas,
por que, Mestre, fizeste que ela ficasse pedindo tanto, para só depois
atendê-la?”, pergunta Tiago de Zebedeu.
“Por
tua causa, e por causa de todos vós. Isto não é uma derrota, Tiago. Aqui Eu não
fui expulso, escarnecido, amaldiçoado... Que isto reerga o vosso espírito
abatido. Eu já recebi hoje o meu alimento saborosíssimo. E por ele bendigo a
Deus.
(O
Evangelho como me foi Revelado – Maria Valtorta, Vol. 5, pgs.223 a 226)
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