O MESTRE ENSINA.
SEGUNDO DISCURSO DA MONTANHA, O DOM DA GRAÇA E AS BEM-AVENTURANÇAS.
24 de mato de 1945.
..."Muitos me tem perguntado,
durante todos estes anos de pregação: "Mas, tu, que te dizes o Filho de
Deus, dize-nos o que é o Céu, o que é o Reino, e que é Deus. Porque sobre tudo
isso nós temos idéias confusas. Nós sabemos que existe o Céu, com Deus e com os
Anjos. Mas de lá nunca veio ninguém para dizer-nos como ele é, e assim ele fica
fechado aos justos." Perguntaram-me também o que é o Reino e o que é Deus.
Eu me tenho esforçado para explicar-vos o que é o Reino e o que é Deus. Digo
que me tenho esforçado, não porque me fosse difícil explicá-lo, mas porque é
difícil, por um complexo de coisas, fazer-vos aceitar a verdade que se choca,
no que diz respeito ao Reino, contra todo um edifício de idéias que vieram, com
o correr dos séculos, e, no que diz respeito a Deus, pela sublimidade de sua
Natureza. Outros ainda, me perguntaram: "Está bem. Isto é o Reino, e isto
é Deus. Mas como conquistar-se este e aquele?" Também isso Eu procurei
explicar-vos, incansavelmente, a saber, qual o verdadeiro espírito da Lei do
Sinai. Quem consegue possuir aquele espírito, consegue possuir o Céu. Mas, para
explicar-vos a Lei do Sinai, é preciso fazer ouvir o tom forte do Legislador e
do seu Profeta, os quais, se prometem bênçãos aos observantes da Lei, ameaçam
com tremendas penas e maldições aos desobedientes. A Epifania do Sinai foi
terrível, isso se reflete em toda a Lei, se reflete em todos os séculos, se reflete
em todos os espíritos. Mas Deus não é
apenas Legislador. Deus é Pai. E um Pai de imensa bondade. Talvez, e mesmo sem
talvez, os vossos espíritos, enfraquecidos pelo pecado original, pelas paixões,
pelos muitos egoísmos vossos e dos outros, fazendo com que os dos outros vos
tornem espíritos irritados, e os vossos vos tornem espíritos fechados, não
podem elevar-se à contemplação das infinitas perfeições de Deus e, menos ainda
do que à de qualquer outra, à de sua bondade, porque esta é a virtude que,
junto com o amor, é a que menos aparece nos mortais.
A bondade! Oh! É doce ser bons, sem ódio, sem
invejas, sem soberbas! Ter olhos que só olham para amar, e mãos que se estendem
em gesto de amor, e lábios que não preferem senão palavras de amor, e coração,
coração principalmente, que cheio somente de amor, leva os olhos, as mãos e os
lábios a fazerem atos de amor! Os mais doutos entre vós sabem de que dons Deus
tinha enriquecido Adão para ele mesmo e para os seus descendentes. Até os mais
ignorantes entre os filhos de Israel sabem que em nós está o espírito. Só os
pobres pagãos não sabem disso, que nos temos esse hospede real, este sopro vital,
esta luz celeste, que santifica e vivifica o nosso corpo. Mas os mais doutos
sabem quais os dons que haviam sido dados ao homem, ao espírito do homem. Deus
não fez menores doações ao espírito do que à carne e ao sangue da criatura por
Ele feita com um pouco de lama e com o seu hálito. E como deu os dons naturais
de beleza e integridade, de inteligência e de vontade, de capacidade de amar-se
e de amar, assim deu também os dons morais, com a sujeição dos sentidos a
razão, de modo que, na liberdade e no domínio de si mesmo e da própria vontade,
de que Deus havia dotado Adão, não se insinuava o malvado cativeiro dos
sentidos e das paixões, mas livre era o amar-se, livre o querer, livre o prazer
na justiça, sem aquilo que vos torna escravos, fazendo-vos sentir o mordente
deste veneno que Satanás espalhou e que vomita, levando-vos para fora do álveo
límpido para os campos lamacentos, para os brejos podres, onde fermentam as
febres das sensualidades carnais e morais. Porque, ficai sabendo que é
sensualidade até a concupiscência por pensamento. Eles tiveram dons
sobrenaturais, isto é, a Graça santificante, o destino superior, a visão de
Deus.
