“NO TERCEIRO DIA, UMA LUZ VINDA DOS CONFINS DO UNIVERSO, COMO UM METEORO, VAI DIRETO ATÉ O SEPULCRO, QUANDO UM ESTRONDO SACODE A TERRA, AFASTANDO A ENORME PEDRA QUE O SELAVA, E OS GUARDAS ROMANOS FICAM ATORDOADOS. A LUZ ENTÃO ENTRA NO CORPO INERTE DE JESUS, QUE EM SEGUIDA LEVANTA, TRANSPASSANDO OS PANOS DA MORTALHA COM SEU CORPO IMATERIAL FULGURANTE. RESSUSCITANDO DOS MORTOS COM UMA MATÉRIA INCORPÓREA DE INTENSA LUZ, CONHECIDA APENAS POR DEUS, DE UMA BELEZA INDESCRITÍVEL.”

domingo, 17 de novembro de 2024

BÍBLIA SAGRADA - ADVENTO DA IGREJA - VOLUME 1

 

BÍBLIA SAGRADA

 

 

 

ADVENTO DA IGREJA

 

 

 

VOLUME 1

 

 

 

 

 

INTRODUÇÃO

 

               A Bíblia não se encerra com o Livro do Apocalipse de João. Ela é a revelação da existência de Deus como único Criador de tudo que existe, seja visível ou invisível. É a Palavra de Deus, inspirada por Ele nas consciências dos homens, que às professam por meio de palavras e escritos. É a história humana terrestre desde seu início, e terá um fim ao completar os sete mil anos proféticos, e então, o último dia chegará com o julgamento de toda vida humana, desde Adão e Eva até o último homem nascido de mulher. Nos primórdios dos tempos, como existiam apenas cinco livros, eram chamados de Torá em hebraico e Pentateuco em grego. Com a inclusão dos livros subsequentes do Antigo Testamento, chegando a quarenta e seis, naturalmente os gregos os chamavam Bíblia, que na língua deles significa livros. Com o Novo Testamento da Nova Aliança agregou-se mais 27 livros, totalizando setenta e três, mas a história humana terrestre não terminou, a Palavra de Deus também não se calou. Ela continuou a ser escrita pelo Espírito Santo através de seus Santos e Mártires até o dia de hoje, e tais livros com as revelações do Céu devem ser agregadas na Bíblia, fazer parte dela, como continuação. Não podemos deixa-la com a história da humanidade escrita parcialmente, aceitando somente os primeiros quatro mil anos, desde a queda de nossos progenitores. A continuação da Bíblia deve conter primeiramente o início da história da Esposa de Cristo na Terra, a Igreja Católica Apostólica Romana, sua nascente, e através dela colocar todos os livros inspirados de seus Santos, visionários, com a história de todos os Papas. Nesta continuação da Bíblia foram incluídas milhares de Palavras vindas do Céu, porém, não foi possível, infelizmente, colocar todas as mensagens.

               O advento da Igreja, é o tempo do Espírito Santo, da Terceira Pessoa da Trindade, se assim não o fizermos, dando continuidade, estaremos menosprezando-A. Seria como se o Espírito Santo não tivesse existido. É o advento da “Pedra” profetizada por Daniel, referente ao sonho de Nabucodonosor sobre a Estátua, que destrói todos os reinos, saindo-se única vencedora. Também é a “Pedra”, alegoria dada por Jesus à Pedro Apóstolo como primeiro Pontífice da Nova Aliança. É a Pedra rejeitada pelos construtores do Templo tornando-se Pedra angular, perfeita e eterna. Felizes aqueles que acreditaram e praticaram os ensinamentos da Tradição da Igreja, instrumento infalível para a salvação das almas, cuja função foi entronizar Deus no coração dos homens, transformando-o Templo do Espírito Santo. Este é o Templo verdadeiro onde Deus deseja estar, no coração dos homens. Também é preciso reconhecer que somente dentro das Igrejas Católicas, depois do Rito Eucarístico, recebemos verdadeiramente o Corpo e o Sangue de Cristo transubstanciado, adquirindo portanto, naquele momento sublime e milagroso, Deus em nossos corações, com a consumação da hóstia consagrada. Os sete Sacramentos da Igreja dão uma grande ajuda para as almas desejosas de serem salvas da condenação eterna, mas o Sacramento da Eucaristia é o momento de maior elevação espiritual para os cristãos. Deus permanece naquele coração, enquanto não pecar novamente.

               Os antipapas que surgiram durante a história da Igreja, nada mais são do que cismáticos, que ousaram se auto proclamar Pontífices, esquecidos de seus deveres cristãos em aceitar as recomendações tradicionais da Igreja. A Velha Serpente colocou trinta e nove antipapas nestes dois mil anos, sendo o último deles Mario Jorge Bergoglio, identificado no livro do Apocalipse como a Besta que veio da Terra, o lacaio do Anticristo. A ação das Trevas foi constante, a fim de desestabilizar a Igreja de Cristo, criar confusão e divisão. É esta história riquíssima que devemos eternizar para os habitantes do último milênio, o legado da Igreja, a história completa da luta da Luz contra as Trevas.

               Neste tempo da Igreja, uma missão especial de salvação foi dada pelo Criador à Maria Santíssima, a Mulher Vestida de Sol, a fim de preparar o rebanho para a Grande Tribulação. Com as inúmeras aparições da Mãe em muitos lugares da terra, contribuiu com suas revelações, desvendar as ciladas de Satanás, nos orientar e elevar a nossa fé. Ela, a Mãe do Verbo, salvou mais almas para a glória de Deus, do que todos os Santos juntos. Houve em torno de duas mil aparições de Maria desde a fundação da Igreja, e em quase todos estes lugares pediu para construir um Santuário, uma Igreja Católica em sua memória; nestes livros do advento da Igreja estão somente as mais reveladoras. Não porque tais aparições excluídas sejam menos importantes, muito menos os inúmeros cristãos desconhecidos do mundo que aqui não foram lembrados, mas conhecidos e amados pelo Senhor, devido ao grande trabalho em prol da Igreja e da conversão das almas. Há mais de vinte mil Santos e beatos católicos reconhecidos oficialmente pela Igreja Católica através do processo de canonização, nossos heróis que fizeram a vontade de Deus no mundo, a ponto de, pela graça de Deus, merecerem esse reconhecimento. Foram luzes de fé e esperança, engrandecendo espiritualmente a Santa Igreja através dos tempos. Nesta continuação da Bíblia estão mencionados apenas os mais relevantes. Muitos destes Santos e mártires Católicos ficaram com seus corpos incorruptíveis depois da morte. Alguns levaram décadas para começarem a se decompor, outros mais de cem anos, e outros permanecem incorruptíveis até os dias de hoje. Trata-se de pessoas com uma espiritualidade muito elevada, que perseveraram até o fim de suas vidas purificando a alma e o corpo, doando-se inteiramente ao Senhor. Os corpos incorruptos destes Santos ficaram assim por um milagre sobrenatural vindo do Criador, com o intuito de mostrar que é possível a matéria se eternizar conjuntamente com o espírito para o julgamento final, e para que crêssemos no que disseram e fizeram esses servos do Altíssimo. Esses inúmeros corpos estão em exposição nos Santuários e Igrejas de Cristo espalhadas pelo mundo.

               Lembremos também que todas as relíquias de Jesus Cristo estão nesta Santa Igreja, tais como: O Santo Sudário de Turim, o pano que cobriu Jesus no túmulo de José de Arimatéia, a Tunica de Argentil, confeccionada por Maria, vestiu Jesus durante o carregamento da Cruz, o Santo Sudário de Oviedo, colocado sobre a cabeça de Jesus no sepulcro, a Coroa de espinhos, os pregos, o Véu de Verônica, pano que enxugou o rosto de Cristo durante o carregamento da Cruz, onde miraculosamente se estampou o Rosto Santo do Salvador, além de outras. Nossa Senhora guardou tais relíquias num baú de madeira, e depois de sua morte foi entregue a João Apóstolo e dele para outros lugares. Esta Igreja tem sido a força motriz por trás de alguns dos principais eventos da história mundial, incluindo a cristianização da Europa Ocidental, Central e da América Latina, a disseminação da alfabetização, hospitais, o desenvolvimento da arte e música, literatura, arquitetura, contribuições para o método científico, além de outras inestimáveis e necessárias influência social enfatizando as virtudes e a moralidade. Ela desempenhou um papel poderoso nos assuntos globais, incluindo a Reconquista, as Cruzadas, a Inquisição, a Controvérsia da Investidura, o estabelecimento do Sacro Império Romano e a queda do Comunismo na Europa Oriental no final do século XX. Durante todos estes comflitos, principalmente durante a primeira e segunda guerra mundial, atuou sempre como pacificadora, ajudando a todos os necessitados que a ela recorriam como última instância, para sobreviverem. Não é ousado dizer que o mundo sem o cristianismo teria se tornado uma ruína moral e social em todos os aspectos.

               A Igreja Católica Apostólica Romana é a maior e mais longínqua instituição da terra, e a ela devemos nossa gratidão a Deus, por tê-la criado para o nosso bem. Esta grandiosíssima instituição chega nestes finais dos tempos com os números de sua imponência: tem quase 220 mil Igrejas espalhadas pelo mundo, aproximadamente um bilhão e quatrocentos mil fiéis, 5.340 Bispos, 407.870 Sacerdotes, 49.200 diáconos. Ajuda administrar 74.368 Jardins de Infância, frequentados por 7.565.095 alunos, 100.939 escolas primárias com 34.699.835 alunos, 49.868 escolas secundárias para 19.485.025 alunos. Acompanha 2.483.406 alunos do ensino médio e 3.925.325 estudantes universitários. Banca 5.405 hospitais, 15.276 lares de idosos, 10.567 creches. O Legado da Igreja é a certeza de que mostrou o Caminho certo a seguir, a Verdade contida em sua doutrina para conquistar a Vida eterna. Enquanto a Bíblia anterior foi escrita providencialmente por Deus com enigmas indecifráveis, a atual chegou para revelá-los, a fim de que a humanidade fique sabendo o significado de cada Profecia, antes da segunda vinda de Cristo. Deus, amorosíssimo como é, jamais deixaria de providenciar tais revelações, utilizando para isso seus servos, os visionários do final dos tempos. As visões e mensagens inspiradas pelo Paráclito, recebidas pelos visionários – antigamente chamados de Profetas -, o autor é Deus. Já a história dos Papas, e os eventos escatológicos mais marcantes da humanidade, foram escritas e reescritas por inúmeros autores, por centenas de anos, mantendo sempre a mesma história, mudando apenas a forma de contá-las, de acordo com cada autor-biográfico, portanto não se pode cobrar direitos autorais dos textos aqui apresentados. A grande maioria das citações históricas foi escrita por integrantes da própria Igreja, identificando seu escrevente apenas como fonte de informação. A começar pela Bíblia, o Martirológio Romano, Martirológio Jeronimiano, o Liber Pontificalis, Legenda Áurea, entre outros, são obras da Igreja Católica. Sendo a fonte das mensagens deste livro inspiradas por Deus, ou historicamente por ministros da Igreja, o conteúdo torna-se propriedade de toda a humanidade, porque é a herança de nossos pais, é o legado da Igreja, a Verdade que não se cala. Em apocalipse 22;18-19, João nos adverte para que ninguém tire ou acrescente nada no Livro por ele escrito. Muitos entenderam que não era para acrescentar novas revelações do Céu. Não, meus queridos cristãos. A recomendação foi apenas para não alterar somente o que ele havia escrito. Afinal, quem é que pode limitar as providências Divinas? Quem como Deus?   

 

ÍNDICE GERAL

 

Nesta continuação da história humana adotou-se como referência de busca a escatologia, portanto não tem número de páginas, nem mesmo capítulos e versículos.

 

BÍBLIA - ADVENTO DA IGREJA - VOLUME 1

 

1 – S.PEDRO – 33-67

1.1- Nossa Senhora do Pilar

2 – S. LINO – 67-76

3 – S. CLETO – 77-88

4 – S. CLEMENTE I – 89-98

5 – S. EVARISTO – 98-105

6 – S. ALEXANDRE I – 105-115

7 – S. SISTO I – 115-125

8 – S. TELÉSFORO – 125-136

9 – S. HIGINO – 137-140

10 – S. PIO I – 140-155

11 – S. ANICETO – 155-166

12 – S. SOTERO – 166-175

13 – S. ELEUTÉRIO – 175-189

14 – S. VÍTOR I – 189-199

15 – S. ZEFERINO – 199-217

16 – S.CALISTO I – 217-222

Antipapa: Hipólito (217-235)

17 – S. URBANO I – 222-230

17.1 - Santa Cecília

18 – S. PONCIANO – 230-235

19 – S. ANTERO – 235-236

20 – S. FABIANO – 236-250

21 – S. CORNÉLIO – 251-253

Antipapa: Novaciano (251)

22 – S. LÚCIO I – 253-254

23 – S. ESTÊVÃO I – 254-257

24 – S. SISTO II – 257-258

25 – S. DIONÍSIO – 259-268

26 – S. FÉLIX – 269-274

27 – S. EUTIQUIANO – 275-283

27.1 – Santa Helena

28 – S. CAIO – 283-296

29 – S.MARCELINO – 296-304

30 – S. MARCELO I – 307-309

31 – S. EUSÉBIO – 309-310

32 – S. MELQUÍADES – 311-314

33 – S. SILVESTRE I – 314-335

33.1 - São Nicolau

34 – S. MARCOS - 336

35 – S. JÚLIO I – 337-352

36 – S. LIBÉRIO – 352-366

Antipapa: Félix II (355- 365)

36.1 - Aparição de Nossa Senhora das Neves

37 – S. DÂMASO I – 366-384

Antipapa: Ursino (366-367)

37.1 - São Jerônimo

38 – S. SIRÍCIO – 385-398

38.1 - Santo Agostinho de Hipona

39 – S. ANASTÁCIO I – 399-401

40 – S. INOCÊNCIO I – 401-417

41 – S. ZÓSIMO – 417-418

42 – S. BONIFÁCIO I – 418-422

Antipapa: Eulálio (418-419)

43 – S. CELESTINO I – 422-432

44 – S. SISTO III – 432-440

45 – S. LEÃO I – 440-461

46 – S. HILÁRIO – 461-468

47 – S. SIMPLÍCIO – 468-483

48 – S. FÉLIX III – 483-492

49 – S. GELÁSIO I – 492-496

50 – S. ANASTÁCIO II – 496-498

51 – S. SÍMACO – 498-514

Antipapa: Lourenço (498-505)

51.1 - São Bento

52 – S. HORMISDAS – 514-523

53 – S. JOÃO I – 523-526

54 – S. FÉLIX IV – 526-530

55 – BONIFÁCIO II – 530-532

Antipapa: Dióscoro (530)

56 – JOÃO II – 533-535

57 – S.AGAPITO I – 535-536

58 – S. SILVÉRIO – 536-537

59 – VIRGÍLIO – 537-555

60 – PELÁGIO I – 556-561

61 – JOÃO III – 561-574

62 – BENTO I – 575-579

63 – PELÁGIO II – 579-590

64 – S. GREGÓRIO I – 590-604

65 – SABINIANO – 604-606

66 – BONIFÁCIO III - 607

67 – S. BONIFÁCIO IV – 608-615

68 – S. ADEODATO I – 615-618

69 – BONIFÁCIO V – 619-625

70 – HONÓRIO I – 625-638

71 – SEVERINO - 640

72 – JOÃO IV – 640-642

73 – TEODORO I – 642-649

74 – S. MARTINHO I – 649-655

75 – S. EUGÊNIO I – 654-657

76 – S. VITALIANO – 657-672

77 – ADEODATO II – 672-676

78 – DONO – 676-678

79 – S. AGATO – 678-681

80 – S. LEÃO II – 682-683

81 - 684-685 – S. BENTO II – 684-685

82 – JOÃO V – 685-686

83 – CÓNON – 686-687

Antipapas: Teododoro (687), Pascoal (687-692)

84 – S. SÉRGIO I – 687-701

85 – JOÃO VI – 701-705

86 – JOÃO VII – 705-707

87 – SISÍNIO - 708

88 – CONSTANTINO – 708-715

89 – S.GREGÓRIO II – 715-731

90 – S. GREGÓRIO III – 731-741

91 – S. ZACARIAS – 741-752

92 – ESTÊVÃO I (II) - 752

93 – S.ESTÊVÃO II (III) – 752-757

94 – S. PAULO I – 757-767

Antipapas: Constantino II (767-768), Filipe (768)

95 – S. ESTÊVÃO III (IV) – 768-772

96 – ADRIANO I – 772-795

97 – S.LEÃO III – 795-816

97.1 - Aparição de Nossa Senhora em Corbie

98 – S. ESTÊVÃO IV, (V) – 816-817

99 – S. PASCOAL I – 817-824

100 – EUGÊNIO II – 824-827

101 – VALENTINO - 827

102 – GREGÓRIO IV – 827-844

Antipapa: João (844)

103 – SÉRGIO II – 844-847

104 – S.LEÃO IV – 847-855

Antipapa: Anastácio (855)

105 – BENTO III – 855-858

106 – S. NICOLAU I – 858-867

107 – ADRIANO II – 867-872

107.1 - Santos Cirilo e Metódio

108 – JOÃO VIII – 872-882

109 – MARINO I – 882-884

110 – ADRIANO III – 884-885

111 – ESTÊVÃO V (VI) – 885-891

112 – FORMOSO – 891-896

113 – BONIFÁCIO VI - 896

114 – ESTÊVÃO VI (VII) – 896-897

115 – ROMANO - 897

116 – TEODORO II - 897

117 – JOÃO IX – 898-900

118 – BENTO IV – 900-903

119 – LEÃO V - 903

Antipapa: Cristóvão (903-904)

120 – SÉRGIO III – 904-911

121 – ANASTÁCIO III – 911-913

122 – LÂNDO – 913-914

123 – JOÃO X – 914-928

124 – LEÃO VI - 928

125 – ESTÊVÃO VII (VIII) – 929-931

126 – JOÃO XI – 931-935

127 – LEÃO VII – 936-939

128 – ESTÊVÃO VIII (IX) – 939-942

129 – MARINO II – 942-946

130 – AGAPITO II – 946-955

131 – JOÃO XII – 955-963

132 – LEÃO VIII – 963-964

133 – BENTO V – 964-965

134 – JOÃO XIII – 965-972

135 – BENTO VI – 973-974

Antipapa: Bonifácio VII (974)

136 – BENTO VII – 975-983

137 – JOÃO XIV – 983-984

138 – JOÃO XV – 985-996

139 – GREGÓRIO V – 996-999

Antipapa: João XVI (997- 998)

140 – SILVESTRE II – 999-1003

141 – JOÃO XVII - 1003

142 – JOÃO XVIII – 1003-1009

143 – SÉRGIO IV – 1009-1012

144 – BENTO VIII – 1012-1024

Antipapa: Gregório (1012)

145 – JOÃO XIX – 1024-1032

146 – BENTO IX – 1032-1044

147 – SILVESTRE III - 1045

148 – BENTO IX - 1045

149 – GREGÓRIO VI – 1045-1046

150 – CLEMENTE II – 1046-1047

151 – BENTO IX – 1047-1048

152 – DÂMASO II - 1048

153 – S. LEÃO IX – 1049-1054

154 – VÍTOR II – 1055-1057

155 – ESTÊVÃO IX (X) – 1057-1058

Antipapa: Bento X (1058)

156 – NICOLAU II – 1059-1061

156.1 - Aparição de Nossa Senhora de Walsingham

157 – ALEXANDRE II – 1061-1073

Antipapa: Honório II (1061-1072)

158 – S. GREGÓRIO VII – 1073-1085

Antipapa: Clemente III (1080 e 1084-1100)

159 – VÍTOR III – 1086-1087

160 – URBANO II – 1088-1099

160.1 - Santo Anselmo de Cantuária

161 – PASCOAL II – 1099-1118

Antipapas: Teodorico (1100-1102), Alberto (1102), Silvestre IV (1105-1111)

162 – GELÁSIO II – 1118-1119

Antipapa: Gregório VIII (1118-1121)

163 – CALISTO II – 1119-1124

164 – HONÓRIO II – 1124-1130

Antipapa: Celestino II (1124)

165 – INOCÊNCIO II – 1130-1143

Antipapas: Anacleto II (1130-1138), Vítor IV (1138)

166 – CELESTINO II – 1143-1144

167 – LÚCIO II – 1144-1145

168 – EUGÊNIO III – 1145-1153

168.1 – Santa Hildegarda de Bingen

169 – ANASTÁCIO IV – 1153-1154

170 – ADRIANO IV – 1154-1159

171 – ALEXANDRE III – 1159-1181

Antipapas: Vítor IV (1159-1164), Pascoal III (1164-1168), Calisto III (1168-1178), Inocêncio III (1179-1180)

172 – LÚCIO III – 1181-1185

173 – URBANO III – 1185-1187

174 – GREGÓRIO VIII - 1187

175 – CLEMENTE III – 1187-1191

176 – CELESTINO III – 1191-1198

177 – INOCÊNCIO III – 1198-1216

177.1 - São Domingos Gusmão

177.2 - Aparição de Nossa Senhora em Prouile

177.3 - São Francisco de Assis

177.4 - Santa Clara de Assis

178 – HONÓRIO III – 1216-1227

179 – GREGÓRIO IX – 1227-1241

180 – CELESTINO IV - 1241

181 – INOCÊNCIO IV – 1243-1254

181.1 – Santa Matilde de Hackeborn

181.2 - Aparição de Nossa Senhora do Carmo

182 – ALEXANDRE IV – 1254-1261

183 – URBANO IV – 1261-1264

184 – CLEMENTE IV – 1265-1268

185 – GREGÓRIO X – 1271-1276

186 – INOCÊNCIO V - 1276

187 – ADRIANO V - 1276

188 – JOÃO XXI – 1276-1277

189 – NICOLAU III – 1277-1280

190 – MARTINHO IV – 1281-1285

191 – HONÓRIO IV – 1285-1287

192 – NICOLAU IV – 1288-1292

193 – S.CELESTINO V - 1294

194 – BONIFÁCIO VIII – 1294-1303

195 – BENTO XI – 1303-1304

196 – CLEMENTE V – 1305-1314

197 – JOÃO XXII – 1316-1334

Antipapa: Nicolau V (1328-1330)

198 – BENTO XII – 1334-1342

199 – CLEMENTE VI – 1343-1352

199.1 - Santa Catarina de Siena

199.2 - Santa Brígida da Suécia

200 – INOCÊNCIO VI – 1352-1362

201 – URBANO V – 1362-1370

202 – GREGÓRIO XI – 1370-1378

202.1 - Santa Francisca Romana

203 – URBANO VI – 1378-1389

204 – BONIFÁCIO IX – 1389-1404

205 – INOCÊNCIO VII – 1404-1406

206 – GREGÓRIO XII – 1406-1417

Antipapas: Clemente VII (1378-1394), Bento XIII (1394-1423), Alexandre V (1409-1410), João XXIII (1410-1415)

207 – MARTINHO V – 1417-1431

207.1 - Santa Joana D`arc

208 – EUGÊNIO IV – 1431-1447

Antipapa: Félix V (1439-1449)

208.1 - Aparição de Nossa Senhora de Caravaggio

209 – NICOLAU V – 1447-1455

209.1 - Santa Catarina Gênova

210 – CALISTO III – 1455-1458

210.1 – Os Catorze Santos Auxiliares

211 – PIO II – 1458-1464

212 – PAULO II – 1464-1471

213 – SISTO IV – 1471-1484

214 – INOCÊNCIO VIII – 1484-1492

214.1 - Aparição de Nossa Senhora da Guarda

215 – ALEXANDRE VI – 1492-1503

216 – PIO III - 1503

217 – JÚLIO II – 1503-1513

218 – LEÃO X – 1513-1521

219 – ADRIANO VI – 1521-1523

220 – CLEMENTE VII – 1523-1534

220.1 - Santa Angela de Mérice

220.2 - Aparição de Nossa Senhora em Guadalupe

221 – PAULO III – 1534-1549

222 – JÚLIO III – 1550-1555

223 – MARCELO II - 1555

223. 1 - Aparição de Nossa Senhora em Kazan

224 – PAULO IV – 1555-1559

225 – PIO IV – 1559-1565

226 – S. PIO V – 1566-1572

226.1 - Santa Tereza D`avila

226.2 - Aparição de Nossa Senhora da Boa Saúde

227 – GREGÓRIO XII – 1572-1585

227.1 - Aparição de Nossa Senhora do Fetal

227.2 - São Camilo de Léllis

228 – SISTO V – 1585-1590

229 – URBANO VII - 1590

230 – GREGÓRIO XIV – 1590-1591

231 – INOCÊNCIO IX - 1591

232 – CLEMENTE VIII – 1592-1605

232.1 - Aparição de Nossa Senhora do Bom Sucesso

233 – LEÃO XI - 1605

234 – PAULO V – 1605-1621

234.1 - Aparição de Nossa Senhora de Siluva

235 – GREGÓRIO XV – 1621-1623

236 – URBANO VIII – 1623-1644

236.1 - São Vicente de Paulo

237 – INOCÊNCIO X – 1644-1655

237.1 - Aparição de Nossa Senhora de Coromoto

238 – ALEXANDRE VII – 1655-1667

238.1 - Aparição de Nossa Senhora de Jesus de Ágreda

238.2 - Aparição de Nossa Senhora de Laus

239 – CLEMENTE IX – 1667-1669

240 – CLEMENTE X – 1670-1676

241 – INOCÊNCIO XI – 1676-1689

242 – ALEXANDRE VIII – 1689-1691

243 – INOCÊNCIO XII – 1691-1700

244 – CLEMENTE XI – 1700-1721

244.1 - Aparição de Nossa Senhora Aparecida, Portugal

244.2 - Prodígio de Nossa Senhora Aparecida, Brasil

244.3 – Nossa Senhora Desatadora dos Nós

245 – INOCÊNCIO XIII – 1721-1724

246 – BENTO XIII – 1724-1730

247 – CLEMENTE XII – 1730-1740

248 – BENTO XIV – 1741-1758

248.1 - Santo Afonso de Ligório

248.2 - Aparição de Nossa Senhora da Ortiga

249 – CLEMENTE XIII – 1758-1769

250 – CLEMENTE XIV – 1769-1774

251 – PIO VI – 1775-1799

251.1 - Aparição de Nossa Senhora de Lavang

252 – PIO VII – 1800-1823

252.1 - Santa Ana Catarina Emmerich

253 – LEÃO XII – 1823-1829

254 – PIO VIII – 1829-1830

254.1 - Aparição de Nossa Senhora das Graças, Medalha Milagrosa

255 – GREGÓRIO XVI – 1831-1846

256 – PIO IX – 1846-1878

256.1 - São João Bosco

256.2 - Aparição de Nossa Senhora de La Salete

256.3 - Aparição de Nossa Senhora em Lichen

256.4 - Aparição de Nossa Senhora em Lurdes

256.5 - Aparição de Nossa Senhora da Boa Ajuda, Champion

256.6 - Aparição de Nossa Senhora da Esperança, Pontmain

 

BÍBLIA – ADVENTO DA IGREJA – VOLUME 2

256.7 - Aparição de Nossa Senhora de Pellevoisin

257 – LEÃO XIII – 1878-1903

257.1 - Beata Maria Serafina Micheli

257.2- Aparição de Nossa Senhora de Knock

257.3 - Aparição de Nossa Senhora de Sheshan

257.4 - Beato Charles de Foucauld

257.5 - Santa Tereza de Lisiex

257.6 - Santa Josefa Menendes

258 – S. PIO X – 1903-1914

259 – BENTO XV – 1914-1922

259.1 - Aparição de Nossa Senhora em Fátima

260 – PIO XI – 1922-1939

260.1 - Santa Tereza Benedita da Cruz

260.2 - Santa Faustina Kowalska

260.3 - Aparição de Nossa Senhora das Lágrimas

260.4 - Aparição de Nossa Senhora a Beata Alexandrina M.C.Balazar

260.5 - Aparição da Virgem do Coração de Ouro

260.6 - Aparição de Nossa Senhora dos Pobres

260.7 - Aparição de Nossa Senhora no Sítio da Guarda

261 – PIO XII – 1939-1958

261.1 - Aparições de Jesus e Nossa Senhora à Maria Valtorta

261.1.1 - O Evangelho como me foi revelado, Volume 1

261.1.2 - O Evangelho como me foi revelado, Volume 2

261.1.3 - O Evangelho como me foi revelado, Volume 3

261.1.4 - O Evangelho como me foi revelado, Volume 4

 

BÍBLIA – ADVENTO DA IGREJA – VOLUME 3

261.1.5 - O Evangelho como me foi revelado, Volume 5

261.1.6 - O Evangelho como me foi revelado, Volume 6

261.1.7 - O Evangelho como me foi revelado, Volume 7

261.1.8 - O Evangelho como me foi revelado, Volume 8

261.1.9 - O Evangelho como me foi revelado, Volume 9

 

BÍBLIA – ADVENTO DA IGREJA – VOLUME 4

261.1.10 - O Evangelho como me foi revelado, Volume 10

261.2 - Aparição de Nossa Senhora em Umbe

261.3 - Aparição de Nossa Senhora de Bonate

261.4 - Aparição de Nossa Senhora em La Codosera

261.5 - Aparição de Nossa Senhora de Todas as Nações

261.6 - Aparição de Nossa Senhora em Marienfried

261.7 - Aparição de Nossa Senhora do Rosário da Cova da Cruz

261.8 - Aparição de Nossa Senhora Virgem da Revelação

261.9 - Aparição de Nossa Senhora Rosa Mística, Montichiari

261.10 - Aparição de Nossa Senhora na Ilha de Bouchard

261.11 - Aparição de Nossa Senhora Medianeira

261.12 - Aparição de Nossa Senhora em Necedah

261.13 - Aparição de Nossa Senhora da América

261.14 - Prodígio de Nossa Senhora das Lágrimas, Itália

261.15 - Beata Elena Aielo

262 – Antipapa JOÃO XXIII – 1958-1963

262.1 - Aparição de Nossa Senhora Rainha de Turzovka

262.2 - Aparição de Nossa Senhora em Garabandal

263 – PAULO VI – 1963-1978

263.1 - Aparição de Nossa Senhora das Rosas, Maria Aux. Das Mães, Baisaid

263.2 - Aparição de Nossa Senhora Aparecida, Guiricema

263.3 - Aparição de Nossa Senhora da Eucaristia

263.4 - Aparição de Nossa Senhora em Akita

263.5 - Aparição de Nossa Senhora em Cua

263.6 - Aparição de Nossa Senhora em Caserta

263.7 - Aparição de Nossa Senhora ao Padre Stefano Gobbi

263.8 - Aparição de Jesus à Matilde Oliva Arias

264 – JOÃO PAULO I - 1978

265 – JOÃO PAULO II – 1978-2005

265.1 - Aparição de Nossa Senhora em Cuapa

265.2 - Aparição de Nossa Senhora em Medjugorje

265.3 - Aparição de Nossa Senhora em Naju

265.4 - Aparição de Jesus, Nossa Senhora, Miguel Arcanjo, e São Jose ao Discípulo

 

BÍBLIA – ADVENTO DA IGREJA – VOLUME 5

265.5 - Aparição de Nossa Senhora Rainha da Paz em Anguera

266 – BENTO XVI – 2005-2013

266.1 - Aparição de Jesus, Nossa Senhora à Maria Divina Misericórdia

267 - Antipapa FRANCISCO – 2013-2028

Legado do advento da Igreja

 

                           ABREVIATURAS      

1 Co = 1ª Epístola aos Coríntios

1 Cr = 1º Livro de Crônicas

1 Jo = 1ª Epístola de João

1 Pe = 1ª Epístola de Pedro

1 Rs = 1º Livro de Reis

1 Sm = 1o. Livro de Samuel

1 Tm = 1ª Epístola a Timóteo

1 Ts = 1ª Epístola aos Tessalonicenses

2 Co = 2ª Epístola aos Coríntios

2 Cr = 2º Livro de Crônicas

2 Jo = 2ª Epístola de João

2 Pe = 2ª Epístola de Pedro

2 Rs = 2ª Livro de Reis

2 Sm = 2º Livro de Samuel

2 Tm = 2ª Epístola a Timóteo

2 Ts = 2ª Epístola aos Tessalonicenses

3 Jo = 3ª Epístola de João

Ag = Ageu

Am = Amós

Ap = Apocalipse

At = Atos dos Apóstolos

Cl = Colossenses

Ct = Cântico dos Cânticos (ou Cantares de Salomão)

Dn = Daniel

Dt = Deuteronômio

Ec = Eclesiastes

Ed = Esdras

Ef = Efésios

Ex = Êxodo

Ez = Ezequiel

Fm = Filemon

Fp = Filipenses

Gl = Gálatas

Gn = Gênesis

Hb = Hebreus

Hc = Habacuque

Is =Isaías

Jd = Judas

Jl =Joel

Jn =Jonas

Jo = João

Jó = Jó

Jr = Jeremias

Js = Josué

Jz = Juízes

Lc = Lucas

Lm = Lamentações de Jeremias

Lv = Levítico

Mc = Marcos

Ml = Malaquias

Mq = Miquéias

Mt = Mateus

Na = Naum

Ne = Neemias

Nm = Números

Ob = Obadias

Os = Oséias

Pv = Provérbios

Rm = Romanos

Rt = Rute

Sf = Sofonias

Sl = Salmos

Tg = Tiago

Tt = Tito

Zc = Zacarias


 

 

ABREVIATURAS DAS ORDENS CATÓLICAS

 

               É uso corrente na Igreja Católica apor a sigla da ordem ou congregação religiosa logo após o nome do religioso ou da religiosa. Estas letras são, em geral, as iniciais da designação latina da organização.

A.A. - Congregação dos Agostinianos da Assunção; Pia Sociedade dos Padres da Assunção; Assuncionistas

A.B.A. - Monges Antonianos Beneditinos Armênios; Antonianos

A.C.J. - Servas do Sagrado Coração de Jesus

A.C.I. - Escravas do Sagrado Coração de Jesus

A.D. - Servas do Senhor; Congregação das Servas Pobres de Jesus Cristo, de Dernbach

A.M. - Agostinianas Missionárias

A.M.J. - Ancilas do Menino Jesus

A.S. - Auxiliares do Sacerdócio

A.S.C. - Adoradoras do Sangue de Cristo

A.S.C.J. - Apóstolas do Sagrado Coração de Jesus

A.S.J.M. - Agostinianas Servas de Jesus e Maria

A.S.M. - Arautos da Misericórdia Divina: Comunidade dos Apóstolos de Santa Maria; Apóstolos de Santa Maria

B. - Clérigos Regulares de São Paulo; Barnabitas

B.A. - Basilianos Melquitas de Alepo; Ordem Basiliana Alepina

B.C. - Ordem Basiliana de São João Batista dos Melquitas; Ordem Basiliana Chouerita de São João Batista; Basilianos Choueritas

B.D.P. - Fraternidade Beneditina da Divina Providência; Monges Beneditinos da Divina Providência

B.M.M.D. - Monges e Monjas Beneditinos de Maria Mãe de Deus.

B.S. - Ordem Basiliana do Santíssimo Salvador dos Melquitas; Basilianos Salvatorianos; Basilianos Melquitas de São Salvador

C.A.S.H. - Clérigos Apostólicos de São Jerônimo; Jesuatas

C.B. - Irmãos das Escolas Cristãs da Irlanda

C.C.N. - Instituto Religioso Chemin Neuf; Instituto Religioso do Caminho Novo

C.C.V. - Carmelitas da Caridade de Vedruna

C.C.V.I. - Congregação da Caridade do Verbo Encarnado

C.D.C. - Congregação dos Padres Seculares da Doutrina Cristã; Doutrinários; Congregação da Doutrina Cristã

C.D.P. - Carmelitas da Divina Providência

C.F.A. - Congregação dos Irmãos Aleixanos; Irmãos Celitas; Celitas

C.F.C. - Congregação dos Irmãos da Caridade; Bigi

C.F.H. - Irmãos Cristãos da Imaculada Conceição da Santíssima Virgem e Mãe de Deus Maria; Irmãos de Huybergen; Irmãos de Huijbergen

C.F.M.I. - Congregação dos Filhos de Maria Imaculada; Pavonianos de Bréscia

C.F.P. - Congregação dos Irmãos dos Pobres de São Francisco Seráfico (de Aachen)

C.F.V. - Congregação dos Religiosos de São Vicente de Paulo; Congregação dos Irmãos de São Vicente de Paulo

C.F.X. - Congregação dos Irmãos de São Francisco Xavier

C.I.A.S.P. - Congregação das Angélicas de São Paulo

S.S.A. - Congregação das Irmãs de Santa Ana

C.F.S. - Congregação da Fraternidade Sacerdotal

CIANSP - Auxiliares de Nossa Senhora da Piedade

C.I.C.M. - Congregação do Imaculado Coração de Maria; Missionários de Scheut

C.I.I.C. - Congregação das Irmãzinhas da Imaculada Conceição

C.J. - Instituto dos Josefinos; Josefinos da Bélgica

C.J.M. - Congregação de Jesus e Maria; Eudistas

C.M. - Congregação da Missão; Lazaristas; Vicentinos

C.M.E.S - Carmelitas Mensageiras do Espírito Santo

C.M.F. - Congregação dos Missionários Filhos do Imaculado Coração de Maria; Claretianos

C.M.I. - Congregação dos Carmelitas de Maria Imaculada

C.M.M. - Congregação dos Missionários de Mariannhill

C.M.P.S. - Comunidade Missionária Providência Santíssima (Jardinopólis, Brasil)

C.M.S.F. - Congregação Missionária de São Francisco de Assis; Irmãos Missionários de São Francisco de Assis

C.O. - Congregação do Oratório de São Filipe Neri; Congregação do Oratório; Filipinos; Oratorianos; Confederação do Oratório de São Filipe Neri[2]

C.O.S.J. - Congregação dos Oblatos de São José de Asti

C.P. - Congregação da Santíssima Cruz e Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo; Passionistas; Clérigos Descalços da Santíssima Cruz e Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo; Congregação da Paixão de Jesus Cristo

C.P.O. - Congregação dos Operários Pios; Calasantinos

C.P.P.S. - Congregação dos Missionários do Preciosíssimo Sangue

C.P.P.S. - Congregação dos Missionários do Preciosíssimo Sangue; Missionários do Preciosíssimo Sangue

C.R. - Ordem dos Clérigos Regulares; Clérigos Regulares de São Caetano de Thiene; Teatinos

C.R. - Congregação da Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo; Ressurrecionistas

C.R.L. - Cônegos Regulares Lateranenses; Ordem dos Cônegos Lateranenses

C.R.S.A. - Confederação dos Cônegos Regulares de Santo Agostinho

C.R.S.P. - Ordem dos Clérigos Regulares de São Paulo; Barnabitas

CS - Caritas Socialis

C.S. - Congregação dos Missionários de São Carlos Borromeu; Scalabrinianos

C.S.B. - Congregação de São Basílio

C.S.C. - Congregação de Santa Cruz

C.S.J. - Congregação de São José; Josefinos de murialdo

C.S.S. - Congregação dos Sagrados Estigmas de Nosso Senhor Jesus Cristo; Estigmatinos

C.S.Sp. - Congregação do Espírito Santo; Missionários do Espírito Santo.

C.Ss.R. - Congregação do Santíssimo Redentor; Redentoristas.

C.V.S. - Sodalício dos Clérigos Paroquiais; Clérigos Paroquiais; Clérigos de São Viator; Catequistas de São Viator

D.C. - Congregação dos Padres da Doutrina Cristã; Doutrinários

E.P. - Arautos do Evangelho

Es. - Família da Esperança

F.A.M. - Filhos do Amor Misericordioso

F.D.C. - Congregação das Filhas do Amor Divino; Filhas do Amor Divino

F.D.P. - Congregação da Pequena Obra da Divina Providência; Filhos da Divina Providência; Pequena Obra da Providência Divina; Orionitas

F.B.M.V. - Filhas da Bem-aventurada Virgem Maria

F.B.O.S.J. - Fraternidade Beneditina dos Oblatos de São José - Ordinariado Militar do Brasil

F.F.I. - Frades Franciscanos da Imaculada

F.M.A. - Filhas de Maria Auxiliadora

F.M.B.A.V.S.B. - Família Monástica de Belém, da Assunção da Virgem e de São Bruno

F.M.M.A. - Congregação dos Irmãos da Misericórdia de Maria Auxiliadora

F.M.M.D.P. - Congregação das Religiosas Franciscanas Missionárias da Mãe do Divino Pastor; Franciscanas Missionárias da Mãe do Divino Pastor

F.M.M.M.D. - Fraternidade Missionária Maria Mãe de Deus - Instituto Pobres servos de Maria por Amor (ramos feminino e masculino)

F.M.I - Congregação dos Filhos de Maria Imaculada (Pavonianos)

F.M.S. - Instituto dos Irmãos Maristas das Escolas; Irmãos Maristas; Irmãozinhos de Maria; Instituto dos Pequenos Irmãos de Maria; Maristas

F.M.V.D. - Fraternidade Missionária Verbum Dei

F.N.D.L. - Congregação dos Irmãos de Nossa Senhora de Lourdes

F.N.S.V. - Congregação das Irmãs Franciscanas de Nossa Senhora das Vitórias; Irmãs Vitorianas

F.S.A. - Filhos de Sant'Ana

F.S.C. - Irmãos das Escolas Cristãs; Irmãos Lassalistas; Irmãos de La Salle

F.S.C.J - Congregação das Irmãs Filhas do Sagrado Coração de Jesus

F.S.E. - Irmãs Franciscanas da Eucaristia

F.S.C.J. - Congregação das Irmãs Franciscanas do Sagrado Coração de Jesus; Franciscanas do Sagrado Coração de Jesus

F.S.G.M. - Irmãs Franciscanas do Mártir São Jorge

F.S.M. - Fraternidade São Mauro

F.S.M.P. - Filhas de Santa Maria da Providência; Irmãs Guanellianas

F.S.P. - Pia Sociedade das Filhas de São Paulo; Paulinas

I.B.D.P. - Congregação das Irmãs Beneditinas da Divina Providência[2]

I.F.E. - Instituto dos Frades de Emaús, Emautanos; Família Emautana

I.M. - Instituto Internacional das Irmãs de Santa Marcelina; Irmãs Marcelinas.