A Graça santificante: é a vida da alma. É o
que há de mais espiritual colocado em nossa alma espiritual. A Graça nos faz filhos
de Deus, porque nos preserva da morte do pecado, e, quem não está morto,
"vive" na casa do Pai: o Paraíso; no meu Reino o Céu.
Que é essa Graça que santifica, que dá Vida e Reino? Oh! Não useis
de muitas palavras! A Graça é Amor. Portanto a Graça é Deus. É Deus, que
admirando-se a Si mesmo na criatura criada perfeita, se ama, se contempla, se
deseja, dá a Si mesmo o que é seu, para multiplicar isso que tem, e tornar-se
feliz com essa multiplicação, e para amar-se por quantos são outros Ele mesmo. Oh!
Filhos! Não priveis a Deus desse seu direito. Não roubeis de Deus essa sua
posse! Não decepcioneis a Deus nesse seu desejo! Pensai que Ele age por amor.
Ainda que vós não o fôsseis, Ele seria sempre Infinito, e não ficaria diminuído
o seu poder. Mas Ele, ainda que seja completo em sua medida infinita,
incomensurável, quer, não para Si e em Si, não o poderia porque é já o
Infinito, mas pela Criação, sua criatura, Ele quer aumentar o amor por tudo que
essa Criação contém de criaturas, por isso vos dá a Graça: o Amor, para que
vós, em vós, o leveis a perfeição dos santos, e derrameis este tesouro, tirado
do tesouro que Deus vos deu com a sua Graça e aumentado com todas as vossas
obras santas, com toda a vossa vida heróica e santos, no oceano infinito onde
Deus esta no Céu.
Ó divinos, divinos, divinos
mananciais do Amor! Vós existis, e ao vosso ser não é dada a morte, porque sois
eternos como Deus, sendo deus. Vós existireis, e ao vosso ser não se dará fim,
porque, imortais como os santos espíritos, que vos nutriram, abundantemente,
voltando eles para vós enriquecidos com seus próprios méritos. Vós viveis e
nutris, vós viveis e enriqueceis, vós viveis e formais aquela coisa santissima
que é a Comunhão dos espíritos, de Deus, Espírito Perfeitíssimo, até o do pequenino
que acaba de nascer e suga pela primeira vez o leite materno. Não me critiqueis
em vossos corações, ó homens doutos! Não digais: "Esse ai está doido, Esse
ai é mentiroso! Porque como um doido ele está falando da Graça em nós, que
estamos privados dela pela culpa. E ele mente, dizendo que já somos uma só
coisa com Deus." Sim, a culpa existe; sim, a separação também existe. Mas, diante do poder do Redentor, a Culpa,
separação cruel que se fez entre o Pai e seus filhos, cairá por terra, como
muralha, sacudida pelo novo Sansão. Eu já a agarrei e a estou sacudindo, e ela
já se está aluindo, e Satanás está tremendo de raiva, e de impotência, não
podendo fazer muda contra o meu poder, e sentindo que lhe são arrebatadas
tantas presas, e que vai-se tornando mais difícil arrastar o homem para o
pecado. Porque, quando Eu vos tiver, por meio de Mim, levado ao meu Pai, e
quando, ao filtrar-se o meu Sangue, e pela minha dor, fordes ficando limpos e
fortes, tornar-se-à em vós viva, ativa e poderosa a Graça e vos sereis os
triunfadores, se o quiserdes.
Deus não vos força, nem quanto ao pensamento,
nem quanto à vossa santificação. Vós sois livres. Mas Deus vos dá forças. Ele
vos dá a liberdade, mesmo no império de Satanás. Deveis escolher: ou
submeter-vos ao jugo infernal, ou pôr asas de anjos em vossas almas. Tudo
depende de vós, na companhia de Mim, vosso irmão, para guiar-vos e alimentar-vos
com a comida imortal. Como se pode
conquistar a Deus e ao seu Reino por outro caminho mais suave do que o do
Sinai?", assim vós dizeis. Não há outro caminho. O caminho é aquele.
Contudo, devemos olhar para ele, não através da cor da ameaça, e, sim, através
da cor do amor. Nós dizemos: "Ai de mim, se eu não fizer isto!", e
continuar tremendo, esperando o pecado, pensando que somos incapazes de deixar
de pecar. Mas, digamos:
"Feliz de mim, se eu fizer isto!",
e, com um impulso de sobrenatural alegria, jubilosos lancemo-nos nos braços
desta felicidade, que nasce da observância da Lei, como corola de rosa nascida
duma moita de espinhos.
"Feliz de mim, se eu for pobre de
espírito, porque, então, o Reino dos Céus é meu! Feliz de mim, se eu for manso,
porque herdarei a Terra! Feliz de mim, se eu for capaz de chorar sem revolta,
porque serei consolado! Feliz de mim, se mais do que do pão e do vinho para
saciar a fome, eu tiver fome e sede de justiça. A Justiça me saciará!
Feliz de mim, se eu for misericordioso, porque
será usada para comigo a divina misericórdia! Feliz de mim, se eu for puro de
coração, porque Deus se inclinará para o meu coração puro, e eu o verei!
Feliz de mim, se eu tiver um espírito de paz,
porque por Deus serei chamado seu filho, porque na paz está o amor, e Deus é
Amor que ama a quem é semelhante a Ele!
Feliz de mim se, por
fidelidade à justiça, eu for perseguido, porque, para compensar-me das
perseguições terrenas, Deus, meu Pai, me dará o Reino dos Céus.
Feliz de mim, se eu for
ultrajado, e mentirosamente for acusado, por saber ser teu filho, ó Deus! Disso
me deve provir, não desolação, mas alegria, porque isso me iguala aos teus
melhores servos, os Profetas, perseguidos por essa mesma razão; e com os quais
eu creio firmemente que hei de compartilhar a mesma grande recompensa, eterna,
no Céu, que é meu. Olhemos assim para o caminho da salvação. Através da alegria
os santos.
"Feliz de mim, se eu for
pobre de espírito": Oh! riquezas,
brasas de Satanás, a quantos delírios levais! Nos ricos e nos pobres. O rico
que vive para o seu ouro: o ídolo infame do seu espírito arruinado. O pobre que
vive do ódio ao rico! Porque o rico tem o ouro e, ainda que não cometa
materialmente homicídio, lança suas maldições sobre os ricos, desejando-lhes
toda espécie de males. Não basta deixar de fazer o mal, é necessário também não
desejar fazê-lo. Quem diz maldições rogando pragas e desejando a morte, não é
muito diferente de quem mata materialmente, porque nele existe o desejo de ver
morrer aquele a quem ele odeia. Em verdade, Eu vos digo que o desejo outra
coisa não é senão um ato retido, como alguém que já foi concebido no ventre,
mas ainda não foi expelido para fora. O desejo mau envenena e corrompe, porque
dura mais tempo do que o aio violento e vai mais ao fundo do que o próprio ato.
O pobre de espírito, se for rico, não peca por causa do ouro, mas, com o seu
ouro, faz a sua santificação, pois o transforma em amor. Amado e bendito, ele é
semelhante àquelas fontes, que dão vida nos desertos, e que se doam, com
generosidade, alegres por poderem dourar-se para acalmar os desesperas. Se é
pobre, está contente com a sua pobreza, e come o seu pão adoçado pela alegria
de saber-se livre dos ardores do ouro, e dorme o seu sono, livre de pesadelos,
e, se levanta descansado, para o seu tranquilo trabalho, que lhe parece sempre
leve, quando e feito sem avidez e sem inveja. As coisas que tornam um homem
rico são o ouro, entre as coisas materiais e os afetos, entre as coisas morais.