I.M.C. - Instituto da Consolata para as Missões Estrangeiras; Instituto das Missões da Consolata de Turim; Padres da Consolata

I.M.S.S -Instituto Mãe do Santíssimo Sacramento

IR.S.C. - Instituto dos Irmãos do Sagrado Coração (Lyon - França)

I.S.B. - Instituto das Irmãs Sacramentinas de Bérgamo

I.V.E - Instituto do Verbo Encarnado

L.C. - Legionários de Cristo, Missionários do Sagrado Coração e da Virgem das Dores

M.A.D. - Congregação das Irmãs Mensageiras do Amor Divino

M.S.S.P.S. - Missionárias Servas do Espírito Santo; Congregação das Missionárias Servas do Espírito Santo

M.C. - Missionárias da Caridade

M.C.C.J. - Congregação dos Missionários Combonianos do Coração de Jesus; Combonianos

M.I. - Ordem dos Ministros dos Enfermos Camilianos

M.I.C. - Congregação dos Padres Marianos da Imaculada Conceição

M.L.M. - Missionários das Lágrimas de Maria; Missionários de Nossa Senhora das Lágrimas

M.O.P.P. - Missão Operária São Pedro e São Paulo

M.S. - Congregação dos Missionários de Nossa Senhora da Salette

M.S.C. - Sociedade dos Missionários do Sagrado Coração de Jesus

M.S.C.S. - Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo; Scalabrinianas

M.S.F. - Congregação dos Missionários da Sagrada Família

N.D.S. - Congregação dos Religiosos de Nossa Senhora de Sion

O.Ann.M. - Ordem da Anunciação; Ordem da Anunciação da Virgem Maria; Anunciadas

O.A.D. - Ordem dos Agostinianos Descalços; Ordem dos Eremitas de Santo Agostinho

O.A.R. - Ordem dos Agostinianos Recoletos; Agostinianos; Recoletos de Santo Agostinho

Obl. OSB. - Oblatos beneditinos, Ordem de São Bento; Beneditinos

O. Carm. - Ordem dos Irmãos da Bem-Aventurada Virgem Maria do Monte Carmelo; Ordem do Carmo; Ordem dos Carmelitas; Carmelitas Calçados; Carmelitas da Antiga Observância; Ordem dos Carmelitas Observantes;

O.C.D. - Ordem dos Irmãos Descalços da Bem-Aventurada Virgem Maria do Monte Carmelo; Ordem dos Carmelitas Descalços; Carmelitas Descalços; Ordem Carmelitana Descalça

O.C.D.S. - Ordem dos Carmelitas Descalços Seculares; Carmelitas Descalços Seculares; Ordem Carmelita Secular; Carmelo Secular

O. Cart. - Ordem Cartusiana; Ordem da Cartuxa; Religiosos da Cartuxa; Cartusianos; Cartuxos; Monges e Monjas Cartuxos

O. Cist. - Ordem de Cister; Ordem Cisterciense; Cistercienses

O.C.S.O. - Ordem Cisterciense da Estrita Observância; Trapista

O.de.M - Ordem de Nossa Senhora das Mercês; Mercedários

O.F.B. - Ordem dos Irmãos de Nossa Senhora de Belém; Ordem dos Irmãos de Belém; Betlemitas

O.F.M. - Ordem dos Frades Menores; Franciscanos

O.F.M. Cap - Ordem dos Frades Menores Capuchinhos; Capuchinhos

O.F.M. Conv - Ordem dos Frades Menores Conventuais; Conventuais

O.F.S. - Ordem Franciscana Secular; Franciscanos Seculares

O.H. - Ordem Hospitaleira de São João de Deus; Irmãos de São João de Deus

O.L.M. - Ordem Libanesa Maronita; Baladitas

O.M. - Ordem dos Mínimos de São Francisco de Paula; Ordem dos Mínimos; Paulanos, Mínimos

O.M.I. - Missionários Oblatos de Maria Imaculada;

O.Min. - Ordem dos Menores de São Francisco de Assis

O.M.M. - Ordem Maronita da Bem Aventurada Virgem Maria

O.M.V. - Oblatos de Maria Virgem

O.P. - Ordem dos Pregadores (Dominicanos)

O.Praem. - Ordem Premonstratense; Premonstratenses; Frades Regulares de Prémontré; Ordem dos Cônegos Regulares Premonstratenses; Norbetinos; Cônegos Brancos

O.S.A. - Ordem de Santo Agostinho (Agostinianos)

O.SS.A. - Ordem da Santíssima Anunciação, Celestes

O.S.B. - Ordem de São Bento; Beneditinos

O.S.B. - Beneditinas Missionárias de Tutzing

O.S.B.M. - Ordem de São Basílio Magno; Ordem Basiliana de São Josafat

O.S.B.Oliv. - Ordem de Nossa Senhora do Monte Oliveto; Olivetanos

O.S.C. - Ordem da Santa Cruz; Padres Crúzios; Cônegos Regulares da Ordem da Santa Cruz; Padres e Irmãos Crúzios; Crúzios;

O.S.F.S - Congregação dos Oblatos de São Francisco de Sales

O.S.H. - Ordem de São Jerónimo; Monges jerónimos; Monjas jerónimas; Jerónimos; Jerónimas

O.S.J. - Congregação dos Oblatos de São José; Josefinos de Asti

O.S.M. - Ordem dos Servos de Maria; Servitas

O.S.O. - Ordem de Santa Eulália; Eulalistas

O.Ss.S. - Ordem do Santíssimo Salvador de Santa Brígida; Brigidinas

O. Trinit. - Ordem da Santíssima Trindade e da Redenção dos Cativos; Trinitários

O.T.C. - Ordem Terceira do Carmo; Venerável Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo; Terceiros Carmelitas

P.I.M.E. - Pontifício Instituto das Missões; Pontifício Instituto para as Missões Estrangeiras; Pontifício Instituto das Missões Estrangeiras de Milão; Instituto Pontifício dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo e dos Santos Ambrósio e Carlos para as Missões Estrangeiras; PIME

P.S.D.P. - Congregação dos Pobres Servos da Divina Providência; Calabrianos

P.S.S.C.  - Pia Sociedade São Caetano

P.S.S.P. - Pia Sociedade de São Paulo - Padres e Irmãos Paulinos

R.A.D. - Congregação das Religiosas do Amor de Deus

R.B.P. - Congregação de Nossa Senhora da Caridade do Bom Pastor; Congregação das Irmãs do Bom Pastor; Irmãs do Bom Pastor; Religiosas do Bom Pastor

R.C.J. - Rogacionistas do Coração de Jesus; Filhas do Divino Zelo

S.A.C. - Sociedade do Apostolado Católico; Palotinos

S.C.J. - Congregação dos Padres do Sagrado Coração de Jesus; Congregação dos Sacerdotes do Sagrado Coração de Jesus; Dehonianos

S.C.J. - Congregação do Sagrado Coração; Padres de Timon David

S.D.B. - Sociedade de São Francisco de Sales; Salesianos de Dom Bosco; Sociedade Salesiana; Salesianos

SdC. - Servos da Caridade; Obra de Dom Guanella

s.d.P. - Missionários Servos dos Pobres (Servos dos Pobres)

SDM - Instituto dos Servos da Divina Misericórdia (Pequenos Servos do Coração Imaculado de Maria) Associação Pública de Fiéis, fundada em 23 de abril de 2010, por Padre Sérgio Nishiyama, SDM, e aprovada suas Constituições e Normas por Dom Ladislau Biernaski, Bispo Diocesano de São José dos Pinhais, Paraná, Brasil. O Instituto dos Servos da Divina Misericórdia está com a Sede-Geral e o Seminário no município de Fazenda Rio Grande/PR e no município de Curitiba/PR encontra-se o Noviciado, Postulantado e Aspirantado.

S.D.N. - Congregação dos Missionários de Nossa Senhora do Santíssimo Sacramento; Congregação dos Missionários Sacramentinos de Nossa Senhora; Instituto dos Missionários Sacramentinos de Nossa Senhora; Instituto dos Missionários de Nossa Senhora do Santíssimo Sacramento; Sacramentinos de Nossa Senhora

S.D.S. - Sociedade do Divino Salvador (Salvatorianos)

S.J. - Companhia de Jesus; Jesuítas

SSCC - Congregação dos Sagrados Corações de Jesus e de Maria e da Adoração Perpétua do Santíssimo Sacramento; Congregação dos Sagrados Corações; Congregação de Picpus; Padres de Picpus

SSS - Congregação do Santíssimo Sacramento; Sacramentinos

S.S.P. - Sociedade S. Paulo; Paulistas ou Paulinos

S.V.D. - Congregação do Verbo Divino; Missionários do Verbo Divino; Verbitas

S.X. - Pia Sociedade de São Francisco Xavier para as Missões Extrangeiras; Xaverianos

T.O.R. - Terceira Ordem Regular de São Francisco

U.A.C. - União do Apostolado Católico

 

 

Explicitação de inúmeras denominações

Martirológio Romano - O Martirológio Romano é uma coletânea histórica dos Santos e beatos honrados pela Igreja Católica Romana. Apesar do nome, inclui todos os Santos conhecidos e não apenas os mártires. A sua primeira versão foi escrita no século XVI e aprovada pelo Papa Gregório XIII em 1586, tendo sido revisto múltiplas vezes. A atual edição do Martirológio Romano (2001), que atualizou a edição de 1956, inclui 6538 Santos e beatos, mas o seu número total é maior, já que em muitos casos se refere apenas um nome, acompanhado pela menção: «e companheiros mártires». É um livro litúrgico que constitui a base dos calendários litúrgicos que determinam a data das festas religiosas anuais. O documento está ordenado segundo os dias do calendário, nele se anotando o local e a data de morte, o título canônico (apóstolo, mártir, confessor, virgem, ou outro), o tipo de memória litúrgica e algumas notas sobre a sua espiritualidade e factos relevantes da vida e obra.

Martirológio Jeronimiano -  Ou Martirológio de Jerônimo (em latim: Martyrologium Hieronymianum) constitui o mais antigo catálogo dos mártires cristãos da Igreja Católica. Deve o seu nome ao fato de ter sido atribuído a São Jerônimo.

Liber Pontificalis -  Do latim, o Livro dos Pontífices, é um livro de biografias de Papas de São Pedro, até o Papa Estêvão V do século XV. A publicação original parou com o Papa Adriano II (867-872) ou o Papa Estêvão V (885-891), mas foi posteriormente completada em um estilo diferente até que o Papa Eugênio IV (1431-1447) e, em seguida o Papa Pio II (1458-1464).

Legenda Áurea: É uma coletânea de narrativas hagiográficas, de Santos Católicos, reunidas por volta de 1260 pelo dominicano e futuro Bispo de Gênova Tiago de Voragine. É uma reunião de biografias de santos escritas no século XIII com a intenção de difundir valores morais edificantes e arregimentar um maior número de fiéis para a Igreja Católica. O objetivo imediato do autor era fornecer aos frades material para elaboração de sermões, de modo a proporcionar uma pregação mais eficiente. A coletânea conheceu enorme sucesso na Idade Média e se tornou referência nos estudos religiosos. Ao selecionar vasto material erudito e popular, Tiago de Voragie conta a trajetória dos santos de forma envolvente - tendo em vista os que ouviam a pregação - e também eficiente do ponto de vista teológico. Nos relatos, o autor combina simbologia e história, teologia e mitologia.

Pelagianismo - Foi um conceito teológico que negava o pecado original, a corrupção da natureza humana, o servo arbítrio (arbítrio escravizado, cativo) e a necessidade da graça divina para a salvação. O termo é derivado do nome de Pelágio da Bretanha. Acreditavam que todo homem é totalmente responsável pela sua própria salvação e portanto, não necessita da graça divina, em que todo homem nasce "moralmente neutro", sendo capaz, por si mesmo, sem qualquer influência divina, de salvar-se quando assim o desejar.

Visigodos - Foram um de dois ramos em que se dividiram os godos, um povo germânico originário do leste europeu, sendo o outro os ostrogodos. Ambos pontuaram entre os bárbaros que penetraram o Império Romano tardio no período das migrações. Após a queda do Império Romano no Ocidente, os visigodos tiveram um papel importante na Europa nos 250 anos que se seguiram, particularmente na Península Ibérica, onde substituíram o domínio romano na Hispânia, reinando de 418 até 711, data da invasão muçulmana.

Nestorianismo - É uma doutrina cristológica proposta por Nestório, Patriarca de Constantinopla (428–431). A doutrina, que foi formada durante os estudos de Nestório sob Teodoro de Mopsuéstia na Escola de Antioquia, enfatiza a desunião entre as naturezas humana e divina de Jesus.

Novacianismo - Foi um movimento durante o cristianismo primitivo formado pelos seguidores de Novaciano e que se recusavam a readmitir em comunhão os lapsi - os cristãos batizados que tinham renegado a sua fé e realizado sacrifícios aos deuses pagãos - durante a perseguição de Décio em 250. Eles foram posteriormente declarados como heréticos.

Monofisismo - É o ponto de vista cristológico que defende que, depois da união do divino e do humano na encarnação de Jesus Cristo, teria apenas uma única "natureza", a divina, e não uma síntese de ambas. O monofisismo é contraposto pelo diofisismo (ou "diafisismo"), que defende que Jesus preservou em si as duas naturezas.

Maniqueísmo - É uma filosofia religiosa sincrética e dualística fundada e propagada por Manes ou Maniqueu, filósofo heresiarca do século III, que divide o mundo simplesmente entre Bom, ou Deus, e Mau, ou Diabo. A matéria é intrinsecamente má, e o espírito, intrinsecamente bom. Com a popularização do termo, maniqueísta passou a ser um adjetivo usado para descrever todas as doutrinas fundamentadas nos dois princípios opostos do Bem e do Mal.

Arianismo - Foi uma visão cristológica antitrinitária sustentada pelos seguidores de Ário, presbítero cristão de Alexandria nos primeiros tempos da Igreja primitiva, que negava a consubstancialidade entre Jesus e Deus Pai, que os igualasse. Ou seja negava a divindade de Jesus Cristo.

Três Capítulos - A Controvérsia dos Três Capítulos, uma das fases da controvérsia calcedônia, foi uma tentativa de reconciliar os cristãos ortodoxos orientais das províncias romanas da Síria (Igreja Ortodoxa Síria) e Egito (Igreja Ortodoxa Copta) com a Igreja Ortodoxa, logo após o fracasso do Henótico. Os Três Capítulos consistiam nas proposições anatemizando: Teodoro de Mopsuéstia e suas obras. Algumas obras específicas de Teodoreto de Ciro. A carta de Ibas de Edessa para Máris de Calcedônia.

Origenismo - Cognominado Orígenes de Alexandria ou Orígenes de Cesareia ou ainda Orígenes, o Cristão, foi um teólogo, filósofo neoplatônico patrístico e é um dos Padres gregos. Um dos mais distintos pupilos de Amônio de Alexandria, Orígenes foi um prolífico escritor cristão, de grande erudição, ligado à Escola Catequética de Alexandria, no período pré-niceno.

Lombardos ou longobardos - Eram um povo germânico originário da Europa Setentrional que colonizou o vale do Danúbio e, a partir dali, invadiu a Itália bizantina, em 568, sob a liderança de Alboíno. Lá estabeleceram um Reino Lombardo, posteriormente chamado de Reino Itálico, que durou até 774, quando foi conquistado pelos francos.

Anglo-saxões - Os anglo-saxões ou anglo-saxônicos foram um povo que habitou a Grã-Bretanha a partir do século V. Eles compreendem um povo formado de tribos germânicas que migraram para a ilha a partir da Europa continental, seus descendentes (anglos, frísios, jutos e saxões) e grupos celtas britânicos (bretões) que adotaram alguns aspectos da cultura e língua anglo-saxônica.

Iconoclastia - Doutrina bizantina dos séculos VIII e IX que repudiava a representação e o culto de imagens sagradas.

Adocionismo - Algumas vezes chamado de monarquianismo dinâmico, é uma visão teológica não trinitária do cristianismo primitivo, que professa que Jesus nasceu humano, tornando-se posteriormente divino por ocasião do seu batismo, ponto em que foi adotado como filho de Deus.

Docetismo -  Foi uma heresia cristã primitiva que promovia uma visão falsa da humanidade de Jesus. A palavra docetismo vem do grego dokein, que significava “parecer”; segundo o docetismo, Jesus Cristo só parecia ter um corpo humano como o nosso. O docetismo aceitava que Jesus podia ter sido de alguma forma divino, mas negava a Sua plena humanidade. Os docetistas convictos ensinavam que Jesus era apenas um fantasma ou uma ilusão, parecendo ser humano, mas não tendo corpo algum. Outras formas de docetismo ensinavam que Jesus tinha um corpo “celestial” de algum tipo, mas não um corpo real e natural de carne. O docetismo estava intimamente relacionado ao gnosticismo, que via a matéria física como inerentemente má e a substância espiritual como inerentemente boa.

Normandos - Foram um povo germânico estabelecido no norte da França, cuja aristocracia descendia em grande parte de viquingues da Escandinávia. Eles desempenharam um importante papel político, militar e cultural na parte norte e mediterrânea da Europa Medieval e Oriente Médio, por exemplo: a colonização da Normandia, a Conquista Normanda da Inglaterra, o estabelecimento de estados na Sicília e sul da península Itálica e as Cruzadas. Sua rica história originou várias lendas a seu respeito.

Guelfos e Gibelinos - Constituíam facções políticas que, a partir do século XII, estiveram em luta na Itália, especialmente na República Florentina. Os conflitos se intensificaram sobretudo a partir do século XIII. Na origem, tratava-se de uma disputa entre os partidários do papado (os guelfos) e os partidários do Sacro Império Romano-Germânico (os gibelinos).

Jansenismo - É a doutrina dos seguidores de Cornelius Jansen, teólogo holandês que se tornou bispo católico de Ypres. Atribui a salvação da alma ao juízo prévio do Criador, predestinação, e não às "boas obras" ou à disposição da criatura, do livre arbítrio. Ou seja, segundo esta teoria, todos os seres humanos já nascem com seu destino traçado por Deus, são escolhidos aqueles que vão se salvar ou ser condenados antecipadamente pelo Criador. A teoria jansenista se acompanhava de uma ética severa e rigoroso ascetismo.

Tomismo -  é o sistema filosófico e teológico de Santo Tomás de Aquino.

Cátaros ou albigenses - surgiram na França e possuíam uma visão dualista do mundo, ou seja, o mundo material era mau e o mundo espiritual era bom. Afirmavam que o mundo havia sido criado por Satã, contestavam a Trindade e condenavam o casamento e a procriação. Foram perseguidos durante a Cruzada Albigense (1209-1229), e a heresia desapareceu a partir do século XIV.

Valdenses - também surgiram na França a partir das pregações de Pedro Valdo, rico comerciante de Lyon que abandonou seu ofício em 1176 para seguir a vida como pregador. Faziam voto de pobreza, contestavam a autoridade da Igreja Católica e afirmavam obedecer somente a Deus. Foram perseguidos pela Inquisição, mas sobreviveram e fundaram igrejas que hoje atuam em vários países.

Reconquista -  É o processo histórico ao longo do qual os reinos cristãos da Península Ibérica procuraram dominar a região durante o período de al-Andalus. Tal processo decorreu entre 718 ou 722 e 1492, com a conquista do Emirado de Granada pelos reinos cristãos.

Controvérsia das Investiduras - Foi um conflito entre o papado e o Sacro Império Romano-Germânico, que ocorreu entre 1075 e 1122, que teve como objeto o poder de nomear Bispos.

As cruzadas - Foram expedições militares organizadas por católicos da Europa Ocidental, com o objetivo inicial de reconquistar para o mundo cristão lugares sagrados, como o Santo Sepulcro, em Jerusalém, na Palestina, que estavam sob o domínio militar dos muçulmanos.

Inquisição ou Santa Inquisição - Foi um grupo de instituições dentro do sistema jurídico da Igreja Católica Romana cujo objetivo era combater a heresia, apostasia, blasfêmia, feitiçaria e costumes considerados perniciosos para a alma.

Escolasticismo ou Filosofia Escolástica - É um método ocidental de pensamento crítico e de aprendizagem, com origem nas escolas monásticas cristãs, que concilia a fé cristã com um sistema de pensamento racional, especialmente o da filosofia grega.

Montanismo - Foi um movimento cristão fundado por Montano por volta de 156-157, que se organizou e difundiu em comunidades na Ásia Menor, em Roma e no Norte de África. O movimento caracterizou-se como uma volta ao profetismo, pretendendo revalorizar elementos esquecidos da mensagem cristã primitiva, sobretudo a esperança escatológica. Propunha um rigoroso ascetismo, visando à preparação para o momento final, preceituando-se a castidade durante o casamento e proibindo-se as segundas núpcias. No plano alimentar instituiu-se o jejum durante duas semanas por ano e a xerofagia (consumo de alimentos secos), sem o consumo de carne. Negavam a absolvição aos réus de pecados graves (mesmo após o batismo com confissão e arrependimento). As mulheres eram obrigadas ao uso de véu nas funções sagradas. Recomendava-se aos fiéis que não fugissem às perseguições e que se oferecessem voluntariamente ao martírio.

Gnosticismo - Designa um conjunto de crenças de natureza filosófica e religiosa cujo princípio básico assenta na ideia de que há em cada homem uma essência imortal que transcende o próprio homem. Os gnósticos consideram a existência humana neste mundo como não natural, por estar submetida a diversos sofrimentos. Segundo o gnosticismo, o caminho para a libertação desses sofrimentos é através do conhecimento. Não um conhecimento adquirido de forma racional e com base científica, mas um conhecimento intuitivo e transcendental que dá sentido à própria vida humana. Tem origem em várias seitas religiosas anteriores ao cristianismo, mas nos primeiros séculos da era cristã chega a misturar-se com o próprio cristianismo.

Marcionismo - É uma corrente religiosa que surgiu no século II, fundada por Márcion de Sinope. Essa doutrina defendia a existência de dois deuses distintos: um deus do Antigo Testamento, considerado um deus vingativo e cruel, e um deus do Novo Testamento, que seria o verdadeiro Deus, de amor e misericórdia.

 

 

 

INÍCIO DO ADVENTO DA IGREJA

 

O advento da Igreja se iniciou com os atos dos Apóstolos após a morte de Cristo, tendo como Pontífice Simão Pedro.

               Em Jerusalém, sobre o Monte Calvário, o céu estava limpo e o sol escaldante, mas de repente se transformou num céu negro cheio de raios e ventanias. Um grande estrondo provocado por um terremoto sacode a terra, deixando rachaduras, assustando os judeus que fogem aterrorizados. Um Anjo do Senhor neste mesmo momento rasga o Véu dos Santos dos Santos no Templo de alto a baixo, como um sinal de abandono da presença Divina. Uma lágrima vermelha do Criador cai na terra, banhando-a de Sangue, com a morte de seu Primogênito. Porém, no terceiro dia, uma luz vinda dos confins do universo, como um meteoro vai direto até o sepulcro, quando um novo estrondo estremece a terra, afastando a enorme pedra que o selava, e os guardas romanos, atordoados, fogem. A Luz então entra no Corpo inerte de Jesus, que em seguida levanta, transpassando os panos da mortalha com seu Corpo imaterial fulgurante. Ressuscitando dos mortos com uma matéria incorpórea de intensa Luz, conhecida apenas por Deus, de uma beleza indescritível. Depois de quarenta dias ressuscitado volta aos Céus, posicionando-se à direita do Pai, donde há de vir e julgar os vivos e os mortos.

               E o Verbo que era Deus se fez Hóstia, transformando-se em Comida e Bebida vinda do Céu para os homens, na Nova Aliança eterna, para os purificar e salvar. Convidando-nos para a Graça, o Amor, afim de elevar-nos novamente ao patamar puríssimo de nossos progenitores quando foram criados.

               Jesus nasceu no dia 25 de dezembro e viveu 33 anos completos, vindo a falecer numa sexta-feira dia 3 de abril do ano 34 d.C., ressuscitando três dias depois num domingo dia 6. Durante 40 dias esteve presente na terra ressuscitado, chegando ao dia 15 de maio do ano 34 d.C., quando subiu aos Céus. Assume então no dia 16 de maio de 34 d.C. o primeiro representante de Deus na terra, o Apóstolo Pedro, primeiro Pontífice da Nova Aliança. Assim começa o advento da Santa Igreja.

 

1º - São Pedro - 34 – c.67

               Simão Pedro, filho de Jonas, casado com Porfíria, sem filhos, natural de Betsaida, trabalhava como pescador em Cafarnaum. Adotou um órfão de 12 anos, chamado Marzian no segundo ano de evangelização do Senhor, que depois de alguns anos se tornou discípulo de Cristo. No ano 34 d.C., logo depois da morte do Senhor, Pedro assumiu o posto de líder dos Apóstolos, conforme Jesus havia profetizado anteriormente dizendo que ele seria a Pedra de sua Igreja. Logo nos primeiros meses depois do Pentecostes, quando os Apóstolos e Nossa Senhora receberam o Espírito Santo, Pedro decidiu que o sábado deveria ficar com os Judeus, e que o dia para realizar os Missais em memória do Senhor, seria no domingo, dia da ressurreição. A primeira Missa do cristianismo foi realizada no Cenáculo em Jerusalém por Jesus Cristo. O Cenáculo é portanto a primeira Igreja do cristianismo, onde Pedro realizou a segunda Missa, e depois passou ao Apóstolo Thiago, irmão de Judas Tadeu, primos de Jesus. Thiago foi o primeiro Bispo do cristianismo em Jerusalém. Pedro ajudou na fundação da Igreja de Antioquia, depois se dirigiu a Roma e la ficou até sua morte. Durante seu Pontificado morreu o discípulo Estevão em c.34 d.C., ex-aluno do Fariseu e Doutor Gamaliel; também foi assassinado o Apóstolo Thiago primo de Jesus, em c.41 d.C. e a miraculosa Assunção de Nossa Senhora em c.44 d.C. Em c.48 d.C. foi necessário o primeiro Concílio do cristianismo presidido por Pedro. O Concilio de Jerusalém foi uma reunião inicial entre as lideranças cristãs nos meados do século I, para abordar se os gentios deveriam seguir as leis de Moisés. Entre alguns da Judeia estabeleceu-se uma dúvida e uma polêmica: saber se os gentios, ao se converterem ao cristianismo, teriam que adotar algumas das práticas antigas da Lei Mosaica para poderem ser salvos, inclusive fazer-se circuncidar. O apóstolo Paulo, ao levar o cristianismo à outros povos, não exigia a circuncisão desses novos cristãos. Diante disso os presbíteros de Jerusalém se reuniram em torno de Pedro, que já exercia sua função de chefe dos Apóstolo e da igreja, com o Bispo do Cenáculo em Jerusalém, Tiago, primo de Jesus. Na reunião deste Concílio, Pedro foi enfático em afirmar que não havia diferença entre os gentios e eles; portanto deveriam seguir a doutrina de Jesus igual para todos, excluindo, obviamente, os costumes Mosaicos.

               A comunidade cristã de Roma foi fundada pelos apóstolos Pedro e Paulo. Por esta razão desde a antiguidade a comunidade de Roma teve o primado sobre todas as outras comunidades locais; nessa visão o ministério de Pedro continua sendo exercido até hoje pelo Bispo de Roma, assim como o ministério dos outros apóstolos é cumprido pelos outros Bispos unidos a ele, que é a cabeça do colégio apostólico, do colégio episcopal. Nestes 33 anos do Pontificado de Pedro, muita coisa permaneceu encoberta pelo véu do mistério divino. Devido as perseguições implacáveis do Anticristo Nero, logo depois de ter incendiado Roma, São Pedro foi crucificado – a seu pedido - de cabeça para baixo, pois não se achava digno morrer como Cristo morreu, e agonizante desfaleceu. Seu túmulo está sob a Basílica de São Pedro no Vaticano, em Roma. Pedro, a Pedra, faz parte literalmente das pedras da Sede da Igreja Católica. São Paulo Apóstolo morreu nesta mesma época.

 

1 . 1 - Nossa Senhora do Pilar

               A conversão da Espanha ao cristianismo foi muito difícil. O Apóstolo Tiago, que em espanhol é chamado de Santiago, sofria grandes desafios para evangelizar os pagãos da Península Ibérica. Estamos falando dos anos 40 do primeiro século da nossa era: fazia pouco tempo que Jesus tinha morrido e ressuscitado. Seus apóstolos ainda viviam neste mundo, assim como sua Mãe, Nossa Senhora, que morava na Terra Santa. Acontece que, certa noite, para encorajar o Apóstolo a não esmorecer diante da resistência pagã na Espanha, a Virgem Santíssima apareceu para São Tiago na região de Caesaraugusta, hoje Saragoça (em espanhol, Zaragoza), acompanhada por um coro de anjos. Ela estava sobre um pilar e afirmava a São Tiago que, no futuro, a fé daqueles povos ibéricos seria profunda e firme. Assim incentivado, o Apóstolo perseverou na árdua missão e o resultado é que, hoje, uma das mais numerosas parcelas de católicos de todo o planeta reza em espanhol. Maria tinha pedido a São Tiago que construísse naquele mesmo lugar uma igreja cujo altar ficasse ao redor do pilar onde ela estava. E fez uma promessa: “Este lugar permanecerá até o fim do mundo para que a graça de Deus realize milagres e prodígios pela minha intercessão àqueles que suplicarem a minha ajuda”.

               São Tiago e seus seguidores atenderam ao pedido de Nossa Senhora e construíram ali a capela que foi chamada de Nossa Senhora do Pilar. Foi o primeiro templo dedicado à Virgem Maria. Essa devoção foi se consolidando até que Nossa Senhora do Pilar fosse reconhecida, como é até hoje, a Padroeira da Espanha. Depois de evangelizar a região, São Tiago, irmão de João, voltou para Jerusalém e lá morreu martirizado por volta do ano 44. Segundo a tradição, os seus discípulos levaram o corpo de volta à Espanha para sepultá-lo onde hoje se ergue um dos mais populares destinos de peregrinação do mundo inteiro: Santiago de Compostela. Quanto à aparição de Maria como Nossa Senhora do Pilar, trata-se, a rigor, de um caso de bilocação, ou seja, o fenômeno de se estar fisicamente presente em dois lugares ao mesmo tempo. Recordemos que, na época, Nossa Senhora ainda estava nesta Terra, morando na Palestina, quando apareceu para São Tiago em Saragoça. E quanto ao pilar, ele existe até hoje, tendo resistido a quase dois milênios de invasões, perseguições, batalhas, a brutal Guerra Civil Espanhola e até mesmo à queda de três bombas, que, milagrosamente, não explodiram.

 

2º - São Lino - c.67 – c.76

               Lino foi um dos setenta e dois discípulos de Jesus. Nas escrituras é mencionado em 2 Timóteo 4;21. Nasceu em Túcia, Itália no ano 10 d.C. Com sua cidadania romana, Lino se tornou influente em Roma ao lado de Pedro. Como ainda não havia uma Igreja em Roma, as Igrejas nesta época eram improvisadas nas casas de conhecidos cristãos. Antes, porém, que fosse eleito bispo, trabalhava pela salvação das almas ao lado de São Pedro, de quem era grande colaborador. Teria recebido a missão de pregar na Gália. Chegando àquelas terras, estabeleceu-se em Vesôncio (atual Besançon), capital do Franco Condado. Graças ao apoio que tinha do tribuno Onósio, principal magistrado que tinha por missão lutar pelas causas do povo, São Lino acabou transformando-se em um homem público, exercendo preponderante papel junto à população. Em pouco tempo tornou-se um líder influente, de grande capacidade intelectual. Dadas as circunstâncias, aproveitou o terreno para plantar as sementes da religião cristã, mesmo sabendo que os obstáculos, dificuldades e perseguições seriam inevitáveis. Por conseguinte, empreendeu intenso esforço para afastar o povo da idolatria e da adoração de deuses estranhos. Seus discursos eram duros, porém, verdadeiros e por isso, não tardou que acabasse sendo violentamente escorraçado da cidade. Era uma figura extremamente incômoda e inconveniente aos líderes pagãos, que diante da persuasão junto ao povo, temiam a perda de seu espaço. São Lino testemunhou a queda de alguns imperadores romanos e a destruição de Jerusalém pelo Imperador Tito, em 70 d.C., cumprindo-se a profecia de Jesus. Em sua última prática na cidade de Vesôncio, São Lino criticou e repreendeu veementemente os idólatras, feiticeiros renomados e diversos pagãos, que ofereciam sacrifícios aos seu ídolos e seus deuses. "Cessai", disse São Lino, "cessai de render adoração a tão vis criaturas". Os líderes presentes, percebendo que estavam prestes a cair em descrédito pela força de sua palavra, gritaram ao povo, dizendo que as insolências sacrílegas proferidas por Lino, iriam provocar a ira dos deuses e caso lhe dessem ouvidos, sério castigo se precipitaria sobre o povo. Continuando a esbravejar, incitaram o povo, que acabou investindo contra o santo mediante golpes, tendo sido expulso da cidade completamente ferido e também abandonado, até mesmo por aqueles que sempre o apoiaram. Dali retornou para Roma, onde permaneceu até ser escolhido como sucessor de São Pedro. As sementes que deixou para trás, germinaram com grande vigor, tanto que passaria a ser venerado pelo povo tempos depois, em sua primeira Sede Episcopal de Besançon. Lino, depois de curar a filha do Consul Sênio Saturnino, o mesmo se voltou contra ele, dominado por insinuações mentirosas de seus conselheiros, mandou degolar Lino no dia 23 de Setembro de c.76 d.C.

 

3º - Santo Anacleto - c.77 – c.88

               Nasceu em Atenas, Grécia, faleceu em Roma, 92 d.C. Foi Papa durante o reinado de Tito, quando em 24 de agosto de 79 o Monte Vesúvio causou a destruição das cidades de Estábia, Ercolano e Pompéia. Cletus, nome grego que também identifica Anacleto, viveu os anos iniciais do cristianismo, marcados por perseguições e descrenças. A Igreja Católica apenas começava a se organizar para propagar os ensinamentos de Jesus Cristo, o qual deixou seu Apóstolo Pedro como responsável romano pela palavra. Anacleto assumiu o papado no ano 77, sucedendo o Papa Lino, e viveu entre oscilações de paz e perseguições. Naquele momento, no entanto, as perseguições aos cristãos eram bem mais intensas e cotidianas, especialmente porque Roma ainda era um império pagão, cultuava vários deuses. O Papa Anacleto conviveu com o reinado do imperador Vespasiano e de seus dois filhos, que eram pagãos e perseguiam a religião do Senhor. Esses cristãos pioneiros ainda viviam sob a expectativa do fim do mundo a qualquer momento, o que incomodava também os interesses de Roma. Há poucas informações registradas sobre o papado de Anacleto, pois se trata de um período muito distante e é bem provável que documentos dos cristãos tenham sido destruídos entre as constantes perseguições. Mas sabemos que Anacleto ordenou sacerdotes em Roma, construiu um monumento sobre a sepultura de Pedro e instituiu sua veneração. Anacleto também orientou que os cristãos não aceitassem comida oferecida aos deuses pagãos e condenou o culto de objetos supostamente mágicos e de feitiçaria em geral. Embora Anacleto tenha conseguido alguns momentos de paz para os cristãos, o que predominou foi mesmo a perseguição. O final de sua vida foi em decorrência justamente desse cenário opressor. No ano 88, o segundo filho de Vespasiano a ocupar o trono de imperador, Domiciano, promoveu uma perseguição que capturou o Papa Anacleto e o assassinou. O Papa foi martirizado e sepultado ao lado de Lino na Colina do Vaticano, local de construção da Basílica de São Pedro.  

 

4º - São Clemente I - c.89 – c.98

               Também conhecido como Clemente Romano. Nascido em Roma, nos arredores do Coliseu, de família hebraica, foi um dos primeiros a receber o batismo de São Pedro. Foi sucessor de Anacleto I, e autor da Epístola de Clemente aos Coríntios (segundo Clemente de Alexandria e Orígenes), talvez o segundo documento de literatura cristã, endereçada à Igreja de Corinto. Ele foi considerado posteriormente o primeiro Pai da Igreja Apostólica Romana por ter defendido publicamente o sistema religioso através da hierarquia sacerdotal e rituais dogmáticos. Estabeleceu o uso da Crisma, deu início ao rito papado sendo o primeiro Papa instituído e iniciou o uso da palavra Amém nas cerimônias religiosas. É conhecido pela carta que escreveu para a comunidade de Corinto, na qual rezava uma convicta censura à igreja, devida sobretudo às discórdias entre os fiéis (consta que os presbíteros mais jovens teriam expulsado do meio dos cristãos os bispos nomeados pela Igreja de Roma), estabeleceu normas precisas referentes à ordem eclesiástica hierárquica (bispos, presbíteros, diáconos) e ao primado da Igreja de Roma. Neste pontificado ocorreu uma segunda perseguição aos cristãos, na época de Domiciano. Com Nerva, os cristãos viveram uma temporada de paz. Mais tarde, Clemente foi preso no reinado de Trajano. Após ser detido e condenado ao exílio, com trabalhos forçados nas minas de cobre de Galípoli; no ano 97, decidiu que os cristãos não podiam ficar sem um guia espiritual, renunciando em favor de Santo Evaristo. Converteu muitos presos e por isso, no ano 100 foi atirado ao mar com uma pedra amarrada ao pescoço, tornando-se num mártir cristão dos princípios da Cristandade. Seu corpo foi recuperado das águas e sepultado em Quersoneso, na Crimeia, de onde, mais tarde, por ordem de Nicolau I, seu corpo foi levado a Roma.

 

5º - Santo Evaristo - c.98 – c.105

               Temos muito poucas informações certas a respeito de santo Evaristo, um dos primeiros sucessores de Pedro. Santo Ireneu e Santo Eusébio indicam-no como sucessor imediato de são Clemente, e por isso foi por volta do ano 98 que ele se tornou Papa, ou mais exatamente bispo de Roma. Esse esclarecimento faz-se oportuno, pois então o título de papa, ou seja pai, era conferido a qualquer autoridade religiosa: só a partir do século VI ficou reservado ao pontífice romano. Era grego originário de Antioquia, enquanto seu pai, de nome Judas, era judeu de Belém. O Martirológio Romano, que escreve precisamente: “Em Roma, santo Evaristo, Papa e mártir, que, sob o Imperador Adriano empurpurou com o seu sangue a Igreja de Deus”. Há duas disposições tomadas por santo Evaristo no exercício do seu pontificado: a distribuição dos sacerdotes de Roma nos vinte e cinco títulos ou igrejas paroquiais da cidade, que teriam sido instituídas já por São Cleto; e que os diáconos estivessem ao lado do bispo enquanto este pregava e proclamava o prefácio da missa, para testemunhar, em caso de necessidade, a ortodoxia e também para conferir maior solenidade à celebração.

               Neste Pontificado morre João Apóstolo. João foi preso em Éfeso pelos Romanos e levado para Roma afim de ser morto numa grande vasilha de óleo fervente. Porém Deus tinha outros planos para o Apóstolo querido, e um milagre aconteceu. João saiu do óleo fervente como se fosse apenas água. Depois disso o Imperador Domiciano irritado mandou exilar João na Ilha Grega de Patmos, onde escreveu o Apocalipse. Morreu em Éfeso, no ano de c.103 d.C. Acredita-se que João foi arrebatado por Deus ao Céu, como Enoc e Elias, por isso não tem túmulo.

 

6º - Santo Alexandre - c.105 – c.115

               Nascido em Roma no ano 75, Aleksander esteve entre os primeiros cristãos e, por consequência, sofreu com as perseguições do Império Romano. Fiel e seguidor dos ensinamentos de Jesus Cristo, Aleksander dedicou-se à religião desde cedo. Sua firmeza de personalidade e sua capacidade de exercer influência sobre as pessoas o levaram a uma posição de destaque no cristianismo. O romano era conhecido também por sua piedade, o que o representava como uma santidade. Suas características de homem pacífico, porém determinado, ajudaram a converter centenas de pessoas à fé cristã, incluindo membros do Senado e da nobreza romana. Ações que representaram verdadeiras conquistas para a Igreja Católica, pois as décadas e séculos iniciais do cristianismo foram repletos de perseguição e insatisfação com a religião monoteísta que nascia e crescia em um império historicamente identificado pelo politeísmo. Com todas suas notáveis características para o momento, Aleksander, ou simplesmente Alexandre, foi escolha imediata para suceder o Papa Evaristo, falecido no ano 105. Naquela época, Alexandre tinha apenas 30 anos, mas já era bem conhecido na esfera política e possuía um histórico favorável. O papado de Alexandre I deixou um legado representativo especialmente para a liturgia católica. O Papa estabeleceu o uso de pão sem fermento durante a celebração da eucaristia, assim como a mistura de um pouco de água ao vinho que é consagrado na celebração para representar a união de Cristo com a Igreja. A característica litúrgica mais marcante de seu papado foi ter instituído o uso de água benta para aspersão. O Papa Alexandre I ordenou seis padres, dois diáconos e cinco bispos, de acordo com alguns pesquisadores. Para confrontar os opositores da Igreja Católica, excomungou todos que impediam que os legados da instituição religiosa exercessem os cargos indicados pelo Sumo Pontífice. Também escreveu epístolas, ordens e decretos. Sua atuação resultou no descontentamento do Império Romano, que tinha intolerância à Igreja Católica. Acredita-se que Alexandre I tenha sido aprisionado pelo imperador Aureliano e, mesmo na cadeia, o papa teria realizado milagres capazes de converter outros romanos. Embora haja dúvidas sobre a precisão dos fatos, acredita-se que Aureliano tenha ordenado a martirização do Papa Alexandre I, o qual teria sido amarrado a um cavalo, chicoteado e finalmente morto na fogueira, levando consigo alguns de seus seguidores. Após dez anos de papado, Alexandre I faleceu no ano 115 e foi canonizado pela Igreja Católica. Muitos séculos mais tarde, em 834, seus restos mortais foram transferidos para Freising, na Baviera.

 

7º - São Xisto I - c.115 - c.125

               Nascido em Roma no ano 42, Elvidius Xystus, ou simplesmente Sisto, era filho de um romano que tinha o nome de Pastor. Viveu em um período muito próximo dos primeiros cristãos. É um período também de muitas dificuldades para esses fieis, pois havia grande perseguição do Império Romano, que professava o paganismo como religião oficial. Nessa época, a Igreja Católica ainda não estava consolidada como instituição e tampouco gozava do prestígio que a caracterizaria a partir da Idade Média. O Papa Sisto I enfrentou as primeiras divergências entre a Igreja de Roma e as Igrejas do Oriente e, curiosamente, um dos principais motivos foi a Páscoa. Esta era uma celebração já estabelecida entre os cristãos orientais e que ainda não havia sido adotada no Ocidente. Hoje, no entanto, é uma das celebrações mais marcantes e importantes da Igreja Católica Romana. Outro enfrentamento ocorreu contra os adeptos da gnose, que procuravam conciliar todas as religiões e explicar o sentido mais profundo de tudo. Combateu fortemente as doutrinas gnósticas. Mas, além da divergência, Sisto I estabeleceu importantes atos para os católicos. Foi este papa que determinou que ninguém, além dos presbíteros e ministros do culto, pode tocar no cálice e na patena durante a consagração. Determinou também que os bispos consagrados deveriam ter um documento comprobatório do papa. O Papa Sisto I parece ter sido muito influente na tradição litúrgica do catolicismo. Foi autor de duas epístolas. A primeira acerca da doutrina da Santíssima Trindade e a segunda sobre o primado do Bispo de Roma sobre as igrejas particulares. Foi o primeiro papa a enviar um missionário para evangelização da Gália. O Papa Sisto I deu importante continuidade ao trabalho de estruturação eclesiástica e fundamentou ritos que se tornaram marcantes na Igreja Católica. Pelo que consta, deu auxílio paternal aos mártires cristãos e foi igualmente martirizado. Faleceu no dia sete de fevereiro de 125, aos 83 anos de idade, e foi sepultado nas terras onde posteriormente seria erguida a Basílica de São Pedro.

 

8º - São Telésforo - c.125 – c.136

               Nascido em ano desconhecido, Telésforo era proveniente de Terranova da Sibari. Viveu em um período chamado de cristianismo primitivo, próximo da época em que Jesus Cristo pregou sua palavra. Era um momento de muita dificuldade para os cristãos porque eram perseguidos pelos imperadores romanos, que professavam o paganismo. Muitos dos líderes cristãos foram martirizados em função da opressão. Telésforo se tornou papa no ano 125 para ser sucessor de Sisto I. Apesar das dificuldades vividas pelos cristãos naquela época, seu papado foi de relativa paz porque os imperadores Adriano e Antonino não publicaram éditos de perseguição aos cristãos, algo muito comum naquele período. No entanto, a paz não foi completa porque os cristãos tiveram desentendimentos com outros grupos religiosos e comunidades que não seguiam a fé cristã. Não se conhecem muitas informações sobre o Papa Telésforo porque as fontes daquele período foram, em grande parte, perdidas em função de conflitos e desastres. O que se sabe mesmo é acerca dos dados gerais que são conhecidos sobre o momento. Por exemplo, os pagãos viviam fazendo acusações aos cristãos e tentando se apropriar de seus bens. Muitos cristãos dessa fase foram atirados aos leões para servirem de alimento. No que diz respeito especificamente ao papado de Telésforo, são creditados a ele alguns ritos tradicionais da Igreja Católica, porém sem precisão, pois alguns pesquisadores contestam esses fatos. O Papa Telésforo teria supostamente instituído as comemorações natalinas para celebrar a vinda de Jesus Cristo à Terra, ainda que esse ritual tenha se tornado oficial apenas no ano 440. Hoje sabe-se, contudo, que a data do Natal concorria com as datas comemorativas dos pagãos em dezembro, e que ela não representa a data que seria mais precisa do nascimento de Jesus Cristo. Alguns argumentam também que foi o Papa Telésforo que instituiu a celebração da missa do Galo, estabeleceu a Páscoa aos domingos e a Quaresma como o período de sete semanas precedentes. Todavia há argumentos suficientes para questionar essas atribuições. Apesar de um papado em relativa paz com os imperadores, o período de 13 anos de Telésforo como líder da Igreja Católica terminou de modo trágico, como era comum na época. Fontes da época indicam que o Papa Telésforo morreu martirizado no ano 137. Ele foi sepultado junto ao túmulo de São Pedro. Foi santificado mais tarde e é venerado na Igreja Católica Apostólica Romana e na Igreja Ortodoxa Grega.

 

9º - Santo Higino - c.137 - c.140

               Nascido em Atenas, na Grécia, no ano 90, Hyginys Desposyni era filho de um filósofo grego e, provavelmente, teve uma formação cultural e analítica mais ampla para sua época. Não são conhecidas muitas informações de sua vida, mas, como cristão, enfrentou as mesmas dificuldades da comunidade cristã de sua época, que era perseguida pelos pagãos. Seu pontificado iniciou no ano 137 e introduziu muitos costumes típicos e importantes da liturgia católica. O Papa Higino sucedeu o Papa Telésforo e se esforçou em tornar mais precisa a questão da hierarquia no interior da Igreja. Até hoje, a instituição religiosa é conhecida por sua rígida estrutura hierarquizada. E parece mesmo que o Papa Higino gostava bastante da ordem, foi ele também quem introduziu o costume da existência do padrinho e da madrinha no batismo. Outra tradição amplamente difundida e praticada entre os católicos. Além dessas marcas tradicionais do ritual e da estrutura católica, o Papa Higino enfrentou as típicas perturbações causadas pelas constantes perseguições aos seguidores da fé cristã. Para o cristianismo primitivo, essa era uma condição comum, não diferente daquela enfrentada por muitos outros papas. Mas uma preocupação de seu pontificado foi em relação ao que se considerava como heresia, que nascia e começava a tomar forma naquele momento. O Papa Higino identificou e condenou heresias e seus heresiarcas, conquistando vitória sobre eles. Combateu um movimento gnóstico que enfrentou Roma. O gnosticismo foi considerado uma heresia por misturar doutrinas e práticas religiosas com filosofia e mistérios. Os gnósticos acreditavam que havia uma fé comum para os incultos e uma ciência reservada aos doutores. O Papa Higino, excomungou seus principais líderes. Não há certeza sobre a causa de sua morte, mas era muito comum naquele momento, em função da perseguição sofrida pelos cristãos, o martírio dos papas. O certo é que seu pontificado durou quatro anos e que Higino faleceu aos 50 anos de idade, no ano 140. Ele foi enterrado próximo à tumba de São Pedro.