Pela palavra ouro compreendem-se não só as moedas, mas também as casas, os
campos, as jóias, os móveis, os rebanhos, tudo, afinal, que faz a vida
materialmente rica. Nas afeições: os laços do sangue e do casamento, as
amizades, as riquezas intelectuais, os cargos públicos. Como estais vendo, se
para aquela primeira categoria o pobre pode dizer: "Oh! Quanto a mim,
basta que eu não tenha inveja de quem possui, e já estou em meu lugar, porque
eu sou pobre, e por isso aqui necessariamente colocado", com a segunda
categoria também o pobre tem que tomar cuidado, porque pode, até o mais
miserável dos homens, tornar-se pecaminosamente rico em espírito. Todo aquele que se afeiçoa imoderadamente a
alguma coisa, peca. Vós direis: "Mas, então, devemos odiar o bem que
Deus nos deu? Se assim for, por que é
que Ele manda amar o pai, a mãe, a esposa, os filhos, e diz: "Amarás ao
teu próximo como a ti mesmo"? Fazei aqui uma distinção. Devemos amar ao
pai, à mãe, à esposa, e ao próximo, mas na medida que Deus deu: "como a
nós mesmos". Enquanto que Deus deve ser amado sobre todas as coisas e com
todo o nosso ser. Não temos que amar a Deus como amamos aos mais queridos dos
nossos próximos, à mãe, porque nos amamentou, à esposa, porque dorme sobre o
nosso peito e criado os filhos: mas, sim, amar a Deus com todo o nosso ser:
isto é, com toda a capacidade de amar que existe no homem: amor de filho, amor
de esposo, amor de amigo e oh! não vos escandalizeis! com amor de pai. Sim,
porque pelos interesses de Deus devemos ter os mesmos cuidados que um pai tem
para com os seus filhos, e para os quais guarda com amor os bens e os faz
aumentar, e se ocupa e se preocupa com o seu crescimento físico e cultural e
com o seu bom êxito nos negócios do mundo. O amor não é um mal, nem deve
tornar-se um mal. As graças que Deus nos concede não são um mal, nem devem
tornar-se um mal. Elas são amor. Por amor nos foram dadas. É preciso usar com
amor destas riquezas que Deus nos concede, tanto em afetos, como em bens. E,
somente quem não faz delas os seus ídolos mas meio para servir em santidade a
Deus, é que mostra não ter um apego pecaminoso a elas. Procura, pois, a Santa
pobreza do espírito, que se despoja de tudo, para ficar mais livre, a fim de
conquistar a Deus Santo, que é a Suprema Riqueza: conquistar a Deus quer dizer
ter o Reino dos Céus.
"Feliz serei eu se for
manso". Isto pode parecer estar em contraste com os exemplos que vemos
na vida de cada dia. Os que não são mansos é que parecem triunfar nas famílias,
nas cidades, nas nações. Mas, será mesmo um verdadeiro triunfo o deles? Não. É
o medo que está conservando aparentemente inclinados os subjugados pelo
déspota, mas esse medo não é mais do que um véu colocado sobre a efervescência
da revolta contra o tirano. Os que são iracundos e prepotentes não possuem os
corações nem de seus familiares, nem dos concidadãos, nem de seus súditos. Não
conquistam as inteligências e os espíritos para as suas doutrinas aqueles que
são mestres do: "Eu disse, e está dito!" Eles criam apenas
autodidatas, que vivem buscando e rebuscando uma chave capaz de abrir as portas
fechadas de uma sabedoria e de uma ciência, que eles percebem que deve existir,
e que é justamente a oposta à que lhes está sendo imposta. Não estão levando almas para Deus aqueles
sacerdotes que não se entregam à conquista dos espíritos com uma doçura cheia
de paciência, humilde, amorosa, mas que mais parecem ser uns guerreiros
armados, que se lançam a um assalto feroz, pelo modo como avançam com
impetuosidade e intransigência contra as almas... Oh! pobres almas! Se elas
fossem santas, não teriam necessidade de vós, ó sacerdotes, para chegarem à
luz. Pois já a teriam consigo. Se fossem justos, não teriam necessidade de vós
juízes para serem contidos pelo freio da justiça, pois já a teriam em si. Se
fossem sãos, não precisariam de quem os curasse. Por isso sede mansos. Não
façais que as almas fujam, espavoridas. Mas, atraí-as com amor. Porque a
mansidão é amor, assim como a pobreza de espírito também o é. Se assim fordes,
conquistareis a Terra, e levareis para Deus este lugar, que antes era de
Satanás, porque a vossa mansidão, que, além de ser amor, é também humildade,
terá vencido o ódio e a soberba, matando nos ânimos o rei abjeto da soberba e
do ódio, e então, o mundo será vosso, isto é, de Deus, pois vós sereis justos,
ao reconhecerdes a Deus como Senhor Absoluto das criação, ao qual há de ser
dado todo louvor, e entregue tudo o que é seu.