 

10º - São Pio I – c.140 – c.155

               Nascido em Aquileia, na Itália, no ano 100, Pius Desposyni era filho do 15º Bispo de Jerusalém, Judas. Acredita-se que ele era um dos príncipes antigos aparentados com Jesus Cristo por causa de sua filiação. No entanto, esta era uma questão que só interessava aos cristãos, pois, na época em que viveu, o cristianismo era primitivo e sofria com muitas perseguições. Pouco importando informações como essa para os imperadores pagãos. Já para os cristãos, este fato certamente influenciou na escolha de Pio para suceder o Papa Higino. Além disso, Pio jejuou e orou durante três dias voltando suas preces aos fiéis romanos e a escolha adequada de seu novo pontífice. Sua eleição ocorreu no ano 140, liderando a Igreja Católica durante os reinados de Antonino Pio e Marco Aurélio, dois imperadores romanos não convertidos ao cristianismo. O novo Papa enfrentou muitas dificuldades advindas de problemas variados. Pio I enfrentou problemas de cunho religioso com os judeus convertidos e com os hereges de seu tempo. Entre estes estavam os gnósticos, com destaque para Marcião, criador do marcionismo, uma seita religiosa cristã do início do século II que rejeitava que o Antigo Testamento estivesse ultrapassado e fazia oposição entre justiça e amor, lei e evangelho. Pio I até tentou dialogar com esses hereges que defendiam visões mais espiritualizadas dos evangelhos sagrados, mas não houve entendimento, então Marcião foi excomungado. O Papa Pio I foi o criador da tradição da celebração da Páscoa aos domingos. É identificado também como o construtor da igreja Santa Pudenziana, uma das mais antigas de Roma. Seu pontificado foi dedicado a combater as ameaças hereges especialmente propagadas pelos gnósticos. Assim, o décimo papa tentava consolidar a presença e a soberania da Igreja Católica. Mas suas ações não fizeram da religião cristã a predominante no império e, por isso, acredita-se que Pio I tenha sido martirizado. Pio I permaneceu 15 anos à frente da Igreja Católica e faleceu aos 55 anos de idade, no ano 155. Foi reconhecido mais tarde como Santo e é celebrado no dia 11 de julho.

 

11º - Santo Aniceto - 155 - 166

               Nascido na Síria no ano 110, acredita-se que Aniceto tenha sido proveniente da cidade Emesa, que hoje é identificada pelo nome Hims. Devoto em toda sua vida, fez parte do grupo de cristãos comumente chamados primitivos, ou seja, aqueles que viveram e compartilharam hábitos do tempo de Jesus Cristo. Esses cristãos, dos dois primeiros séculos, eram membros de uma Igreja pequena e fortemente reprimida pelos pagãos romanos. Enfrentaram muitas condições desfavoráveis para manter o trono de São Pedro. Com o falecimento do Papa Pio I, Aniceto tornou-se o líder, em 155, dessa comunidade religiosa que, apesar das dificuldades, crescia. O Papa Aniceto foi o primeiro Sumo Pontífice a fazer uma condenação pelo crime de heresia. Em seu papado, o montanismo foi oficialmente condenado como herético. O montanismo era um movimento cristão fundado por Montano nos anos 156-157, que foi organizado e difundido entre várias comunidades que se espalhavam pela Ásia Menor, o Norte da África e na própria Roma. O movimento era como uma volta ao profetismo para valorizar elementos esquecidos da mensagem cristã primitiva, com atenção especial para a esperança escatológica. Era dotado de vários dogmas, como a castidade durante o casamento, a proibição das segundas núpcias, o jejum durante duas semanas do ano, o consumo de alimentos secos, o não consumo de carne, a não absolvição de pecadores e o oferecimento voluntário ao martírio. Mas não apenas o montanismo foi condenado pelo Papa Aniceto, o gnosticismo também o foi. Esta era uma doutrina que pregava o racionalismo cristão, com uma supervalorização do conhecimento, o qual seria o suficiente para a salvação. Esse racionalismo incomodava muito à Igreja e seus preceitos. Assim, o gnosticismo foi fortemente perseguido e imediatamente condenado pelo papado. Por sinal, o Sumo Pontífice em questão dedicou-se muito a proibições. Além das condenações das doutrinas consideradas heréticas pelo líder da Igreja e seus cardeais, Aniceto determinou que os padres estavam proibidos de deixar o cabelo crescer para não ser motivo de vaidade. Um fato marcante do papado de Aniceto para todo o ritual católico envolveu algumas resoluções sobre a Páscoa. Durante seu pontificado, o Papa recebeu Policarpo em Roma para discutirem a controvérsia da Páscoa. O problema, que atormentava os cristãos e a unidade da Igreja na época, envolvia um conjunto de controvérsias sobre a data apropriada para a celebração cristã da Páscoa. Naquele momento, os cristãos preocupavam-se com a dúvida sobre seguir ou não as práticas do Antigo Testamento. Eles chegaram ao entendimento de terminar o jejum no dia considerado de ressureição de Jesus. O Papa Aniceto liderou a Igreja Católica por 11 anos e faleceu em 166, aos 56 anos de idade.

 

12º - São Sotero - c.166 - c.175

               São Sotero foi elevado ao papado depois da morte de S. Aniceto. Sotero foi Papa num período em que ser cristão era muito difícil e perigoso. Nasceu na cidade de Fondi, na Campânia, Itália, e seu pai se chamava Concórdio. Durante o seu pontificado, a Igreja ampliou-se bastante. Ele mesmo ordenou inúmeros diáconos, sacerdotes e bispos; e seu pontificado foi exemplar. Disciplinou por meio das leis canônicas, a participação das mulheres na Igreja, que até então não tinham seu caminho muito bem definido. Mas, sobretudo, o papa Sotero combateu com grande valentia e coragem as heresias que pairavam sobre a Igreja dos tempos iniciais do cristianismo. No seu tempo, foi extinta a heresia de Montano, que propunha um exagerado rigor de costumes. Era uma doutrina de medo e de pessimismo, porque o fim do mundo sempre poderia acontecer a qualquer momento. Supondo isso, todos os cristãos deveriam viver numa santidade irreal, renunciando ao matrimônio e buscando o sofrimento da penitência constante, porque, segundo Montano, a Igreja não tinha faculdades para perdoar os pecados. Essa doutrina, que também era defendida por Tertuliano e, principalmente, Novaciano, foi condenada pela Igreja na época do papa Sotero. Ele defendeu a doutrina ensinada por Jesus Cristo e que a Igreja sempre continuou praticando, ou seja, que para o pecador verdadeiramente arrependido não existe pecado, por maior que seja, a que não se possa conceder o perdão. Assim, desapareceu o clima de rigor e pessimismo que tanto atormentava os cristãos, tão contrário ao da doutrina do Evangelho, que prega o amor, o perdão, a alegria e a esperança. Outra característica do papa Sotero foi sua ardente caridade para com os necessitados. Ele desejava que se vivesse como os primeiros cristãos, citados nos textos dos apóstolos, onde “tudo era comum entre eles” e onde “todos eram um só coração e uma só alma.” Papa Sotero pedia esmolas para as dioceses mais ricas, para que fossem distribuídas entre as mais pobres e esforçava-se “por tratar a todos com palavras e obras, como um pai trata os seus filhos”. Ele foi um eloquente defensor dos cristãos perseguidos e deixou isso registrado na carta que enviou especialmente para os de Corinto. Os vestígios dela foram encontrados quando Eusébio de Cesaréia entregou a ele a eufórica resposta de Dionísio, em agradecimento pelo conforto que o valoroso papa levou aos corações aflitos pela morte iminente. Provavelmente, foi este corajoso apoio que levou ao martírio o Papa Sotero, que morreu em 20 ou 22 de abril de 175, pela perseguição do imperador Marco Aurélio. Foi martirizado e sepultado no Vaticano, mais tarde seu corpo foi transferido para a igreja de San Martino ai Monti.

 

13º - Santo Eleutério - c.175 - c.189 

               Nascido em Épiro, na Grécia, no ano 130, sabe-se pouco sobre a vida de Eleutério. Ele viveu em um período que podemos chamar ainda de cristianismo primitivo, no qual os seguidores da fé cristã conviviam com muitas dificuldades porque eram perseguidos pelos pagãos dominantes da época. Naquele tempo, o culto cristão era proibido e condenado em muitos lugares, o que resultou em uma série de papas martirizados. Eleutério, cujo nome em grego significa livre, enfrentou as dificuldades da época, porém gozou de condições relativamente boas durante seu papado. O pontificado do Papa Eleutério foi inicialmente pacífico porque o imperador Cômodo não era um perseguidor dos cristãos. Isso não quer dizer que era um cristão em fé, pelo contrário, era pagão. Porém não se importava com a questão da perseguição aos cristãos. Essa condição já conferiu relativa paz a Eleutério para conduzir seu papado. Diz-se ainda que o papa teria recebido cartas do rei Lúcio de uma parte da Bretanha pedindo que o pontífice enviasse missionários para instruir seu povo na fé cristã. O pedido teria sido correspondido e os padres Damião e Fugácio teriam sido os responsáveis pelo batizado de Lúcio, de sua rainha e de grande parte de sua população. Mas esta não é uma história fundamentada em fatos históricos, não há dados que comprovem a ocorrência da situação. Porém ela ilustra o momento singular dos católicos em meio a tantas perseguições da época. Com um pouco de liberdade para agir, o Papa Eleutério foi quem resolveu a questão judaica sobre alimentos puros e impuros. Embora as duas religiões tivessem traços comuns em suas essências, catolicismo e judaísmo, aos poucos, iam se distinguindo, e Eleutério foi fundamental neste caso. Os católicos deixaram de conviver com restrições alimentares, como acontecia com os judeus, nessa época. Outra medida importante para a tradição litúrgica dos católicos aplicada pelo Papa Eleutério foi considerar o Papa como sucessor de Pedro. O estabelecimento desse costume reafirmava Pedro como o Pai da Igreja, o primeiro a divulgar a obra de Jesus Cristo, o primeiro Papa. E, por fim, ele introduziu as primeiras normas para celebração da Páscoa. O pontificado de Eleutério foi marcado também pelo combate à doutrina montanista, considerada excessiva e foi amplamente combatida pelos católicos. Permaneceu em seu pontificado por 14 anos e faleceu aos 59 anos de idade, em 189.

 

14º - São Vitor I - c.189 - c.199

               Nascido na Tunísia no ano 155, Vitor era proveniente de uma província romana e era filho de Félix, única informação precisa que se conhece sobre sua família e sua vida antes de se tornar papa. Sabe-se que Vitor cresceu sob influência do cristianismo e do Império Romano, uma combinação que ainda não era muito saudável em sua época. Ele assumiu a liderança da recente Igreja Católica no ano 189, momento em que os cristãos se aproximavam de melhores condições de vida e de culto no Império Romano. O Papa Vitor I foi mais significativo para a história da instituição religiosa no que se refere às tradições dos rituais litúrgicos. Foi ele quem flexibilizou o processo de batismo ao estabelecer que qualquer água poderia ser utilizada no caso de faltar água benta nessas celebrações. Foi o Papa Vitor I também que estabeleceu o domingo como dia sagrado para se respeitar a memória da ressurreição de Jesus Cristo, o que era feito no sábado. No mesmo sentido, Vitor I determinou que a Páscoa sempre seria celebrada no domingo, o que causou o desagrado de muitos bispos. Em resposta, o Sumo Pontífice excomungou todos os bispos que se opuseram à mudança. Por fim, ainda no que se refere à liturgia, foi ele quem estabeleceu a celebração das missas em latim, e não mais em grego. Todas as suas medidas que influenciaram diretamente na tradição dos rituais católicos foram ratificadas mais de um século depois no Concílio de Niceia, realizado na cidade que dá nome ao encontro no ano 325. O Papa Vitor I permaneceu cerca de dez anos como Bispo de Roma, e sua atuação foi muito marcante para a história da Igreja Católica. As medidas que tomou na liderança da instituição religiosa marcam profundamente o culto católico atual. À exceção do idioma no qual as missas são celebradas, muitos dos costumes cristãos que marcam a sociedade ocidental são provenientes de sua época. Ainda que tenha sido marcante no sentido litúrgico e que sua época já apresentasse melhoras para a vida cotidiana dos fiéis, o Papa Vitor I foi, provavelmente, vítima da chamada quinta perseguição, promovida pelo Imperador romano Sétimo Severo, que era pagão. Acredita-se que Vitor I tenha sido martirizado nesse contexto e sua vida tenha se encerrado aos 44 anos de idade no ano 199.

 

15º - São Zeferino - c.199 - c.217

               Nascido em Roma, na Itália, em data desconhecida, Zeferino é um Papa com origens ainda não conhecidas. Ele foi o primeiro Papa do século III, mas sabe-se pouco sobre sua vida antes do papado e sua influência e atuação no mundo cristão. Tudo que é conhecido a seu respeito basicamente inicia com sua eleição para Papa. No mais, o que se sabe é a respeito do contexto geral de sua época, no qual havia muita perseguição aos cristãos, já que a religião ainda não havia se tornado oficial do Império Romano. O papado de Zeferino começou no ano de 199 e avançou pelas duas primeiras décadas do século seguinte. Durante seu exercício, o Papa teve que enfrentar problemas teológicos que dividiam os fiéis, na ocasião, excomungou Tertuliano. Foi o primeiro autor cristão a produzir uma obra literária em latim e era um grande defensor do cristianismo e combatente das heresias. Embora tenha se tornado importante para a Igreja Católica, suas ideias não eram plenamente aceitas pelos ortodoxos da época. O Papa Zeferino estabeleceu alguns costumes na liturgia cristã, como a comunhão para maiores de 14 anos na Festa de Páscoa e o uso da patena e de cálices sagrados produzidos em vidro. No entanto, Zeferino não era muito significativo na política institucional, seu assessor, Calisto, era quem se incumbia das tarefas. Em função disto, Calisto conquistou grande poder e reconhecimento na Igreja Católica, supostamente até dominando o Papa Zeferino. Quando o Sumo Pontífice manifestou sua intenção de criar uma catacumba na Via Ápia, a tarefa e os cuidados do projeto foram atribuídos a Calisto. Não por menos, tornou-se conhecida como Catacumba de Calisto. O Papa Zeferino foi descrito como um homem simples e sem educação por São Hipólito. Seu pontificado durou 18 anos e foi encerrado por martírio. Ele faleceu no dia 20 de dezembro de 217 e foi o primeiro papa a ser enterrado na Catacumba de Calisto, que se tornaria seu sucessor.

 

16º - São Calixto I - c.217 - c.222

               Nascido em Roma no ano 165, Calisto foi escravo em sua juventude e era responsável por coletar dinheiro entre os fiéis para auxílio de órfãs e viúvas. Conta-se que, em determinada ocasião, ele perdeu a coleta e aproveitou para fugir de Roma. Sem muito sucesso, tentou pular de uma ponte para continuar fugindo, mas foi capturado e levado novamente ao seu proprietário. Mais tarde, Calisto foi alforriado graças ao pedido de vários credores que acreditavam que poderiam recuperar o dinheiro de alguma maneira. No entanto, esse não foi o fim da juventude conturbada de Calisto. O jovem chegou a brigar em uma sinagoga onde fazia negócios com judeus. Seu comportamento, agora que não era mais escravo, resultou em prisão. Explorado como escravo e preso por desordem em local sagrado para os judeus, a juventude de Calisto ainda escondia outra vertente perseguida na época em que viveu. Calisto era cristão. A crença de Calisto foi denunciada e ele foi condenado a trabalhar forçadamente nas minas de Sardenha, de onde só saiu a pedido de Jacinto, um fiel que solicitou a liberação dos cristãos. Mas, neste ponto, a saúde de Calisto já estava muito debilitada em função de todas as explorações e perseguições que sofreu ao longo de sua juventude. Calisto foi enviado para se recuperar em Antium e lá recebeu uma pensão do Papa Vitor I, iniciando sua escalada no cristianismo. Calisto tornou-se diácono e era muito respeitado pelos Papas de sua época. O Papa Zeferino o confiou importantes funções na Igreja Católica. Sua atividade fiel e responsável fez crescer sua popularidade entre os cristãos. A vida difícil levada por Calisto representava bem a martirizarão de um cristão em busca da salvação de sua alma. Quando o Papa Zeferino faleceu, Calisto foi imediatamente eleito, no ano 217, para sucedê-lo. O Papa Calisto I não exerceu um papado de tranquilidade. Assim como sua vida, o tempo em que permaneceu como Supremo Pontífice também foi repleto de confusões, perseguições e acusações. Foi perseguido, junto com todos os cristãos. Os imperadores de Roma ainda empreendiam grandes caçadas contra cristãos em favor do paganismo. Seu papado, propriamente dito, foi acusado de ser indulgente na administração das penitências, causando tamanho distúrbio que apareceu a figura de um antipapa com o nome de Hipólito. O desentendimento girava em torno de discórdias com as práticas de Calisto I, especialmente em relação à absolvição que este concedeu a adúlteros, homicidas e apóstatas. A misericórdia de Calisto I com os pecadores, mesmo os reincidentes, desagradava os cristãos mais fervorosos. Por isso, o papa teve que conviver com um antipapa ao longo de três anos. Toda a vida do Papa Calisto I foi muito difícil, quando jovem, foi escravo e esteve preso. Tornou-se papa e foi muito questionado, a ponto de confrontar um antipapa. E o final de sua vida morreu durante uma rebelião popular no dia 14 de agosto de 222, tornando-se um mártir. Foi enterrado na Via Aureliana e seus restos mortais foram transferidos no século XIX para Santa Maria in Trastevere.

 

17º - Santo Urbano I - c.222 - c.230

               Nascido em Roma no ano 175, Urbano viveu uma época em que as perseguições aos cristãos eram intensas e rotineiras. Não havia liberdade religiosa plena e seguidamente os papas eram martirizados pelo Império Romano. Com o falecimento do Papa Calisto I em 222, Urbano foi eleito para ser seu sucessor no mesmo ano. O papa de Urbano I é, geralmente, esquecido ou pouco comentado. De fato sabe-se pouco sobre sua atuação como Sumo Pontífice, mas não há dúvida que tenha vivido momento de relativa estabilidade no Império Romano. Isto porque o imperador da época era Alexandre Severo, o qual estabeleceu certa tolerância à crença monoteísta professada pelos cristãos romanos. Embora a religião do Império Romano fosse o paganismo e a perseguição e o massacre ao cristianismo fosse intenso naquela época, Alexandre Severo permitiu certa liberdade de culto e tolerou razoavelmente o convício entre as crenças. A condição de relativa paz vivida pelos cristãos durante o papado de Urbano I, algo que não era comum naqueles tempos, foi importante para que a Igreja Católica florescesse e cultivasse algumas representações. Com alguma liberdade para administrar a Igreja, o Papa Urbano I determinou que todos os vasos sagrados fossem feitos de prata e benzeu alguns artefatos deste material para a paróquia de Roma. Era o início da riqueza que marcaria tão notoriamente a história da Igreja Católica. Embora o catolicismo já desse sinais de sua preocupação com a riqueza no final do século II, o papa não deixou de pensar nos desvalidos. Mesmo cultuando os objetos de valor, Urbano I determinou que as esmolas ofertadas à Igreja fossem empregadas exclusivamente em duas frentes, o culto divino e os desvalidos. Ou seja, a Igreja demonstrava já seu perfil dúbio que oscila entre riqueza e pobreza. Apesar da rotineira martirização dos Papas nessa época, tudo indica que o final da vida de Urbano I não tenha seguido esse caminho. Seu Pontificado durou oito anos e terminou com seu falecimento no ano 230, quando tinha 55 anos de idade.

 

17 . 1 - Santa Cecília

               Nascida em Roma c.180, falecimento em Roma c.230. - Cecília seria da nobre família romana dos Metelos, filha de senador romano e cristã desde a infância. Ela foi dada em casamento, contra a vontade, a um jovem chamado Valeriano. Se bem que tivesse alegado os motivos que a levavam a não aceitar este contrato, a vontade dos pais se impôs de maneira a tornar-lhe inútil qualquer resistência. Assim se marcaria o dia do casamento e tudo estava preparado para a grande cerimônia.

               Da alegria geral que estampava nos rostos de todos, só Cecília fazia exceção. A túnica dourada e alvejante peplo que vestia não deixavam adivinhar que por baixo existia o cilício, e no coração lhe reinasse a tristeza. Estando só com o noivo, disse-lhe Cecília com toda a amabilidade e não menos firmeza: “Valeriano, acho-me sob a proteção direta de um Anjo que me defende e guarda minha virgindade. Não queiras, portanto, fazer coisa alguma contra mim, o que provocaria a ira de Deus contra ti”. A estas palavras, incompreensíveis para um pagão, Cecília fez seguir a declaração de ser cristã e obrigada por um voto que tinha feito a Deus de guardar a pureza virginal. Disse-lhe mais: que a fidelidade ao voto trazia a bênção, a violação, porém, o castigo de Deus. Valeriano, ficou "vivamente impressionado" com as declarações da noiva, respeitou-lhe a virgindade, converteu-se e recebeu o batismo naquela mesma noite. Valeriano relatou ao irmão Tibúrcio o que tinha se passado e conseguiu que também ele se tornasse cristão. Turcius Almachius, prefeito de Roma, teve conhecimento da conversão dos dois irmãos. Citou-os perante o tribunal e exigiu peremptoriamente que abandonassem, sob pena de morte, a religião que tinham abraçado. Diante da recusa formal, foram condenados à morte e decapitados. Também Cecília, teve de comparecer na presença do juiz. Antes de mais nada, foi intimada a revelar onde se achavam escondidos os tesouros dos dois sentenciados. Cecília respondeu-lhe que os tinha bem guardados, sem deixar perceber ao tirano que já tinham achado o destino nas mãos dos pobres. Almachius, mais tarde, cientificado deste fato, enfureceu-se e ordenou que Cecília fosse levada ao templo e obrigada a render homenagens aos deuses. De fato foi conduzida ao lugar determinado, mas com tanta convicção falou aos soldados da beleza da religião de Cristo que estes se declararam a seu favor, e prometeram abandonar o culto dos deuses. Almachius, vendo novamente frustrado seu estratagema, deu ordem para que Cecília fosse trancada na instalação balneária do seu próprio palacete e asfixiada pelos vapores d’água. Cecília teria sido então protegida milagrosamente, e embora a temperatura tivesse sido elevada a ponto de tornar-se intolerável, ela nada sofreu. Segundo outros mitos, a Santa foi posta em um banho de água fervente do qual teria saído ilesa. Almachius recorreu então à pena capital. Três golpes vibrou o algoz sem conseguir separar a cabeça do tronco. Cecília, mortalmente ferida, caiu por terra e ficou três dias nesta posição. Aos cristãos que a vinham visitar dava bons e caridosos conselhos e ao Papa entregara todos os bens, com o pedido de distribuí-los entre os pobres. Outro pedido fora o de transformar a sua casa em igreja, o que se fez logo depois de sua morte. Foi enterrada na Catacumba de São Calisto. As diversas invasões dos godos e lombardos fizeram com que os Papas resolvessem a transladação de muitas relíquias de santos para igrejas de Roma. O corpo de Santa Cecília ficou muito tempo escondido, sem que lhe soubessem o jazigo. Uma aparição da Santa ao Papa Pascoal I (817-824) trouxe luz sobre este ponto. Achou-se o caixão de cipreste que guardava as relíquias. O corpo, foi encontrado intacto e na mesma posição em que tinha sido enterrado. O esquife foi achado em um ataúde de mármore e depositado no altar de Santa Cecília. Ao lado da Santa acharam seu repouso os corpos de Valeriano, Tibúrcio e Máximo. Em 1599, por ordem do Cardeal Sfondrati, foi aberto o túmulo de Santa Cecília e o corpo encontrado ainda na mesma posição descrita pelo papa Pascoal. O escultor Stefano Maderno que assim o viu, reproduziu em finíssimo mármore, em tamanho natural, a sua imagem. Ele teve pouco tempo, pois o corpo se desintegrou em poucos dias. A Igreja ocidental, como a oriental, têm grande veneração pela Mártir, cujo nome figura no cânon da Missa. O ofício de sua festa traz como antífona um tópico das atas do martírio de Santa Cecília, as quais afirmam que a Santa, nos festejos do casamento, ouvindo o som dos instrumentos musicais, teria elevado o coração a Deus nestas piedosas aspirações: “Senhor, guardai sem mancha meu corpo e minha alma, para que não seja confundida”. Desde o século XV, Santa Cecília é considerada padroeira da música sacra. Sua festa é celebrada no dia 22 de Novembro, dia da Música e dos Músicos.

 

18º - São Ponciano - c.230 - c.235

               Nascido em Roma no ano 175. Naquela época, os cristãos enfrentavam grandes dificuldades para se expressar e, à exceção de Pedro, os papas se revezavam na liderança da Igreja com alta frequência. Não se sabe muito a respeito da vida particular de Ponciano antes de ser papa, somente pode-se inferir sua representatividade para a comunidade cristã. Com o falecimento do papa Urbano I em 230, um conclave se formou para eleger o novo Papa. No dia 21 de julho de 230, Ponciano foi eleito para assumir o posto de liderança da Igreja. O pontificado de Ponciano começou em meio a um cisma existente no catolicismo, o qual o novo Papa superou de forma singular. Para interromper a divisão que existia em sua religião, Ponciano e outros líderes da Igreja foram exilados pelo imperador romano Maximino Trácio. Todos eles foram enviados para Sardenha. Ponciano não gostou da medida imposta e, para resolver o cisma, renunciou ao seu posto. Foi, assim, o primeiro papa da história da Igreja Católica a renunciar seu papado. O papa Ponciano enfrentou de frente o antipapa Hipólito que existia na época em que assumiu o papado. Ponciano tinha um relacionamento muito bom com o imperador Alexandre Severo, mas quando este foi destituído e morto Maximino Trácio tomou o poder. Maximino é reconhecido como o primeiro bárbaro a reger Roma. Também foi o primeiro imperador que comandou o império sem ter posto o pé na cidade de Roma. Maximino reativou uma forte perseguição aos cristãos e exilou o Papa e o antipapa. O cisma foi resolvido com a abdicação de ambos em favor de um único papa, Antero. Ponciano renunciou no dia 28 de setembro de 235. Não se sabe quanto tempo ele permaneceu exilado, mas sabe-se que Ponciano e Hipólito foram martirizados até a morte. Ponciano trabalhou forçadamente e de forma desumana nas minas de Sardenha, o que levou à sua morte por esgotamento. Seus restos mortais foram, então, levados para Roma e enterrados na catacumba do Papa Calisto I.

 

19º - Santo Antero - c.235 - 236

               Nascido na Grécia em 180, Antero era filho de Romulus e, em função de seu nome, acredita-se que ele teria sido um escravo livre. Homem dedicado à religião, foi eleito Papa no dia 21 de novembro de 235, sucedendo o Papa Ponciano. O Papa Antero foi um dos papas que menos tempo exerceu o pontificado, pois ele faleceria apenas um mês e dez dias depois de assumir o posto de Sumo Pontífice da Igreja Católica. Sua morte ainda é um mistério, não se sabe ao certo o motivo de um pontificado tão curto. A ideia mais plausível é de que o imperador romano Maximino Trácio o condenou à morte pela aprovação do Pontífice aos atos dos Mártires. O carisma do papa teria enfurecido o imperador romano que, naquela época, foi um ódio de um pagão contra o cristianismo que aflorava. Em seu pouco tempo de pontificado, conquistou várias conversões entre romanos e gregos, ambos pagãos. Incomodou mais ainda o imperador Maximino Trácio o fato de que até membros de sua guarda pessoal estavam se convertendo ao cristianismo. Além da inimizade do imperador romano, o Papa Antero teve que enfrentar a oposição de Nereu, um sacerdote de Chipre que cobiçava o posto de Sumo Pontífice. Todavia, Nereu não possuía seguidores ou adeptos em quantidade suficiente para causar um enfrentamento direto ou mesmo um cisma na Igreja Católica. Só que isso não o impediu de causar muitos transtornos ao curto pontificado de Antero. O Papa Antero faleceu no dia três de janeiro de 236, para satisfação de seus adversários. Foi enterrado na catacumba do Papa Calisto I, em Roma, mas o local só foi desterrado em 1854. Seus restos mortais foram, então, transferidos para a igreja de São Silvestre.

 

20º - São Fabiano - 236 - 250

               Nascido em Roma no ano 200, Fabiano viveu a fase inicial do cristianismo católico na Europa. Esse momento foi muito marcado pelo preconceito e, em alguns momentos, a caça deliberada do Império Romano aos seguidores da nova religião. Em meio a um conturbado período, os religiosos tentavam dar prosseguimento aos ensinamentos de Jesus Cristo. Por volta do ano 200, o Império Romano começou a demonstrar mais tolerância com o cristianismo e, inclusive, alguns de seus imperadores passariam a tender para o lado da doutrina católica. Quando Fabiano voltava para Roma após o falecimento do papa Antero, havia uma divisão na escolha do novo Supremo Pontífice. Conta-se que uma pomba branca surgiu repentinamente e pousou sobre a cabeça de Fabiano, encantando todos os cristãos romanos, que o escolheram por unanimidade para ser o novo papa. Fabiano teria cedido ao momento sublime e aceitado liderar a Igreja Católica. O Papa Fabiano exerceu seu papado com grande retidão. Seu cargo na liderança da Igreja Católica esteve inserido em um momento de relativa paz para os cristãos. Aproveitando-se disso, Fabiano implementou reformas na divisão administrativa das regiões que permaneceram vigentes por muitos séculos. Mas, ainda assim, houve confrontos e momentos difíceis. Um deles foi com o imperador romano Décio, e também um desentendimento com o Bispo Privado que exercia sua função na África, o qual foi deposto pelo Papa. Fabiano é identificado como responsável pelas primeiras expedições às Gálias. Em meio as disputas políticas do Império Romano, Fabiano teria batizado o primeiro imperador romano cristão, Felipe, o árabe, que seria assassinado por Décio, em seguida começou a perseguir e maltratar os cristãos chegando a matar o Pontífice. O Papa Fabiano é considerado mártir da Igreja Católica e chamado de São Fabiano pelos cristãos. Ele faleceu aos 50 anos de idade, após 14 anos de papado, no dia 20 de janeiro de 250.

 

21º - São Cornélio - 251 - 253

               Nascido em Roma no ano 200, Cornélio viveu um momento complicado para os cristãos. Em meados do século de seu nascimento, o Imperador Décio perseguia os cristãos do Império Romano, chegando a ordenar que cometessem sacrifícios religiosos, pois, em caso contrário, seriam sentenciados à morte. A ameaça fez com que alguns cristãos apostatassem, outros realizaram os sacrifícios e alguns se recusaram, o que os levou à morte. Nesse cenário persecutório, o Papa Fabiano se recusou a atender os ordenamentos do imperador e foi um dos cristãos martirizados. Para agravar a crise na Igreja Católica, Décio tentou impedir a eleição de um novo Papa, mas, forçado a se ausentar de Roma para combater os godos, a eleição foi realizada. Na ocasião, Cornélio, contra sua vontade, foi eleito Papa em 251. O papado de Cornélio foi muito turbulento. Já havia um cenário anterior estimulado pelo Imperador Décio desfavorável, mas, semanas depois, Novaciano se proclamou antipapa, gerando um cisma. Novaciano achava que seria eleito Papa e não concordou com a derrota. Só que Cornélio tinha o apoio de importantes religiosos da época e de diversas regiões cristãs, enquanto Novaciano era apoiado apenas por uma minoria do clero de Roma. Cornélio reagiu excomungando Novaciano. O Papa Cornélio enfrentou as perseguições contra os cristãos e o cisma da Igreja, demonstrando grande capacidade para ser um líder religioso, mesmo que não fosse seu interesse ser Papa. Possuía dons diplomáticos também para solucionar problemas políticos. Perfil que o tornou um exemplo para todos os Papas que o sucederam. A morte de Décio não aliviou a perseguição aos cristãos porque o sucessor, Treboniano Galo, também foi um opositor. O novo imperador exilou o Papa em Civitavecchia. Após uma vida toda dedicada ao cristianismo, Cornélio faleceu em reclusão em 253. É venerado como Santo pela Igreja Católica.

 

22º - São Lúcio I - 253 - 254  

               Nascido em Roma no ano 205, Lúcio tem uma história familiar desconhecida. Sabe-se apenas o nome de seu pai, que era Prophyrianus. Lúcio nasceu em um momento que o cristianismo começava a se expandir pelo Império Romano. Foi por volta do ano 200 que os cristãos passaram a superar as perseguições religiosas, iniciando uma guinada que levaria o cristianismo a ser a religião oficial do Império. A conversão do primeiro imperador romano ao cristianismo selaria de vez a amplitude do cristianismo e abriria as portas para que influenciasse profundamente toda a história ocidental. Lúcio faz parte do momento inicial do papado, ainda sem muitas riquezas. Foi o sucessor do Papa Cornélio, que faleceu em 253. Lúcio foi eleito no dia 25 de junho do mesmo ano em meio a uma perseguição que havia banido seu antecessor e o novo Papa. Todavia, Lúcio I conseguiu retornar a Roma para exercer seu papado. O papado de Lúcio I foi curto, porém conturbado. Já de início, teve de contornar a perseguição sofrida para assumir seu posto. Feito isto, precisou combater o novacionismo, um movimento do cristianismo primitivo que se recusava a readmitir cristãos que tinham celebrado os deuses pagãos durante a perseguição empreendida pelo imperador Décio. Esse embate foi intenso e, mais tarde, os novacianos seriam declarados hereges. De toda forma, Lúcio I foi firme em defesa da doutrina de Cristo segundo a Igreja Católica. O papado de Lúcio I ainda enfrentou grandes dificuldades em função da perseguição e da intolerância religiosa dos romanos. Décio foi um dos exemplos, era um imperador intolerante e caçador de cristãos. Só durante o papado de Lúcio I, cerca de 900 cristãos foram martirizados. O Supremo Pontífice teve poucas oportunidades de fazer seu trabalho, pois faleceu em cinco de março de 254, menos de um ano depois de assumir o posto. Mas também se tornou um mártir na batalha pela liberdade e legitimidade do cristianismo. O falecimento de Lúcio I apresenta um curioso detalhe, sua tumba está na catacumba de Calisto, seus restos mortais estão na igreja de Santa Cecília in Trastevere e sua cabeça está na Catedral de Santo Ansgar, em Copenhague, na Dinamarca.

 

23º - Santo Estevão I - 254 - 257

               Nascido em Roma no ano 210, Estevão era proveniente de uma família de nobres. Vivenciou uma época imediatamente posterior à conversão do Império Romano ao cristianismo, ou seja, quando Roma trocou oficialmente o paganismo pela religião de Jesus Cristo. Embora ainda houvesse alguma perseguição aos cristãos, era um momento favorável para a Igreja Católica, que se expandia pelo império e conquistava poderes políticos. Estevão era homem religioso e reconhecido membro da Igreja. Quando seu antecessor faleceu, Lúcio I, ele foi eleito no dia 12 de maio de 254 para ser o novo líder da instituição religiosa. Seu papado seria curto e conturbado, apesar do crescente poder e da crescente influência da Igreja Católica. O Papa Estevão I teve desavenças com as igrejas do continente africano e do continente asiático, com as quais travou um embate acerca da supremacia da sede romana. Foi muito rígido com os homens considerados hereges, os quais não aceitavam se reintegrar à Igreja Católica. Por conta disso, envolveu-se em discussão com Cipriano de Cartago sobre o rebatismo de hereges. Também foi intolerante na reabilitação de Bispos que eram acusados de apostasia. O Papa Estevão I enfrentou muitos problemas e os potencializou em função de sua intransigência. Quando assumiu o papado, já havia um antipapa em exercício. Era um estudioso conhecido como Novaciano que antagonizava a figura do Papa romano desde 251. Novaciano tinha o apoio de muitos nobres e religiosos, o suficiente para o manter com relativa estabilidade em confronto com os Papas romanos. Todavia Estevão I intensificou as disputas cismáticas e abalou a zona de conforto de Novaciano. Estevão I conseguiu reunir as igrejas que antes estavam desunidas, porém não foi capaz de derrubar Novaciano em vida. O Papa romano abriu caminho para acabar com o poderio e a estabilidade do antipapa vigente. No entanto, não viveu o suficiente para vê-lo derrotado. No meio desse confronto havia outro personagem, o imperador romano Valeriano. Este foi responsável pela perseguição ao Papa e ao antipapa. Estevão I foi caçado pelo imperador romano e, segundo consta, martirizado. Faleceu no dia dois de agosto de 257. O antipapa, contudo, também foi alvo de perseguição do imperador romano. Logo após a morte de Estevão I, Novaciano fugiu para tentar escapar da perseguição de Valeriano. Não se sabe ao certo se ele também foi martirizado, mas faleceu no ano 258. Só que Novaciano deixaria marcas cismáticas por muitos séculos na Igreja Católica, em função das seitas que se estabeleceram. O Papa Estevão I foi canonizado pela Igreja Católica e é chamado de São Estevão.

 

24º - São Xisto II - 257 - 258

               Papa Sisto II (em latim: Sistus) foi o vigésimo quarto Papa, de 31 de Agosto de 257 até 6 de Agosto de 258. Ele morreu como mártir, durante a perseguição do imperador Valeriano. Sisto II procurou unir a igreja cristã em torno dos sacramentos e da palavra de Deus. Perdoou os delatores, fortaleceu o espírito dos condenados pelo "crime capital de professar a fé em Jesus Cristo". Reatou as relações com os bispos africanos e da Ásia Menor, interrompidas pela controvérsia sobre o batismo dos hereges. Efetuou o translado dos restos de São Pedro e São Paulo. Teria sido Sisto o primeiro Papa a enviar um missionário para a evangelização da Gália, o bispo São Peregrino.

               Sisto II foi decapitado no dia 6 de agosto de 258, sendo um dos primeiros a cair vítima da promulgação de um édito do imperador Valeriano contra os cristãos, publicado nos primeiros dias daquele mês. O documento ordenava que bispos, padres e diáconos fossem sumariamente condenados à morte. Naquele dia, tentando escapar da vigilância dos oficiais imperiais, reuniu seus fiéis em um cemitério pouco conhecido, próximo à Via Ápia. Durante da celebração, foi repentinamente preso por um grupo de soldados. Não se sabe se ele foi decapitado imediatamente ou foi levado a um tribunal para receber sua sentença, e depois levado de volta ao cemitério para a execução.

 

25º - São Dionísio - 259 - 268

               Nascido provavelmente na Magna Grécia em ano desconhecido, a vida de Dionísio ainda é um mistério para os historiadores. A origem grega ainda não é um consenso para os pesquisadores, já que não foram encontradas provas que atestem o fato. Da mesma forma, não se sabe como foi a formação religiosa que levaria Dionísio ao posto máximo da Igreja Católica. Esta, por sua vez, sofria com as intensas perseguições promovidas pelo Império Romano durante o século III. Mesmo já com mais de 200 anos de religião estabelecida, o cenário era muito instável para os cristãos porque cada imperador se comportava de uma maneira na relação com a doutrina e seus fiéis. Até a elevação do cristianismo como religião oficial do império e ao gozo de benefícios na sociedade romana, os cristãos conviveram com muitos desafios. Foi nesse contexto opressor que levou à morte o Papa Sisto II. Para sucedê-lo, foi eleito o Papa Dionísio, em 22 de julho de 259. O Papa Dionísio só foi eleito e assumiu o posto de Sumo Pontífice um ano após a morte do Papa Sisto II, vítima da perseguição de Valeriano. O momento era péssimo para os cristãos porque o imperador promovia violentas perseguições contra os fiéis e, com o falecimento do Papa, dificultou ao máximo a eleição de um sucessor. A perseguição só diminuiu em 259, quando a Igreja conseguiu fazer seu novo líder. No ano seguinte, 260, o Imperador Valeriano seria capturado e morto pelos persas. Seu fim traria novo alento para os cristãos, pois o sucessor, Galiano, publicaria um édito de tolerância, acabando com a perseguição aos cristãos e os concedendo um status de legalidade. O Papa Dionísio assumiu em meio a transição de uma má fase para uma boa fase para os seguidores de Cristo. Cabia a ele, então, reorganizar a Igreja que, além de abalada com os ataques, estava em desordem. Para isso, o Papa enviou muito dinheiro para as igrejas da Capadócia, que haviam sido devastadas e que muitos de seus membros haviam sido feitos prisioneiros. Junto ao Imperador Galiano, o Papa Dionísio teve paz para trazer a ordem novamente para a Igreja. O édito valeria até o ano 303, logo, seria um momento raro de crescimento para os fiéis nos primeiros séculos de fé cristã. Para se ter uma noção de como era severa a perseguição aos cristãos até então, o Papa Dionísio é considerado o primeiro Papa da Igreja Católica a não ser martirizado. Após nove anos de papado, Dionísio faleceu de morte natural no dia 26 de dezembro 268 e foi sepultado na Catacumba de São Calisto.

 

26º - São Félix I -  269 - 274

               Nascido em Roma em data desconhecida, Félix viveu em meados do século III. Naquela ocasião, a perseguição aos católicos já não era tão intensa como nos dois séculos anteriores, embora o Império Romano ainda não tivesse se convertido ao cristianismo e as opressões ainda existissem. Os dados sobre sua vida são tão desconhecidos quanto à data de seu nascimento. Sabe-se extremamente pouco sobre sua vida antes do falecimento do Papa Dionísio, o qual sucedeu a partir de cinco de julho de 269. O Papa Félix I foi quem autorizou a celebração da missa sobre os túmulos dos mártires. Ele iniciou o sepultamento dos mártires sobre o altar para fugir da perseguição do imperador Adriano. Iniciou um longuíssimo hábito da Igreja Católica que, no entanto, não é praticado mais. Naquele século, a situação era mais branda para os católicos, porém as perseguições e as dificuldades se acentuavam de acordo com a postura religiosa de cada imperador, pois a religião do império era o paganismo. Talvez a mais significativa medida do Papa Félix I em relação à própria Igreja tenha sido a intervenção na questão que envolvia Paulo de Samósata. Este bispo pregava que Cristo e o Espírito Santo eram qualidades de um único Deus, assim a inspiração de Jesus vinha do alto e crescia em Espírito Santo até se tornar o Pai no momento de sua ressurreição. No entanto, o Concílio de Éfeso, em 431, já havia estabelecido que Jesus Cristo era homem e Deus em uma única pessoa, definindo a divindade e a humanidade de Cristo e as duas naturezas distintas em uma só pessoa. Em função disso, Paulo de Samósata foi deposto de seu cargo eclesiástico e condenado por suas doutrinas trinitárias e cristológicas no Sínodo de Antioquia, realizado em 268. O Papa que criou a tradição de sepultar os mártires sob o altar de celebração das missas também foi martirizado, como se acredita. Após cinco anos de Pontificado à frente da Igreja Católica, foi sepultado na catacumba de São Calisto, na Via Ápia, no dia 30 de dezembro de 274.

 

27º - Santo Eutiquiano - 275 - 283

               Nascido em Luni, na Itália, em 240, Eutiquiano viveu uma época em que os católicos começavam a conquistar um pouco de liberdade para seu culto e suas ações. De todo modo, ainda não gozavam de plena aceitação ou de reconhecimento oficial, o que significa dizer que os cristãos ainda sofriam perseguições impostas pelos pagãos da época. Não se conhece praticamente nada sobre a vida de Eutiquiano, além do fato de ter chegado ao principal posto da Igreja Católica em meio a situações tão conturbadas para a fé cristã. Ele se tornou Papa no dia quatro de janeiro de 275 para suceder o Papa Félix I. O Papa Eutiquiano ordenou ações que seriam muito marcantes para os cristãos da época, e, de certo modo, seriam confrontadoras da lógica estabelecida. Ele ordenou, por exemplo, que os mártires fossem cobertos pela dalmática, um manto que era parecido com o dos imperadores romanos. Uma afronta para a época. Alguns anos mais tarde, o Papa Silvestre I adotaria a mesma dalmática como traje dos clérigos encarregados de ler a epístola e o evangelho nas missas solenes. O que ajudou a solidificar a tradição que chega aos nossos dias. Os diáconos celebram todas suas missas vestindo suas dalmáticas específicas para cada situação. Além de iniciar uma conduta que marcaria profundamente a tradição das celebrações católicas, o Papa Eutiquiano também instituiu a benção da colheita nos campos.  Ele proibiu ainda que se entregasse a comunhão aos enfermos. Queria evitar que o Santíssimo Sacramento fosse profanado e acreditava que proibir as mulheres ou leigos portassem a comunhão a um enfermo já seria uma inibição. Morreu martirizado no dia sete de dezembro de 283 e foi o último Papa a ser sepultado na cripta dos Papas.

 

27 . 1 - Santa Helena

               Santa Helena, de família plebeia e pagã, nasceu em meados do século III, provavelmente em Drepamin, na Bitínia, no Golfo da Nicomédia (hoje, Turquia); essa cidade, mais tarde, foi chamada Helenópolis, em sua honra, pelo seu filho e futuro imperador Constantino. Segundo Santo Ambrósio, Helena exercia o cargo de “estabulária”, ou seja, a estalajadeira encarregada dos estábulos. A modéstia e a delicadeza de Helena levaram o jovem oficial, Constâncio Cloro, a apaixonar-se por ela, apesar do seu nível social mais elevado. No entanto, quis casar-se com ela, levando-a consigo para Dardania, nos Bálcãs.

               A jovem, que não tinha direito ao título honorífico do seu marido, foi uma esposa fiel. No ano 280, em Naisso, na Sérvia, deu à luz ao filho Constantino. Constâncio, esposo de Helena, consentiram-lhe obter, junto com Galério, o título de César (co-regente); mas era preciso ratificar a sua elevação pelo novo sistema político da Tetrarquia. Por isso, os imperadores Diocleciano e Maximiano, em 293, obrigaram-no a divorciar-se da sua esposa e de unir-se em matrimônio com a enteada do segundo, Teodora. Isso era possível porque a lei romana não reconhecia o casamento entre nobres e plebeus. Helena foi obrigada a deixar sua família e seu filho. Helena se fez pequena, afastada da família e do filho, que até então havia educado com dedicação e amor; ela nunca desanimou. Pelo contrário, permaneceu, humildemente, na sombra, enquanto Constantino foi elevado à corte de Diocleciano. Com a morte de Constâncio em 306, Constantino mandou buscar a mãe para junto de si na Corte. Não sabemos quando se fez cristã; se ela que influiu na conversão de Constantino ou se, como escreve Eusébio de Cesareia, foi ele quem à converteu. Tornou-se uma cristã fervorosa e piedosa.  Tinha-lhe muito amor e não parou de encher de honras. Entre as suas primeiras medidas, o novo imperador mandou chamar imediatamente a sua mãe, Helena Flávia Júlia, a qual foi condecorada com o título de Augusta. As honras jamais influenciaram seu coração, pelo contrário, estimularam a sua atenção inata para com o próximo, que se concretizou em dar esmolas, satisfazer as necessidades materiais dos pobres e libertar numerosas pessoas das prisões, das minas e do exílio. Luminosa e contagiosa, a ponto de muitos perceberem a influência que teve na conversão do seu filho e na promulgação do Edito de Milão, em 313, que concedeu a liberdade de culto aos cristãos após três séculos de perseguição. Dizem que Helena participava das celebrações religiosas, usando roupas modestas, para se confundir com a multidão, e convidava os famintos para o almoço, servindo-os pessoalmente. Em 326, um acontecimento perturbou a vida da família: Constantino mandou matar, primeiro seu filho Crispo, por instigação da madrasta, Fausta, sua segunda mulher, também suspeita de acometer a sua honra. Diante dessa tragédia, com 78 anos de idade, Helena manteve firme a sua fé fazendo uma peregrinação penitencial à Terra Santa. Ali, mandou construir duas Basílicas: a da Natividade, em Belém, e a da Ascensão, no Monte das Oliveiras. Essa iniciativa inspirou Constantino a construir também a Basílica da Ressurreição. No Gólgota, ao mandar destruir os edifícios pagãos, construídos pelos romanos, aconteceu uma prodigiosa descoberta da verdadeira Cruz. Após aquela insigne vitória de Constantino sobre Maxêncio, quando ele recebeu de Deus o sinal da Cruz do Senhor, Santa Helena, sua mãe, foi a Jerusalém para procurar a Cruz de Cristo. Lá cuidou ela de destruir a imagem de Vênus, em mármore, que, para apagar a memória da Paixão de Cristo Senhor, os gentios haviam colocado no lugar da Cruz e que ali permanecera durante cerca de 180 anos. O mesmo ela fez no presépio do Salvador, onde fora posto um simulacro de Adônis, e no lugar da ressurreição, onde haviam colocado um de Júpiter. Purgado, assim, o local da Cruz, foram encontradas depois de profundas escavações três cruzes, e, à parte delas, a inscrição que havia sido posta sobre a Cruz do Senhor. Como não se sabia sobre qual das três Jesus foi afixado, um milagre sanou a dúvida. Eis que Macário, bispo de Jerusalém, tendo elevado preces a Deus, levou cada uma das cruzes a três mulheres que sofriam de grave enfermidade, e, enquanto as duas primeiras de nada serviram às mulheres, a terceira Cruz, levada à terceira mulher, curou-a imediatamente. Santa Helena, tendo encontrado a Cruz da salvação, construiu ali uma igreja magnificentíssima, na qual depositou parte da Cruz em urnas de prata, entregando outra parte a seu filho Constantino, que a levou para Roma, à igreja da Santa Cruz de Jerusalém. Ela também entregou ao filho os cravos que trespassaram o Santíssimo Corpo de Jesus Cristo. Naquele tempo, Constantino sancionou uma lei para que, desde então, ninguém fosse condenado ao suplício da cruz. Santa Helena morreu em 329, aos 80 anos de idade, em um lugar não identificado. Ainda moribunda, foi assistida por seu filho, que, depois, levou seu corpo para a Via Labicana, em Roma, onde foi sepultada em um mausoléu em sua homenagem. Seu sarcófago de pórfiro, transportado ao Latrão, no século XI, hoje está conservado no Museu Vaticano.

 

 

28º - São Caio - 283 - 296

               Nascido na Dalmácia, região que hoje é pertencente à Croácia, em data desconhecida, Caio, por sinal, é um dos Papas mais desconhecidos. Sabe-se muito pouco sobre sua vida pessoal e mesmo religiosa antes de se tornar Sumo Pontífice. Há falta de dados históricos para reconstruir sua trajetória, porém sabe-se que era descendente da família imperial de Dioclesiano, que era seu tio. Com o falecimento do Papa Eutiquiano, Caio foi eleito para ser sucessor no dia 17 de dezembro de 283. Era uma época de muitas dificuldades para os cristãos, mas o Papa Caio conseguiu oferecer um período de relativa paz, construir igrejas por toda Roma e encontrou as catacumbas de cristãos que foram martirizados antes de seu papado. Habilidoso no trato com as autoridades romanas, o Papa Caio conseguiu converter o prefeito Cromâncio. O Sumo Pontífice foi conselheiro dos cristãos refugiados que se escondiam na casa do prefeito romano, todavia sugeriu que todos fugissem antes de serem presos pela perseguição que era constante. Pelo que consta, foi o mesmo que alertou São Sebastião, o qual preferiu ficar em Roma para animar e defender os cristãos, no entanto acabou morto, mas em circunstâncias impressionantes. Ao tomar conhecimento de cristãos infiltrados no exército romano, Maximiano realizou uma caça a esses cristãos, expulsando-os do exército. Só os filhos de soldados ficaram obrigados a servirem o exército. E este era o caso do Capitão Sebastião. Para os outros jovens a escolha era livre. Denunciado por um soldado, o imperador se sentiu traído e mandou que Sebastião renunciasse à sua fé em Jesus Cristo. Sebastião se negou a fazer esta renúncia. Por isso, Maximiano mandou que ele fosse morto para servir de exemplo e desestímulo a outros. Maximiano, porém, ordenou que Sebastião tivesse uma morte cruenta diante de todos. Assim, os arqueiros receberam ordens para matarem-no a flechadas. Eles tiraram suas roupas, o amarraram num poste no estádio de Palatino e lançaram suas flechas sobre ele. Ferido, deixaram que ele sangrasse até morrer, mas as flechas não conseguiram seu intento. Irene, uma cristã devota, e um grupo de amigos, foram ao local e, surpresos, viram que Sebastião continuava vivo. Levaram-no dali e o esconderam na casa de Irene que cuidou de seus ferimentos. Depois de curado, Sebastião continuou evangelizando e se apresentou ao imperador Maximiano, que não atendeu ao seu pedido. Sebastião insistia para que ele parasse de perseguir e matar os cristãos. Desta vez o imperador mandou que o açoitassem até morrer e depois fosse jogado numa fossa, para que nenhum cristão o encontrasse. Porém, após sua morte, São Sebastião apareceu a Lucina, uma cristã, e disse que ela encontraria o corpo dele pendurado num poço, pedindo para ser enterrado nas catacumbas junto dos apóstolos.

               Voltando a falar sobre o Papa Caio, em uma de suas ações, decretou que todo bispo só poderia assumir a posição após desempenhar as funções de ostiário, leitor, exorcista, acólito, sub-diácono, diácono e padre. Reformando a administração da Igreja, dividiu os bairros de Roma entre os diáconos e conteve agitadores que desejavam se vingar da morte imposta a outros pontífices. Embora tenha conseguido ampliar a presença da Igreja Católica em Roma física e administrativamente, o Papa Caio conviveu com uma época em que as medidas contra os cristãos estavam em crescimento. A tradição diz que o Sumo Pontífice foi decapitado no dia 22 de abril de 296, data que marca o fim do seu papado. Caio foi sepultado na Catacumba de Calisto, mas seus restos mortais estão hoje na capela da família Barberini.

 

29º - São Marcelino - 296 – 304  

               Ordenou São Silvestre, que viria a assumir o pontificado em 314. Nascido em Roma em data desconhecida, Marcelino viveu no terceiro século da era cristã, época de dificuldades e perseguições para os fiéis que professavam tal fé. Naquele momento, o cristianismo ainda não era reconhecido como religião oficial do Império Romano e dava seus primeiros passos contra a repressão do paganismo. Em função disso, os cristãos sofriam constantemente com perseguições, assassinatos e martírios que não poupavam nem mesmo o Sumo Pontífice líder da mais alta hierarquia dentro da Igreja Católica. Nem sempre o relacionamento com os imperadores era satisfatório, pois variava em função da concepção de cada um deles. Essa instabilidade perduraria por mais de um século ainda até a situação dos cristãos se tornasse mais confortável. Sabe-se pouco sobre a vida de Marcelino, o mais preciso é que ele foi eleito Papa no dia 30 de junho de 296 para suceder o Papa Caio. O Papa Marcelino precisou enfrentar a conjuntura de perseguição durante seu pontificado. Enquanto liderou a Igreja Católica, teve que se defender de um grande movimento pagão que tinha o intuito de confrontar o cristianismo. O movimento foi liderado por César Galério, em 302, o qual convenceu o Imperador Diocleciano do perigo que era os cristãos para Roma. Acredita-se, inclusive, que César Galério tenha promovido algumas ações de distúrbio para culpar os cristãos. Verdade ou não, o certo é que o Imperador Romano decretou seu primeiro édito de perseguição e intolerância aos cristãos. A influência de César seria fundamental para a grande perseguição promovida por Diocleciano. De início, os soldados cristãos tiveram que abandonar o exército, as propriedades da Igreja foram confiscadas e seus livros sagrados queimados. Os cristãos se deparavam com inúmeras restrições, eram forçados a renunciar a própria fé e suas manifestações foram impedidas. A esposa e a filha de Diocleciano, que eram cristãs, foram forçadas a professar o paganismo. Em função de todo esse contexto, nada há de registro sobre as ações do Papa Marcelino durante seu pontificado. Naturalmente, ele estava preocupado com a sobrevivência da religião naquele período e também com a sua própria vida. Em 303, a perseguição apresentou maiores proporções, causando graves danos à Igreja. Em meio ao conturbado período vivido pelos cristãos e a Igreja Católica, o Papa Marcelino chegou a ser acusado de ter entregue os textos sagrados e feito ofertas aos deuses pagãos para escapar das perseguições. Supostamente, o Papa teria apostatado e logo depois se arrependido, o que causaria a ira de Diocleciano, que o condenaria à morte. Mas nada disso foi comprovado. No entanto, sabe-se que a conduta do Papa não era aprovada pelos cristãos. O Papa Marcelino foi rapidamente venerado e muito se disse sobre seu processo de martirização, mas o mais provável é que o Papa tenha falecido de causas naturais no ano 304. O dia preciso também é uma incerteza, mas provavelmente no mês de outubro. Ele permaneceu à frente da Igreja por oito anos e faleceu após dois anos de grandes perseguições de Diocleciano. Curiosamente, foi em seu pontificado que surgiu o primeiro país cristão, a Armênia. Diferentemente de seus antecessores, não foi sepultado nas Catacumbas de São Calisto, pois esta foi confiscada pelo Imperador.

 

30º - São Marcelo I - 307 - 309

               São Marcelo só foi eleito quatro anos após a morte de São Marcelino, devido às terríveis perseguições que os cristãos sofreram pelas mãos do imperador Dioclesiano. Acabou sendo exilado pelo imperador Maxêncio, e sofreu diversas humilhações e castigos. Morreu exilado, numa igreja que foi fechada e transformada num estábulo, onde trabalhava como escravo.  Nascido em Roma no ano 255, Marcelo viveu uma época ainda de insegurança para os cristãos, pois eles continuavam sendo perseguidos pelos imperadores. Um dos maiores opositores daquela época era Dioclesiano, imperador que chegou a tornar obrigatório o culto a Júpiter, pois se identificava com este deus, além de ordenar violenta perseguição aos cristãos. Enquanto isso, Marcelo dedicava-se à vida religiosa com o reconhecimento de seus companheiros em fé. A situação para os cristãos era tão tensa em Roma no período do imperador Dioclesiano que o Papa Marcelino faleceu em 304 e houve uma vacância de quatro anos até Marcelo ser eleito como sucessor. As péssimas condições de relacionamento vividas pelos cristãos dificultavam a manutenção de suas atividades cotidianas. Junto com o Papa Marcelino, vários outros fieis foram martirizados. No entanto, a repressão foi reduzindo gradativamente até que os cristãos pudessem se reunir novamente para reorganizar sua comunidade e para realizar suas celebrações. O Papa Marcelo I assumiu uma Igreja em condição desastrosa, pois ela havia perdido muitos bens e muitos fieis estavam com medo de se manifestar. O novo Papa buscou logo a reorganização através da divisão do território romano em 25 distritos chefiados por presbíteros. Seu novo modelo administrativo permitiria novamente a presença dos cristãos e de suas manifestações por todas as partes. No entanto, Marcelo I era severo e muito fiel às tradições de sua religião, ele condenava completamente os cristãos que renunciaram à religião para salvar suas vidas em algum momento de perseguição. Ainda que a situação fosse desfavorável durante seu papado, Marcelo I não aceitava readmitir os fiéis que abandonaram a religião, ele exigia severas penitências. Foi assim que o Papa começou a conquistar opositores. A situação gerou um grupo de cristãos que se opunha ao pontífice, criando situações de grande instabilidade. O papado de Marcelo I foi muito breve porque, além da pressão externa, os desequilíbrios internos da religião contribuíram para uma situação insustentável. O imperador Magêncio aproveitou para o exilar em 309 em local que ainda é desconhecido. Magêncio se beneficiou do tumulto que as penitências impostas pelo Papa causaram. No mesmo ano o Papa Marcelo I faleceu em seu exílio e, mais tarde, foi venerado como santo e seus restos mortais transferidos para San Marcello al Corso, onde se encontra atualmente, falecendo aos 54 anos de idade.

 

31º - Santo Eusébio - c.309 - c.310

               Nascido na Grécia por volta do ano 255, Eusébio viveu uma época de mudanças estruturais favoráveis à Igreja Católica. Todavia, embora o cristianismo se tornasse cada vez mais aceito pelo Império Romano, os cristãos ainda não viviam em paz com seu culto. Continuava existindo opositores e defensores do tradicional paganismo que promoviam perseguições aos praticantes da nova religião monoteísta. Eusébio sempre foi um homem religioso e carismático, sua ascensão ocorreu, de certa forma naturalmente. Com o falecimento do Papa Marcelo I, Eusébio foi facilmente eleito no dia 18 de abril de 309 para ser seu sucessor. Mas seu papado não seria nada fácil, pois a Igreja enfrentava atos de violência que perturbavam a paz. Na época, havia uma grande discussão sobre a readmissão dos considerados apóstatas, ou seja, aqueles que declaradamente abandonavam a religião. O confronto de ideias gerou uma severa dissensão na Igreja e o Papa Eusébio se posicionou a favor da exclusão definitiva dos que tinham apostatado da comunhão, permitindo a readmissão apenas aos que passassem por um ato público de penitência. Eusébio enfrentou forte oposição daqueles que exigiam a readmissão imediata ao corpo religioso, intensificando muito o conflito. O Papa Eusébio foi firme à condenação dos apóstatas e também na defesa da disciplina eclesiástica. Pelo que se tem notícia, ele foi o Papa mais amado e venerado pelos cristãos de sua época porque era homem de grande bondade e de misericórdia, embora fosse decididamente contra a reintegração daqueles que haviam apostatado. Esta posição foi fundamental para que seu papado durasse tão pouco tempo. No dia 17 de agosto do mesmo ano em que assumiu, o Papa Eusébio foi deportado para a Sicília e exilado por ordem do Imperador Magêncio, que defendia uma posição contrária sobre os apóstatas. A data marcaria o fim oficial de seu papado, pois Eusébio jamais voltaria do exílio. Ele faleceu pouco tempo depois, no dia 21 de outubro do mesmo ano, quando tinha 55 anos de idade. O corpo do Papa Eusébio foi transladado para Roma provavelmente em 311 e depositado em um cubículo nas Catacumbas de São Calisto. É venerado como Santo e Mártir pelos cristãos.

 

32º - São Melquíades - 311 - 314         

Conversão do Imperador Constantino ao catolicismo. Tempos de paz para a Igreja pelo fim das perseguições aos cristãos.

               Nascido no norte da África provavelmente no ano 270, Melquíades é também conhecido como Milcíades, Miltíades ou Melquiadas. Junto como os demais fieis do cristianismo, viveu as perseguições empreendidas pelo Império Romano, porém foi sempre dedicado à vida religiosa. Sua ascensão na vida religiosa o levou dos povos berberes ao posto máximo da Igreja Católica, como sucessor do Papa Eusébio. O Papa Melquíades assumiu o pontifício de Roma no dia dois de julho do ano 311 em função do exílio que o imperador Maxêncio impôs ao Papa Eusébio na Sicília. Mas o Pontificado de Melquíades alcançou uma grande conquista para os cristãos, pois, em 312, o imperador Constantino assumiu o poder em Roma e se aproximou respeitosamente do Papa. O novo imperador romano deu ao pontífice um palácio para ser sua residência e sede do governo cristão. O Palácio Laterano, como era chamado, ainda está de pé e é parte do patrimônio arquitetônico do Vaticano, indicado hoje como Palácio de Latrão. Foi residência Papal por 770 anos. O ato do imperador já representava um grande avanço e boas esperanças para o povo cristão. No ano seguinte, em 313, houve uma medida ainda melhor para os fiéis, o imperador garantiu a liberdade religiosa dos cristãos e devolveu as propriedades que foram tomadas. A bondade do imperador Constantino foi fruto de sua conversão ao cristianismo, o que foi sucedido pela transformação da fé cristã em religião oficial de Roma. A nova realidade mudava por completo o cotidiano dos cristãos e da Igreja Católica, que ganhava espaço e liberdade para agir em prol de sua expansão. O Papa Melquíades aproveitou essa liberdade para organizar as sedes paroquiais e recuperar os bens da Igreja. No seu pontificado deu-se início a construção da Basílica de São João e reforçou-se a unidade da Igreja de Roma. Além disso, vários costumes católicos são atribuídos a Melquíades. O legado do Papa Melquíades é importantíssimo para a Igreja Católica, foi fundamental para transformar a história do Ocidente, em função de sua aproximação com o imperador Constantino. Os benefícios da conversão do Império Romano ao cristianismo causariam uma guinada no poder político e cultural da Igreja. O fim da perseguição aos fiéis do cristianismo e ampliação patrimonial iniciariam uma forte ascensão que culminaria com o poder supremo da instituição durante a Idade Média. O Papa Melquíades, no entanto, não chegou a completar quatro anos como Sumo Pontífice. Faleceu no dia dois de janeiro de 314 e foi erroneamente indicado como mártir em alguns documentos medievais. Mas é venerado como santo pela Igreja Católica.

               IMPERADOR CONSTANTINO - Flávio Valério Aurélio Constantino (272-337), conhecido por Constantino I ou Constantino, o Grande, foi imperador do Império Romano de 306 a 337 d.C. Passou a história como primeiro imperador cristão. Era filho de um oficial grego, Constâncio Cloro, que no ano 305 foi nomeado Augusto ao mesmo tempo que Galério, e de Helena, uma mulher que chegaria a ser santa. Por morte de Constâncio Cloro, em 306, Constantino é aclamado imperador do Ocidente pelo exército local, no meio de uma difícil situação política, agravada pelas tensões com o antigo imperador, Maximiano, e com o seu filho Maxêncio. Constantino começou por derrotar Maximiano, em 310, e logo a seguir Maxêncio, na batalha de Ponte Milvio, em 28 de Outubro de 312. Segundo a tradição, Constantino teve uma visão antes dessa batalha. Olhando o Sol, ao qual prestava culto, como pagão que era, viu uma cruz e ordenou que os seus soldados pusessem nos escudos o monograma de Cristo (as duas primeiras letras do seu nome em grego, sobrepostas). Embora continuasse a praticar ritos pagãos, a partir dessa vitória passou a mostrar-se favorável aos cristãos. Com Licínio, imperador do Oriente, promulgou o chamado “Édito de Milão”, favorecendo a liberdade de culto. Mais tarde, os dois imperadores confrontaram-se e, no ano de 324, Constantino derrotou Licínio, convertendo-se no único Augusto do Império. Constantino levou a cabo numerosas reformas de tipo administrativo, militar e econômico, mas no que mais se destacou foi nas disposições político-religiosas e, em primeiro lugar, nas que tinham por objetivo a cristianização do Império. Promoveu estruturas adequadas para conservar a unidade da Igreja, como modo de preservar a unidade do Estado e legitimas a sua configuração monárquica, embora também tivesse outras motivações religiosas de tipo pessoal. Tomou certas medidas contra heresias e cismas, a par de várias disposições administrativas eclesiásticas. Lutou contra o cisma causado pelos donatistas no norte da África, para defender a unidade da Igreja, e convocou o Concílio de Niceia, para resolver a controvérsia trinitária originada por Ario. Em 330 transferiu a capital do Império de Roma para Bizâncio, à qual chamou Constantinopla, o que implicou uma ruptura com a tradição, apesar de ser sua intenção realçar o aspecto de capital cristã. Como era normal na sua época, só foi batizado pouco antes de morrer, por Eusébio de Nicomédia, bispo de tendência ariana.

 

33º - São Silvestre - 314 - 335

O imperador Constantino decreta o fim da crucificação, da perseguição aos cristãos e pessoalmente contribui para a construção de Igrejas.

O Papa manda erigir a imagem de Nossa Senhora Auxílio dos Cristãos, em gratidão à Maria Santíssima pelo fim da perseguição contra a Igreja.

Condenação das heresias donatista e ariana pelos concílios de Arles e Nicéia.

É construída a Basílica Vaticana sobre o túmulo de São Pedro, com auxílio do imperador Constantino. (Esta deu lugar a atual Basílica de São Pedro).

O Papa Silvestre I em seu calendário confirma o domingo (e não o sábado judaico) como o primeiro dia da semana, "dies dominicus" ("Dia do Senhor", em latim) e ordena aos membros da igreja que o mantenham como um dia santo; dia em que Jesus ressuscitou; como já tinha sido falado pela Epístola de Barnabé, Santo Inácio de Antioquia aos Magnésios, São Justino o Mártir em sua Apologia, etc.

Em 325, a controvérsia ariana irrompe em Alexandria, causando ampla violência e perturbações entre os cristãos.

Em 325, o Primeiro Concílio Ecumênico de Nicéia, convocado como resposta à controvérsia ariana, estabelece o Credo Niceno, declarando a crença dos cristãos trinitários ortodoxos na Trindade.

18 de novembro de 326: o Papa Silvestre I consagra a Basílica de São Pedro, construída por Constantino, o Grande, sobre o túmulo do apóstolo Pedro.

               Nascido em Roma no ano 285, Silvestre viveu a época da recente conversão do Império Romano ao cristianismo. Homem de fé e atuante no catolicismo, foi o sucessor do Papa Melquíades que faleceu no início do ano 314. No dia 31 de janeiro do mesmo ano, Silvestre foi eleito. O Papa Silvestre I exerceu um dos mais longos pontificados da história da Igreja Católica. Ele foi Sumo Pontífice por 21 anos. Assumiu o posto com apenas 29 anos, o que lhe garantiu longevidade. Seu pontificado longo interagiu muito bem com o momento vivido pelo cristianismo primitivo, alcançando várias conquistas para a Igreja Católica que permitiram a esta uma expansão significativa. O pontificado do Papa Silvestre I ocorreu ao mesmo tempo em que Constantino I era o imperador de Roma. A relação entre os dois foi sadia, o que permitiu benefícios mútuos. Constantino I convocou um sínodo e um concílio, nos quais o Papa enviou emissários para presidir os encontros. O imperador romano apresentava um quadro de saúde bastante debilitado, e o Papa foi simpático aos seus interesses. O bom relacionamento entre o Papa Silvestre I e o imperador Constantino I estabeleceu a autoridade da Igreja Católica no mundo Antigo e Medieval e deu início aos primeiros monumentos cristãos, como o Santo Sepulcro em Jerusalém e as primitivas basílicas de São João de Latrão e São Pedro. Esse bom relacionamento entre os dois líderes muito se deu em função da conversão de Constantino I ao cristianismo. Sua conversão é atribuída a uma visão que o imperador teve durante uma batalha em Milvius. Mas, seja como for, o fato é que até o reinado deste imperador os cristãos eram perseguidos rotineiramente no Império Romano. A divergência de religião entre cristianismo e paganismo resultou em vários conflitos e massacres que contabilizaram perdas maiores para os cristãos. A conversão de Constantino I inaugurou uma nova fase na história da Igreja Católica, pois abriria caminho para que a crença se tornasse oficial do império, se firmasse, conquistasse adeptos em grande quantidade, assim como poder político. Para a Igreja, é o início de um estado de paz. Não há dúvida de que a maior conquista do papado de Silvestre tenha sido a valorosa e harmônica relação com Constantino I. Isso garantiu também que o Papa pudesse exercer seu pontificado com tranquilidade, sem perseguição, exílio ou assassinato, como muito de seus antecessores. Faleceu aos 50 anos de idade, em 31 de dezembro de 335. Silvestre I foi o primeiro Papa canonizado sem ter sofrido martírio, é celebrado como São Silvestre I.

 

33 . 1 - São Nicolau

               São Nicolau de Mira, também conhecido como São Nicolau de Bari, foi um dos primeiros cristãos, era grego, proveniente da Ásia Menor. É o Santo padroeiro da Rússia, da Grécia, da Noruega e de Beit Jala, na Palestina. É o patrono dos guardas-noturnos na Armênia e dos coroinhas na cidade de Bari, na Itália, onde estariam sepultados seus restos.

               São Nicolau era de ascendência grega e seria proveniente de Patara (atual Turquia), no Império Romano, onde teria nascido na segunda metade do século III, e teria falecido em dezembro do ano de 350 (6 de dezembro segundo o calendário hoje usado no Ocidente, 19 de dezembro no calendário do cristianismo oriental), em Mira, também na atual Turquia. Foi um bispo cristão que ficou conhecido por sua caridade e afinidade com as crianças. Devido à sua imensa generosidade e aos milagres que lhe foram atribuídos, foi canonizado pela Igreja Católica e tornou-se um símbolo ligado diretamente ao nascimento do Menino Jesus. São Nicolau é considerado um dos santos mais conhecidos da cristandade, tendo servido de inspiração para a figura do Papai Noel, símbolo do Natal. Teria vivido alguns anos nas vizinhanças da cidade de Belém, na Terra Santa, próximo ao local do nascimento de Jesus. Sobre a cripta onde teria vivido, foi construída o que é hoje a principal igreja de Beit Jala, pequena cidade na Palestina.

               A Nicolau foram atribuídos vários milagres, sendo daí proveniente sua popularidade em toda a Europa e sua designação como protetor dos marinheiros e comerciantes, santo casamenteiro e, principalmente, amigo das crianças. Sob o império de Diocleciano, Nicolau foi encarcerado por recusar-se a negar sua fé em Jesus Cristo. Após a subida ao poder de Constantino, Nicolau volta a enfrentar oposição, desta vez da própria Igreja. Diante de um debate com outros líderes eclesiásticos, Nicolau levanta-se e esbofeteia um de seus antagonistas, o herege Ário. Isso o impede de permanecer como líder da Igreja. Nicolau, porém, não se dá por vencido e permanece atuante, prestando auxílio a crianças e outros necessitados.

Aparição de Nossa Senhora a São Nicolau

               Quando São Nicolau era Bispo de Mira, na Turquia, e vivia grandes dificuldades para levar adiante sua missão de servir a Cristo, na condução de sua diocese, Nossa Senhora Mãe da Misericórdia, apareceu-lhe em duas oportunidades para incentivá-lo e fortalecê-lo em sua árdua jornada. Após estas manifestações o Santo Bispo reanimou-se, inclusive tendo importante participação no Concílio de Nicéia, onde com ardor e inspirada sabedoria defendeu a divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo. Esta tornou-se a sua grande missão durante o resto de sua vida: pregar e defender a Divindade de Nosso Senhor.

               Um caso famoso, sempre relatado em suas biografias, mostra como ele ajudava aos sofredores. Segue-se: Ocorre que, na cidade de Patara, havia um rico comerciante que tinha três filhas; quando estas cresceram, tornaram-se formosas, mas, bem por esta época, as transações comerciais de seu pai fracassaram, até que ele chegou à completa falência. Teve então o comerciante a criminosa ideia de usar a beleza das filhas para obter os meios de sobrevivência de que necessitava. São Nicolau soube do plano e decidiu salvar tanto o pai quanto as filhas de tal pecado e vergonha.

               À noite, camuflou-se com uma capa e foi à casa do comerciante falido. Não consta que tenha descido pela chaminé, mas fez quase isso: jogou pela janela um saco não com presentes, mas com moedas de ouro. Algumas versões dão conta de que isto se deu na véspera do Natal. Fato é que o comerciante, achando o ouro, com grande alegria preparou o enxoval da filha mais velha e assim arranjou-lhe um bom casamento. Para tanto, naquela época, era preciso que a noiva tivesse um bom dote. Algum tempo depois, São Nicolau novamente jogou outro saco com ouro para dentro da casa do comerciante, o suficiente para o enxoval e casamento da segunda filha. Quando São Nicolau, repetindo o mesmo plano, jogou o terceiro saco com ouro para a filha mais nova, o comerciante, desconfiado, já estava à sua espera. Prostrando-se diante do Santo, agradeceu-lhe, com lágrimas que lhe desciam copiosamente pelas faces, a salvação da família de um horrível pecado e da grave vergonha a que se submeteria perante toda a cidade. Após o casamento das três filhas, o comerciante conseguiu enfim recuperar seus negócios, e começou a ajudar também seus próximos, imitando o exemplo de seu benfeitor.

               Vemos claramente como o episódio descrito acima, em muitos aspectos, deu origem às lendas que conhecemos sobre o Papai Noel. A conclusão da história deste Santo, que é especialmente querido pelos ortodoxos e em particular pelos russos, é a seguinte: em certo ponto, ele acabou por vender todas as suas posses para dar o dinheiro aos mais necessitados. Ele, que desde a morte dos pais havia se aproximado de seu tio, o Bispo da cidade de Patara, foi logo ordenado sacerdote, e terminou por se tornar, ele próprio, o Bispo de Mira. Homem tão bondoso e caridoso, Nicolau foi sempre amado por todo o povo, e conta-se que realmente gostava de distribuir presentes entre as crianças. Faleceu no dia 6 de dezembro de 343, sendo o aniversário de sua morte o dia de São Nicolau. Assim, influenciados pela popularidade de São Nicolau na Europa, os imigrantes europeus trouxeram sua história e suas tradições para a América. Eis a origem do nome Santa Claus (corruptela de Saint Nikolaus/St. Niklaus) que o Papai Noel tem em inglês. Com o passar dos tempos, outras lendas e mitos sobre ele foram sendo acrescentadas à sua verdadeira história, e assim apareceu o "Papai Noel" dos dias de hoje.

 

34º - São Marcos - 336

               Nascido em Roma no ano 290, Marcos cresceu no momento de transição do paganismo para o cristianismo no Império Romano. Os cristãos ainda sofriam com alguns ataques e a religião monoteísta havia se tornado há pouco a religião oficial do Império. A instituição Igreja Católica, contudo, já mostrava forte expansão e apontava para a significativa influência que teria na vida política e cultural do Ocidente. Naquela época, os Papas permaneciam pouco tempo no cargo, em função de variadas situações. Muitos deles, inclusive, foram perseguidos e aprisionados, morrendo como mártires. Marcos foi eleito para suceder o Papa Silvestre I no dia 18 de janeiro de 336. Ele ficou pouquíssimo tempo no posto de Sumo Pontífice, falecendo no final do mesmo ano. O papado de Marcos foi muito curto, o que o impossibilitou de grandes realizações. No entanto, ainda deixou algumas heranças culturais para a Igreja Católica. Acredita-se, por exemplo, que tenha surgido em seu papado a compilação de Bispos e mártires do cristianismo. O papado de Marcos também gerou o primeiro calendário com as festas religiosas da Igreja Católica e instituiu o uso do pálio, um tecido com lã branca de cordeiro ilustrado com cruzes negras. Marcos ainda mandou construir as basílicas de São Marcos e de Santa Balbina, mas não teria tempo de velas prontas. O Papa Marcos era novo quando assumiu o papado, tinha apenas 46 anos de idade. Demonstrava vigor e ânimo para conduzir a Igreja Católica. No entanto, faleceu supostamente de causas naturais no dia sete de outubro de 336, mesmo ano em que havia assumido o posto de Sumo Pontífice. Mesmo com pouco tempo à frente da Igreja Católica, deixou marcas culturais para sempre, como o extenso calendário de festas religiosas que existe atualmente. Foi canonizado mais tarde e é também reconhecido como Papa São Marcos.

 

35º - São Júlio I - 337 - 352

Em 345, o Papa Júlio I oficialmente define a data de 25 de dezembro para a celebração da Natividade ou Natal.

               Júlio era de origem romana, filho de um certo cidadão chamado Rústico. Viveu no período em que a Igreja respirava a liberdade religiosa concedida pelo Imperador Constantino, o Magno, em 313. Essa liberdade oferecia ao cristianismo melhores condições de vida e expansão da religião. Por outro lado, surgiram as primeiras heresias: donatismo, puritanismo na moral, e o arianismo, negando a divindade de Cristo. Com a morte de Constantino, os sucessores, infelizmente, favoreceram os partidários do arianismo. O Papa Júlio I tomou a defesa e hospedou o Patriarca de Alexandria, Atanásio, o grande doutor da Igreja, batalhador da fé no Concílio de Nicéia e principal alvo do ódio dos arianos, que o tinham expulsado da sede patriarcal. O Papa Júlio I convocou dois sínodos de bispos em que, com a condenação do semi-arianismo, Atanásio foi reabilitado, recebendo cartas do Papa que se felicitava com a Igreja de Alexandria, baluarte da ortodoxia cristã. O Papa Júlio I construiu várias igrejas em Roma: a dos Santos Apóstolos, a da Santíssima Maria de Trastévere, e mais três mandou construir nos cemitérios das vias Flavínia, Aurélia e Portuense, respectivamente as igrejas de São Valentim, de São Calisto e de São Félix. Cuidou da organização eclesiástica e da catequese catecumenal, ou seja, dos adultos e mais velhos. Morreu em 352, após quinze anos de pontificado. Foi sepultado no cemitério de Calepódio, na via Aurélia, numa igreja que ele também havia mandado edificar. Sua veneração começou entre os fiéis a partir do século VII. Suas relíquias, segundo a tradição, foram transladadas para a Basílica de São Praxedes a pedido do Papa Pascoal I. O seu culto, que já fora autorizado, refloresceu em 1505, quando do seu translado para a Basílica da Santíssima Maria de Trastévere, em Roma.

 

36º – Libério - 352 - 366  

               Libério reinou de 17 de maio de 352 até 24 de setembro de 366. Seu primeiro ato como Papa foi, após se reunir em um sínodo em Roma, escrever ao Imperador Constâncio II (353-354), então em Arles, pedindo para que fosse feito um Concílio em Aquileia tratando dos assuntos relacionados a Atanásio de Alexandria, mas seu mensageiro Vicêncio de Cápua foi pressionado pelo imperador em um Conciliábulo (Conciliabulum) feito em Arles para subscrever, contra à sua vontade, a uma condenação do ortodoxo Patriarca de Alexandria. Após isto, o comando imperial de Milão impôs seus cânones sobre todos os Bispos ocidentais, como consequência, Libério foi perseguido e exilado para Bereia e substituído pelo antipapa Félix II. Após um exílio de mais de dois anos, o imperador Constâncio II chamou-o a Roma, sendo a Sé de Roma oficialmente ocupada pelo antipapa Félix. O imperador propôs que Libério governasse a Igreja juntamente com Félix, mas antes da chegada de Libério, Félix foi expulso pelo povo romano. Após a morte do imperador Constâncio II em 361, Libério anulou os decretos e reiterou sua posição e os Bispos que aprovaram o concílio retiraram a sua adesão. Em 366, Libério deu um acolhimento favorável a uma delegação do Episcopado Oriental, e admitiu em sua comunhão mais moderada os convertidos Arianos. Morreu em 24 de setembro de 366.

O Concílio de Laodiceia ou Sínodo de Laodiceia, foi um sínodo regional de aproximadamente 30 clérigos da Anatólia (atual Turquia) entre 363 e 364 d.C. Logo depois da guerra romano-persa na época do imperador romano Teodósio I. As principais decisões e preocupações do concílio envolveram efetivamente o comportamento dos membros da igreja. O concílio registrou seus cânones por meio de regras escritas, cujos principais manuscritos sobreviveram até a atualidade ou foram citados por outros sínodos e concílios.

 

36 . 1 - Aparição de Nossa Senhora das Neves – Itália

               No ano de 363 vivia em Roma um ilustre descendente de nobre família romana, o qual, não possuindo herdeiros, resolveu, em combinação com a esposa, consagrar sua imensa fortuna à glória de Deus e em honra a Santíssima virgem Maria. Na noite de 4 para 5 de agosto estava pensando seriamente no assunto, quando a Rainha do Céu apareceu-lhe em sonhos e disse-lhe: - "Edificar-me-eis uma basílica na colina de Roma que amanhã aparecerá coberta de neve". Ora, nos dias 4 e 5 de agosto, é a época de maior calor na Itália. Mas no dia seguinte, devido a um estupendo milagre, o monte Esquilino estava coberto de neve. A população da cidade acudiu ao lugar do prodígio e até mesmo o Papa Libério que recebeu a mesma revelação também em sonho, acompanhado de todo o clero, para lá se dirigiu. Logo depois de iniciada a construção, a Basílica foi denominada de Nossa Senhora das Neves, devido ao fenômeno climático. Este templo, no entanto, é conhecido universalmente pelo nome de Santa Maria Maior (Basilica di Santa Maria Maggiore) por ser a mais importante entre todas as Igrejas de Roma dedicadas à Virgem Santíssima.

 

37º - São Dâmaso I - 366 - 384

Em 381, Primeiro Concílio Ecumênico de Constantinopla. Condenação das heresias de Macedônio e Apolináris.

Em 382, o Concílio de Roma, sob o Papa Dâmaso I, define o cânon da Bíblia, listando os livros aceitos do Antigo Testamento e do Novo Testamento. Nenhum outro deve ser considerado escritura.

               Nascido em Portugal no ano 305, não há certeza se ele é proveniente de Guimarães ou de Idanha-a-Velha. Sabe-se, contudo, que ele viveu um período de transição quanto à perseguição sofrida pelos cristãos no Império Romano. Até o século III as perseguições eram intensas, variando de acordo com a postura religiosa de cada imperador. Em alguns momentos havia relativa paz. Mas, em outros, a perseguição era extrema, causando a morte de muitos cristãos e mesmo de Papas, que eram martirizados. A situação instável avançou pelo século IV, mas a ascensão de Constantino ao poder no Império Romano mudaria a história não apenas de seu império, mas também de todo o Ocidente. Constantino converteu-se ao catolicismo e o tornou religião oficial de Roma. A partir daí, a perspectiva mudaria para os cristãos, já que as perseguições cessariam, pelo menos como eram antes. As condições propícias de melhor estabilidade para o culto levariam os cristãos ao domínio ideológico e político que marcaria toda a Idade Média. No entanto, as disputas políticas pelo poder no interior da própria Igreja Católica e com outros monarcas seria sempre constante. Quando o Papa Libério faleceu, por exemplo, havia uma intensa disputa no seio da Igreja Católica que retardou a eleição do sucessor Dâmaso. O Papa Dâmaso I foi eleito para ser o sucessor do Papa Libério, no entanto, só ocupou o cargo efetivamente após uma grave disputa com Ursino, que se declarava também Papa. Isso aconteceu no início do mês de outubro do ano 366. O Papa tinha 61 anos de idade naquela época. Antes do efetivo reconhecimento como Sumo Pontífice, Dâmaso enfrentou dois anos de batalhas sangrentas. Os dois postulantes ao posto montaram exércitos e combateram avidamente em busca do poder que almejavam. Em meio a vários conflitos e elevado número de mortes, Dâmaso foi acusado de assassinato e teve que se defender perante um tribunal imperial. Ursino também recebeu acusações e foi julgado. Porém, como Dâmaso tinha o apoio do Imperador Valentiniano I, ele foi inocentado enquanto seu adversário foi condenado ao desterro. Passada a tormenta, o Papa Dâmaso I se dedicou à administração da Igreja Católica e à condução de seu pontificado. Como recebeu grande apoio do império para assegurar sua eleição, tratou logo de promover uma aproximação entre o poder temporal e o poder espiritual, os quais entraram em consonância. O pontífice criou, assim, condições propícias para um bom relacionamento com os monarcas e para ter relativa estabilidade para se dedicar às causas religiosas. Agindo muito bem estrategicamente, Dâmaso I teve forças para combater qualquer ameaça de cisma na Igreja. Deixou um importante legado para a história da instituição religiosa como escritor de epigramas e de cartas sinodais, além de ter encomendado uma revisão da Bíblia latina, conhecida como Vulgata Latina, que é uma das mais importantes traduções do livro sagrado para os cristãos. Adotou o hábito de usar o Anel do Pescador, um costume dos Papas que dura até hoje, mas, naquela época, tratava-se de um único anel que era passado de um Papa para o seu sucessor. Apesar do caminho sangrento que percorreu para efetivar seu pontificado, Dâmaso I é reconhecido como um dos mais importantes Papas do século IV. Ele permaneceu à frente da Igreja Católica durante 18 anos e faleceu aos 79 anos de idade, no dia 11 de dezembro de 384.

 

CREDO NICENO CONSTANTINOPOLITANO

Creio em um só Deus, Pai todo-poderoso, Criador do céu e da terra, de todas as coisas visíveis e invisíveis. Creio em um só Senhor, Jesus Cristo, Filho Unigênito de Deus, Nascido do Pai antes de todos os séculos: Luz da Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado não criado, consubstancial ao Pai. Por Ele todas as coisas foram feitas. E, por nós, homens, e para a nossa salvação, desceu dos céus: e encarnou pelo Espírito Santo, no seio da Virgem Maria, e se fez homem. Também por nós foi crucificado sob Pôncio Pilatos; padeceu e foi sepultado. Ressuscitou ao terceiro dia, conforme as escrituras; E subiu aos céus, onde está sentado à direita do Pai. E de novo há de vir, em sua glória, para julgar os vivos e os mortos; e o seu reino não terá fim. Creio no Espírito Santo, Senhor que dá a vida, e procede do Pai; e com o Pai e o Filho é adorado e glorificado: Ele que falou pelos profetas. Creio na Igreja Una, Santa, Católica e Apostólica. Professo um só batismo para remissão dos pecados. Espero a ressurreição dos mortos; E a vida do mundo que há de vir. Amém.

               Este Credo é uma obra prima, uma inspiração Divina que deve ser eternizada, sem mudanças ou alterações. O nome "niceno-constantinopolitano" referencia o primeiro Concílio de Niceia 325 d.C., do qual resultou o Credo Niceno, e o primeiro Concílio de Constantinopla (381 d.C.), onde a declaração de fé foi finalmente estabelecida a partir dos resultados dos dois concílios. Os concílios se reuniam a fim de esclarecer questões teológicas que geravam controvérsias, de modo que as linhas acrescidas significam os pontos de unanimidade na Igreja Una de Cristo.