"Feliz serei eu, se souber
chorar sem revoltar-me." A dor
está sobre a terra. E a dor arranca lágrimas ao homem. Antes não existia a dor.
Mas o homem a colocou sobre a terra e, por uma depravação de sua inteligência,
esforça-se por descobrir o modo de aumentá-la sempre, e de todos os modos. Além
das doenças e das desventuras provindas de raios, de tempestades, de
avalanchas, de terremotos, eis que o homem, para sofrer, mas principalmente
para fazer sofrer, pois gostaríamos somente que os outros sofressem, e não nós,
dos meios estudados por nós para fazer sofrer eis, então, que o homem inventa
armas mortíferas sempre mais tremendas e durezas morais cada vez mais
astuciosas. Quantas lágrimas o homem faz outro homem derramar, por instigação
do seu rei oculto, que é Satanás! Pois bem. Em verdade, Eu vos digo que essas
lágrimas não são uma diminuição, mas uma perfeição para o homem. O homem é um
menino descuidado, é um despreocupado superficial, é alguém nascido de uma
inteligência tardia, enquanto o pranto não o tornar adulto, reflexivo e inteligente.
Somente os que choram, ou que já choraram, é que sabem amar e compreender. Amar
os irmãos que também choram, compreendê-los em suas dores, ajudá-los com sua
bondade, que já sabe por experiência quanto se sofre estando sozinho no pranto.
E sabem amar a Deus porque compreenderam que fora de Deus tudo é dor, porque
compreenderam que a dor se mitiga, se for chorada sobre o coração de Deus,
porque chegaram a compreender que o choro resignado, e que não quebranto a fé,
que não torna árida a oração, que não conhece o que é revolta, muda de
natureza, transformando-se de dor em consolação. Sim. Os que choram amando o Senhor,
serão consolados.
"Feliz
serei eu, se tiver fome e sede de justiça." Desde o momento em que
nasce, até o momento em que morre, o homem se inclina avidamente para o
alimento. Ele abre a boca, quando nasce, para agarrar o bico do peito, abre os
lábios para engolir algum sustento, numa aflição de agonia. Trabalha para se
alimentar. Ele faz da terra um enorme mamilo, do qual suga insaciável para
aquilo que morre. Mas, que é o homem? Um animal? Não, é um filho de Deus. Ele
está aqui no exílio por poucos ou por muitos anos. Mas sua vida não termina com
a mudança da sua morada. Existe uma vida na vida, assim como em uma noz existe o
miolo. Não é a casca que é a noz, mas é o miolo, que está dentro dela é que é a
noz. Se semeardes uma casca de noz, não nasce nada. Mas, se semeardes a casca
com sua polpa, nascerá uma grande árvore. Assim é o homem. Não é a carne que se
torna imortal, mas é a alma. E ela é nutrida para alcançar a imortalidade, à
qual, por amor, ela depois levará a carne, na feliz ressurreição. Alimento da
alma é a Sabedoria, é a Justiça. Como um liquido e um alimento, elas são
absorvidas e fortalecem a alma, e quanto mais se prova delas, mais cresce a
santa avidez de possuir a Sabedoria e de conhecer a Justiça. Contudo, há de
chegar um dia no qual a alma, insaciável nesta santa fome, ficara saciada.