 

37 . 1 - São Jerônimo

               Também conhecido como Jerônimo de Estridão (Estridão, c. 347 – Belém, 30 de setembro de 420), foi um sacerdote cristão ilírio, destacado como teólogo, historiador e confessor, e considerado Santo e Doutor da Igreja pela Igreja Católica. Filho de Eusébio, da cidade de Estridão, na fronteira entre a Dalmácia e a Panônia, é mais conhecido por sua tradução da Bíblia para o latim (conhecida como Vulgata) e por seus comentários sobre o Evangelho dos Hebreus, mas sua lista de obras é extensa. Eusébio Sofrônio Jerônimo nasceu na cidade de Estridão, na província romana da Dalmácia, por volta de 347, mas só foi batizado entre 360 e 366, quando viajou para Roma com seu amigo Bonoso, seu companheiro quando foi viver como eremita numa ilha no Adriático – para continuar seus estudos sobre retórica e filosofia. Lá, Jerônimo estudou gramática latina e um pouco de grego com o gramático Élio Donato, embora não tenha adquirido a proficiência na língua grega que, anos depois, alegaria ter obtido como estudante. Jerônimo, tendo nascido em uma região do Império com forte presença romana desde 165 a.C., quando da derrota do último rei da Ilíria, Gêncio, e já completamente latinizada no século IV d.C., teria falado latim como língua materna. Em Antioquia, onde ficou por mais tempo, dois de seus companheiros morreram e ele próprio ficou seriamente doente mais de uma vez. Durante uma destas enfermidades (perto do inverno de 373-374), Jerônimo teve uma visão que levou-a a abandonar seus estudos seculares para dedicar-se completamente a Deus. Ele parece ter trocado uma grande quantidade de tempo que dispendia no estudo dos clássicos para estudar a Bíblia, dirigido por Apolinário de Laodiceia, que na época ensinava em Antioquia e ainda não dava sinais de sua futura condenação por heresia. Tomando por um súbito desejo de viver em penitência asceta, Jerônimo passou um tempo no deserto de Cálcis, para o sudoeste de Antioquia, uma região conhecida como "Tebaida Síria", onde moravam numerosos eremitas. Lá também dedicou-se a aprender pela primeira vez o hebraico, sob a tutela de um judeu convertido e é possível que ele tenha mantido correspondência com os judeo-cristãos de Antioquia. Por volta desta época, Jerônimo contratou uma cópia de um "Evangelho Hebreu", do qual fragmentos foram preservados em suas notas e que é hoje conhecido como "Evangelho dos Hebreus", considerado o verdadeiro Evangelho de Mateus pelos nazarenos. Depois disso, ele próprio traduziu partes da obra para o grego. De volta em Antioquia em 378 ou 379, foi ordenado pelo Bispo Paulino de Antioquia. Logo depois, viajou para Constantinopla para continuar seus estudos sobre as Escrituras com Gregório Nazianzeno. Ele passou por volta de uns dois anos por lá e partiu novamente para Roma, onde passou os três anos seguintes (382-385) na corte do Papa Dâmaso I e a liderança cristã da cidade. O motivo da viagem foi um convite para que participasse do concílio de 382 realizado para acabar com o cisma na Igreja de Antioquia, que na época tinha mais de um patriarca alegando ser o verdadeiro. Acompanhando um deles, Paulino, pretendia apoiá-lo nos trabalhos, acabou se destacando junto ao Papa e passou a exercer um importante papel durante seus concílios. Jerônimo então recebeu diversos encargos em Roma e realizou ali uma revisão da Bíblia Latina (Vetus Latina) baseando-se em manuscritos gregos do Novo Testamento. Ele também atualizou o saltério contendo o "Livro dos Salmos" que era na época utilizado em Roma baseando-se na Septuaginta grega. Em Roma, Jerônimo estava rodeado por um círculo de mulheres bem-nascidas e bem-educadas, incluindo algumas oriundas das mais nobres famílias patrícias romanas, como as viúvas Leia, Marcela e Paula, com suas filhas Blesila e Eustóquia. Como resultado da crescente inclinação destas mulheres pela vida monástica, da indulgente lascividade que imperava em Roma e mais a crítica feroz de Jerônimo ao clero secular, que não poupava ninguém, logo irrompeu um conflito contra o clero romano e seus aliados. Uma rica viúva, Paula deu condições para que Jerônimo pudesse viver sem preocupações financeiras e se dedicasse aos estudos. Ela seguiu-o depois para Belém e morreu com ele na Terra Santa. Em agosto de 385, Jerônimo abandonou Roma definitivamente e voltou para Antioquia com seu irmão Pauliniano e diversos amigos; logo depois vieram Paula e Eustóquia, decididas a terminar suas vidas na Terra Santa. No inverno do mesmo ano, Jerônimo viajou com elas na função de conselheiro espiritual. O grupo, acompanhado do bispo Paulino de Antioquia, peregrinou por Jerusalém, Belém e os lugares santos da Galileia antes de seguir para o Egito, onde viviam os heróis da vida asceta, os monges do deserto. Na Escola Catequética de Alexandria, Jerônimo ouviu Dídimo, o Cego, ensinar sobre o Profeta Oseias e contar o que se lembrava de Santo Antão, que morrera trinta anos antes. Depois, passou algum tempo na Nítria admirando a disciplinada vida comunitária dos numerosos habitantes da "cidade do Senhor", percebendo que, mesmo ali, "serpentes escondidas", ou seja, a influência do polêmico teólogo alexandrino Orígenes. No final do verão de 388, voltou para a Terra Santa e passou o resto de sua vida numa cela eremítica perto de Belém rodeado por uns poucos amigos, homens e mulheres (incluindo Santa Paula e Eustóquia), a quem ele atendia como sacerdote e professor.

               Com recursos financeiros suficientes providenciados pela rica Paula, que investia também em aumentar sua biblioteca, Jerônimo passou a levar uma vida de incessante produção literária. A estes últimos trinta e quatro anos de sua carreira pertencem suas mais importantes obras; sua versão do Antigo Testamento traduzida do original hebraico, o melhor de seus comentários sobre as Escrituras, seu catálogo de autores cristãos (De Viris Illustribus) e o seu diálogo contra os pelagianos, de perfeição reconhecida até pelos seus adversários. Em 416, como consequência de suas obras contra o pelagianismo, partidários inflamados da crença invadiram os edifícios monásticos perto de onde vivia, atearam-lhes fogo, atacaram os moradores e mataram um diácono, forçando Jerônimo a se refugiar numa fortaleza nas imediações. Jerônimo morreu perto de Belém em 30 de setembro de 420. Diz-se que seus restos, originalmente enterrados em Belém, foram trasladados para a Basílica de Santa Maria Maior, em Roma, embora outros locais no ocidente também reivindiquem a posse de alguma relíquia relacionada ao Santo.

               Suas avaliações direcionadas principalmente contra os defensores de doutrinas contrárias às ortodoxas, até mesmo a tradução de um tratado de Dídimo, o Cego, sobre o Espírito Santo para o latim (iniciada em Roma em 384 e completada em Belém) revela uma tendência apologética contra os arianos e os pneumatomachoi. O mesmo vale para sua versão para "De principiis", de Orígenes (ca. 399), cujo objetivo era sobrepujar a tradução incorreta de Rufino. Durante suas passagens por Constantinopla e Antioquia, por exemplo, Jerônimo estava mais preocupado com a controvérsia ariana e, especialmente, com o cisma em Antioquia protagonizado por Melécio de Antioquia e Lúcifer Calaritano. Duas cartas ao Papa Dâmaso trazem reclamações a ambos os partidos em disputa, os melecianos e os paulinianos, que tentavam atraí-lo para a controvérsia sobre a relação entre Deus Pai e Deus Filho na Trindade e, mais especificamente, à aplicação de termos como ousia (substância) e hipóstase a esta relação. Na mesma época ou pouco depois (373), ele compôs sua "Liber Contra Luciferianos", na qual ele utiliza o diálogo de forma bastante inteligente para combater os princípios da facção dos calaritanos, principalmente sua rejeição ao batismo realizado por heréticos. Em Roma (por volta de 383), Jerônimo escreveu uma apaixonada resposta aos ensinamentos de Helvídio defendendo a doutrina da virgindade perpétua de Maria e da superioridade da castidade sobre o matrimônio. Um adversário de natureza similar foi Joviniano, com quem debateu em 392 ("Adversus Jovinianum" e a defesa desta obra endereçada ao seu amigo Pamáquio - Ep. 48). Em 406, uma vez mais Jerônimo defendeu as práticas piedosas cristãs e sua própria ética asceta contra o presbítero gaulês Vigilâncio, que era contrário à veneração dos mártires e das relíquias, ao voto de pobreza e ao celibato clerical. Em paralelo, participou ainda da controvérsia com João II de Jerusalém e Rufino sobre a ortodoxia do origenismo. A este período pertencem algumas de suas mais apaixonadas e completas obras: a "Contra Joannem Hierosolymitanum" (398 ou 399); duas obras intimamente relacionadas, "Apologiae contra Rufinum" (402) e sua "última palavra", escrita poucos meses depois, "Liber tertius seu ultima responsio adversus scripta Rufini". A última obra de Jerônimo foi sua "Dialogus contra Pelagianos" (415), contra a heresia do pelagianismo. Jerônimo é o segundo autor mais prolífico do cristianismo antigo, (depois de Santo Agostinho). Na Igreja Católica, ele é reconhecido como Santo padroeiro dos tradutores, bibliotecários e enciclopedistas.

 

38º - São Sirício - 385 - 398

Em 391, os decretos teodosianos proíbem a maioria dos rituais pagãos ainda praticados em Roma.

No Concílio de Hipona em 393, na África do Norte, foi um dos primeiros a fazer uma lista formal dos livros que seriam reconhecidos como canônicos.

No Concílio de Catargo em 397, reiterou e confirmou a lista de livros canônicos.

               Nascido em Roma no ano 334, viveu aquele que seria o último século do que se pode chamar de dificuldade do cristianismo no Império Romano. Houve momentos de graves crises e momentos de relativa paz, mas a situação só apresentou melhores substanciais quando a religião foi declarada oficial do império. A partir de então, os cristãos tiveram que se preocupar especialmente com os problemas internos da Igreja Católica, que não eram poucos, e com as relações políticas. Sirício era um homem comum em Roma, casado e com filhos, mas fiel ao cristianismo e próximo da Igreja Católica. Não se conhece exatamente o número de filhos que tinha, mas conta-se que ele deixou sua esposa e seus filhos para se tornar Pontífice. Com o falecimento do Papa Dâmaso I, Sirício foi escolhido por unanimidade no dia 17 de dezembro de 384 para ser seu sucessor. Havia naquele período uma tentativa de autopromoção de Ursino, que se apresentava como antipapa, mas seu prestígio era pequeno e sua iniciativa foi frustrada pela escolha do novo Papa. O Papa Sirício assumiu a liderança da Igreja Católica quando tinha 50 anos de idade. Durante 15 anos dedicou-se ativamente à administração da Igreja, sendo o primeiro Papa a escrever decretos. Era um homem calmo e sereno, tinha humildade suficiente para dialogar e evitar o confronto. Sua reputação causou natural agrado a muitas pessoas e, desta forma, conseguiu converter muitos fiéis ao cristianismo. Mas Sirício não abria mão de administrar a Igreja de acordo com os preceitos religiosos que acreditava, atuando de maneira a reforçar a doutrina e os dogmas, deixando legados para a história da instituição religiosa. Mesmo tendo sido casado e com filhos, Sirício reforçava fortemente o celibato para sacerdotes e diáconos e proibiu o casamento de membros do clero, deixando, certamente, um reforço na tradição da Igreja que dura até hoje. Outro ponto de destaque de sua administração foi o combate a heresias, condenou várias das doutrinas que pregavam caminhos diferentes para o paraíso através do cristianismo ou que reconheciam Jesus Cristo com essências diferenciadas daquelas determinadas pela Igreja Católica. Ainda que tentasse resolver tudo através do diálogo, e conseguisse em vários casos, não deixava de condenar aquilo que ia contra os preceitos da Igreja. Foi através do assunto heresia que o Papa Sirício se envolveu com a política dos reis no século IV. O Sumo Pontífice se manifestou contrariamente à condenação do Bispo Prisciliano, da Espanha, por heresia, o que o levaria à pena de morte. Criou-se um momento de tensão com o Imperador Magno Máximo, já que o Papa declarou-se publicamente contra o veredito e defendeu o povo contra a tirania imperial. Após seus 15 anos de Pontificado, faleceu no dia 26 de novembro de 399, aos 65 anos de idade.

Hipona (hoje Annaba) foi uma antiga cidade situada onde hoje se encontra o território da Argélia. No outono de 393, os Bispos do Norte da África foram convocados à sede do episcopado, sob a liderança do Bispo local, Valério, do Primaz de Cartago, Aurélio, e do então presbítero Agostinho, que assumiria o Bispado três anos depois.

O Papa Sirício, embora diligente na administração da Igreja, não participou deste sínodo regional. No entanto, as deliberações finais foram expressamente submetidas a ele, nestes termos: “Ad confirmationem huius canonis, Ecclesia trans mare consultatur” (Sobre a confirmação deste cânon, se consultará a Igreja do outro lado do mar, ou seja, Roma). Sob seu pontificado e ainda sobre a confirmação da lista dos livros inspirados, foram realizados outros dois sínodos regionais, um em 394 e outro em 397. O Papa Sirício, por sua vez, deu particular atenção à observância do cânon pelo clero.

 

38 . 1 - Santo Agostinho de Hipona

               Aurélio Agostinho de Hipona, Tagaste, 13 de novembro de 354 – Hipona, 28 de agosto de 430), conhecido universalmente como Santo Agostinho, foi um dos mais importantes teólogos e filósofos nos primeiros séculos do cristianismo, cujas obras foram muito influentes no desenvolvimento do cristianismo e filosofia ocidental. Foi Bispo de Hipona, uma cidade na província romana da África. Escrevendo na era patrística, é amplamente considerado como o mais importante dos Padres da Igreja no ocidente. Suas obras-primas são De Civitate Dei (A Cidade de Deus) e "Confissões", ambas ainda muito estudadas atualmente. De acordo com Jerônimo, seu contemporâneo, Agostinho "restabeleceu a antiga fé". Em seus primeiros anos, Agostinho foi muito influenciado pelo maniqueísmo e, logo depois, pelo neoplatonismo de Plotino. Depois de se converter ao cristianismo e aceitar o batismo em 387, desenvolveu uma abordagem original à filosofia e teologia, acomodando uma variedade de métodos e perspectivas de uma maneira até então desconhecida.

               Acreditando que a graça de Cristo era indispensável para a liberdade humana, ajudou a formular a doutrina do pecado original e deu contribuições semanais ao desenvolvimento da doutrina da guerra justa. Quando o Império Romano do Ocidente começou a ruir, Agostinho desenvolveu o conceito de "Igreja Católica" como uma "Cidade de Deus" espiritual (na obra homônima) distinta da cidade terrena e material de mesmo nome. "A Cidade de Deus" estava também intimamente ligada ao segmento da Igreja que aderiu ao conceito da Trindade como postulado pelo Concílio de Niceia e pelo Concílio de Constantinopla. Na Igreja Católica e na Comunhão Anglicana, Agostinho é venerado como um Santo, um proeminente Doutor da Igreja e o Patrono dos agostinianos. Sua festa é celebrada no dia de sua morte, 28 de agosto. Muitos protestantes, especialmente os calvinistas, consideram Agostinho como um dos "pais teológicos" da Reforma Protestante por causa de suas doutrinas sobre a salvação e graça divina. Na Igreja Ortodoxa, algumas de suas doutrinas não são aceitas, como a da cláusula Filioque, do pecado original e do monergismo. Ainda assim, apesar destas controvérsias, é considerado também um Santo, sendo comemorado como "Beato Agostinho" no dia 15 de junho. Outro sim, numerosos autores ortodoxos advogaram a favor de suas obras e de sua personalidade, como Genádio II de Constantinopla e Seraphim Rose. No verão de 386, depois de ouvir a história da vida de Santo Antão do Deserto por Placiano e seus amigos, Agostinho se converteu. Como ele próprio contou depois, a conversão foi incitada por uma voz infantil que ele ouviu pedindo-lhe para "tomar e ler", o que ele entendeu ser um comando divino para abrir a Bíblia, abri-la e ler a primeira coisa que encontrasse. Agostinho abriu na Epístola aos Romanos num trecho conhecido como "transformação dos crentes", os capítulos 12 ao 15, no qual Paulo delineia como o Evangelho transforma os crentes e seu comportamento. Ambrósio batizou Agostinho e seu filho Adeodato na Vigília da Páscoa de 387 em Mediolano. Um ano depois, em 388, Agostinho completou sua apologia "Sobre a Santidade da Igreja Católica". No mesmo ano, a família decidiu voltar para a África, mas Mônica morreu em Óstia, perto de Roma, quando se preparava para embarcar. Quando chegaram, passaram a viver aristocraticamente com os rendimentos auferidos pelas extensivas propriedades da família na região. Logo depois, Adeotato também faleceu e Agostinho, entristecido, vendeu todo seu patrimônio e deu o dinheiro aos pobres, mantendo apenas a casa da família, que ele converteu numa fundação monástica para si e alguns amigos. Em 391, foi ordenado sacerdote em Hipona e rapidamente tornou-se um pregador muito famoso - há mais de 350 sermões de Agostinho que se acredita serem autênticos - e um ardoroso adversário do maniqueísmo, sua religião da juventude. Em 395, foi nomeado Bispo coadjutor de Hipona e, logo depois, assumiu o trono episcopal, motivo pelo qual é conhecido como "Agostinho de Hipona", uma posição que manteve até sua morte em 430. Suas "Confissões" foram escritas entre 397 e 398, ao passo que "A Cidade de Deus" foi escrita para consolar os cristãos logo depois do traumático saque de Roma pelos visigodos em 410. Neste período, Agostinho trabalhou incansavelmente para converter o povo de Hipona. Apesar de ter deixado o mosteiro, continuou a levar uma vida asceta na residência episcopal. Para seus companheiros, deixou uma regula que fez com que, muito depois, fosse considerado como o "padroeiro do clero regular". Grande parte do que sabemos sobre os anos finais de Agostinho foi relatada por seu amigo Possídio, o Bispo de Calama (moderna Guelma, na Argélia), em sua obra Sancti Augustini Vita. Possídio admirava Agostinho como uma pessoa intelectualmente poderosa e de retórica arrebatadora que aproveitava todas as oportunidades para defender o cristianismo contra seus detratores. Ele preservou também os traços pessoais de Agostinho em detalhes, revelando um indivíduo que comia pouco, trabalhava muito, desprezava fofocas, evitava as tentações da carne e era muito prudente na administração financeira de sua sé. Na primavera de 430, os vândalos, uma tribo germânica convertida ao arianismo, invadiram a África romana e cercaram Hipona. Agostinho, porém, já estava irremediavelmente doente. De acordo com Possídio, um dos poucos milagres atribuídos a ele, a cura de um doente, deu-se durante o cerco. Ainda segundo ele, Agostinho passou seus últimos dias em oração e penitência, com salmos pendurados nas paredes de seu quarto para que pudesse lê-los. Antes de morrer, ordenou que a biblioteca da igreja de Hipona e todos os seus livros fossem cuidadosamente preservados, e faleceu finalmente em 28 de agosto de 430. Logo em seguida, os vândalos desistiram do cerco, mas retornaram não muito depois e incendiaram a cidade, destruindo tudo menos a catedral e a biblioteca de Agostinho. Agostinho foi canonizado por aclamação popular e foi depois reconhecido como Doutor da Igreja em 1298 pelo Papa Bonifácio VIII.

 

39º - Santo Anastácio I - 399 - 401

Em 400, a tradução da Bíblia em latim da Vulgata de Jerônimo é publicada, declarada autêntica pelo Concílio de Trento. Este permaneceu o texto padrão no mundo católico até o Renascimento.

               Anastácio, nasceu em Roma. Combateu com energia a heresia donatista nas províncias no Norte da África. Na base dessa heresia, estava o rigorismo defendido pelo Bispo Donato (donde o nome “donatismo”), Bispo da Numídia, no Norte da África. Dentre tantas ações, Papa Anastácio é mais conhecido pela controvérsia contra o origenismo, isto é, ele foi totalmente contrário à posição defendida por alguns partidários de Orígenes – um grande escritor eclesiástico – segundo a qual, as almas seriam eternas e os demônios poderiam também se converter e alcançar a salvação, tornando o inferno algo obsoleto. Praticamente o que se sabe sobre o Papa Santo Anastácio vem do conteúdo das cartas de São Jerônimo. São Jerônimo chegou a tecer grandes elogios à Anastácio. Num de seus discursos, Jerônimo afirma que se o Papa morreu cedo, foi por respeito da Providência, pois assim o Papa foi poupado de assistir ao trágico espetáculo da queda de Roma, por obra do bárbaro Alarico. A história guarda também a memória da amizade que Papa Anastácio nutria por São Paulino, Bispo de Nola: entre os dois houve uma intensa troca de cartas. Eleito em 27 de novembro de 399, conciliou os cismas entre Roma e a Igreja de Antioquia. Combateu tenazmente os seguidores de costumes imorais, que estavam convencidos de que também na matéria se escondia a divindade. Deixou como principal legado para a liturgia católica a obrigação dos sacerdotes permanecerem de pé durante a leitura do Evangelho. Morreu em 19 de dezembro, em Roma e foi sucedido por Santo Inocêncio I. Segundo o Martirológio Romano, pouco depois de sua morte Roma foi tomada e saqueada pelos Godos, um povo germânico originário das regiões meridionais da Escandinávia, que se distinguiam por usarem escudos redondos e espadas curtas e obedecerem fielmente a seus reis.

 

40º - Santo Inocêncio I – 401 - 417

               O Papa Inocêncio I liderou a Igreja Católica no início do século V e, em seu pontificado, apoiou, o mais tarde designado São Jerônimo à terminar a revisão da tradução latina da Bíblia, que ficou pronta em 404. Este foi um evento importante de seu pontificado porque foi no começo daquele século que a Bíblia foi elaborada como livro sagrado para os cristãos. Em função de sua defesa das prerrogativas da Sé Apostólica, o Papa Inocêncio I tentou unificar a Igreja do Ocidente em torno da práxis romana, estabelecendo, então, a observância dos ritos romanos, o catálogo dos livros canônicos e as regras monásticas. Assim, reforçava a supremacia da Igreja de Roma sobre as questões de doutrina e fé. Naturalmente, combateu as heresias de sua época, com destaque para a condenação de Pelágio da Britânia, um monge que foi acusado por seus adversários de negar o pecado original, de negar que a graça de Deus é essencial para a salvação e de defender que o homem é capaz de decidir o seu futuro. Por outro lado, foi defensor de São João Crisóstomo, considerado um dos Doutores da Igreja Católica. O Papa Inocêncio I também enfrentou problemas políticos durante seu pontificado, como a invasão de Roma pelos visigodos. Sob a liderança de Alarico I, o povo considerado bárbaro invadiu e saqueou a cidade de Roma. No entanto, a Igreja conseguiu se defender. Por fim, no relacionamento benéfico com o império, Inocêncio I conseguiu convencer o Imperador Flávio Honório a proibir as lutas de gladiadores. Estes foram apenas dois eventos trágicos de seu reinado, tendo em vista que as lutas de gladiadores eram muito populares na época. Faleceu aos 67 anos de idade no dia 12 de março de 417, após 16 anos de pontificado.

               João Crisóstomo (Antioquia, c. 347 – Comana Pôntica, 14 de setembro de 407) foi um Arcebispo de Constantinopla e um dos mais importantes patronos do cristianismo primitivo. É conhecido por suas poderosas homilias, por sua habilidade em oratória, por sua denúncia dos abusos cometidos por líderes políticos e eclesiásticos de sua época, por sua "Divina Liturgia" e por suas práticas ascetas. Chrysostomos, em português Crisóstomo, significa "da boca de ouro" em língua grega, que lhe foi dado por conta de sua lendária eloquência. O título apareceu pela primeira vez na "Constituição" do Papa Vigílio em 553, sendo João Crisóstomo considerado o maior pregador cristão da história.

 

41º - São Zósimo – 417 - 418

               Nascido em Masuraca, na Grécia, no ano 370, Zósimo era filho de Abrão e acredita-se que sua família era de origem judaica. Viveu uma época de acomodação para a Igreja Católica, pois a religião já havia sido declarada a oficial no Império Romano e, então, conquistava mais poder e influência na sociedade. Ainda assim, opositores e perseguidores continuavam existindo e, eventualmente, causando grandes perturbações. Zósimo seria o sucessor do longo pontificado do Papa Inocêncio I. O Papa Zósimo assumiu a liderança da Igreja Católica no dia 18 de março de 417, quando tinha 47 anos de idade. Seu pontificado foi breve, porém muito atormentado. Durante pouco mais de um ano como Papa, Zósimo estabeleceu regras rígidas para o catolicismo romano. Proibiu que filhos ilegítimos fossem ordenados e reivindicou o poder da Igreja contra interferências alheias. O curto pontificado de Zósimo teve muito trabalho enfrentando o pelagianismo, um comportamento considerado herético na época por disseminar a ideia de que as pessoas podiam se salvar sem as graças de Deus. Com o intuito de unir a Igreja, o Papa Zósimo criou vicariatos no Ocidente, mas não obteve muito sucesso em função da incompetência dos Bispos indicados. O Sumo Pontífice publicou uma epístola decretando a superioridade da Sede Apostólica e condenando os que apelavam ao poder civil. Por fim, declarou que somente os Bispos e o próprio Papa tinham autoridade para deliberações sobre assuntos eclesiásticos. O Papa Zósimo faleceu em Roma no dia 26 de dezembro de 418, aos 48 anos de idade. Foi um breve pontificado que durou pouco mais de um ano, embora muito turbulento. Porém Zósimo deixou uma situação instável com sua morte. Havia uma parte do clero que estava insatisfeita e que decidiu eleger um antipapa de nome Eulálio para se opor ao Papa legítimo. A existência de dois líderes criou dois grupos de oposição que entraram em conflito. Bonifácio I chegou a ser expulso de Roma, mas o comportamento do antipapa acabou desagradando o Imperador Romano Honório, que interferiu diretamente na resolução do cisma dando ordem e condição para que o Papa Bonifácio I assumisse seu posto legítimo. Todavia, a situação abriu precedente para um longo período de ingerência civil na escolha do Papa.

 

42º - São Bonifácio I - 418 – 422

               Nascido em Roma no ano 375, Bonifácio era filho de um presbítero chamado Jocundo. Sua vida foi sempre atrelada à religião, o que resultou em sua ordenação pelo Papa Damásio I. Bonifácio esteve sempre muito próximo ao alto poder da Igreja Católica, desde sua ordenação. Mais tarde, ele serviu ao Papa Inocêncio I em Constantinopla, esboçando um caminho para o sumo pontificado através de importantes ligações políticas no interior da Igreja. Quando o Papa Zósimo faleceu, no ano 418, Bonifácio tinha 43 e foi eleito para ser o sucessor no dia 28 de dezembro do mesmo ano. Não havia, contudo, um consenso em torno de Bonifácio para que fosse o líder da religião. Em desagrado com sua eleição, um grupo de opositores preferiu negar sua autoridade e escolher um antipapa chamado Eulálio. O Papa Bonifácio I iniciou seu papado com sérios problemas administrativos no seio da Igreja Católica. Teve de se impor e combater a figura do antipapa existente, superando os opositores de sua eleição. Defendeu a unidade eclesial e a primazia da Sé Romana. Para sua sorte, o antipapa Eulálio viveu pouco tempo como antagonista. Todavia, os dois papas coexistentes foram aconselhados a deixar Roma até que um concelho tomasse a decisão acerca da divisão. O concelho ratificou a eleição de Bonifácio e deu a Eulálio um bispado em Campânia, encerrando a questão em 419. Poucos anos depois, em 423, Eulálio faleceu. O papado de Bonifácio I foi profundamente marcado pela interferência do poder civil nas decisões da instituição religiosa, pois foi o prefeito de Roma que decidiu a disputa pelo sumo Pontificado. Esta situação impactou o restante do exercício de seu cargo e o Papa teve dificuldades para lidar com vários arcebispos e para administrar a Igreja Católica no continente africano. Ainda assim, Bonifácio I conseguiu contornar a situação e atuar de tal forma que lhe garantisse o respeito e a representatividade como autoridade máxima da Igreja. Em sua alçada, renovou a legislação religiosa feita pelo Papa Sotero, mas manteve a proibição de escravos se tornaram clérigos. O Papa Bonifácio I teve um papado curto que durou apenas quatro anos. Faleceu no dia quatro de setembro de 422.

 

43º - São Celestino I - 422 – 432

Convocou o Concílio de Éfeso que instituiu a segunda parte da Ave-Maria, ou seja "Santa Maria Mãe de Deus".

Em 431, o Concílio Ecumênico de Éfeso declara que Jesus existia como Homem e Deus simultaneamente, esclarecendo seu status na Santíssima Trindade. O significado do Credo Niceno também é declarado um texto sagrado e permanente da igreja.

               Nascido em Campânia no ano 380, Celestino era filho de Priscus e viveu sua infância em Roma. Há muito pouca informação sobre sua vida antes de se tornar Papa. Porém uma das coisas mais marcantes sobre sua vida antes de se tornar um importante religioso é que teria vivido durante um tempo em Milão na Arquidiocese de Mediolanum com aquele que viria a ser conhecido como Santo Ambrósio, um dos padres latinos e doutores da igreja. Após sua estadia em Milão, Celestino envolveu-se profundamente com o mundo religioso do catolicismo. Com o falecimento do Papa Bonifácio I, ele foi eleito para o pontificado seguinte no dia dez de setembro de 422. Como Papa, assumiu o nome de Celestino I. Os anos iniciais em que esteve no posto máximo da Igreja Católica são pouco conhecidos. Além disso, algumas das atitudes mais importantes aconteceram realmente no final de seu papado. Celestino I permaneceu por praticamente dez anos à frente da Igreja Católica. Na ocasião do Primeiro Concílio de Éfeso, em 431, ele não compareceu. Todavia enviou delegados para condenar os nestorianos, os seguidores de uma doutrina cristológica proposta pelo Patriarca de Constantinopla, Nestório, enfatizando a desunião entre as naturezas humana e divina de Jesus. Como cristão ortodoxo, Celestino I condenou também os pelagianos, seguidores de uma teologia cristã que sustentava que todo homem é responsável por sua completa salvação, ou seja, não necessitando da graça divina para isso. Celestino enviou representantes para a Irlanda com a função ampliar a obra missionária na região. Em Roma, Celestino I confrontou-se fortemente com os novacianos, os seguidores de um movimento do cristianismo primitivo que se recusavam a readmitir os cristãos que tinham negado sua fé e realizado rituais com sacrifícios aos deuses pagãos durante a perseguição aos cristãos empreendida pelo imperador Décio no ano 250. Celestino aprisionou o Bispo dos novacianos e proibiu seus cultos. Celestino I foi um Papa ortodoxo que combateu qualquer ideia questionadora à fé como estabelecida pela Igreja Católica Romana. Entrou em choque com grupos diversos e os derrotou ou os oprimiu. Aos 52 anos de idade, faleceu no dia 27 de julho de 432 e foi enterrado no cemitério de Santa Priscila. Mais tarde, seus restos mortais foram transferidos para a Basílica de Santa Prassede, onde se encontram até hoje. Foi o primeiro Papa a citar o bastão pastoral e é considerado Santo pela Igreja Católica.

               Santo Ambrósio, Aurélio Ambrósio (c. 340 – Mediolano, 4 de abril de 397), foi um Arcebispo de Mediolano (moderna Milão) que se tornou um dos mais influentes membros do clero no século IV. Foi prefeito consular da Ligúria e Emília, cuja capital era Mediolano, antes de tornar-se Bispo da cidade por aclamação popular em 374. Ambrósio era um fervoroso adversário do arianismo. Tradicionalmente atribui-se a Ambrósio a promoção do canto antifonal, um estilo no qual um lado do coro responde de forma alternada ao canto do outro, e também a composição do Veni redemptor gentium, um hino natalino. Ambrósio é um dos quatro doutores da Igreja originais e é notável por sua influência sobre o pensamento de Santo Agostinho.

 

44º - São Xisto III - 432 – 440

               Pouco se sabe sobre as origens de São Xisto III, antes de ele se tornar Papa. Sabe-se que uma das grandes marcas de seu pontificado foi a amizade com Santo Agostinho e a luta contra algumas heresias que ameaçavam o futuro da Igreja. Nisso, ele teve papel determinante. A princípio, antes de ser Papa, São Xisto assumiu uma posição de neutralidade a respeito da “doutrina” dos pelagianos e de uma controvérsia sobre isso que apareceu no sul da França. Porém, foi sabiamente advertido pelo Papa Zózimo e, com a ajuda de Santo agostinho, reconheceu seu erro. Agostinho, com efeito, combatia com toda a força a heresia pelagiana. Os dois mantinham constante contato através de cartas. A doutrina pelagiana, criada por um indivíduo de sobrenome Pelágio, negava a realidade do pecado original, bem como a fragilidade e a corrupção inerente à natureza humana. A doutrina defendia também a ideia de que o homem, por sua própria força, tinha a capacidade para não pecar, “não precisando”, assim, da graça de Deus. Logo que assumiu, começou a agir com muita firmeza e austeridade com todos aqueles que se desviavam da verdadeira Doutrina Católica. Santo Agostinho o ajudou no discernimento e na maneira de agir com relação às heresias. Assim, São Xisto III conseguiu acabar definitivamente com a doutrina pelagiana dentro da Igreja. São Xisto III também soube conduzir com prudência e sabedoria ações conciliadoras em relação ao nestorianismo, outra ideologia criada por Nestório. Esta, continha desvios acerca do verdadeiro papel da Virgem Maria na história da Salvação. O Papa Xisto III acabou com a controvérsia que estava acontecendo entre os padres João de Antioquia e outro chamado Cirilo, que era patriarca da cidade de Constantinopla. O Papa Xisto III demonstrou ainda forte autoridade papal numa disputa com um Patriarca chamado Proclo. O imperador romano do Oriente queria que a região da lliría passasse para o governo de Constantinopla. Para tanto, contava com o auxílio de Procolo. Xisto III escreveu muito e trabalhou para que a região fosse mantida sob o governo romano do Ocidente. E conseguiu. No Concílio de Éfeso, ocorrido em 431, a Virgem Maria foi proclamada Mãe de Deus. Por isso, o Papa Xisto III, depois de eleito, ampliou e enriqueceu uma Basílica que era dedicada à Santa Mãe das Neves. Esta, ficava no alto do monte Esquilino. Mais tarde ela passou a ser chamada de Basílica de Santa Maria Maior. O notável é que esta igreja é a primeira igreja do Ocidente dedicada a Nossa Senhora. Assim, os fiéis católicos receberam um maravilhoso monumento dedicado ao culto da Virgem Maria. Havia na Palestina algumas tábuas guardadas e veneradas como tendo pertencido à manjedoura que acolheu o salvador quando ele nasceu em Belém. O Papa Xisto III pediu que essas relíquias fossem trasladadas para a mesma Igreja em Roma. Assim, ele deu origem à tradição do presépio que, mais tarde, São Francisco aprimorou. Xisto III também Introduziu na cultura ocidental a Missa do Galo, que passou a ser celebrada na noite do Natal. Esta missa já era celebrada na cidade de Jerusalém, na Terra Santa, desde os primórdios da Igreja. Durante todo o pontificado, o Papa Xisto III realizou uma enorme atividade na área da construção. Construiu inúmeras igrejas e reformou outras tantas. Dentre elas se destaca a esplendorosa Basílica de São Lourenço, situada em Lucina, na Itália. Faleceu no dia 19 de agosto do ano 440. Antes de morrer, indicou aquele que, segundo o seu coração, deveria ser seu sucessor: Leão Magno. Este, de fato, o sucedeu e se tornou um dos Papas mais importantes para a Igreja dos primeiros séculos. A Igreja instituiu sua festa no dia 28 de março.

 

45º - São Leão I - 440 – 461

8 de outubro de 451: Conselho Ecumênico de Calcedônia é aberto. 1º de novembro de 451: O Concílio de Calcedônia, o quarto Concílio Ecumênico, é encerrado. É emitido o Credo Calcedônia, que reafirma Jesus como verdadeiro Deus e verdadeiro homem e o dogma da Virgem Maria como a Mãe de Deus. O conselho excomunga Eutiques, levando ao cisma com a Ortodoxia Oriental.

               Leão I, dito o Grande ou São Leão Magno, foi Papa entre 29 de setembro de 440 e sua morte em 10 de novembro de 461. Um aristocrata de origem italiana, Leão foi o primeiro a receber o título de "o Grande". Ele é, provavelmente, mais famoso por ter ido ao encontro de Átila, o Huno, em 452 para persuadi-lo a desistir de sua invasão da Itália. Ele é também considerado um Doutor da Igreja, lembrado teologicamente por seu "Tomo de Leão", um documento que foi fundamental durante os debates do Concílio de Calcedônia. Este concílio ecumênico, o quarto, tratou principalmente de questões cristológicas e elucidou a definição considerada ortodoxa de que Cristo é uma união hipostática de duas naturezas: humana e divina, unidas em uma única pessoa, "sem confusão e nem divisão" (diofisismo). A ele se seguiu um grande cisma entre os diofisistas e as igrejas monofisistas e miafisistas. De acordo com o "Liber Pontificalis", Leão era nativo da Toscana. Em 431, já como diácono, ocupou uma posição suficientemente importante na visão do Patriarca Cirilo de Alexandria a ponto deste escrever para ele para pedir a intervenção de Roma nas reivindicações do também Patriarca Juvenal de Jerusalém sobre a Palestina - a menos que esta carta tenha sido endereçada ao Papa Celestino I e não a Leão. Mais ou menos na mesma época, João Cassiano dedicou-lhe um tratado contra Nestório escrito a seu pedido. Mas nada mostra mais a confiança que lhe era dedicada do que ele ter sido escolhido pelo imperador para mediar a disputa entre Aécio e o cônsul Cecina Décio Aginácio Albino, as duas maiores autoridades romanas na Gália. Neste ínterim, o Papa Sisto III morreu (11 de agosto de 440) e Leão foi unanimemente eleito pelo povo para sucedê-lo. Em 29 de setembro, ele iniciou um pontificado que seria marcante para a centralização do governo da Igreja Romana.

               Leão foi muito importante para a centralização da autoridade espiritual na Igreja e na reafirmação da autoridade Papal. O bispo de Roma já era visto na época como o principal patriarca da igreja ocidental, mas muito da autoridade Papal estava, na época, delegada aos Bispos de cada diocese. Não sem enfrentar séria oposição, Leão conseguiu reafirmar sua autoridade na Gália, por exemplo. Quando Pátroclo de Arles, havia recebido do Papa Zósimo o reconhecimento como um primaz subordinado sobre toda a Igreja da Gália, um direito que foi fortemente reafirmado por seu sucessor, Hilário de Arles. Um apelo de Celidônio de Besançon deu a Leão a oportunidade de reafirmar sua autoridade sobre Hilário, que teimosamente se defendeu em Roma contra a autoridade judicial de Leão. Sentindo que a primazia de sua sé estava ameaçada, Leão apelou aos poderes seculares em busca de ajuda e conseguiu que o imperador Valentiniano III emitisse o famoso decreto de 6 de junho de 445 que reconheceu a primazia do Bispo de Roma baseando-se nos méritos de São Pedro, na dignidade da cidade e na legislação do Primeiro Concílio de Niceia. O decreto também serviu de base para a extradição, pelas mãos dos governadores provinciais, de qualquer Bispo que se recusasse a atender os chamados de Roma. Depois do decreto, Hilário se submeteu ao Papa e, durante o governo de seu sucessor, Ravênio, Leão dividiu a Arquidiocese entre Arles e Vienne (450). Para defender sua posição, além de recorrer a passagens bíblicas, Leão também descreve sua própria relação pessoal com Pedro em termos que derivam do direito romano. Ele se considera ao mesmo tempo um herdeiro (ainda que indigno) e um deputado (vicarius) de Pedro, recebedor de sua autoridade apostólica e, sendo, assim, está obrigado a seguir seu exemplo. Por um lado, Pedro se posta à sua frente como uma obrigação de como Leão deveria exercer seu cargo; por outro, Leão, como o Bispo de Roma, representa o Apóstolo, cuja autoridade ele detém. Cristo, porém, sempre aparece como fonte de toda autoridade e de toda a graça e Leão responde a ele sobre como exerce seus deveres. Pedro é, portanto, um exemplo para a relação de Leão com Cristo. Assim, o cargo de Bispo de Roma, com sua importância universal, estaria enraizado na relação especial entre Cristo e São Pedro, uma relação que, não se pode repetir; portanto, Leão depende da mediação de Pedro, de seu auxílio e exemplo para conseguir realizar adequadamente seu papel e exercer sua autoridade como Bispo de Roma, tanto na cidade quanto além dela. Em 445, Leão entrou em conflito com Dióscoro de Alexandria, sucessor de São Cirilo como Patriarca de Alexandria, insistindo que a prática eclesiástica de sua sé deveria seguir à de Roma argumentando que São Marcos, o discípulo de São Pedro e fundador da Igreja de Alexandria, não poderia ter seguido nenhuma outra tradição que não à do primeiro entre os Apóstolos. Na África, o fato da província da Mauritânia Cesariense ter se mantido parte do império e da fé nicena durante a invasão dos vândalos—o que a deixou predisposta a receber ajuda externa por causa de seu isolamento—deu a Leão uma oportunidade de afirmar sua autoridade na região, o que ele fez decisivamente, mesmo enfrentando questionamentos. Sobre a Itália, numa carta aos Bispos da Campânia, Piceno e Túscia (443), exigiu de todos a observância de todos os seus preceitos e de seus predecessores; ele também admoestou bruscamente os Bispos da Sicília (447) por terem se desviado dos costumes romanos sobre o batismo, exigindo que eles enviassem delegados a um sínodo em Roma para que aprendessem a forma apropriada. Sobre a Grécia, em decorrência da antiga divisão entre as porções ocidental e oriental do Império Romano, a Ilíria estava eclesiasticamente sujeita à Roma. O Papa Inocêncio I havia estabelecido o Arcebispo de Tessalônica como seu vigário para conter a crescente influência do Patriarca de Constantinopla na região. Numa carta de c. 446 a um dos Bispos da cidade, Anastácio, Leão admoestou-o pela forma como ele tratou um dos Arcebispos sujeitos a ele; depois de dar várias instruções sobre as funções encarregadas a ele e depois de sublinhar que certos poderes estavam reservados para o Papa, Leão escreveu: "O cuidado sobre a Igreja Universal deve convergir para o trono único de Pedro e nada, em lugar nenhum, deve se separar de sua cabeça".

               No Segundo Concílio de Éfeso, em 449, os representantes de Leão entregaram seu famoso "Tomo" ("carta" em latim), uma afirmação da fé da Igreja romana, endereçado ao arcebispo Flaviano de Constantinopla que repete, de forma muito aderente às teorias de Agostinho, as fórmulas da cristologia ocidental. O concílio não apenas não leu a carta e ignorou os protestos dos legados de Leão, como depôs Flaviano e Eusébio de Dorileia, que apelaram para Roma. Parcialmente por conta disto, este concílio jamais foi reconhecido como ecumênico e terminou depois sendo repudiado no Concílio de Calcedônia. Depois disso, Leão exigiu do imperador que um concílio ecumênico fosse realizado na Itália e, enquanto isso não acontecia, num sínodo em Roma em outubro do mesmo, repudiou todas as decisões do já infame "Latrocínio de Éfeso". Sem fazer um exame crítico de seus decretos dogmáticos, ele exigiu em suas cartas ao imperador e outras personalidades a deposição de Eutiques, acusando-o de ser maniqueísta e docético. Com a morte de Teodósio II em 450 e da mudança brusca que se seguiu no cenário político oriental, Anatólio de Constantinopla, o Patriarca seguinte, seguiu as recomendações de Leão e seu "Tomo" foi lido e reconhecido em toda parte. Depois disso, Leão não queria mais realizar um concílio, especialmente por que ele dificilmente se realizaria na Itália. Ao invés disso, ele foi convocado para uma reunião em Niceia, que foi depois mudada para Calcedônia.

               Uma ocasião perfeita para ampliar a autoridade de Roma no oriente se mostrou quando a controvérsia cristológica sobre as ideias de Eutiques se reacendeu. No início do conflito, apelou a Leão e se refugiou nele em sua condenação ao Arcebispo de Constantinopla Flaviano. Mas, ao receber um relato mais completo do próprio Flaviano, Leão passou a apoiá-lo decisivamente. O Tomo foi apresentado novamente em Calcedônia como uma solução proposta para a controvérsia cristológica que ainda grassava tanto no oriente quanto no ocidente. Desta vez ele foi lido. Os atos do concílio relatam que "Depois da leitura da citada epístola, os mais reverenciados Bispos gritaram: 'Esta é a fé dos padres, esta é a fé dos Apóstolos. Assim cremos todos, assim creem os ortodoxos. Anátema àquele não acredita. Pedro falou conosco através de Leão. Assim ensinaram os Apóstolos. Piedosamente e verdadeiramente Leão ensinou, assim ensinou Cirilo. Eterna seja a memória de Cirilo. Leão e Cirilo ensinaram o mesmo, anátema àquele que não acredita nisso. Esta é a verdadeira fé. Aqueles entre nós que são ortodoxos acreditam nisso. Esta é a fé dos padres. Porque estas coisas não foram lidas em Éfeso? Estas são as coisas que Dióscoro escondeu". Leão defendia a verdadeira divindade e a verdadeira humanidade da pessoa única e não dividida de Cristo (a chamada união hipostática) contra heresias que defendiam variações desta fórmula. Ele abordou o tema em muitos de seus sermões e, através dos anos, desenvolveu ainda mais seus conceitos originais. Uma ideia central para Leão, à volta da qual ele aprofunda e explica sua teologia, é a presença de Cristo na Igreja, mais especificamente na doutrina e na pregação da fé (Escrituras, tradição e suas interpretações), na liturgia (sacramentos e celebrações), na vida de cada fiel e da Igreja organizada, especialmente quando reunida em concílio. Apesar da aceitação do "Tomo", Leão recusou-se firmemente a confirmar as decisões disciplinares do concílio, que pareciam permitir que Constantinopla adquirisse, na prática, uma autoridade similar à de Roma, principalmente ao considerar a importância civil de uma cidade como fator determinante para sua posição eclesiástica; mas ele apoiou fortemente seus decretos dogmáticos, especialmente quando, depois da ascensão do imperador bizantino Leão I, o Trácio (457), uma possível acomodação com Eutiques parecia possível. Leão conseguiu ainda fazer com que um Patriarca imperial, Timóteo III de Alexandria, fosse eleito como Patriarca de Alexandria no lugar do copta Timóteo II Eluro depois do assassinato do ortodoxo grego Protério de Alexandria.