Chegará esse dia. Deus se dará ao seu filho e o apertará diretamente ao seu
seio, e o filho nascido para o Paraíso se saciará da Mãe admirável, que é o
próprio Deus, e já não saberá mais o que é fome, mas repousará feliz sobre o
seio divino. Nenhuma ciência humana iguala esta ciência divina. A curiosidade
da mente pode ser satisfeita, mas a necessidade do espírito, não. Pelo
contrário, na diversidade dos sabores, o espírito até sente desgosto, vira a
boca para longe do amargo mamilo, preferindo passar fome a encher-se com um
alimento, que não tenha vindo de Deus. Não tenhais medo, ó sequiosos, ó
famintos de Deus! Sejais fiéis e sereis saciados por Aquele que vos ama.
"Feliz
serei eu, se for misericordioso". Quem é entre os homens o que pode
dizer: "Eu não preciso de misericórdia"? Ninguém. Pois bem, se até na
Antiga Lei está dito: "Olho por olho e dente por dente" por que se
não há de poder dizer na Nova assim: "Quem for misericordioso, encontrará
misericórdia"? Todos precisam de perdão. Pois bem ! Não é a fórmula e a
forma de um rito, figuras externas concedidos por causa da opaca mentalidade
humana, não são elas que obtém o perdão. Mas é o rito interno do Amor, isto é,
o rito da misericórdia. Porque, se foi imposto o sacrifício de um bode ou de um
cordeiro e a oferta de algumas moedas, isto foi feito porque na base ele todo
mal ainda se encontram duas raízes: a avidez e a soberba. A avidez é punida com
a despesa para a aquisição da oferta; e a soberba com a evidente confissão
daquele rito: "Eu celebro este sacrifício, porque pequei." Também se
fez isso para percorrer os tempos e os sinais dos tempos e, no sangue que se
espalha, está a figura do Sangue que vai ser derramado para cancelar os pecados
dos homens. Feliz, pois, daquele que sabe ser misericordioso para com os
esfaimados, para com os nus, para com os que não tem casa, para com os
miseráveis de misérias ainda maiores, que são as de possuir maus caracteres,
que fazem sofrer a quem os tem e aos que com eles convivem. Tende misericórdia.
Perdoai, compadecei-vos, socorrei, instruí, amparai. Não vos fecheis em uma
torre de cristal, dizendo: "Eu sou puro, e não desço ao meio dos pecadores."
Não digais: "Eu sou rico e feliz e não
quero ouvir falar das misérias dos outros." Tomai cuidado, porque, mais
depressa do que a fumaça, que se dissipa no ar por algum forte vento, pode
desvanecer-se também a vossa riqueza, a vossa saúde, o vosso bem-estar
familiar. E lembrai-vos de que o cristal serve de lente, e aquilo que,
misturando-vos com a multidão, podia passar inobservado, se vos colocardes numa
torre de cristal, sozinhos, separados, recebendo luz de todos os lados, já o
não podeis conservar escondido. Misericórdia também para levar a termo um
sacrifício de expiação secreto e continuo para com ele obter misericórdia.
"Feliz
de mim, se eu for puro de coração." Deus é pureza. O Paraíso é um Reino de Pureza.
Nada de impuro pode entrar no Céu, onde está Deus. Por isso, se fordes impuros,
não podereis entrar no Reino de Deus. Mas. Oh! Que alegria! É uma alegria
antecipada, que o Pai concede aos filhos! Quem é puro já tem, desde esta terra,
um começo do Céu, porque Deus se inclina para o puro, e o homem daqui da terra
já vê o seu Deus. Ele não conhece o sabor dos amores humanos, mas experimenta,
até ao êxtase, o sabor do amor divino, podendo dizer: "Eu estou contigo, e
Tu estás em Mim, por isso eu te possuo e conheço como esposo amabilíssimo de
minha alma." E, crede-o, quem possui a Deus, tem também em si mesmo mudanças
substanciais inexplicáveis, pelas quais ele se torna santo, sábio, forte, e
sobre seus lábios florescem palavras, e seus raios assumem poderes, que não
são, não, da criatura, mas de Deus que vive nela.