               Apesar de ter sido derrotado na Batalha dos Campos Cataláunicos, em 451, Átila invadiu a Itália romana no ano seguinte, saqueando importantes cidades (como Aquileia) enquanto marchava para Roma. Ele então exigiu que a irmã do imperador romano do ocidente, Valentiniano III, fosse enviada até ele com um rico dote. Para responder à ameaça, Valentiniano enviou três emissários para negociar com o invasor: Genádio Avieno, um dos cônsules de 450, Mêmio Emílio Trigécio, um ex prefeito urbano, e Leão. A maior parte dos historiadores celebra as ações de Leão, dando-lhe todo o crédito pelo sucesso da embaixada. De acordo com Próspero da Aquitânia, Átila teria ficado tão impressionado com Leão que recuou. Jordanes afirma que Átila temia o mesmo destino do rei visigótico Alarico I, que morreu logo depois de saquear Roma em 410. Paulo, o Diácono, no final do século VIII, relata que um homem enorme, vestido em trajes sacerdotais e armado com uma espada visível apenas para Átila, ameaçou ele e seu exército com a morte durante a conversa com Leão, o que compeliu o huno a atender o pedido do Papa. Infelizmente, a intercessão de Leão não conseguiu evitar que Roma fosse saqueada pelos vândalos em 455, mas as mortes e a devastação da cidade foram diminuídas por sua influência. Leão morreu em 10 de novembro de 461.

               A importância do Pontificado de Leão está em sua afirmação da jurisdição universal do Bispo de Roma, expressada em suas epístolas e em suas outras 96 orações sobreviventes. Esta tese é conhecida geralmente como a doutrina da primazia petrina: de acordo com Leão, diversos padres da Igreja e algumas interpretações das Escrituras, a Igreja foi construída a partir de Pedro, de acordo com a chamada "Confissão de Pedro" (Mateus 16:16–19). Leão foi proclamado Doutor da Igreja por Bento XIV em 1754 (Doctor Ecclesiae). As cartas e sermões de Leão refletem os muitos aspectos de sua carreira e personalidade e são fontes históricas de valor inestimável. Sua prosa rítmica, chamada de cursus leonicus, influenciou a linguagem eclesiástica por séculos. A Igreja Católica Apostólica Romana define 10 de novembro como a data da festa de São Leão e ela já aparece no Martyrologium Hieronymianum e no "Calendário" de São Vilibrordo do século VIII como dia de sua morte e admissão no céu. Sua festa já foi celebrada em Roma no dia 28 de junho, o aniversário do traslado de suas relíquias para a Basílica de São Pedro, mas, no século XII, a festa do rito galicano, celebrada em 11 de abril, entrou para o Calendário Geral Romano, que manteve a data até ser abolido em 1969. Algumas denominações vetero-católicas continuam a observar estas datas. As igrejas católicas orientais e também as igrejas ortodoxas celebram São Leão em 18 de fevereiro. Leão foi originalmente sepultado num monumento próprio. Porém, alguns anos depois de sua morte, suas relíquias foram colocadas num túmulo que continha também as relíquias dos quatro primeiros papas chamados "Leão". No século XVIII, as relíquias de Leão Magno foram separadas das dos demais e ganharam uma capela separada.

 

46º - Santo Hilário - 461 – 468

               Nascido na Sardenha, Itália, em 415, Hilário inclinou-se à vida religiosa. Não se conhece muito sobre sua vida antes de sua carreira eclesiástica, mas como membro da Igreja foi um religioso de destaque. Hilário foi o sucessor do Papa Leão I, que faleceu em 461. No dia 19 de novembro do mesmo ano, o conclave decidiu por Hilário para ser o novo Supremo Pontífice. Ainda antes de se tornar Papa, Hilário era muito próximo de Leão I e seu homem de confiança, chegou, inclusive, a representar o próprio Papa no Concílio de Éfeso demonstrando oposição ao monofisismo e lutando pelos direitos da Igreja. O Papa Hilário deu continuidade às suas posições políticas e de seu antecessor durante seu papado. Confirmou três concílios e defendeu a supremacia da Igreja Católica em um momento que Bispos da Espanha e da Gália semeavam tendências autônomas. Como parte desse embate, criou um vicariato na Espanha que o ajudou a demonstrar a supremacia da Igreja e também formar mais religiosos. Neste sentido, foram criados vários conventos em Roma. O Papa Hilário acreditava na supremacia e no poder cultural da Igreja Católica. Acreditava que era preciso formar religiosos e formar com qualidade. Ele estabeleceu que a formação do sacerdote deveria ser dotada de profunda cultura e não permitiu mais que Pontífices e Bispos escolhessem seus sucessores. Hilário foi fundamental para a formação do aparato cultural da Igreja Católica, interferiu na organização litúrgica e contribuiu com o patrimônio da Basílica de Latrão. Foi responsável pela formulação da dupla natureza de Jesus Cristo quando escreveu que este nasceu de Deus e se fez homem ao assumir um corpo. Severo e religioso convicto do poder cultural do catolicismo, Hilário exerceu seu papado durante quase sete anos. Faleceu no dia 29 de fevereiro de 468 em Roma e foi enterrado na igreja São Lourenço fora dos Muros.

 

47º - São Simplício - 468 - 483

               Nascido em Tivoli, na Itália, no ano 430, Simplício era um amante das artes, homem muito dedicado à vida religiosa e influente nos bastidores da Igreja. Com o falecimento do Papa Hilário em 468, foi eleito para o posto de Sumo Pontífice no dia três de abril do mesmo ano, quando tinha 38 anos de idade. O pontificado de Simplício enfrentou muito mais problemas internos na Igreja do que externos. Em sua época, o cristianismo já havia se tornado a religião oficial do Império Romano e desfrutava de notória influência na política. Desde o imperador Constantino I, a Igreja Católica gozava de paz, as perseguições aos cristãos haviam cessado e os monumentos do catolicismo proliferavam, assim como seu poder. Toda essa situação transferiu para o interior da Igreja alguns embates. Núcleos eclesiásticos passaram a disputar o poder no interior da instituição religiosa, causando conflitos e rompimentos. O Papa Simplício teve que conviver com um grande cisma da Igreja Católica que resultaria na fundação das igrejas da Armênia, da Síria e do Egito. O cristianismo fragmentava-se em diferentes instituições. O papado de Simplício apresentou um relacionamento muito tenso também com a igreja de Constantinopla. O Papa tentou interver em algumas situações e nomeações da igreja no Oriente, o que só ampliou o descontentamento e a instabilidade na relação entre as partes. Crise foi sem dúvida o teor do papado de Simplício. Além do cisma, da fundação de novas igrejas e da divergência com a igreja do Oriente, o oitavo ano de atuação do Papa vivenciou a queda do Império Romano do Ocidente, um desastre para um dos maiores impérios da história. Apesar de todos esses problemas que são administrativos, mas em diferentes esferas, o Papa Simplício não deixou de praticar atos de caridade e generosidade. As complicações que se abateram sobre a Igreja Católica e o Império Romano gerou uma legião de miseráveis até em Constantinopla. Um grande número de pessoas pobres e desamparadas que necessitavam de auxílio para sobreviver. O Papa Simplício encarregou-se de organizar e distribuir esmolas aos peregrinos e às novas igrejas, atendendo com caridade os desvalidos. Foi atuante no serviço social e também na atividade pastoral da Igreja Católica. Veio a faleceu aos 53 anos de idade no dia dez de março de 483, após um papado de quase 13 anos. Foi enterrado na Basílica de São Pedro.

 

FIM DO IMPÉRIO ROMANO DO OCIDENTE -  ANO 476

 

48º - São Félix III - 483 - 492

               Nascido na Itália no ano 440, a vida religiosa de Félix antes de se tornar Papa não é muito conhecida. Sabe-se apenas que era proveniente de uma família nobre de nome Anicia composta por senadores de Roma, ou seja, imagina-se que tivesse respaldo de grande influência nas questões políticas e religiosas. No entanto, deve ter conseguido expandir suas influências sabiamente, pois foi indicado para o posto de Papa por Odoacro, rei dos hérulos com atuação fundamental na queda do Império Romano do Ocidente. Com o falecimento do Papa Simplício, em 483, foi eleito o Papa Félix III no dia 13 de março do mesmo ano. Seu papado dedicou-se a estabelecer a paz no Oriente e combater heresias do cristianismo na época. A luta pela purificação da doutrina envolveu um combate com Eutiques, um monge de Constantinopla que fundamentava o monofisismo. Seus seguidores acreditavam que Jesus Cristo era dotado de apenas uma natureza, a divina. A ideia se contrapunha ao que pregava a Igreja do Ocidente, de que Jesus Cristo era dotado de uma natureza divina e de uma humana, e por isso era considerada herética. Esta tensão realmente incomodava os cristãos romanos da época, que viviam em sérias disputas pela imposição de sua doutrina. O debate criou sérios problemas com o Patriarcado de Constantinopla. As querelas doutrinárias com o Oriente começaram antes ainda do papado de Félix III. Um ano antes de sua eleição, o imperador do Oriente, Zenão, promulgou um documento que parecia defender ou favorecer o monofisismo. No entanto, a Igreja Católica romana havia condenado tal doutrina no Concílio de Calcedônia realizado em 451. Quando assumiu o posto de Sumo Pontífice, Félix III enviou embaixadores a Constantinopla para discutir com o patriarca os motivos e os fins do documento. Para insatisfação do Papa, o Patriarca Acácio se recusou a abrir mão do que havia ratificado no documento e supostamente ainda tentou corromper os embaixadores. A reação foi enfática, Acácio foi excomungado, criando, assim, sérias desavenças entre Roma e Constantinopla. A confusão que se criou em torno de disputas doutrinárias gerou um cisma e um ambiente de tensão com a Igreja oriental. O imperador Zenão convenceu o rei dos Ostrogodos, Teodorico, a lutar contra Odoacro, amigo de Félix e quem o havia indicado para Papa. O embate resultou na vitória de Teodorico, que ficou com o título de rei da Itália. Nesse contexto, contudo, nem Zenão nem o Papa chegaram a vivenciar seu desfecho, ambos faleceram em 491. O papado de oito anos de Félix III chegou ao fim no dia primeiro de março de 491. O Papa está atrelado a algumas curiosidades. Por exemplo, Félix III teve filhos e um deles seria pai do conhecido São Gregório Magno. Outra curiosidade é que Félix III é o único Papa enterrado na Basílica de São Paulo Extramuros.

 

49º - São Gelásio I - 492 - 496

               Nascido na África no ano 410, Gelásio era filho de um humilde ferreiro que sempre viveu na pobreza e amou os pobres. Foi um homem singular em sua época. Na ocasião, a Igreja Católica já havia conquistado grande espaço e influência no Império Romano. A religião já havia se tornado a oficial entre os romanos e a Bíblia já havia sido definida quanto ao seu conteúdo. Gelásio traçou um caminho religioso por uma longa vida. Com o falecimento do Papa Félix III, Gelásio foi eleito no dia primeiro de março de 492 para ser seu sucessor, já aos 82 anos de idade. O Papa Gelásio I foi singular, inicialmente, pela idade que tinha quando assumiu o papado. E em segundo lugar porque era de origem africana. Até hoje, são raros os Papas não europeus. Como líder da Igreja Católica foi combatente de doutrinas que considerava heréticas. Era contrário ao pelagianismo, ao maniqueísmo e ao arianismo. A primeira delas era uma doutrina teológica cristã atribuída a Pelágio da Bretanha que sustentava que todo homem era responsável pela sua própria salvação, não necessitando da graça divina. Ideia que feria diretamente os interesses da Igreja Católica. O maniqueísmo era uma filosofia sincrética e dualista fundada por Maniqueu que dividia o mundo entre bom e mau. O bom era o espírito e o mau era a matéria. A ideologia conquistou muitos seguidores e, por isso, foi considerada herética pela Igreja Católica. Por fim, o arianismo era uma visão cristológica sustentada pelos seguidores de Arius que negava a existência da consubstancialidade entre Jesus e Deus, ou seja, negava que os dois possuíssem a mesma essência. O Papa Gelásio I foi o primeiro a efetuar a distinção entre poder temporal dos imperadores e poder espiritual dos Papas, colocando os Bispos em posição superior. Assim, um Papa não poderia ser julgado por ninguém. A partir dele surgiu uma norma eclesiástica que durou até a Idade Moderna chamada de Infabilidade Papal. Também desenvolveu um grande trabalho de renovação litúrgica. Organizou e presidiu o sínodo de 494, no qual saiu aprovada a grande renovação litúrgica da Igreja. Assim, ele instituiu o Sacramentário Gelasiano, para uniformizar as funções e ritos das várias igrejas. Trata-se do decreto que, levando o seu nome, contém cerca de cinquenta prefácios litúrgicos, uma coletânea de orações para recitar durante a missa. Atualmente, esse e os outros decretos que assinou fazem parte do acervo do Museu Britânico. O Papa Gelásio I também ratificou os livros canônicos e apócrifos aprovados pela Igreja Católica. O papado de Gelásio I durou pouco mais de quatro anos, e faleceu no dia 21 de novembro de 496, aos 86 anos de idade.

 

50º - Anastácio II - 496 - 498

               Nascido em Roma no ano 445, Anastácio estava inserido em uma nova e atraente realidade para a Igreja Católica. Naquele mesmo século, a religião havia finalmente alcançado a plenitude em Roma, pois fora declarada religião oficial do Império Romano. Após muitos anos de perseguição de seus seguidores, os cristãos não conviviam mais com o risco constante de martírio ou execuções causadas por imperadores pagãos. Desde Constantino, o cristianismo assumiu um novo status e seus fiéis passaram a se locomover com mais tranquilidade dentro do império. No interior da Igreja Católica, no entanto, havia enorme desordem que persistiria por muitos séculos. Clérigos e nobres brigavam constantemente pelo poder, Papas eram acusados de heresias e golpes eram tramados por todos os lados. Anastácio, que dedicara toda sua vida à religiosidade, não escaparia dessa realidade. Aos 51 anos de idade ele foi eleito para o cargo máximo da Igreja Católica, sucedendo o Papa Gelásio I. Anastácio II logo recebeu acusações e entrou no jogo de tramas pelo poder que pairava sobre a instituição religiosa. Quando o Papa acolheu o diácono Fotino de Tessalônica em Roma ambos foram acusados de heresia. Os dois foram acusados de defender que o Espírito Santo não precedia o Pai e de que o Pai era maior que o Filho. Essa situação causou enorme tormenta ao seu papado, uma acusação que teve de superar rapidamente, ainda que paliativamente, para que não perdesse seu posto. Mas o que ocorreu de fato foi que o Papa Anastácio II demonstrou sua afeição por escândalos, pois outra atitude sua, logo em seguida, causaria rumores de descontentamento. O Papa tentou acabar com a excomunhão de Acácio, Bispo de Constantinopla, ao mesmo tempo em que negociava com Anastácio I, Imperador do Oriente, para restaurar a unidade da Igreja. A situação era, na verdade, muito confusa. Anastácio I era favorável ao monofisismo, uma doutrina cristã considerada herética pela Igreja Católica, e o Papa não deixava também de discordar das teorias de Acácio que o levaram à excomunhão. Ou seja, o Papa não demonstrava coerência e tampouco firmeza para conduzir seu pontificado e os caminhos da Igreja Católica. E isso não foi tudo, ainda interferiu na conversão de Clóvis I, Rei dos Francos, e de seu povo, demonstrando, mais uma vez, incapacidade para as responsabilidades que possuía. Por todos esses aspectos, o Papa Anastácio II não era querido pelo povo e nem mesmo respeitado por seus pares. Durante seu curto papado de quase dois anos, se intrometeu em questões com as quais não sabia lidar. Suas ações erradas e mesmo inocentes demonstraram toda sua fraqueza como líder para solucionar as questões da Igreja Católica, como o cisma com o Oriente. Quando faleceu aos 53 anos de idade, no dia 16 de novembro de 498, sua morte foi considerada uma punição divina.

 

51º - São Símaco - 498 - 514

               Papa São Símaco, Sardenha, data de nascimento desconhecida - Roma, 19 de julho de 514. Foi Papa de 22 de novembro de 498 até a data de sua morte. Símaco é venerado como um Santo na Igreja Católica. Ele era nativo de Sardenha e seu pai era chamado Fortunato. Símaco foi batizado em Roma e logo se tornou parte do clero de Roma, sendo ordenado diácono. Imediatamente após a morte do Papa Anastácio II, Símaco foi eleito seu sucessor pela maioria do clero romano em 22 de Novembro de 498. A eleição foi aprovada por uma parte do senado romano e ele foi consagrado Papa.

               Posteriormente uma minoria do clero e do senado, apoiados pelo imperador bizantino Anastácio I Dicoro, reuniram-se na Basílica de Santa Maria Maior e elegeu Lourenço como antipapa. Ambas as partes concordaram que os dois candidatos deviam comparecer à Ravena para que o rei Teodorico, o governante da Itália, decidisse qual de ambos era legítimo, e respeitassem sua decisão. Teodorico se pronunciou a favor de Símaco, baseando-se no fato de que ele foi eleito primeiro e pela maioria do clero, Lourenço se submeteu à decisão. Em um sínodo realizado em Roma, à 1 de Março de 499, Símaco foi universalmente reconhecido, e transferiu Lourenço para a Diocese de Nocera na Campânia. No entanto, o partido do imperador bizantino Anastásio, em 501, apelou para Teodorico contra o Papa, acusando-o de heresia em questões relacionadas à celebração da Páscoa. Teodorico convocou o Papa Símaco em Rimini, lá Símaco refutou o conteúdo da acusação e, se recusou a reconhecer o rei como seu juiz em questões de ortodoxia, retornando para casa. Seus adversários o acusaram de simonia e solicitaram novamente que o rei convocasse um sínodo para investigar as denúncias, nomeando um visitante para ir à Roma. Símaco concordou com a convocação de um sínodo, mas ele e seus adeptos protestaram contra o envio de um visitante. Teodorico no entanto, enviou como visitante o Bispo Pedro de Uso, para Roma e, contrariamente às ordens do rei, tomou partido dos adeptos de Lourenço, de modo que Teodorico posteriormente o demitiu. Em 502, o sínodo reuniu-se na Basílica de Júlio (Santa Maria in Trastevere). O Papa declarou que o sínodo foi convocado com o seu consentimento e que ele estava pronto para responder as acusações, antes disso, o visitante foi removido e o Papa foi restabelecido como o administrador da Igreja. A maioria dos Bispos concordaram com essa decisão e enviaram uma embaixada ao rei exigindo a execução destas condições. Teodorico no entanto, se recusou, e exigiu, em primeiro lugar, uma investigação das acusações contra o Papa. A segunda sessão do sínodo realizou-se em 1 de Setembro de 502, no Basílica Sessoriana (Santa Cruz em Jerusalém). Quando Símaco se dirigiu ao local para se defender ele foi atacado por seus adversários e maltratado, escapando com grande dificuldade, voltou a Basílica de São Pedro; diversos padres que estavam com ele foram mortos ou gravemente feridos. Os godos enviados por Teodorico prometeram-lhe uma escolta de confiança, mas o Papa agora, se recusou a comparecer perante a sínodo, embora tenha sido convidado três vezes. Consequentemente, os Bispos declararam na terceira sessão, realizada em meados de setembro, que eles não poderiam julgar o Papa, porque não havia precedentes que mostrassem que um Papa havia sido submetido ao julgamento de outros Bispos. Eles convidaram o clero de Lourenço para se apresentar ao Papa, e solicitaram ao rei permitir que os Bispos retornassem às suas dioceses. Porém os partidistas de Lourenço exigiram a convocação de uma quarta sessão para por fim a questão definitivamente, que se reuniu em 23 de Outubro de 502; nesta sessão, foi reconhecido que só Deus pode julgar o Papa, que Símaco tinha o direito ao pleno exercício de seu episcopado; e quem não o obedecesse devia ser punido. A decisão foi assinada por setenta e cinco Bispos. Muitos bispos voltaram para suas dioceses, porém alguns, se reuniram com outros padres na Basílica de São Pedro para uma quinta sessão sob a presidência de Símaco em 6 de Novembro de 502 sobre as propriedades da Igreja. Símaco também estabeleceu que ficaria proibido procurar votos para o futuro pontífice e que na falta de regulamentar a sucessão, seria eleito quem tivesse os votos de todo o clero, ou da maioria. Estas medidas foram fundamentais para deixar a disputa sucessória apenas para o clero e acabar com tumultos. Teodorico, não satisfeito com a decisão do sínodo, embora a maioria do episcopado italiano apoiava o legítimo Papa, ordenou que Lourenço fosse novamente para Roma. Ele residia no Palácio de Latrão, sob controle de seus adeptos, enquanto Símaco residia próximo a Basílica de São Pedro. O cisma continuou durante quatro anos, durante os quais ambas as partes, disputaram ferozmente em Roma. Posteriormente Teodorico ficou contra o partido de Lourenço, devido a seu apoio a Constantinopla. Ele ordenou que os senadores reconhecessem Símaco como Papa. Lourenço foi obrigado a sair de Roma, e retirou-se para uma fazenda pertencente ao senador Festo, seu protetor. Apenas uma pequena parte do clero ainda apoiava Lourenço e se recusou a reconhecer Símaco como Papa, posteriormente esta facção reconciliou-se com o Papa Hormisda, sucessor de Símaco.

               Símaco zelosamente defendeu os partidários da ortodoxia durante os distúrbios do cisma acaciano. Ele defendeu, porém sem sucesso, a reconciliação entre católicos e monofisistas em uma carta ao Imperador Anastácio I. Posteriormente, muitos Bispos orientais perseguidos se dirigiram ao Papa com uma confissão de fé. Em uma carta datada de 8 de Outubro de 512, dirigida ao Bispos da Ilíria, o Papa alertou o clero de que sua província que não devia entrar em comunhão com hereges. Logo após o início de seu pontificado, Símaco se interpôs na disputa entre os Arcebispos de Arles e Vienne quanto aos limites das suas respectivas jurisdições. Ele anulou o decreto emitido pelo Papa Anastácio II em favor do Arcebispo de Vienne e em 6 de Novembro de 513 confirmou os direitos do Arcebispo metropolitano Cesário de Arles, como haviam sido definidos pelo Papa Leão I. Além disso, ele concedeu a Cesário o privilégio de usar o pálio. Numa carta de 11 de Junho de 514, nomeou Cesário para representar os interesses da Igreja tanto na Gália quanto na Hispânia e para convocar sínodos. Na cidade de Roma, Símaco construiu a Basílica de Santa Inês na Via Aurélia, adornou a Basílica de São Pedro, e reconstruiu a Basílica dos Santos. Reformou as catacumbas de Jordani na Via Salária. Ele também construiu asilos para os pobres perto das três igrejas de São Pedro, São Paulo, e outros fora das muralhas da cidade. O Papa contribuiu com grandes somas para o apoio dos Bispos na África que foram perseguidos pelos vândalos seguidores do arianismo. Libertou todos os escravos de Roma, também ajudou os moradores das províncias da Itália que sofreram com a invasão dos bárbaros. Após sua morte, ele foi enterrado na Basílica de São Pedro.

 

51 . 1 - São Bento

               São Bento de Núrsia, nascido Benedito da Nórcia (Nórcia, Reino Ostrogótico, c. 480 – Abadia de Monte Cassino, 21 de março de 547) foi um monge, ao qual é atribuída a organização das atividades da vida monástica. A Ordem de São Bento ou Ordem dos Beneditinos, uma das maiores ordens monásticas do mundo, recebe esse nome em homenagem a ele, bem como por seguir a regra proposta por ele. Embora não possa ser declarado fundador da Ordem dos Beneditinos, ele participou da fundação de mosteiros que adotaram essa denominação. Foi o criador da Regra de São Bento, um dos mais importantes e utilizados regulamentos de vida monástica, inspiração de muitas outras comunidades religiosas. Era irmão gêmeo de Santa Escolástica. O Papa Paulo VI designou-o Patrono da Europa em 1964, sendo também Patrono da Alemanha. É venerado não apenas por católicos, como também por ortodoxos e anglicanos. Fundou a Abadia de Monte Cassino, na Itália, destruída durante a Segunda Guerra Mundial e posteriormente restaurada. O calendário católico-romano comemora-o a 11 de julho, data em que se trasladaram suas relíquias para a Abadia de Saint-Benoît-sur-Loire. A fonte de todos os acontecimentos da vida de São Bento são os Diálogos de São Gregório Magno, redigidos por volta de 593, que se baseou em fatos narrados por monges que conheceram pessoalmente São Bento. Segundo o Papa Gregório I, São Bento foi filho de uma família nobre romana da região de Nórcia (próximo à cidade italiana de Espoleto), onde realizou seus primeiros estudos. Mais tarde, foi enviado a Roma para estudar retórica e filosofia, mas, tendo-se decepcionado com a decadência moral da cidade, abandona logo a capital e retira-se para Enfide (atual Affile), em 500. Ajudado por um abade da região chamado romano, instalou-se em uma gruta de difícil acesso, a fim de viver como eremita. Depois de três anos nesse lugar, dedicando-se à oração e ao sacrifício, foi descoberto por alguns pastores, que divulgaram a fama de santidade. A partir de então, foi visitado constantemente por pessoas que buscavam conselhos e direção espiritual. Foi então eleito abade de um mosteiro em Vicovaro, no centro da península itálica. Por causa do regime de vida exigente, os monges tentaram envenená-lo, mas, no momento em que dava a bênção sobre o alimento, saiu da taça que continha o vinho envenenado uma serpente e o cálice se fez em pedaços. Com isso, São Bento resolve deixar a comunidade retornando à vida solitária. Em 503, recebeu grande quantidade de discípulos e fundou doze pequenos mosteiros. Em 529, por causa da inveja do Sacerdote Florêncio, tem de se mudar para Monte Cassino, onde fundou o mosteiro que viria a ser o fundamento da expansão da Ordem Beneditina. É nesse episódio que Florêncio lhe enviou de presente um pão envenenado, mas Bento deu o pão a um corvo que todos os dias vinha comer de suas mãos e ordenou à ave que o levasse para longe, onde não pudesse ser encontrado. Durante a saída de Bento para Monte Cassino, Florêncio, sentindo-se vitorioso, saiu ao terraço de sua casa para ver a partida do monge. Entretanto, o terraço ruiu e Florêncio morreu. Um dos discípulos de Bento, Mauro, foi pedir ao mestre que retornasse, pois o inimigo havia morrido, mas Bento chorou pela morte de seu inimigo e também pela alegria de seu discípulo, a quem impôs uma penitência por regozijar-se pela morte do Sacerdote. Em 534, começou a escrever a Regula Monasteriorum (Regra dos Mosteiros). Morre em 21 de março de 547, tendo antes anunciado a alguns monges que iria morrer e seis dias antes mandado abrir sua sepultura. Sua irmã gêmea Escolástica havia falecido em 10 de fevereiro do mesmo ano. As representações de São Bento geralmente mostram, junto com o Santo, o livro da Regra, um cálice quebrado e um corvo com um pão na boca, em memória ao pão envenenado que recebeu do Sacerdote invejoso. As relíquias de São Bento estão conservadas na cripta da Abadia de Saint-Benoît-sur-Loire (Fleury), próximo a Orleães e Germigny-des-Prés, no centro da França. De acordo com a tradição, Bento de Núrsia foi santificado por ter vencido duas ciladas armadas pelo Diabo, nas quais lhe é oferecido um cálice de vinho envenenado e um pedaço de pão, também envenenado. Além disso, em muitas vezes fora tentado efetivamente pelo Diabo, além de ser ofendido e insultado de tal maneira que os irmãos de hábito que estavam ao seu redor podiam escutar as ofensas que ele recebia. O Santo Varão, como também é chamado, vencia o tentador utilizando-se do sinal da cruz e da oração contida na Cruz Medalha que fora esculpida nas paredes de um mosteiro.

               A Regra de São Bento: A Regula Monasteriorum, também denominada Regula Monachorum, é composta por um prólogo e 73 capítulos. É possível que ela não seja inteiramente composta por Bento, mas criada por ele valendo-se de uma regra mais antiga, Regula Magistri, composta por autor desconhecido, na mesma região da Itália, trinta anos antes da composição da Regra de São Bento. Dom Basilius Steidle propôs as seguintes divisões temáticas para Regra de São Bentoː Estrutura fundamental do mosteiro, A arte espiritual, Oração comum, Organização interna do mosteiro, O mosteiro e suas relações com o mundo, A renovação da comunidade monástica, Porta do Mosteiro e Clausura, Acréscimos e complementos. Bento de Aniane retomou a regra no século IX, antes das invasões normandas. Ele a estudou e codificou, dando origem a sua expansão por toda Europa carolíngia, ainda que tenha sido adaptada diversas vezes, conforme diversos costumes. Posteriormente, através da Ordem de Cluny e da centralização de todos os mosteiros que utilizavam a regra, ela foi adquirindo grande importância na vida religiosa europeia durante a Idade Média. No século XI, surgiu a reforma da Ordem de Cister, que buscava recuperar um regime beneditino mais de acordo com a regra primitiva. Outras reformas (como a camaldulense, a olivetana ou a silvestriana), buscaram também dar ênfase a diferentes aspectos da Regra de São Bento. Apesar dos diferentes momentos históricos, nos quais a disciplina, as perseguições ou as agitações políticas causaram uma certa decadência da prática da Regra de São Bento, e mesmo da população monástica, os mosteiros beneditinos conseguiram manter, durante todos os tempos, um grande número de religiosos e religiosas. Atualmente, perto de 700 mosteiros masculinos e 900 mosteiros e casas religiosas femininas, espalhados pelos cinco continentes, seguem a Regra de São Bento. Inclusive algumas comunidades de confissões luterana, anglicana e metodista.

A Cruz-Medalha de São Bento

               A origem da Cruz-Medalha de São Bento é incerta, sabe-se que ela foi redescoberta em 1647, em Nattremberg, na Baviera, por ocasião da condenação de algumas bruxas, que afirmaram não conseguir praticar qualquer tipo de feitiçaria ou encanto contra lugares em que houvesse a imagem da Cruz, em especial, a abadia de São Miguel em Metten. Intrigados com o fato, as autoridades foram averiguar o que existia no mosteiro. Ao entrarem em uma das dependências, observaram entalhadas nas paredes imagens da cruz tal como estão representadas nas medalhas utilizadas hoje. Na biblioteca dessa mesma abadia, encontraram um manuscrito do ano de 1415, o qual continha, além de textos, ilustrações, sendo uma delas a de São Bento, com uma cruz e uma flâmula, com os versos da medalha: Crux sacra sit mihi lux, non draco sit mihi dux. Vade retro satana, nunquam suade mihi vana. Sunt mala quae libas, ipse venena bibas. Por esse motivo, estima-se que a origem da imagem da medalha situa-se no século XV.

               A medalha, com algumas variações, possui na frente a imagem de São Bento, vestindo o traje monástico - chamado cógula - trazendo na mão direita uma cruz e na mão esquerda uma flâmula ou livro aberto, que representa a Regra. No verso, há uma imagem da cruz. Ambas as faces trazem inscrições em latim, seja apenas letras ou em palavras, a saber:

Na frente da medalha: Eius in obitu nostro praesentia muniamur' = "Sejamos protegidos pela sua presença na hora da nossa morte".

No verso: C S P B: Crux Sancti Patris Benedicti - Cruz do Santo Pai Bento.

C S S M L: Crux Sacra Sit Mihi Lux - Que a Cruz sagrada seja a minha luz.

N D S M D: Non Draco Sit Mihi Dux - Não seja o Dragão o meu guia.

V R S: Vade retro, satana! - Retira-te, Satanás!

N S M V: Nunquam Suade Mihi Vana - Nunca me aconselhes coisas vãs,

S M Q L: Sunt Mala Quae Libas - É mau o que me ofereces:

I V B: Ipse Venena Bibas - Bebe tu mesmo os teus venenos.

               Essa oração, acrescida da jaculatória "Rogai por nós bem aventurado São Bento, para que sejamos dignos das promessas de Cristo", se tornou uma fórmula de oração a São Bento. Em 1742, o Papa Bento XIV aprovou a medalha, concedendo indulgências a quem a usar e estabelecendo a oração do verso da medalha como uma forma de exorcismo, que se tornou conhecida como Vade retro Satana. Atualmente existe uma forma comum da medalha, conhecida como Medalha do Jubileu, cunhada em 1880 por ocasião do XIV Centenário do nascimento de São Bento, pelos monges de Beuron para a Abadia de Monte Cassino. Essa medalha acrescenta a palavra pax - paz - no alto da cruz e aos pés de São Bento os dizeres Ex S.M. Casino MDCCCLXXX - Do Santo Monte Casino - 1880.

 

52º - São Hormisdas - 514 - 523

               Papa da Igreja Cristã Romana, nascido em Frosinone, Itália, eleito em 20 de setembro de 514, como sucessor de São Símaco de quem fora diácono, cujo pontificado ocorreu a reconciliação entre a Igreja do Oriente e a do Ocidente, sem dúvida, seu grande feito. Eleito Papa cuidou de enfrentar a grave situação em que estava envolvida a Igreja de sua época, o cisma laurenciano, herdado de seu antecessor e provocado pelo antipapa Lourenço (498-515). Após a retratação dos seguidores de Lourenço, reintegrou-os em sua função e cuidou, em seguida, da conciliação do cisma mais grave, o acaciano, criado por Acácio, patriarca de Constantinopla, que separava a Igreja do Oriente de Roma, cujos seguidores aceitavam os concílios de Nicéia e de Constantinopla, mas se negavam ao de Calcedônia. As negociações entre o Papa e o Imperador do Oriente, Anastácio, fracassaram; e um acordo só foi possível com o imperador sucessor, Justino, e o Patriarca João, que aceitou e subscreveu a Fórmula de fé de Hormisdas ou Formula Hormisdae (519). Reorganizou a Igreja da Espanha após a invasão dos visigodos e estabeleceu que os cargos de Bispo não podiam ser comprados com privilégios ou donativos. Morreu em 6 de agosto de 523, em Roma. Casado, antes de ser ordenado presbítero, seu filho Silvério seria eleito Papa. Foi no seu Pontificado que São Bento fundou a Ordem dos Beneditinos e construiu a célebre abadia de Monte Casino, destruída por um bombardeio em 1944.

 

53º - São João I - 523 - 526

               João nasceu em Túsculo, uma província da Itália. Foi eleito sucessor do Papa Hormisda, em 523, e costuma ser identificado como João Diácono, autor da epístola "Ad senartun", importante para a história da liturgia batismal. É reconhecido também pela autoria de "A fé católica", transmitida pelos antigos, entre as obras do filósofo e mártir São Severino Boécio, cujo trabalho exerceu grande influência sobre São Tomás de Aquino. Vejamos qual foi a situação herdada pelo Papa João I. O Papa Hormisda e o Imperador Justino tinham feito cessar o cisma entre Roma e Constantinopla, que se iniciara em 484, com o então imperador Zenon, por meio do que parecia impossível: um acordo entre católicos e arianos. Com esse esquema obtivera bons resultados políticos, pois os godos eram arianos. Porém, no final de 524, o Imperador Justino publicou um decreto ordenando o fechamento das igrejas arianas de Constantinopla e a exclusão dos arianos de toda a função civil e militar. Roma era, então, governada pelo imperador Teodorico, o Grande, o rei dos bárbaros arianos que tinham invadido a Itália. Ele obrigou o Papa João I a viajar a Constantinopla para solicitar ao imperador Justino a revogação daquele decreto. Apesar de o imperador Justino ter-se ajoelhado perante o primeiro sumo pontífice a pisar em Constantinopla, ele não conseguiu demovê-lo da perseguição aos arianos. A solicitação foi atendida apenas em parte, pois o Imperador concordou em devolver as igrejas confiscadas aos arianos, mas manteve o impedimento de os arianos convertidos ao catolicismo poderem retornar ao arianismo. Com o fracasso de sua missão, o Papa João I despertou a ira do imperador Teodorico. Assim, quando colocou os pés em Roma, foi detido e aprisionado em Ravena, onde morreu em 18 de maio de 526. Foi então declarado mártir da Igreja.

ANNO DOMINI – NO ANO DO SENHOR

               Dionysius Exiguus ou Dionísio Exíguo, o Menor, o Pequeno ou ainda o Humilde, Monge, matemático, astrônomo e historiador grego nascido na Cítia Menor, hoje a região de Dobruja, Romênia, que propôs em 525 o denominado Calendário Cristão para pôr fim à desordem dos diversos sistemas de contagem cronológica então empregados. Pelos seus altos conhecimentos em matemática e em astronomia, foi convidado pela Santa Sé católica e passou a viver em Roma a partir dos seus 30 anos, tornando-se um dos sábios da Cúria Vaticana. Traduziu do grego para o latim 401 cânones eclesiásticos, incluindo os apostólicos e os decretos do Concílio de Nicéia, do Primeiro Concílio de Constantinopla e dos Concílios de Calcedónia e de Sardes. Também traduziu para latim uma coleção de decretos Apostólicos papais referentes aos pontificados de origem grega, de Sirício a Anastácio II, de extrema importância para a estruturação doutrinária das igrejas ocidentais. Foi convidado pelo Papa João para compilar a tabela para as futuras datas da Páscoa. Naquele tempo a data era calculada com base no Calendário juliano e a contagem era feita a partir do início do reino do Imperador romano Diocleciano um feroz perseguidor dos cristãos. Por causa disso o monge procurou não continuar reverenciando a memória do terrível perseguidor e, assim, propôs uma contagem dos anos a partir do nascimento de Jesus Cristo, e apresentou o seu Liber de Paschate em 525, introduzindo a contagem: Antes de Cristo e Depois de Cristo. Criou, então, um notável conjunto de tabelas para calcular a data da Páscoa e introduziu o conceito de Anno Domini e a contagem dos anos a partir do nascimento de Cristo. Assim o Calendário cristão tomava como base o calendário juliano e tendo o nascimento de Jesus Cristo como ano 1 do século I e os períodos e acontecimentos anteriores a isso passaram a ser datados com a sigla a. C. e d. C.

 

54º - São Félix IV - 526 - 530

               Papa da Igreja Cristã Romana, nascido em Sâmnio, Benevento, no sul da Itália, nomeado arbitrariamente pelo rei godo Teodorico como sucessor de São João I, que no entanto, demonstrou tal lealdade à Igreja que o rei ostrogodo o repudiou. Também chamado de Félix IV na lista de Papas que inclui ilegítimos, foi designado para o trono pontifício por Teodorico, mas teve sua consagração ratificada por Bispos. Teodorico havia prometido aos hereges arianos todas as igrejas católicas de Ravena, porém o rei godo faleceu repentinamente e Amalasunta, a rainha regente, reinou mantendo boas relações com Roma. Enquanto desfrutava de prestígio na corte dos godos, conseguiu transformar dois templos pagãos adjacentes na igreja de S. Cosme e S. Damião. Durante seu pontificado se difundiu na Itália o monacato, ou seja, a vida conventual como monge ou monja, e conseguiu que os cristãos tivessem liberdade de culto. Também foi durante seu pontificado que São Bento de Núrsia construiu a famosa abadia em Monte Cassino em 528. Da Ordem Beneditina viriam mais de 20 Papas. Condenou o semipelagianismo em uma carta a São Cesáreo de Arlés, que o Concílio de Orange (529) converteu em cânones. O pelagianismo ou doutrina de Pelágio (séc. V), heresiarca inglês, negava o pecado original e a corrupção da natureza humana e, consequentemente, a necessidade do batismo. A beira da morte, São Félix pediu ao clero que elegesse o Arquediácono Bonifácio para sucedê-lo, tornando-se na tradição pontifícia o primeiro a designar o próprio sucessor. O Papa veio a falecer no dia 12 de setembro de 530.

 

55º - Bonifácio II - 530 – 532

               Eleito em 17 de setembro de 530; morreu em outubro de 532. Ao chamá-lo de filho de Sigisbaldo, o Liber Pontificalis faz a primeira menção da ancestralidade germânica do Papa. Bonifácio serviu a Igreja Romana desde a juventude. Durante o reinado do Papa Felix IV, ele foi Arquidiácono e personagem de considerável influência junto às autoridades eclesiásticas e civis. Sua elevação ao papado é notável, pois oferece um exemplo inquestionável da nomeação de um Papa por seu predecessor, mesmo sem a formalidade de uma eleição. Félix IV, tendo apreensão pela morte e temendo uma disputa pelo papado entre facções romanas e góticas, reuniu em torno dele vários de seus clérigos e vários senadores romanos e patrícios que por acaso estavam por perto. Na presença deles, ele solenemente conferiu ao seu antigo Arquidiácono o pálio da soberania papal, proclamando-o seu sucessor e ameaçando com excomunhão aqueles que se recusavam a reconhecer e obedecer a Bonifácio como Papa validamente escolhido. Na morte de Felix, Bonifácio assumiu a sucessão, mas quase todos os sacerdotes romanos, sessenta de talvez cerca de setenta, recusaram-se a aceitá-lo e elegeram Dioscoro. Eles temiam a influência indevida nos assuntos papais no rei ostrogodo Atalarico, cujo avô, Teodorico I, ajudara a eleger o Papa Felix IV, uma circunstância que tornava mais odiosa a nomeação de Bonifácio. Ambos os Papas foram consagrados em 22 de setembro de 530, Bonifácio na Basílica de Júlio e Dióscoro em Latrão. A Igreja Romana estava assim envolvida no sétimo cisma antipapal. Felizmente durou apenas vinte e dois dias, pois Dioscoro morreu em 14 de outubro, deixando Bonifácio de posse. Ele logo convocou um sínodo romano e apresentou um decreto anatematizando seu último rival, ao qual ele garantiu as assinaturas dos Sacerdotes que haviam sido partidários de Dióscoro (dezembro de 530). Cada um deles lamentou sua participação na eleição irregular e prometeu obediência futura. Bonifácio reconciliou muitos por sua administração suave e conciliatória; mas algum ressentimento permaneceu, pois ele parece não ter tido oferecido uma eleição formal por aqueles que, apesar de sua submissão, impugnaram validamente sua nomeação; e cinco anos depois um Papa da escolha deles solenemente queimou o anátema contra Dióscoro. Em um segundo sínodo, realizado em São Pedro (531), Bonifácio apresentou uma constituição atribuindo a si o direito de nomear seu sucessor. O clero romano assinou e prometeu obediência. Bonifácio propôs como sua escolha o diácono Virgílio e foi ratificado por sacerdotes e povo. Esta promulgação provocou um ressentimento amargo e até mesmo uma inimizade imperial, pois no terceiro sínodo em 631, foi revogada. Bonifácio queimou a constituição perante o clero e o senado e anulou a nomeação de Virgílio. O reinado de Bonifácio foi marcado por seu interesse ativo em diversos assuntos da Igreja Ocidental e Oriental. No início de seu pontificado, ele confirmou as atas do Segundo Concílio de Orange, um dos mais importantes do século VI, que efetivamente acabou com as controvérsias semipelagianas. O seu presidente, Cesário, Arcebispo de Arles, amigo íntimo de Bonifácio, enviara, antes da sucessão deste último, um Sacerdote Armênio a Roma para pedir a Bonifácio que assegurasse a confirmação do concílio pelo Papa. Sendo ele mesmo Papa quando o mensageiro chegou, Bonifácio enviou uma carta de confirmação a Cesario (25 de janeiro de 531), na qual ele condenava certas doutrinas semipelagianas. Ele recebeu um apelo dos Bispos africanos, que estavam trabalhando na reorganização de sua igreja após a devastação dos vândalos, pedindo-lhe para confirmar em direitos primais ao Arcebispo de Cartago, que este último poderia ser mais capaz de lucrar com a ajuda da Sé Romana. No Oriente, ele afirmou os direitos do Papa à jurisdição em Ilírico. Em 531, Epifânio, Patriarca de Constantinopla, declarou irregular a eleição de Estêvão para o Arcebispado de Larissa, na Tessália. Apesar das severas pressões tomadas em Constantinopla para frustrar seu propósito, Estêvão apelou a Roma, alegando que Epifânio não era competente para decidir o caso, mantendo seu ponto em termos que revelam uma clara concepção da Primazia Romana. Bonifácio convocou um quarto sínodo romano de 7 a 9 de dezembro de 531, no qual foram apresentados cerca de vinte e cinco documentos em apoio à reivindicação de Roma de jurisdição na Ilíria. O resultado do sínodo não é conhecido. Bonifácio foi estimado por sua caridade, particularmente em relação aos sofredores pobres de Roma durante um ano de fome. Ele foi enterrado com São Pedro, em 17 de outubro de 532, onde um fragmento de seu epitáfio ainda pode ser visto.