Que é a vida daquele que vê a
Deus? É felicidade. E quereríeis privar-vos de tão grande dom, por causa de fétidas
impurezas?
"Feliz eu serei, se tiver
um espírito de paz." A paz é uma das características de Deus. Deus não
está senão na paz. Porque a paz é amor, enquanto que a guerra é ódio. Satanás é
ódio. Deus é paz. Não pode alguém se dizer filho de Deus, e nem pode Deus dizer
que é seu filho um homem, se este tiver um espírito irascível, sempre pronto a
desencadear tempestades. E não somente isso. Também não pode dizer-se filho de
Deus quem, ainda que ele não seja propriamente um desencadeador de tempestades,
contudo, não contribui em nada, com a grande paz que tem, para acalmar as
tempestades levantadas por outros. Quem é pacífico, difunde a paz, mesmo sem
falar nada. Senhor de si, e ouso dizer até senhor de Deus, ele o leva como uma
lâmpada leva a sua luz, como um turíbulo que vai soltando os seus perfumes,
como um odre que transporta o seu líquido, e brilha a luz por entre as névoas
fumegantes dos rancores, e purifica-se o ar dos miasmas das invejas, e se
acalmam as ondas enfurecidas das contendas, por meio deste óleo suave, que é o
espírito de paz, que emana dos filhos de Deus. Fazei por onde possam os homens
chamar-vos por este nome.
"Feliz de mim, se eu for perseguido por amor da Justiça."
O homem é tão endemoninhado que odeia o bem onde quer que ele se encontrei, que
odeia a quem é bom, como se, por ser bom, mesmo que esteja calado, o esteja
acusando e censurando. De falo a bondade de alguém faz com que apareça ainda
mais preta a maldade do malvado. De falo, a fé de quem verdadeiramente crê, faz
que apareça mais viva a hipocrisia do que só finge crer. E, na verdade, não pode
deixar de ser odiado pelos injustos quem, com seu modo de viver, é uma
testemunha constante da justiça. E, então, acontece que o mau se enfurece
contra os amigos da justiça. Também aqui acontece como nas guerras. O homem
progride na arte satânica de perseguir, muito mais do que progride na arte
santa de amar. Mas, só pode perseguir quem tem vida curta. Pois o eterno, que
existe no homem, escapa da armadilha, e até, pela perseguição, adquire uma
vitalidade ainda mais vigorosa. A vida foge daquelas feridas que abrem as veias
ou pelos sofrimentos que vão consumindo o perseguido. Mas o sangue faz a
púrpura do futuro rei e os sofrimentos são como outros tantos degraus para
subir aos tronos que o Pai preparou para os seus mártires, para os quais estão
preparados os tronos régios do Reino dos Céus.
"Feliz eu serei, se for ultrajado e caluniado." Fazei
somente que vosso nome possa ser escrito nos livros do Céu, nos quais não estão
marcados os nomes, conforme as mentiras humanas, ao louvar aos que menos
merecem louvor. Mas neles, com justiça e amor, estão escritas as obras dos
bons, para dar-lhes o prêmio prometido aos benditos por Deus. Antes de nosso
tempo, foram caluniados e ultrajados os Profetas. Mas, quando forem abertas as
portas dos Céus, eles entrarão na Cidade de Deus, com a imponência de reis, e,
diante deles, se inclinarão os Anjos, cantando cheios de alegria. E vós também,
sim, e vós também, ultrajados e caluniados por terdes sido de Deus, tereis o
triunfo no Céu e, quando o tempo terminar e completo estará o Paraíso, então,
sim, todas as lágrimas serão por vós bem estimadas, porque por elas é que
tereis conquistado esta glória eterna, que Eu, em nome do Pai, vos prometo.
Ide. Amanhã eu vos falarei ainda. Fiquem aqui
agora somente os doentes para que Eu os socorra em seus sofrimentos. A paz
esteja convosco, e a meditação sobre a salvação, através do amor, vos encaminhe
pela estrada, cujo fim é o Céu."
( O Evangelho come me foi
Revelado – Maria Valtorta, Vol 3 pgs,78,79,80,81,82,83,84,85,86,87,88,89)
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