 

56º - João II - 533 - 535  

               No dia 2 de janeiro de 533, foi eleito ao pontificado “um candidato de consenso”, Mercúrio, um velho sacerdote da Basílica de São Clemente em Latrão; visto que se chamava Mercúrio, ou seja, o nome de uma divindade pagã, mudou seu nome para João, assumindo o nome do seu predecessor, Papa João I. Foi, de fato, o primeiro Papa a mudar o nome, que se tornou costume a partir de Gregório V (996-999). Papa João II tinha bons relacionamentos tanto com o ostrogodo rei da Itália, Atalarico (526-534), quanto com o imperador do Oriente Justiniano (527-565). E é exatamente à relação entre o Papa João II e o imperador Justiniano que está ligado o episódio mais significativo deste pontificado. Um decreto de Justiniano reconhecia a doutrina dos primeiros quatro concílios universais: o primeiro Concílio de Niceia (325), o primeiro Concílio de Constantinopla (381), o Concílio de Éfeso (431) e o Concílio da Calcedônia (451). Mas, o decreto incluía uma fórmula dogmática suscetível a interpretações, que, por exemplo, o Papa Hormisda havia recusado: “Um da Trindade sofreu na carne”. Para Justiniano o reconhecimento pontifício da fórmula interessava particularmente para conquistar para si, para a Igreja, mas sobretudo para a unidade do Império, os seguidores de uma doutrina muito difundida no Oriente, o monofisismo. Tal doutrina se opunha ao Concílio da Calcedônia, afirmando que Cristo tinha apenas uma natureza, enquanto que para o concílio havia duas naturezas em Cristo. Os monges orientais Acêmetes – do grego akoìmetos, insones – de Constantinopla, grandes apoiadores da ortodoxia calcedonesa recorreram ao Papa contra a fórmula dogmática. João II tentou convencê-los a abandonarem a própria posição, mas, diante de sua recusa, os excomungou. O Papa escreveu ao imperador declarando ortodoxo o seu decreto. E Justiniano ficou muito feliz, inserindo no próprio Codex tanto a sua carta como a resposta do Papa. João II morreu no dia 8 de maio de 535.

 

57º - Santo Agapito I - 535 - 536

               O Bispo eleito para suceder o Pontífice João II, na cidade de Roma, foi Agapito I, que se consagrou no dia 13 de maio de 535. O seu pontificado durou apenas onze meses e dezoito dias. Nesse tão curto período do seu governo, o Papa Agapito I elevou as finanças da Igreja; tomou decisões doutrinais importantes para a correta compreensão dos fundamentos do cristianismo e lutou com energia pela defesa da fé e dos bons costumes. Ele mandou queimar as bulas de Bonifácio II, condenatórias das doutrinas de Dióscoro, e negou aos hereges re-convertidos que conservassem seus cargos e benefícios, como pretendia o imperador Justiniano. Enfim, foi um Papa zeloso e defensor da tradição católica. Também proibiu que os Bispos das Gálias, atuais França e Espanha, vendessem os bens de suas igrejas, até mesmo em caso de extrema necessidade. Excomungou Antimo, o Patriarca de Constantinopla, que havia alcançado o Patriarcado graças às intrigas da imperatriz Teodora, e nomeou em seu lugar Mena, um Bispo católico, homem de fé e saber. Como revelou o próprio Papa Agapito I, numa carta a Pedro, Bispo de Jerusalém; era a primeira vez, desde os tempos apostólicos, que uma Igreja Oriental recebia como Patriarca um Bispo consagrado pelo Papa. Fundou, em Roma, uma academia de Belas Letras e várias escolas para adultos e crianças pobres, e distinguiu-se por sua inesgotável caridade. Por fim, o Papa Agapito I viajou para Constantinopla, capital do Império Romano do Oriente, na qualidade de embaixador do rei, na esperança, logo tornada desilusão, de fazer cessar a desastrosa guerra greco-gótica da Itália, estourada em 535. Porém quase foi condenado ao exílio pelo imperador Justiniano, decidindo voltar para Roma. Ocorreu, entretanto, que o Papa Agapito I foi acometido por uma grave enfermidade, morrendo logo em seguida, no dia 22 de abril de 536. Seu funeral foi tal como nunca se vira em Constantinopla, tanto para um Bispo quanto para um imperador. O corpo de Santo Agapito I, Papa e confessor, foi transladado para o Vaticano e enterrado no dia 17 de setembro do mesmo ano, no pátio da catedral de São Pedro, em Roma. A santidade do Papa Agapito I sempre foi muito lembrada pelos escritos de São Gregório Magno. Ele que é reverenciado pela Igreja no dia 28 de abril, como consta do Martirológio Romano.

 

58º - São Silvério - 536 - 537

               Silvério nasceu em Frosinone, na Campânia, Itália. Era filho do Papa Hormisdas, que fora casado antes de entrar para o ministério da Igreja. Entretanto, ao contrário do que se encontra em alguns escritos, ele não foi sucessor do seu próprio pai. Antes de Silvério assumir, e depois do seu pai, outros ocuparam o trono de Pedro. Em períodos variados, não ultrapassando dois anos cada um; foram os Papas: João I, Félix III, Bonifácio II, o antipapa Dióscoro da Alexandria, João II e Agapito I. Embora fosse apenas subdiácono quando assumiu o trono de Pedro, ele foi um dos mais valentes defensores do cristianismo, pois enfrentou a imperatriz Teodora.

               O conflito com a imperatriz começou quando ela enviou uma carta a ele ordenando que aceitasse, em Roma, Bispos heréticos, entre eles Antimo. Respondendo com veemência que não obedeceria de forma alguma, foi preso. Tiraram-lhe as vestes Papais, e, vestido como um simples monge, foi deportado para Patara, na Ásia. Enquanto isso, assumia o governo da Igreja o antipapa Virgílio, que foi colocado em seu lugar porque aceitou a imposição da imperatriz de receber em Roma os tais Bispos heréticos recusados por Silvério. Esse, por sua vez, pouco depois foi enviado a Lícia. Mas, como era um religioso muito popular, foi recebido com honras inesperadas pelos monarcas romanos da região. Revoltado com a deposição de Silvério, o Bispo de Lícia resolveu falar diretamente com o imperador Justiniano. Foi nesse encontro que proferiu as palavras que ficariam gravadas na história e seriam repetidas pelos séculos seguintes: "Existem muitos reis neste mundo, mas apenas um Papa em todo o universo". Tocado pelas palavras do religioso, o imperador determinou a volta do Papa Silvério a Roma. Mas Teodora continuou com suas armações e, pouco tempo depois, ele era enviado à ilha de Palmaria, Ponza, onde sofreu um exílio mais rigoroso que o primeiro. Novamente, recebeu ordem de Justiniano para voltar a Roma. Contudo o Papa preferiu terminar no cisma que surgira, abdicando no dia 11 de novembro de 537. Consumido pelas chagas e pela fome, morreu pouco depois, no dia 2 de dezembro do mesmo ano. Seu corpo, ao contrário dos outros Papas que morreram no exílio, não retornou para Roma, permaneceu naquela ilha, onde sua sepultura se tornou local de muitas graças e meta de peregrinação. O Santo Papa Silvério é venerado no dias de sua morte.

 

59º – Vigílio - 537 - 555

               Membro duma ilustre família romana, sendo o seu pai, o oficial João, referido no Livro dos Pontífices como cônsul, tendo recebido o título do imperador. Reparato, irmão de Vigílio, era senador. Vigílio entrou ao serviço da Igreja de Roma em 531 como diácono, ano em que a Igreja concordou com um decreto, habilitar o Papa a escolher o seu sucessor. Vigílio foi escolhido por Bonifácio II como seu sucessor. Mas a oposição a este procedimento obrigou Bonifácio, no ano seguinte a retirar a sua designação e queimar o decreto. O segundo sucessor de Bonifácio, o Papa Agapito I (535–536), nomeou Vigílio como representante papal em Constantinopla. Nesta cidade a imperatriz Teodora tentou conquistá-lo como seu aliado para se vingar da deposição, por Agapito I, do Patriarca constantinopolitano que defendia o monofisismo. Vigílio parece ter concordado com os planos da imperatriz, que prometera fazer dele Papa e uma grande soma de dinheiro. Após a morte de Agapito, a 22 de Abril de 536, Vigílio regressou a Roma com cartas da corte imperial e com o dinheiro. Entretanto em Roma, Silvério tinha sido eleito Papa, pela influência do rei ostrogótico Teodato. Pouco depois, o general bizantino Belisário entra em Roma e Vigílio, ao voltar, entrega-lhe as cartas que trouxera de Constantinopla. Belisário acaba por depor Silvério, e exilado, tenta voltar a Roma, mas é novamente exilado e acaba por morrer na ilha de Ponza, após o que Vigílio foi reconhecido como Papa por todo o clero romano. Mas com Vigílio os planos de Teodora saíram frustrados, pois ele manteve a posição do papado contra o monofisismo. De acordo com o Livro dos Pontífices, a 20 de Novembro, enquanto o Papa celebrava missa em honra de Santa Cecília na igreja que leva o nome desta santa em Trastevere, antes da missa acabar, Vigílio foi intimado por oficiais imperiais a viajar imediatamente para Constantinopla. O Papa foi levado para um barco ancorado no Tibre, enquanto a população o amaldiçoava e atirava pedras contra o barco. Roma estava outra vez cercada pelos ostrogodos chefiados por Tótila e a população vivia na maior das misérias. Vigílio tentou enviar navios carregados de trigo a Roma, mas foram capturados pelo inimigo. O Papa teria deixado Roma provavelmente a 22 de novembro de 545. Permaneceu longo tempo na Sicília e só chega a Constantinopla em Janeiro de 547. O seu pontificado foi agitado pela luta dos Três Capítulos. O imperador Justiniano (r. 527–565) chamou-o a Constantinopla, pressionando-o a ordenar os Três Capítulos (mais tarde suspensos pela reação no ocidente). Justiniano convocou um sínodo em 553 contra a vontade do Papa. Perante o seu protesto, Vigílio é exilado. Depois de oito anos na capital imperial, o Papa conseguiu um entendimento com o imperador e começou a viagem de regresso a Roma na primavera de 555. Morreu em Siracusa, na Sicília, sendo o seu corpo levado para Roma e enterrado na Basílica de S. Silvestre sobre a Catacumba de Priscila, na Via Salária. O Império Bizantino, que na verdade era uma divisão do Império Romano do Oriente, toma posse da Itália com sua força governamental autoritária, prejudicando grandemente o bom andamento do cristianismo do Ocidente.

 

60º – Pelágio - 556 - 561

               Foi eleito em 16 de Abril de 556 e morreu em 4 de Março de 561. Nascido em Roma, cerca do ano 500, era filho do governador de um distrito de Roma. A primeira referência que temos de Pelágio é de 536, quando se encontrava em Constantinopla - provavelmente para o sínodo contra Severo de Antioquia e seus aliados - na companhia do Papa Agapito I, que o nomeou Núncio apostólico da Igreja de Roma naquela cidade. E tudo leva a crer que conseguiu ter uma grande influência sobre o imperador. Em 543, depois de ter conseguido a condenação do Origenismo, regressa a Roma. Em novembro de 545, quando o Papa Vigílio foi obrigado pelo imperador ir a Constantinopla, deixou Pelágio em Roma como seu representante. Eram tempos difíceis na Itália e particularmente para a cidade de Roma, cercada por Tótila, rei dos ostrogodos. Pelágio distribuiu a sua fortuna privada em benefício das vítimas da fome e esforçou-se para conseguir uma trégua junto do rei. Embora tenha falhado, conseguiu que Tótila poupasse a vida dos romanos quando tomou a cidade em dezembro de 546. Tótila se admirou com Pelágio que o enviou a Constantinopla com o fim de conseguir a paz com Justiniano, mas o imperador mandou-o de volta, dizendo que era Belisário quem detinha o comando em Itália e, portanto, quem decidia sobre questões de guerra e paz. Em 551, Pelágio está em Constantinopla para apoiar o Papa Vigílio, infamemente tratado pelo imperador por causa da Controvérsia dos Três Capítulos. Mas acaba por se afastar do Papa, uma atitude que os seus opositores viram como uma tentativa de voltar a cair nas boas graças do imperador, pouco antes de abandonar Constantinopla, com Vigilio, em 555. Alguns opositores de Pelágio consideram-no responsável pela morte de Vigílio, mas só a 16 de Abril de 556, quase um ano depois, Pelágio é eleito seu sucessor. Isto porque parece ter tido dificuldades em encontrar Bispos que o consagrassem. Oposto ao origenismo, foi designado Papa por imposição do imperador Justiniano I (nessa época, a Itália era uma província do Império Bizantino) após aceitar a condenação dos Tres Capítulos, que havia defendido nos tempos do Papa Vigílio. Por este motivo teve que superar uma forte oposição do clero romano, que duvidava da sua ortodoxia. Mandou construir a Basílica dos Doze Santos Apóstolos em Roma, distribuiu seus bens entre os pobres, quando Roma foi assolada pela fome, mostrando-se muito caridoso. Morreu em 4 de Março de 561 e foi sepultado na Basílica de S. Pedro.

 

61º - João III - 561 - 574

               Não se sabe a data de seu nascimento, mas ele morreu em 13 de julho de 574 em Roma, Itália, e sepultado na Basílica de São Pedro. Era romano de nascimento, e tornara-se Papa em julho de 561. Foi durante o seu pontificado que os Lombardos invadiram a Itália por repetidas vezes. Mudou o seu nome Catelino para João. Papa italiano, pertencia a uma importante família romana e era filho do procurador Anastásio, com nome de batismo Catelinus. Foi Papa de 17 de julho de 561 a 13 de julho de 574. Fez com que a igreja de Nápoles se submetesse ao poder de Roma, assim como o restabelecimento das relações com as igrejas de África, que se tinham afastado depois da excomunhão do Papa Vigílio. Organizou o monaquismo, existente no Ocidente desde o século IV, tendo São Bento de Núrsia compilado as normas de vivência destas comunidades numa regra. Para a organização destas comunidades tinham-se traduzido também os Ditos dos Anciãos e a Exposição do Heptateuco. A aproximação dos lombardos fez com que o Papa rogasse ao rei Narsés que estabelecesse a sua residência em Roma, para melhor proteger a cidade. Contudo, o povo de Roma não aceitou de bom grado a medida e o Papa teve de se mudar da Basílica de São João de Latrão para a basílica dos Santos Tiburtino e Valeriano, com o intuito de acalmar a fúria popular e melhor se defender em caso de perigo. Embora seu pontificado tenha durado cerca de 13 anos, todos os registros do seu pontificado foram destruídos pelos longobardos, que invadiram Roma. Fugiu dos violentos invasores para as catacumbas de Praetextatus onde ele permaneceu durante muitos meses e salvou a Itália da barbárie, chamando junto a ele todos os italianos, a fim de que se defendessem contra a crueldade dos invasores, período em que por causa das invasões longobardas, a Sé Apostólica ficou sem Papa durante 11 meses, com Roma sitiada e a fome e a desolação assolando-a.

 

62º - Bento I - 575 - 579 

               Papa Bento I, foi Papa da Igreja Católica de 2 de junho de 575 a 30 de julho de 579. Eleito Papa após quase um ano de vacância devido à ocupação de Roma pelos Lombardos. Bento I tentou restabelecer a ordem na Itália e na França, conturbadas pelas invasões bárbaras e ensanguentadas por discórdias internas. Em seu tempo a guerra trouxe a praga da fome, houve tão grande miséria, que muitas fortalezas se renderam aos implacáveis bárbaros, só para haverem um pouco de alimento. Deus teve pena de tanta calamidade e o Imperador Justino II fez mandar do Egito muitos navios carregados de trigo. No campo religiosos confirmou o V Concílio Constantinoplano de 533, como consta de uma carta de Gregório, por ele nomeado Arcediago e que foi mais tarde o Papa Gregório Magno. Nessas aflições morreu o venerado pontífice, que foi sepultado na sacristia da Basílica de São Pedro. Sua fé superou os temores e foi um pilar de inspiração aos fiéis cristãos no meio de provações.

 

63º - Pelágio II - 579 - 590

               Papa da Igreja Cristã Romana, nascido em Roma, eleito Pontífice em 26 de novembro de 579, como sucessor de Benedito I, e que reinou nos anos imediatamente posteriores à invasão Longobarda. De origem gótica, diante da insegurança que a Santa Sé sentia frente aos novos dominadores da península, buscou apoio tanto no Reino Franco (580) como à Constantinopla (584), por meio do diácono Gregório. E tinha razão: em seu pontificado, os lombardos destruíram a abadia de Monte Cassino e, em Roma, foram construídos os alicerces de San Lorenzo fuori le Mura. Sem a ajuda bizantina, juntou-se aos francos e mandou trazer do norte da Itália os hereges de volta a Roma. Além do desagradável assédio lombardo, também não conseguiu resultados concretos, para pôr fim ao cisma de Aquiléia que se iniciara durante o pontificado de Pelágio I a mais de 25 anos. Com a ajuda de Gregório, lançou o celibato entre o clero e ordenou que cada dia os Sacerdotes rezassem o Ofício Divino. Transformou sua casa num hospital e adornou a Basílica de São Pedro com o próprio dinheiro. Vítima de uma epidemia, morreu em Roma, sepultado na Basílica de São Pedro.

 

64º - São Gregório I - 590 - 604  

               Nascido em Roma no ano 540, Gregório era proveniente de uma família tradicional aristocrática da cidade. Seu pai chamava-se Gordiaus e sua mãe chamava-se Santa Sílvia. Quando jovem, Gregório chegou a investir na carreira política e ocupou, inclusive, o cargo de prefeito de Roma. Após seu cargo político-administrativo, Gregório foi influenciado pelos escritos e a personalidade de São Bento. Resolveu então, assumir a vida religiosa e ingressou em um mosteiro por volta de 575. Como homem religioso, foi tão dedicado que converteu sua casa no mosteiro de Santo André, além de fundar outros seis nas terras que sua família possuía na Sicília. Antes de tornar-se Papa, Gregório foi apocrisiário em Constantinopla, um cargo religioso que equivale atualmente ao de embaixador ou núncio apostólico. Outros religiosos que desenvolveram a mesma função em Constantinopla também chegariam ao Supremo Pontificado, como foi o caso dos Papas Sabiniano, Bonifácio III e Martinho I. Com a morte do Papa Pelágio II, o Conclave se reuniu e elegeu Gregório para ser o novo líder da Igreja, no dia 3 de setembro de 590. O Papa Gregório I foi o responsável por enviar os primeiros missionários com a missão de converter os anglo-saxões ao cristianismo. Um grupo de quarenta monges beneditinos se dirigiu às Ilhas Britânicas em uma missão que recebeu o nome de Missão Gregoriana. Seu nome também ficou popularmente reconhecido por difundir um tipo de música que se identificou muito com a Igreja, o canto gregoriano. Gregório I foi muito ativo como Supremo Pontífice e produziu uma extensa obra escrita, contando com sermões e comentários sobre a Bíblia. Um de seus atos mais famosos foi a compilação dos sete pecados capitais, fazendo sua adaptação para o Ocidente. Politicamente, Gregório enfrentou um problema com o Patriarca de Constantinopla que se declarava acima de todos os Bispos do mundo. O Papa respondeu se intitulando Servo dos Servos de Deus, o qual é utilizado pelos Papas até hoje. Sua determinação em defender a Igreja rendeu-lhe um tratamento de respeito: Magno. É considerado também Doutor da Igreja e Santo. Faleceu no dia 12 de março de 604, aos 64 anos de idade.

 

65º – Sabiniano - 604 - 606

               Nascido no ano 530, Sabiniano natural de Blera. Foi um dedicado religioso durante toda sua vida. Sua dedicação foi naturalmente reconhecida por seus superiores na escala hierárquica da Igreja. De tal maneira, que o Papa Gregório I o nomeou para diversos cargos importantes. Apesar de sua dedicação à vida religiosa e de se destacar nas tarefas da Igreja, Sabiniano não obteve o mesmo sucesso em Constantinopla. O próprio Papa Gregório I o escolheu para desempenhar a função de Núncio Apostólico na cidade, só que, nesta situação, ele não foi suficientemente astuto para lidar com os bizantinos e, assim, não correspondeu às expectativas do Papa, que depositara confiança nele para intermediar questões no Oriente. Ainda com o insucesso em Constantinopla, Sabiniano voltou para Roma, após quatro anos entre os bizantinos, com respaldo para ocupar o mais importante cargo da Igreja Católica. O Papa Gregório I faleceu e, seis meses depois, ocorreu a eleição de seu sucessor. No dia 13 de setembro de 604, um conclave escolheu Sabiniano, que ainda teve que esperar alguns meses pela confirmação Imperial e a posse. Toda essa demora para eleger e empossar o novo Papa já demonstrava o nível de dificuldade que seu papado teria de enfrentar. De fato, as dificuldades foram muitas. A começar pela ameaça dos Lombardos e pela fome. Os Lombardos, um dos chamados povos bárbaros, eram uma ameaça constante de invasão de Roma e ao cristianismo. Mas, passado o período mais intenso dessa ameaça, a Igreja dedicou-se a outras questões. A Igreja passou a vender os cereais de seu celeiro por preços muito mais altos do que os comumente praticados e também deixou de distribuí-los gratuitamente, como fazia Gregório I. Essa situação rendeu ao Papa Sabiniano a fama de avarento. Sabiniano também tentou desacreditar Gregório I, motivado por ciúmes que tinha pelo prestígio de seu antecessor que o acusou de fracassar em Constantinopla. Sua atitude só aumentou a antipatia do povo pelo Papa Sabiniano. Seu papado não tinha recursos financeiros suficientes, não podia distribuir comida como seu antecessor e pouco podia fazer para combater a grande fome que atingiu a cidade romana em 605. Alguns dizem que foi um Papa tomado pelo ódio e que fracassou rapidamente. O Papa Sabiniano é o responsável por tornar obrigatório o uso dos sinos nas igrejas para convocar os fiéis para as missas e para celebrações importantes. Ele também decretou que as igrejas deveriam manter as luzes sempre acesas. Sabiniano, contudo, teve um papado muito curto, faleceu no dia 22 de fevereiro de 606.

 

66º - Bonifácio III - 607

               Nascido em Roma no ano 540, Bonifácio era filho de João Cataadioce, um romano com ascendência grega. Ele se dedicou à vida religiosa desde cedo e foi ordenado diácono, função que manteve durante muitos anos. Sua atuação religiosa, contudo, só se tornou realmente significativa quando foi enviado pelo Papa Gregório I a Constantinopla para servir como legado, em 603. Sua atuação parece ter impressionado não só o Papa, mas também o Imperador Focas, que reconheceu sua prudência para solução de questões diversas. Três anos mais tarde, seu nome já havia repercutido pelos seus feitos e Bonifácio foi indicado como sucessor do Papa Sabiniano. Mesmo ainda em Constantinopla, ele foi eleito no dia 19 de fevereiro de 607. O Papa Bonifácio III enfrentou grandes dificuldades para voltar a Roma. O regresso demorou tanto que criou-se um debate sobre as razões da demora e a viabilidade para exercer seu cargo em Constantinopla. Alguns pesquisadores argumentam que o Papa Bonifácio III se recusou a assumir o cargo até que ficasse comprovado que sua eleição havia sido justa e livre. Seu interesse por eleições livres de interferências externas era latente, como comprovaram suas principais ações como Papa. Após assumir o cargo, o Papa Bonifácio III convocou um concílio em Roma no qual proibiu que fosse discutida a sucessão de um Papa que ainda estivesse vivo, sob pena de excomunhão. Ele também determinou que as medidas para eleger o sucessor só poderiam ser tomadas três dias depois do enterro do Papa falecido. Ambas as iniciativas causaram grande impacto na eleição papal. Mas, além disso, suas relações próximas com o Imperador Focas foram fundamentais para que se restaurasse a ideia de que o Apóstolo Pedro deveria ser a cabeça de todas as Igrejas. Esta medida simbólica garantia ao Bispo de Roma o título de Bispo Universal, superando outros religiosos que reclamavam essa identificação. Devido às importantes medidas do Papa Bonifácio III, alguns pesquisadores argumentavam que ele teria sido o efetivo fundador da Igreja Católica. Mas hoje entende-se que suas ações apenas reforçavam as medidas anteriores de Justiniano, o qual deu reconhecimento legal à primazia do pontificado romano. Liderou a Igreja por menos de um ano, pois faleceu no dia 12 de novembro de 507. Suas ações, contudo, deixaram um grande legado para a instituição religiosa e certamente contribuíram para que a Igreja Católica ocupasse o lugar do fragmentado Império Romano como principal detentora do poder político na Idade Média.

 

67º - São Bonifácio IV - 608 - 615

               Papa Bonifácio IV, O.S.B (Valeria, 550 — Roma, 8 de maio de 615) foi um monge beneditino eleito em 25 de Agosto de 608. No pontificado do Papa Gregório I, Bonifácio era diácono da Igreja de Roma e ocupava o cargo de dispensator, isto é, era o encarregado da administração do patrimônio. O pontificado de Bonifácio foi marcado por muito sofrimento em Roma, devido à fome, pestilência e inundações. Converteu o Panteão de templo pagão em igreja dedicada à Virgem Maria e a Todos os Santos e Mártires, salvando-o da destruição. Instituiu a festa de Todos os Santos em 1 de Novembro. Morreu em 8 de Maio de 615. O Pontífice morreu em retiro monástico (tinha convertido a sua casa num mosteiro) e foi sepultado no pórtico de S. Pedro. Posteriormente os seus restos mortais foram movidos por três vezes, no século XI ou XII, no século XIII e finalmente de volta à Basílica de S. Pedro, em 21 de outubro de 1603. Bonifácio IV é venerado como Santo em 8 de maio.

Nesta mesma época surgiu a religião de Lúcifer. O Islamismo é uma corrente política e ideológica usando como base as revelações de Lúcifer quando apareceu à Maomé ditando o Alcorão. Lúcifer se apresentou diante de Maomé no ano de 610, em Meca no Monte Hira, como um anjo de luz, dizendo -  mentindo obviamente -, que se chamava Gabriel. Os versos satânicos deste livro nega a Trindade Divina, nega a Divindade de Jesus Cristo, e inúmeras passagens Bíblica, além de aprovar a poligamia. Se auto intitula dona da verdade absoluta. Esta seita constituiu um verdadeiro exército de muçulmanos, que perseguiam e matavam cristãos, caso estes não se convertessem ao Islã. Foi esta fúria ideológica em Jerusalém e na Palestina, o motivo pelo qual Deus teve que intervir, transladando com seus Anjos Celestiais, a Casa de Maria Santíssima e de Jesus que estava em Nazaré, para Loreto, Itália, para não ser destruída pelos furiosos islâmicos.

 

68º - Adeodato I - 615 - 618

               Adeodato I (Roma, 570 — 8 de novembro de 618), também chamado Deodato I, foi Papa de 19 de outubro de 615 até sua morte, em 618. Ele foi o primeiro Sacerdote a ser eleito Papa desde João II, em 533. Sua festa é celebrada no dia 8 de novembro. Ele nasceu em Roma e era filho de um subdiácono. Serviu como padre por 40 anos antes de sua eleição e foi o primeiro padre a ser eleito Papa desde João II em 533. Adeodato representou a segunda onda de antigregorianos ao papado, a primeiro sendo o de Sabinian. Ele também reverteu a prática de seu antecessor Bonifácio IV de encher as fileiras administrativas Papais com monges, remontando com o clero às posições originais com cerca de 14 sacerdotes, as primeiras ordenações em Roma desde o Papa Gregório. Segundo a tradição, ele foi o primeiro Papa a utilizar selos de chumbo em documentos Papais, que por sua vez vieram a ser chamado de "bulas Papais". Uma bula datada de seu reinado ainda está preservada, nele observa-se o detalhe do Bom Pastor que no meio de suas ovelhas, com as letras Alfa e Omega abaixo, enquanto o verso contém a inscrição: Deusdedit papae. Em agosto de 618, um terremoto atingiu Roma, e mais tarde um surto de lepra, Adeodato liderou esforços para cuidar de pobres e doentes. Ele morreu em 8 de novembro de 618. Houve uma vaga de um ano, um mês e 16 dias antes de seu sucessor Papal ser consagrado. Sua festa ocorre em 8 de novembro. Ele também é um Santo da Igreja Ortodoxa como um dos "Papas ortodoxos de Roma" pré-cisma.

 

69º - Bonifácio V - 619 - c.625

               Papa da Igreja Cristã Romana, nascido em Nápoles, mas não se conhece a data de seu nascimento, sucessor de Adeodato I, cujo governo caracterizou-se por contínuas lutas pela coroa da Itália. De origem napolitana, foi eleito em circunstâncias extremamente críticas e só assumiu o trono pontifício muitos meses depois da morte do antecessor, porque Roma estava preocupada em defender-se do exarca Eleutério, título do delegado dos imperadores de Bizâncio na Itália ou na África. Interessou-se particularmente pela Igreja anglo-saxônica, segundo testemunham alguns escritos seus, como uma carta à Justo, Bispo de Rochester e Canterbury, e outra à Etelberga, rainha de Kent. Promulgou algumas normas litúrgicas e canônicas e instituiu a imunidade do asilo, para as pessoas perseguidas que buscassem refúgio na Igreja. Também durante seu pontificado, no oriente o infeliz Maomé iniciou seus sermões, e assim, na era cristã, foi a primeira vez que apareceu uma outra grande religião, a muçulmana, que se espalharia pelo mundo inteiro. Pelo Liber pontificalis e pelas inscrições na sua tumba, era um homem de muitos adjetivos magnânimos como plácido, humilde, doce, misericordioso, sábio, casto, sincero e justo. Morreu em 25 de outubro, em Roma.

 

70º - Honório I - 625 - 638

               Papa Honório I nasceu em Capua. Eleito em 27 de outubro de 625, tinha sido discípulo de S. Gregório Magno. Durante o seu pontificado impulsou a evangelização da Inglaterra, procurando a integração dos monotelitas na Igreja — heresia que negava uma vontade humana em Cristo, mantendo somente a divina — a qual ele não combateu, inclusive aprovando a Ecthesis de Sérgio I de Constantinopla. Isso fê-lo ser condenado por heresia pelo Papa Leão II em 682. De fato Honório se mostrou incapaz de estar no mais alto comando da Igreja, ao invés de defender a fé tradicional, aceitou de bom grado a heresia. Instituiu a Festa da Exaltação da Santa Cruz, no dia 14 de Setembro. Sanou as questões da Igreja no Oriente e o cisma de Aquileia. Preocupou-se com a restauração das igrejas e mandou reparar o antigo aqueduto de Trajano, que levava água à cidade de Roma. Morreu em 12 de outubro de 638.

 

71º – Severino - 640  

               Foi o sucessor do Papa Honório I, e o condenador da doutrina monotelista. Severino nasceu em Roma, mas a data de seu nascimento não é conhecida. Seu pai se chamava Avienus, e é especulado que este poderia ter sido um dos senadores romanos. Ele foi eleito Papa em 28 de maio de 638, mas só foi consagrado em 28 de maio de 640. Foi eleito como de costume no terceiro dia após a morte de seu predecessor: Honório, e logo foram enviados representantes para Constantinopla a fim de obter a confirmação da sua eleição. Mas o imperador bizantino, Heráclio, em vez de conceder a confirmação, ordenou a Severino que assinasse a Ectese, uma profissão de fé monotelita escrita pelo próprio imperador junto do Patriarca de Constantinopla. O Papa eleito recusou terminantemente a fazê-lo. Por isso, o imperador ordenou o saque de Roma e das riquezas das igrejas, especialmente da Igreja de São João e do Palácio de Latrão, saqueado pelo Exarca Isaac. Mas Severino se manteve firme. Enquanto isso, seus enviados em Constantinopla, embora se recusassem a assinar qualquer documento herético e depreciassem a violência em questões de fé, comportaram-se com grande tato e finalmente garantiram a confirmação imperial. Após uma vacância de mais de um ano e sete meses, a Sé de Pedro foi novamente preenchida, e seu novo ocupante passou imediatamente a declarar que, como em Cristo havia duas naturezas, também havia nele duas vontades e duas operações naturais. É justamente esta coragem de Severino que faltou no Papa Honório. Durante seu breve reinado, ele construiu a abside da antiga Igreja de São Pedro, na qual foi sepultado. Morreu em 2 de agosto de 640.

 

72º - João IV - 640 - 642

               O Papa João IV, morreu em 12 de outubro de 642. Foi Bispo de Roma de 24 de Dezembro de 640 até sua morte. Sua eleição ocorreu após uma vacância de quatro meses. O Papa João era natural de Iadera, Dalmácia. Ele era filho do escolástico (advogado) Venantius. Na época de sua eleição, ele era Arquidiácono da Igreja Romana, um papel importante no governo da Sé. João era considerado um homem muito culto. Como a consagração de João em 24 de dezembro de 640 ocorreu logo após sua eleição, supõe-se que as eleições foram confirmadas pelo exarca de Ravena, e não diretamente pelo imperador em Constantinopla. Embora ainda apenas Papa eleito, João, com os outros Bispos da Igreja Católica, escreveu ao clero da Irlanda e da Escócia para contar-lhes os erros que estavam cometendo em relação ao tempo de guardar a Páscoa, e exortá-los a continuar sua guarda contra a heresia pelagiana. Quase ao mesmo tempo, ele condenou o monotelismo como heresia. O imperador Heráclio imediatamente renegou o documento monotelita conhecido como "Ectese". Ao filho de Heráclio, Constantino III, João dirigiu seu pedido de desculpas ao Papa Honório I, em que ele desaprovou a tentativa de conectar o nome de Honório com o monotelismo. Honório, declarou ele, ao falar de uma vontade em Jesus, pretendia apenas afirmar que não havia duas vontades contrárias Nele. Problemas em sua terra natal causados ​​por invasões de eslavos chamaram a atenção de João para lá. Para aliviar a aflição dos habitantes, João enviou o abade Martinho à Dalmácia e à Ístria com grandes somas de dinheiro para a redenção dos cativos. Como as igrejas em ruínas não puderam ser reconstruídas, as relíquias de alguns dos santos dálmatas mais importantes foram levadas para Roma. João então ergueu um oratório em sua homenagem. Foi adornado pelo Papa com mosaicos representando o próprio João segurando em suas mãos um modelo de sua oratória. João se esforçou assim para converter os eslavos da Dalmácia e da Ístria ao cristianismo. Imperador Constantino Porfirogênio afirmou que o duque Porga da Croácia, que tinha sido convidado para a Dalmácia por Heráclio, enviou ao Imperador Heráclio professores cristãos. Supõe-se que o Imperador a quem esta mensagem foi enviada foi o próprio imperador Heráclio, e que ele a enviou ao Papa João IV. João foi sepultado na Basílica de São Pedro.

 

73º - Teodoro I - 642 - 649

               Nascido em Jerusalém no ano 610, Teodoro era de origem grega e filho de um Bispo com o mesmo nome. Viveu uma época em que a Igreja Católica já havia consolidado seu poder no Império Romano e sua influência na cultura e na política do Ocidente.  A lacuna que o império deixava seria justamente ocupada pela Igreja Católica, a qual ampliaria significativamente sua influência e seu poder, o que caracterizaria uma nova etapa da história da humanidade que se convencionou chamar de Idade Média. Teodoro sucedeu o Papa João IV e foi eleito no dia 24 de novembro de 642. Foi ele quem agregou ao nome de Pontífice o título de Soberano, passando a reconhecer os Papas como Supremos Pontífices ou Sumo Pontífices, como dizemos atualmente. O Papa Teodoro I estava preocupado com a estrutura e a representação de poder da Igreja Católica. A designação criada por Teodoro I foi fundamental em teor simbólico para denotar o grande poder que o cristianismo havia conquistado. Além disso, Teodoro I aproveitou também para reorganizar a jurisdição interna do clero católico. O Papa Teodoro I enfrentou com fervor os chamados monotelistas, seguidores de uma doutrina que afirmava haver apenas uma natureza em Jesus Cristo. Os defensores desta ideia incomodaram os católicos durante muitos séculos e ainda existem, embora seja uma discussão que não tenha mais tanta repercussão. Na ocasião, perseguiu os monotelistas e também condenou os Patriarcas de Constantinopla. Ainda teve desavenças com o imperador romano. O Papa Teodoro I preocupado com a expansão da Igreja Católica, se cercou de homens cultos e distintos. Levou o cristianismo à Grécia, atingindo e convertendo os gregos que negavam a natureza divina de Jesus Cristo. Sua postura militante pelo cristianismo que, por vezes, era dotada de atos que incomodavam, fizeram levantar suspeitas de envenenamento, por isso a causa de sua morte não é muito bem explicada, considera-se que muitos opositores tenham tentado matá-lo. Inclusive o imperador romano da época. O Papa Teodoro I faleceu no dia 14 de maio de 649, após quase sete anos de papado. Seus restos mortais estão na Basílica de São Pedro.

 

74º - São Martinho I - 649 - 655

               Nascido em Todi, na Itália, em 590, Martinho viveu no império que havia se convertido e oficializado como cristão há relativamente pouco tempo. Destacado membro da Igreja Católica, foi eleito no dia cinco de julho de 649 para suceder o Papa Teodoro I. O Papa Martinho I possui destaque na história do cristianismo por introduzir algumas práticas religiosas que são celebradas até hoje. Ele foi o primeiro a celebrar a festa em homenagem à Virgem Imaculada, que passou a ser celebrada no dia 25 de março. Mas Martinho I também enfrentou grandes dificuldades, caracterizando uma gestão de muita complexidade. Assim que eleito, o Papa Martinho I convocou o Concílio de Latrão para debater e definir a doutrina oficial da Igreja Católica e a natureza de Cristo. Este era um problema que se arrastava desde os primórdios do cristianismo. Existiam, e ainda existem, diversas correntes de interpretação sobre a natureza de Jesus Cristo, considerando sua parte humana e sua parte divina. Na ocasião do Concílio de Latrão, o Papa Martinho I condenou os monotelistas. Embora tenha teoricamente solucionado uma questão de interpretação sobre a natureza de Jesus Cristo, este seria o menor dos problemas que enfrentaria durante seu pontificado. A maior parte do tempo que permaneceu como Sumo Pontífice Martinho I teve que encarar a prisão e o exílio. O Papa condenou os escritos de Heráclito e Constantino II, que eram imperadores bizantinos, e foi respondido com o aprisionamento e transporte para Constantinopla. No centro do Império Bizantino, o Papa Martinho I foi condenado à morte, mas sua sentença foi negociada. Martinho I foi forçado a renunciar para ter sua pena de morte suspensa. De toda forma, o Papa não escapou da prisão e dos maus tratos que se seguiriam até sua morte. Foi exilado na ilha de Naxos e declarado como herege, falecendo em Quersoneso no dia 12 de novembro de 665. Um ano antes de Martinho I falecer, já havia sido eleito o novo Papa, Eugênio I. Porém este não deixou de reconhecer e reverenciar Martinho, pois sua renúncia foi imposta em uma situação extrema, e a Igreja Católica não poderia ficar sem um líder. A maior parte das relíquias de Martinho I foram transferidas para Roma e se encontram na Basílica de San Martino ai Monti.

 

75º - Santo Eugênio I - 654 – 657

               Substituiu o Papa São Martinho I, quando este estava no exílio, na Criméia. Nascido no ano 615 em Roma, Eugênio era descendente de família siciliana e sempre se dedicou à vida religiosa. Foi núncio em Constantinopla e conhecia bem as características da vida bizantina. Eugênio era reconhecido e valorizado por seu valor moral e intelectual. Era um homem íntegro na fé. Quando o Papa Martinho I foi exilado em Constantinopla não houve dúvida, Eugênio seria seu sucessor. Porém a situação forçou um fato curioso. O cerco e o exílio sofridos pelo Papa Martinho I deixaram a Igreja Católica e a comunidade cristã carentes de uma liderança efetiva. Cientes da difícil situação vivida pelo Papa, Eugênio foi eleito, um ano antes da morte de Martinho I. O imperador Constante II, mais tarde, seria derrotado pelos muçulmanos. Eugênio I assumiu o papado restabelecendo a imagem de um Papa presente em meio a um momento conturbado e de perseguições. Ainda que o cristianismo já tivesse se estabelecido como religião oficial do Império Romano, disputas políticas e territoriais acabavam envolvendo a Igreja Católica. Eugênio I comunicou toda a Europa sobre o sofrido fim de Martinho I e buscou novos rumos de estabilidade para os religiosos. O maior problema que enfrentou durante seu papado foi em relação aos monotelistas. Com eles discutiu um problema teológico muito presente na época que debatia sobre a natureza de Cristo. Alguns monges também suspeitaram de seu papado, acreditando que teria sido eleito em função de tramas com Constantinopla. Mas este foi um problema menor, pois Eugênio tinha respaldo amparado em sua vida religiosa e era dedicado ao cristianismo romano. O Papa Eugênio I administrou as crises de seu papado com autoridade e manteve a unidade da fé. O Papa excomungou os monotelistas e condenou a corte bizantina pelo ocorrido com Martinho I. Foi um opositor de Constante II, do qual se livrou em 655 graças ao ataque dos muçulmanos. Popularmente, Eugênio I era reconhecido como um Papa benévolo e afável com todos. Preocupou-se muito com os pobres e deixou a eles todos os seus bens. Eugênio I faleceu no dia dois de junho de 657. Seus restos mortais estão na Basílica de São Pedro, no Vaticano.

 

76º - São Vitaliano - 657 - 672

               Não se conhece muito sobre a vida de Vitaliano. A data de seu nascimento, por exemplo, ainda é um mistério para os pesquisadores. Sabe-se apenas que ele era natural de Segni, na Itália. Vitaliano sempre foi um homem da Igreja e fiel defensor do catolicismo romano. Martinho I foi sucedido por um breve pontificado de Eugênio I, também acompanhado por Vitaliano. Após três anos do papado de Eugênio I, Vitaliano foi eleito no dia 30 de julho de 657 para ser seu sucessor. O Papa Vitaliano tentou melhorar o relacionamento com Constantinopla, causa de tantas perturbações nos dois papados anteriores. Sua estratégia, contudo, é não fazer afronta a seus líderes, tentando manter um relacionamento pacífico. Vitaliano foi bem correspondido pelo Patriarca de Constantinopla. O Papa tentou não ser um personagem de batalhas, mas mantenedor da fé e do cristianismo na Europa. Preocupava-se mais com a epidemia de peste que estava dizimando o clero no continente, causando outro tipo de crise. Ao invés de conflitos, prefere receber o imperador Constante II em Roma com honras quase religiosas. A postura conciliadora do Papa Vitaliano reflete na expansão da autoridade pontifícia sobre o território europeu. O Papa convocou, então, o VI Concílio Ecumênico para restabelecer a paz religiosa. No entanto, Vitaliano morreria antes de sua conclusão. Mas deixaria como legado a adoção da liturgia romana no território britânico, além de espalhar núncios por outras regiões do continente. Ele foi o primeiro Papa a autorizar o uso do órgão nas cerimônias religiosas e também destacou-se pela conversão dos lombardos ao cristianismo. O papado de Vitaliano durou 14 anos, e faleceu no dia 27 de janeiro de 672.

 

77º - Adeodato II - 672 - 676

               Nascido em Roma no ano 621, Adeodato era filho de Gioviniano e viveu no mosteiro de Santo Erasmo. Dedicou toda sua vida à Igreja, a maior parte dela como monge beneditino. Com o falecimento do Papa Vitaliano no ano 672, Adeodato foi eleito no dia 11 de abril do mesmo ano para ser seu sucessor, adotando o nome de Adeodato II. Foi ativo no melhoramento da disciplina monástica, organizando métodos e ações. Foi o primeiro Sumo Pontífice a datar seus atos. Seu papado também combateu o monotelismo, visto que naquela época, haviam diversas correntes de pensamento sobre a natureza de Jesus Cristo, o que causava debates fervorosos. Foram necessários alguns concílios para resolver a questão e definir o que era oficialmente aceito pela Igreja Católica. Além de problemas no cristianismo, o papado de Adeodato II também esteve em choque com o islamismo. Seu pontificado iniciou com a invasão de muçulmanos, o que teve de combater para conseguir liderar a Igreja em liberdade. Sabe-se muito pouco a respeito da vida do Papa Adeodato II, basicamente, há duas cartas que são atribuídas a ele. Uma escrita a Adriano, abade do monastério de São Pedro, e outra aos Bispos da Gália para informar os privilégios concedidos ao monastério de San Marino di Tours. Ainda assim, há dúvidas sobre a autenticidade das duas cartas. É certo, contudo, que Adeodato II foi uma pessoa generosa com todos, preocupado com peregrinos e com o próprio clero. Era muito caridoso com os pobres. Mesmo como Papa, vivia como monge, dedicando-se à oração e ao estudo das escrituras. Antes de falecer, e com a ajuda de missionários, conseguiu converter grande parte dos moronitas, povo de origem armeno-síriaca, ao cristianismo. Foi também responsável pela restauração da Basílica de São Pedro e reconstruiu e ampliou o monastério onde viveu, em Santo Erasmo. O Papa Adeodato II faleceu no dia 17 de junho de 676.

 

78º - Dono I - 676 - 678

               Nascido em Roma em data desconhecida, Dono era filho do romano Maurizio. Seu interesse pela vida religiosa ficou evidente desde muito cedo. Não há muita informação sobre sua vida antes do papado, mas sabe-se que Dono optou e ingressou cedo na vida eclesiástica, conquistando espaço e reconhecimento para se tornar o líder de toda a instituição religiosa. Dono sucedeu o Papa Adeodato II que faleceu no ano 676. No dia dois de novembro do mesmo ano, o conclave votou e decidiu pela eleição de Dono como novo Supremo Pontífice da Igreja Católica. Seu papado seria muito breve e em meio a grandes problemas. Assim que assumiu o posto, Dono teve de enfrentar o cisma de Ravena, que já vinha causando complicações. Foi bem sucedido, conseguindo encerrá-lo. O Papa Dono teve pouco tempo para comandar a Igreja Católica, mas exerceu um pontificado dinâmico. Incentivou o desenvolvimento de escolas através de Bispos em locais diversos, como Trevira, Galiléia e Cambrigde, que se tornariam referências culturais no futuro. Preocupou-se também com o patrimônio católico e romano, melhorando a arquitetura da cidade e restaurando as Basílicas de São Pedro e São Paulo Extramuros. O Papa Dono aproximou-se do Oriente e estabeleceu uma relação de amizade com o imperador Constantino IV, de Constantinopla, superando questões de cisma e permitindo o desenvolvimento de relações pacíficas com vizinhos. Dono permaneceu pouco tempo como Papa, pouco mais de um ano. Confiava muito em seu tesoureiro de nome Agatão, embora este não tivesse estudos suficientes e necessários, Dono o considerou digno de receber ordens Sacerdotais e o Consagrou, criando-o Cardeal e preparando-o para ser seu substituto. Dono sabia que não teria muito tempo de vida, faleceu no dia 11 de abril de 678 e foi enterrado na Basílica de São Pedro. Seu tesoureiro, que já era um ancião, tornou-se efetivamente seu sucessor, Papa Agatão, ou Agato.

 

79º - Santo Agato - 678 - 681

               Nascido no ano 620 na Sicília, Itália, Agatão viveu a parte inicial de sua formação religiosa em um mosteiro de Palermo. Foi uma homem sempre dedicado ao cristianismo, rendendo sua vida à devoção. Conquistou crescimento dentro da estrutura da Igreja Católica e tornou-se tesoureiro da Igreja, cargo que desempenhou bem por muitos anos mesmo sem ter os estudos necessários. Com o falecimento do Papa Dono, um conclave elegeu Agatão como novo Papa no dia 27 de junho de 678. Como Papa, conquistou o apoio político do imperador Pogonato e convocou um concílio ecumênico em Constantinopla para resolver problemas sobre a organização da Igreja. A aliança feita com o imperador Pogonato foi importante para acabar com o monotelismo. O acordo ainda o permitiu contestar os abusos imperiais. Agatão apresentou grande capacidade de administração na Igreja Católica e conquistou grandes avanços. Foi responsável por dialogar com os Bispos da região da Inglaterra e tornar a Irlanda um centro de cultura. Ele é autor do famoso juramento Papal, o texto que é repetido por todos os Papas assim que são eleitos. Uma tradição que mantém-se intacta. Na época, acreditava-se que Agatão teria realizado uma série de milagres, o que lhe rendeu os títulos de Taumaturgo e fazedor de Milagres. Devido a sua afeição pelos mosteiros, cuidou com muito afinco da disciplina nesses recintos religiosos. Seu papado chegou ao fim com um novo surto de peste. Não há informações precisas sobre isso, mas é possível que Agatão tenha sido uma das vítimas da peste, pois faleceu no dia dez de janeiro de 681, momento em que a epidemia estava em alta. Se tornou um dos Santos da Igreja Católica.

 

80º - São Leão II - 682 - 683

               Nascido na Sicília, Itália, no ano 611, Leão era um homem de múltiplos conhecimentos. Fontes e relatos históricos dizem que ele era atlético, eloquente, instruído nas escrituras sagradas, bom conhecedor das línguas grega e latina, perito em cantos e salmos, mestre de ciências, elegante nas palavras e no estilo, atencioso com os pobres e dedicado a socorros espirituais e temporais. Ele viveu em um momento em que o Império Romano enfrentava crises que o levariam a ruína. Os romanos não eram capazes mais de administrar todo o território que haviam conquistado, deter as invasões dos povos ditos bárbaros e progredia a escassez de escravos. Por sua vez, a Igreja Católica já havia se constituído como instituição religiosa de diversos poderes, a ponto de ocupar a lacuna deixada pelo Império Romano. Com o falecimento do Papa Agatão, Leão foi eleito para ser seu sucessor no dia 17 de agosto de 682. O Papa Leão II permaneceria muito pouco tempo a frente da Igreja Católica, mas, ainda assim, sua atuação seria marcante o suficiente para ser considerado Santo anos mais tarde. Uma das decisões mais importantes de seu papado foi a condenação do Papa Honório I, acusado de heresia em função de sua postura duvidosa sobre o monotelismo. Por outro lado, Leão II foi benevolente e acolheu fraternalmente muitos hereges arrependidos. Sobre as tradições católicas, o Papa Leão II ordenou a restauração da Igreja de Santa Bibiana e explorou com especial atenção o culto aos mártires São Sebastião e São Jorge. Faleceu no dia três de julho de 683, encerrando um curto período de aproximadamente dez meses de papado.

 

81º - São Bento II - 684 – 685

               Nascido em 635, Bento era proveniente de Roma e viveu uma época de ruína do Império Romano, que se desintegrava em vários reinos independentes. Nesse contexto, a Igreja Católica procurava manter sua autoridade e conquistar total independência nas relações políticas. Ainda era comum a interferência dos imperadores na eleição de novos Papas e nas decisões da instituição religiosa. Isso acontecia de tal maneira que, após o falecimento do Papa Leão II, passaram-se 11 meses até que Bento fosse consagrado como novo Papa, em 26 de junho de 684, já que aguardava a confirmação do imperador. O Papa Bento II era dotado de muito conhecimento das cerimônias religiosas da Igreja Católica, pois se dedicou a elas desde a infância. Em seu exercício pontifício lutou contra a prepotência imperial para livrar a Igreja das suas imposições. O Papa não teve muito tempo para grandes conquistas, mas, sem dúvida, ter superado o poder imperial para as decisões da Igreja, fazendo com que o imperador não precisasse mais confirmar o Papa eleito, foi o grande legado de seu papado para a instituição religiosa. O Papa Bento II ainda distribuiu cargos e recompensas para diversas ordens do clero e, inclusive, deixou 30 libras de ouro para serem divididas entre mosteiros, o clero e os leigos encarregados dos serviços da Igreja Católica. Seu papado foi curtíssimo, mas politicamente muito importante para a Igreja Católica. Faleceu no dia oito de maio de 685, menos de um ano após ter assumido o papado e aos 50 anos de idade. Foi, mais tarde, considerado Santo.

 

82º - João V - 685 - 686 

               Nascido na Antioquia, na Síria, no ano 635, João era um homem generoso e filho de sírios. Há poucas informações a respeito de sua vida antes do pontificado, mas sabe-se que ele sempre foi voltado para a educação religiosa cristã. Era um homem sábio e moderado que buscou a satisfação de sua vida através da religião, a qual se dedicou por completo. Começou a exercer suas funções religiosas como diácono e se tornou representante apostólico no Sexto Concílio Ecumênico, em 682, voltando para Roma com os documentos oficiais da ocasião. Com o falecimento do Papa Bento II, foi eleito para a sucessão no dia 23 de julho de 685. O Papa João V tomou uma decisão que foi repleta de implicações para a época. Ele se consagrou Papa sem esperar a autorização do imperador do Oriente. Assim, ele emancipou o papado de sua tutela e, mesmo desta forma, manteve sua simpatia. De tal maneira que o imperador reduziu os impostos cobrados sobre os patrimônios papais na Sicília e na Calabria e ainda reduziu outros fardos fiscais da Igreja Católica. Mas foi um ato político importante para emancipação da Igreja que ajudaria a construir o contexto de poderio e autonomia dos católicos durante toda a Idade Média na Europa. Outro importante evento do pontificado de João V foi a reunião de um concílio para organizar as dioceses de Sardenha e Córsega. O Papa conseguiu fazer com que essas igrejas ficassem sob sua autoridade diretamente e, então, somente a Santa Sé poderia nomear os Bispos das ilhas. Mas as implicações de seu papado cessaram aí, porque João V permaneceu pouco mais de um ano como líder da Igreja Católica. Só que essas duas medidas políticas foram muito significativas para o poderio católico e a administração de seu reino. Diz-se que o Papa João V era muito generoso e que teria chegado a distribuir cerca de dois mil soldos aos pobres. Mas suas ajudas acabaram no dia dois de agosto de 686 ao ser vitimado por uma longa enfermidade aos 51 anos de idade. Iniciando uma longa série de Papas provenientes do Oriente.

 

83º – Cónon - 686 – 687

               Nascido na Trácia, na Turquia, em 630, Cónon era filho de um soldado que recebeu sua educação na Sicília e depois se tornou presbítero em Roma. Dedicou sua vida à religião cristã e foi reconhecido por isso para ocupar o mais importante posto da Igreja Católica. Com o falecimento do Papa João V, Cónon foi eleito em 21 de outubro de 686 para ser seu sucessor. O Papa Cónon era um homem muito caridoso e bondoso. Em seu pontificado, ajudou a muitos mosteiros. No entanto, ele viveu em um período de muita turbulência da Igreja Católica, na qual sucediam-se muitos Papas porque eles exerciam o papado durante pouco tempo ou porque havia antipapas em constantes confrontos. Assim, muitos foram assassinados naquela época em função das disputas pelo poder. O papado de Cónon não foi diferente, ele enfrentou muitas dificuldades por causa da anarquia reinante na Igreja Católica. A situação era dramática a ponto de Cónon ter sofrido vários atentados. O somatório de um período de muita instabilidade com o fato do Papa Cónon ser proveniente da Turquia não agradava aos protagonistas dos confrontos da época. Cónon ficou muito pouco tempo exercendo seu pontificado, o qual, por ser muito instável, não apresentou avanços ou fatos importantes para a História da Igreja Católica. Acredita-se que o Papa Cónon tenha sido envenenado por uma das facções que tentavam alcançar o poder em Roma. Logo em seguida à morte do Papa, dois antipapas apareceram reclamando o poder, Pascoal e Teodoro, causando grande reboliço. A crise só foi resolvida com a eleição do Papa Sérgio I. Faleceu no dia 21 de setembro de 687, aos 57 anos de idade e com pouco menos de um ano de exercício de seu pontificado. Seu corpo foi sepultado na Basílica de São Pedro.

 

84º - São Sérgio I - 687 - 701

               Nascido em Palermo, numa data desconhecida, Sérgio foi eleito Papa em 15 de dezembro de 687. Logo em seguida, chegou da Bretanha o rei pagão Ceadwalla, soberano de Wessex, o qual desejava tornar-se cristão, recebendo o batismo diretamente das mãos do Papa Sérgio I, adotando o nome Pedro. Sérgio I foi um Papa muito popular, por ter sido um homem de fé, de oração. Antes de tornar-se Sacerdote, já era famoso na Schola Cantorum. Depois de ordenado, tornou-se um personagem eminente do clero. Quando morreu o Papa Cónon, em 687, foi indicado para sucedê-lo. Naquela época, os imperadores romanos do Ocidente e do Oriente reclamavam para si a autoridade de Pontífice, não aceitando estar abaixo do Papa, mesmo em questões de fé. Os Papas que iam contra essa exigência eram forçados a aceitá-la, ou morriam. Um exemplo foi o Papa Martinho I, que foi morto pelo imperador do Oriente, Constante II. Agora, Justiniano II, imperador do Oriente, desejava impor a Roma e a todos os cristãos as normas disciplinares adotadas em um concílio composto somente de Bispos orientais, efetuado em Constantinopla. Assim, ele mandou o respectivo decreto para aprovação do Papa Sérgio I. Entre outras coisas, o decreto terminava com o celibato sacerdotal. Sérgio negou-se, terminantemente, a aprovar tal decreto. Justiniano, então, enviou um alto dignitário, Zacarias, para prendê-lo e deportá-lo a Constantinopla, a exemplo de Martinho I. Porém Zacarias foi recebido pelas milícias formadas pelo povo que tentava ajudar Sérgio. Eram milhares de pessoas revoltadas pelos desmandos do imperador que circundavam o palácio Lateranense, residência do Papa. Zacarias procurou fugir, porém foi pego pelas milícias. Sérgio foi em seu socorro, libertou-o e perdoou. Mandou que retornasse ao seu imperador, ileso. Justiniano nada podia fazer para combater a popularidade deste Papa. A vontade de Roma permaneceu, bem como o celibato em toda a Igreja Católica. Apesar desses acontecimentos, o pontificado de Sérgio I foi marcado pela paz religiosa, numa época de muitas divergências teológicas a respeito da pessoa e da natureza de Cristo. Em seus quatorze anos de pontificado, trabalhou para o enriquecimento da liturgia. Deve-se a ele o canto do "Agnus Dei" durante a missa. Morreu aos 8 de setembro de 701 e foi sepultado na antiga Basílica de São Pedro.

 

85º - João VI - 701 - 705

               Papa da Igreja Católica Romana, nascido em data desconhecida, em Éfeso, Grécia, eleito em 30 de outubro de 701, sucessor de São Sérgio I. Governou a Igreja durante quatro anos de momentos difíceis para a cristandade, especialmente quando a Igreja estava cercada pelos turcos sarracenos (muçulmanos) no Oriente e na Espanha. Com os cristãos derrotados no Oriente e na Espanha pelos turcos sarracenos, defendeu os direitos da Igreja. Apesar de sua origem grega, com a ajuda do povo romano, enfrentou o imperador bizantino Tibério III, que tentou prendê-lo, e combateu os lombardos que assolavam a planície romana, salvando Roma da devastação. Eles marchavam contra Roma, conquistando várias cidades, tomando suas riquezas e escravizando seus moradores. Quando acamparam nas vizinhanças de Roma, o Papa, aflito com os sofrimentos das pessoas, enviou vários padres com dinheiro para uma negociação, no acampamento do Duque Lombardo Gisulf. Sua missão conseguiu pleno êxito e não só convenceram o duque a não atacar como resgataram todos os cativos e o persuadiram a devolver seus próprios territórios, mas mediante pagamento de uma alta soma em dinheiro e ainda lhes cedendo parte do exarcado de Ravena, cederam. Também interferiu nos assuntos e pacificou a Igreja na Inglaterra e conseguiu do rei Ethelred a nomeação de Wilfrid de York para Arcebispo de Canterbury. Faleceu em 11 de janeiro de 705, em Roma, foi enterrado na Basílica de São Pedro.

 

86º - João VII - 705 - 707

               Papa da Igreja Católica Romana, nascido em Rossano, na Calábria, eleito em 1 de março de 705, sucessor de João VI, que, devoto da Virgem Maria, ergueu várias igrejas para homenageá-la e mandou restaurar muitas outras. O ano do nascimento dele é desconhecido bem como pormenores de sua vida pré-papal, como muitos outros Papas que atuaram durante o período de influência bizantina em Roma. Sabe-se que descendia de grego, filho de uma família distinta e que o nome de seus pais eram os gregos Blatta e Platão. Antes da elevação dele, era o reitor do patrimônio Papal da Via Ápia (687). Fez oposição ao imperador Justiniano II, cujo governo promoveu medidas que incentivavam a desunião entre os povos latinos e os italianos do Império do Oriente, mas aprovou, por pressão do Imperador, os decretos do sínodo de Trullo. Manteve boas relações com os lombardos, restabeleceu a disciplina eclesiástica na Inglaterra. Construiu várias igrejas e um palácio episcopal perto da igreja de Santa Maria Antiqua. Também ergueu uma capela à Nossa Senhora, em São Pedro, e quando este oratório foi destruído, alguns dos seus mosaicos foram preservados, e podem ser vistos na Igreja romana de Santa Maria, em Cosmedin e em outros lugares. Ele recebeu através do rei lombardo Aripert II a devolução dos patrimônios Papais no Cottian Alpes que os lombardos tinham confiscado. Faleceu no Palácio que tinha construído perto do Palatino, em 18 de outubro, foi enterrado no oratório que ele tinha erguido em São Pedro.

 

87º – Sisínio - 708

               Papa da Igreja cristã Romana, nascido na Síria, eleito em 15 de janeiro de 708, como sucessor de João VII, que por estar velho e doente de gota, seu precário e fugaz pontificado durou apenas vinte dias e a única coisa que fez foi arrecadar fundos para a restauração das muralhas desmoronadas de Roma. Seu pai também se chamava João e, apesar de extremamente limitado fisicamente, com seu caráter forte aceitou o sacrifício com altivez como mais uma missão em sua vida. A corte de Constantinopla perdia progressivamente seu poderio e o imperador bizantino não conseguia mais impor sua autoridade no Ocidente, os búlgaros levavam vantagem no Oriente, os Sarracenos se impunham na África, na Itália os Longobardos progrediam. A Itália acostumou-se a esquecer o imperador e a população agrupava-se sempre mais em torno do Pontífice Romano, como o centro natural e político da Itália. Pela brevidade de seu pontificado não conseguiu fazer obras importantes e preocupou-se com o embelezamento da cidade eterna e a restauração das muralhas de Roma, a fim de proteger a cidade dos assédios dos longobardos e sarracenos. Antes de morrer ainda criou e consagrou o Bispado da Córsega. Morreu em 4 de fevereiro de 708, em Roma e enterrado em São Pedro.

 

88º – Constantino - 708 – 715

               Papa italiano, crê-se que tinha as suas raízes na Síria, sendo filho de João, e que teria sido Arquidiácono antes da sua consagração como Bispo de Roma. Um ano após esta consagração, Constantino I sagrou Félix Bispo de Ravena. Este, contudo, quis tornar a sede autônoma e recusou o voto de fidelidade ao Pontífice romano, e, como consequência do seu comportamento sofreu uma terrível expiação divina, voltando atrás em sua decisão, deu voto de lealdade a Constantino. Constantino I foi um Papa que desfrutou de uma grande popularidade, apesar dos difíceis tempos em que decorreu grande parte do seu pontificado, de 25 de março de 708 a 9 de abril de 715. Este Papa não permitiu aos Bispos de Milão a designação dos Bispos de Pavia, como tinha sido uso até ao estabelecimento dos lombardos. Entre os anos 710 e 711 esteve em Bizâncio, a convite do imperador Justiniano II, para que as conclusões do Quinquagésimo Sexto Concílio, realizado em 692, fossem do agrado tanto da Igreja Oriental como da Ocidental. Foi auxiliado nesta difícil tarefa pelo futuro Papa Gregório, que então era diácono. Tendo esta missão sido concluída com satisfação tanto do Papa como do imperador, este confirmou os direitos de Constantino sobre a cidade de Roma. Ao regressar a Roma deparou-se com a notícia da invasão muçulmana na Espanha. No final do ano de 711 recebeu uma carta de Filipico Bardanes, pretendente ao trono de Justiniano, que tinha sido assassinado, pedindo ao Papa que confirmasse a sua confissão de fé. Constantino I não aceitou esta confissão, uma vez que Filipico era monotelista e tinha usurpado o trono de Justiniano, o que provocou acesos confrontos na cidade de Roma. Com a substituição de Filipico por Anastácio II instaurou-se de novo a paz. Este episódio demonstra claramente a autoridade que estava a ser reconhecida aos Pontífices romanos.

 

89º - São Gregório II - 715 - 731

               Gregório nasceu no ano de 669. Pertencia a uma família cristã da nobreza romana, o pai era senador e a mãe uma nobre, que se dedicava à caridade. Ele teve uma educação esmerada junto à cúria de Roma. Muito culto, era respeitado pelo clero Ocidental e Oriental. Além da conduta reta, sabia unir sua fé inabalável com as aptidões inatas de administrador e diplomata. Tanto que, o Papa Constantino I pediu que ele o acompanhasse à capital Constantinopla, para tentar resolver junto ao imperador do Oriente, Leão II, que se tornara iconoclasta, a grave questão das imagens. Escolhido para o pontificado em 19 de maio de 715, Gregório II governou a Igreja durante dezesseis anos. Neste longo período, administrou seu rebanho com generosidade e sabedoria, consolidando a posição da Igreja no cenário político e religioso. Em 719, enviou São Bonifácio à Alemanha e nos anos seguintes encorajou e apoiou a sua missão apostólica. Incentivou a vida monástica e enfrentou com firmeza, o imperador Leão II, que com um decreto proibia o culto das imagens, o qual, provocou um levante das províncias da Itália contra o exército que marchava para Roma. Gregório não se intimidou, mas para evitar um confronto com os muçulmanos, mandou consertar as muralhas de Roma. Desde os primeiros tempos, o cristianismo venerou as imagens de Cristo, da Virgem e dos santos. Esta maneira, típica do Oriente, de expressar a religiosidade chegou e se difundiu por todo o Ocidente a partir dos séculos VI e VII. A seita iconoclasta não entendia o culto como legítimo, baseando-se no Antigo Testamento e também porque numa imagem de Cristo não se pode representar as suas duas naturezas: terrena e divina, que são inseparáveis. Mas, a legitimidade foi comprovada através dos argumentos da Sagrada Escritura e essencialmente do fato da própria encarnação. O Papa Gregório II expulsou a seita dos iconoclastas, antes de falecer no dia 11 fevereiro de 731. A Igreja sempre condenou a idolatria com rigidez e como reza o Evangelho, por isto mesmo nunca prestou adoração a imagem alguma. O culto tradicional de veneração sim, pois nele não se adora uma imagem, este ato é dirigido à memória e à lembrança, daqueles que ela resgata e reproduz. São Gregório II faz parte do calendário litúrgico se sua festa foi designada para o dia 13 de fevereiro.

               São Bonifácio (em latim: Bonifacius, "aquele que faz o bem"; ca. 672 – 5 de Junho de 754 ou 755), de seu nome verdadeiro Vinfrido, e cognominado Apóstolo dos Germanos. Um acontecimento-chave da sua vida ocorreu em 723, quando derrubou o carvalho sagrado dedicado ao deus Thor, perto da moderna cidade de Fritzlar, no norte do Hesse, e construiu uma pequena capela a partir da sua madeira, no local onde hoje se ergue a catedral de Fritzlar, e onde se viria a estabelecer a primeira sede de Bispado na Alemanha ao norte do antigo limes romano, junto do povoado fortificado franco de Buraburgo, numa montanha próxima da cidade, junto do rio Éder. Este acontecimento é considerado como o início formal da cristianização da Germânia. Bonifácio jamais perdeu a esperança de converter os frísios, e em 754 retomou à Frísia com um pequeno grupo de seguidores. Batizou um grande número de pagãos, e marcou um encontro para a confirmação dos novos batizados num local perto de Dokkum, entre Franeker e Groninga. Contudo, em vez dos seus convertidos, um bando de pagãos armados apareceu e assassinou o Arcebispo Bonifácio. Os seus restos mortais viriam a ser enterrados na abadia de Fulda (atual Catedral de Fulda). São Bonifácio foi declarado Santo e mártir pelas Igrejas Católica Romana e Ortodoxa Oriental, sendo celebrado a 5 de Junho, data da sua morte.

 

90º - São Gregório III - 731 - 741

               Papa de origem siríaca, antigo monge beneditino tornado cardeal em 726, depois de S. Gregório II, foi o último Papa a necessitar do consentimento do imperador para o exercício das suas funções. O seu papado ocorreu de 18 de março de 731 a 28 de novembro de 741. Reforçando a posição do seu antecessor, convocou um sínodo no mês de novembro de 731 que condenou os iconoclastas à excomunhão, depois de ter enviado uma carta (que ficou sem resposta) ao imperador Leão III, com um pedido de renúncia à destruição de imagens. Quando o imperador tomou conhecimento das atas deste sínodo ordenou que fossem apreendidas as propriedades da Igreja que se encontravam nos seus domínios, como por exemplo na Sicília e na Calábria. A partir de então todos os que condenavam a iconoclastia recorriam a Roma, que também se tinha tornado autônoma. Esta autonomia era suportada pela independência política e econômica das possessões romanas no Ocidente. Gregório III investiu sobretudo na estruturação hierárquica da Igreja ocidental, tendo enviado o pallium a São Bonifácio, Bispo da Frísia, em 732, e encarregando-o de formar mais dois Bispados. A partir deste ano de 732 os sete Bispos existentes na cristandade ocidental passaram a ser denominados Cardinales ou Cardeais. Cinco anos depois São Bonifácio deslocou-se de novo a Roma e o Papa delegou-lhe os poderes necessários para remodelar a igreja franca. Gregório III conseguiu que o rei lombardo Liutprando restituísse Ravena ao imperador bizantino, Leão III. Este enviou ao Papa, como agradecimento, seis colunas de ónix, colocadas então no altar de São Pedro. Mais tarde, no ano de 739, o Papa viu-se obrigado a pedir ajuda a Carlos Martel contra as invasões lombardas no ducado da Itália, enviando-lhe relíquias e presentes valiosos. Esta delegação, contudo, não foi bem sucedida, assim como a que lhe sucedeu em 740, uma vez que Carlos Martel não podia responder aos pedidos do Pontífice romano. Martel optou por enviar um emissário, o abade Grimão, ao rei lombardo, para o dissuadir dos seus propósitos. A data de sua morte é desconhecida, em novembro ou dezembro de 741. Foi sepultado no oratório de Nossa Senhora, construído para si na Basílica de São Pedro.

 

91º - São Zacarias - 741 - 752  

               Papa Zacarias era natural da Calábria, Itália. Zacarias nasceu de uma família grega e o seu pai, segundo o Liber Pontificalis, chamava-se Polichronius. Muito provavelmente Zacarias foi diácono da Igreja Romana e, como tal, assinou os decretos do Concílio Romano de 732. Foi eleito em 10 de Dezembro de 741, num período caracterizado pela hostilidade do Império Bizantino e dos lombardos contra o ducado romano, pôs em risco a sua vida ao lutar contra os lombardos, cujo rei devolveu à Igreja as terras que havia tomado. Em uma visita do rei lombardo à Terní, recebeu de volta as cidades de Ameria, Horta, Polimartio e Blera e juntou todo o patrimônio da Igreja romana, que tinha sido roubado pelos lombardos nos últimos trinta anos.

               São Zacarias assinou uma trégua de vinte anos entre o ducado de Roma. Foi recebido de volta pelo povo romano com uma procissão solene. Agradecido a Deus pelos resultados que o Papa tinha conseguido na viagem, mandou construir uma capela na Igreja de São Pedro, em nome do rei Liutprand. Porém, decepcionou-se com o rei quando, no ano seguinte, ele estava pronto para atacar o território de Ravena e o Arcebispo dessa diocese implorou ao Papa que fizesse algo para ajuda-los. Zacarias enviou emissários para resolver o problema, mas eles voltaram sem nada conseguir. Então, ele mesmo foi até Ravena, depois, para Paiva visitar Luitprand, que já estava pronto para começar a invasão. Era véspera de festa de São Pedro e São Paulo. Foi ele quem celebrou a vigília e, com isso, conseguiu convencer o rei a não fazer esse ataque a Ravena. Meses depois, Liutprand morreu, sendo que o primeiro sucessor desistiu e subiu ao trono Ratchis, para conduzir o reino dos lombardos. O novo rei tinha imenso respeito pelo Papa Zacarias, mas, apesar de muito piedoso, sitiou Perusa por pressão dos seus comandados.

               Outra vez, São Zacarias dirigiu-se ao acampamento lombardo. Suas palavras comoveram tanto o rei, que não só levantou o cerco da cidade, mas concedeu a paz aos romanos. Pouco tempo depois, renunciando ao mundo com sua mulher e filha, depôs a coroa aos pés do Papa. Zacarias benzeu suas vestes monarcais e ficou comovido com a família real. Nessa época, os francos voltaram para a Igreja e ela se tornou mais forte, garantindo a ordem cristã. Favoreceu a evangelização da Germânia por São Bonifácio e colaborou na primeira reforma da Igreja franca, com o apoio de Pepino o Breve, cuja coroação como rei dos francos aprovou. Esta foi a primeira investidura de um soberano por parte de um pontífice. Soube que mercadores de Veneza traficavam escravos cristãos para os mouros, pelo que os comprou de volta, dando-lhes a liberdade. Faleceu em 22 de Março de 752.

 

92º – Estevão I; II - 752  

               Foi eleito no mês de março de 752, mas veio a falecer três dias depois.  Seu nome consta honorificamente na relação dos Papas.  Lembrando que no pontificado de 254 a 257 houve um Papa com o mesmo nome.  Estevão só não aparece como o Papa Estevão II porque não houve tempo de ser oficialmente consagrado ao cargo pontifício.  Por isso, os Papas sucessores com o mesmo nome abtiveram a designação numérica dupla.

 

93º - Santo Estevão II; III - 752 - 757

               O pontificado de Estevão II, foi breve mas historicamente importante. John Kelly, no Grande Dicionário Ilustrado dos Papas, observa: “O seu pontificado assistiu não apenas à separação de Bizâncio e à sua passagem para a proteção do reino dos Francos, mas também à formação do Estado Pontifício”. A ocasião para a mudança de rota, que abriu de fato um novo curso na história europeia, foi oferecida paradoxalmente pela hostilidade do rei lombardo Astolfo (749-756), que depois de ter conquistado Ravena chegava às portas de Roma. Estevão, ao invés de pedir ajuda a Bizâncio, dirigiu sua súplica a Pepino III, rei dos Francos (751-768). “O papado, que até então sempre havia se apoiado em Bizâncio, se separou definitivamente do império do Oriente e dirigiu-se completamente para o Ocidente, representado pelo reino dos Francos”, escreve August Franzen na História da Igreja. Pepino, por sua parte, deu uma resposta afirmativa: oferecia a potência político-militar franca para o serviço e a proteção da Igreja. A viagem da Itália para a França, empreendida pelo Papa, simbolizou a dissolução da relação do papado com o império bizantino-romano e a passagem histórica do período bizantino para o franco”. No dia 6 de janeiro de 754, Estevão foi “obedientemente acolhido por Pepino, na França, e então teve a chance de pedir ao rei a ajuda necessária para enfrentar a ameaça lombarda na Itália. Pepino respondeu positivamente ao pedido de ajuda do Papa, numa célebre “promessa de doação”, que infelizmente não possuímos mais no seu texto original, Pepino se comprometeu a restituir a Estevão II todos os territórios da Itália central, que ele tomaria das mãos dos lombardos. Nascia assim o futuro Estado Pontifício. O Glossario Lanczowski-Ricchetti simplesmente anota: “Na realidade, o Estado Pontifício teve a origem mais natural da história: foi o povo romano, praticamente abandonado pelas autoridades civis, que, durante as invasões bárbaras, se dirigiu ao Papa e ao seu prestígio”. Depois de duas campanhas vitoriosas contra Astolfo, implicou em um ato de doação oficial assinado que definiu os territórios que se tornariam de plena propriedade de São Pedro e de seus sucessores: as cidades de Sinigaglia, Fano, Pesaro, Rimini, Ancona e o exarcado de Ravena, que abrangia vinte cidades e centenas de aldeias. Assim nascia oficialmente o Estado Pontifício, que duraria mais de 1100 anos. Assim recuperou as terras da Igreja, das quais se tornou administrador, tornando-se efetivamente o primeiro Papa soberano de estado. Assim, entre Estevão e Pepino houve um acordo recíproco: Pepino se empenharia em proteger a Igreja romana, reconhecendo seu domínio temporal na Itália, e Estevão, no dia 28 de julho de 754, ungiria solenemente Pepino como protetor de Roma, patricius romanorum. Mantendo a sua promessa, Pepino veio à Itália e venceu duas vezes o rei lombardo: a primeira e a segunda paz de Pavia. Dessa forma, nascia oficialmente o novo Estado Pontifício e Estevão II se erguia como seu fundador.

 

94º - São Paulo I - 757 - 767

               São Paulo I foi Papa entre 29 de maio de 757 a 28 de junho de 767 e irmão do Papa Estêvão II. Outro caso encontraremos entre os irmãos Bento VIII e João XIX. Paulo I era romano, filho de Constantino, que era um simples trabalhador de olaria, mas que, em sua sabedoria, soube proporcionar aos filhos, treze ao todo, uma educação exemplar. Órfão desde tenra idade, foi educado, como seu irmão, na escola patriarcal de Latrão. Através de um acordo com Desidério, rei dos Lombardos, conseguiu manter os Estados Papais. Salvou relíquias das catacumbas e combateu o iconoclasmo, abrigando os monges do Oriente que eram perseguidos pelos iconoclastas. Eleito Papa, Paulo I escreveu logo ao rei Pepino, dos Francos, comunicando sua nomeação "por unânime escolha do povo". Pepino respondeu com palavras encomiásticas e lhe enviou um cacho de cabelos de sua filhinha Gisela, irmã do futuro Carlos Magno, pedindo ao Papa que aceitasse ser padrinho da pequena princesa. Os duques e condes romanos acolheram com entusiasmo a proteção do rei franco, que de longe os deixava tranquilos sob o governo pontifício, e, lhes dava garantias contra a barbárie dos Lombardos. O novo rei Lombardo, Desidério, saqueava as cidades e os campos. Somados aos ataques Bizantinos, a devastação foi enorme. Paulo I deu provas de grande habilidade e muita paciência, conseguindo abrandar Desidério. O grego de nome Constantino V Coprônimo, destruidor de imagens, espalhava boatos de terríveis esquadras e ingentes exércitos que estava preparando para ocupar Roma. Paulo I celebrizou-se por sua caridade sem alarde. Visitava à noite os cárceres, libertando, com seu direito de indulto, os condenados à morte. Fazia pagar às escondidas os débitos dos que jaziam presos por insolvência, e colocar víveres e roupas à porta das casas dos pobres. Em 761, fundou com monges gregos, o convento de São Silvestre, ainda hoje existente no local dos antigos e famosos jardins de Lúculo. Terminou a capela de Santa Petronila, iniciada por seu irmão, e chamada capela dos reis francos. São Paulo I morreu ternamente em 28 de junho de 767 e por isso é venerado Santo no mesmo dia de sua morte. Antipapas deste período: Constantino II (767-768), Filipe (768).

 

95º - Santo Estevão III; IV -768 - 772

               Papa e Santo da Igreja Cristã de Roma, nascido na Sicília, eleito em 7 de agosto de 768, como sucessor de São Paulo I. Foi eleito em difíceis circunstâncias, após a cruel luta entre os partidários do primiceirus Cristóforo e do duque Toto de Nepi e a eleição e deposição de Constantino II. O antipapa Constantino, um leigo a quem a aristocracia romana havia coroado Papa. Dois anos depois (769), de fato, o concílio anulou a eleição de Constantino e determinou que o Papa só podia ser eleito pelo clero e escolhido entre cardeais, padres e diáconos. O Arcediago Cristóforo, que cuidava dos negócios da Igreja para o Papa, reuniu o clero romano e escolheu esse monge de quarenta e quatro anos. Os antipapas, o leigo Constantino e o Padre Filipe que ocupavam a cátedra Papal, foram presos e o então Papa convocou um sínodo, no qual decretou que nenhuma pessoa leiga poderia tornar-se Papa. Convenceu Carlos Magno, rei dos francos, e ajudou os cristãos da Palestina. No entanto, o acordo entre Desidério, rei dos lombardos, e Pepino, rei dos francos, logo foi rompido, Cristóvão caiu em desgraça e viu-se sem apoio político forte até sua morte em Roma.

 

96º - Adriano I - 772 - 795

               De 1 de fevereiro de 772 a 25 de dezembro de 795, seu Pontificado de vinte e três anos, dez meses e vinte e quatro dias foi inigualável em comprimento por qualquer sucessor de São Pedro até mil anos depois, quando Pio VI foi deposto e aprisionado pelas mesmas Armas francas que entronizaram o primeiro Papa-rei, superou Adriano por um pontificado de seis meses a mais. Em um período crítico da história do papado, Adriano possuía todas as qualidades essenciais do fundador de uma nova dinastia. Ele era um romano de nobre educação e estatura majestosa. Por uma vida de singular devoção, por realizações consideradas extraordinárias naquela época de ferro e por serviços valiosos prestados durante o pontificado de Paulo I e Estêvão III, ele conquistara tanto a estima de seus conterrâneos indisciplinados que o poderoso camareiro, Paulo Afiarta, representando em Roma os interesses do rei lombardo Desidério, não tinha poder para resistir à voz unânime do clero e do povo que exigia Adriano para o trono Papal. A política temporal do novo pontífice era, desde o início, fortemente definida e tenazmente cumprida; a tônica foi uma firme resistência à agressão Lombarda. Ele libertou da prisão ou retirou do exílio as numerosas vítimas da violência do camareiro; e, ao descobrir que Afiarta fizera com que Sérgio, um alto funcionário da corte Papal, fosse assassinado na prisão, ordenou sua prisão em Rimini, enquanto Afiarta estava voltando de uma embaixada para Desidério com a intenção declarada de levar o Papa à corte Lombarda, “mesmo que fosse a Cadeias”. O tempo parecia propício para sujeitar toda a Itália ao domínio lombardo; e com antagonistas menos capazes do que Adriano e Carlos (que seria famoso em épocas posteriores como Carlos Magno), muito provavelmente a ambição de Desidério teria sido satisfeita. Parecia pouca as chances de uma intervenção franca. Os lombardos mantinham as passagens dos Alpes, e Carlos estava absorto pelas dificuldades da guerra saxônica; além disso, a presença em Pavia de Gerberga e seus dois filhos, a viúva e os órfãos de Carlomano, cujos territórios, após a morte de seu irmão Carlos, havia anexado, pareciam oferecer uma excelente oportunidade de provocar discórdia entre os francos, se apenas o Papa pudesse ser persuadido ou coagido a ungir os filhos como herdeiros do trono de seu pai. Em vez de obedecer, Adriano valentemente determinou a resistência. Fortaleceu as fortificações de Roma, convocou para a milícia os habitantes do território circundante e, quando o exército lombardo avançou, a devastação e a pilhagem convocaram Carlos a apressar-se em defesa de seus interesses comuns. Uma calmaria oportuna na guerra saxônica deixou o grande comandante livre para agir. Incapaz de levar os traiçoeiros Lombardos a termos para aberturas pacíficas, escalou os Alpes no outono de 773, tomou Verona, onde Gerberga e seus filhos procuraram refúgio, e sitiou Desidério em sua capital. Na primavera seguinte, deixando seu exército para prosseguir o cerco de Pavia, ele prosseguiu com um forte desapego a Roma, a fim de celebrar o festival da Páscoa no túmulo dos Apóstolos. Chegando no Sábado Santo, foi recebido por Adriano e pelos romanos com a máxima solenidade. Os três dias seguintes foram dedicados a ritos religiosos; na quarta-feira seguinte aos assuntos de estado. O resultado duradouro de seu importante encontro foi a famosa “Doação de Carlos Magno”, por onze séculos a Magna Carta do poder temporal dos Papas. A investigação minuciosa e imparcial de Duchesne sobre sua autenticidade em sua edição do Liber Pontificalis parece ter dissipado qualquer dúvida razoável. Dois meses depois, Pavia caiu nas mãos de Carlos; o reino dos lombardos foi extinto, e o papado foi para sempre libertado de seu inimigo hereditário e persistente. Nominalmente, Adriano era agora monarca de mais de dois terços da península italiana; mas sua influência era pouco mais do que nominal. Em grande parte do distrito mencionado na Doação, as reivindicações papais foram autorizadas a caducar. Para ganhar e recuperar o resto, Carlos foi forçado a fazer repetidas expedições pelos Alpes. Podemos duvidar se o grande rei dos francos teria sofrido as dificuldades do Papa para interferir em seus cuidados mais imediatos, não fosse por sua extrema veneração pessoal a Adriano, que na vida e na morte nunca deixou de proclamar seu pai e melhor amigo. Não foi em menor grau, devido à sagacidade política, vigilância e atividade de Adriano, que o poder temporal do papado não permaneceu uma ficção da imaginação. Seus méritos foram igualmente grandes nas preocupações mais espirituais da Igreja. Em cooperação com a imperatriz ortodoxa Irene, ele trabalhou para reparar os danos provocados pelas tempestades iconoclastas. No ano de 787, ele presidiu, através de seus legados, o Sétimo Concílio Ecumênico, realizado em Nicéia, no qual a doutrina católica relativa ao uso e à veneração de imagens foi definitivamente exposta. A importância da oposição temporária aos decretos do Concílio em todo o Ocidente, causada principalmente por uma tradução defeituosa, agravada por motivos políticos, tem sido muito exagerada nos tempos modernos. A controvérsia suscitou uma forte refutação do chamado Libri Carolini do Papa Adriano e não ocasionou nenhuma diminuição da amizade entre ele e Carlos. Ele se opunha mais vigorosamente, por sínodos e escritos, à nascente heresia do Adocionismo, um dos poucos erros cristológicos originados pelo Ocidente. O Liber Pontificalis amplia seus méritos para embelezar a cidade de Roma, na qual se diz que ele gastou quantias fabulosas. Ele morreu universalmente lamentado e foi enterrado em São Pedro. Seu epitáfio, atribuído a seu amigo vitalício, Carlos Magno, ainda existe. Raramente o sacerdócio e o império trabalharam juntos tão harmoniosamente, e com resultados tão benéficos para a Igreja e para a humanidade, como durante a vida desses dois grandes governantes. As fontes principais de nossa informação sobre Adriano são a vida no Liber Pontificalis, e suas cartas para Carlos Magno, preservadas por este último em seu Codex Carolinus. As estimativas do trabalho e do caráter de Adriano pelos historiadores modernos diferem das visões variadas dos escritores em relação à soberania temporal dos Papas, dos quais Adriano I deve ser considerado o verdadeiro fundador.

 

97º - São Leão III - 795 – 816

               Nascido em Roma no ano 750, Leão era proveniente de uma modesta família da Itália. Seu envolvimento com a vida religiosa começou muito cedo. Ainda jovem já exercia funções dentro da Igreja Católica. Em sua juventude, foi responsável pelas roupas e os objetos preciosos da Basílica de Latrão. Naturalmente, sua livre circulação por ambientes tão importantes para a religião o colocou em contato com o alto clero, o que certamente influenciou e incentivou sua trajetória. Aos poucos, Leão foi crescendo na importância dos cargos que exercia e estabeleceu uma carreira religiosa promissora. Muito embora ele fosse bem relacionado com o clero, a nobreza romana não agradava a sua presença e o poder que poderia conquistar. De tal maneira que, com o falecimento do Papa Adriano I, a nobreza não desejava que Leão fosse o sucessor na liderança da Igreja. Naquela ocasião, ele tinha 45 anos de idade. Então, o clero contrariou os anseios da nobreza e o elegeu Papa no mesmo dia da morte de seu antecessor, 26 de dezembro de 795. O papado de Leão III já começou enfrentando dificuldades. Isso porque sua eleição desagradou extremamente os partidários de seu sucessor que previam perda de privilégios. A desordem tomou conta de Roma em um ambiente de grande instabilidade. Sem mais o que fazer, a nobreza se deu conta de que a eleição do novo Papa era definitiva e que o relacionamento com ele deveria ser revista. A Igreja Católica conseguiu contornar relativamente a tensão que pairava em Roma, criando as condições mínimas necessárias para o pontificado de Leão III. Todavia os adversários e opositores permaneceram presentes, ameaças constantes que poderiam resultar em graves problemas. Um momento agudo do convívio com o risco ocorreu enquanto o Papa se deslocava a cavalo de Latrão para San Lorenzo in Lucina no dia 25 de abril de 799. Naquele dia, o Papa iria presidir uma procissão, mas foi atacado e ferido no caminho. Por sorte, o ataque não resultou em óbito e o Papa conseguiu escapar e se abrigar na Basílica de São Pedro. Certo da extremidade dos riscos que corria e farto das desordens, o Papa foi em busca do auxílio de um dos mais importantes monarcas da história da Europa, Carlos Magno. Este ofereceu proteção para o Papa retornar a Roma. No ano seguinte, Carlos Magno foi coroado pelo Papa Leão III como imperador, marcando a retomada do Império Romano do Ocidente. Assim, o Papa e a Igreja Católica conseguiam uma grande vitória, aliando-se aos francos e libertando-se dos bizantinos. Evidentemente, o status deu grande poder político ao Imperador Carlos Magno, que condenou todos os opositores do Papa à morte. No entanto, o próprio Leão III retirou a sentença. Os adversários do Papa Leão III o acusavam, entre outras coisas, de adultério. Os boatos se espalharam rapidamente colocando em dúvida a integridade do Pontífice. Foi preciso que o Papa assinasse uma declaração solene no ano 800 jurando não ter cometido os crimes que eram imputados a ele. Após a coroação de Carlos Magno, famílias nobres de Roma se revoltaram novamente causando novas conturbações. O Papa Leão III deixou como legado a condenação do adocionismo, uma visão teológica do cristianismo primitivo que alega que Jesus nasceu humano e só se tornou filho de Deus em seu batismo. Seu pontificado chegou ao fim no dia 12 de junho de 816, quando faleceu aos 66 anos de idade e após 21 anos à frente da Igreja Católica. É considerado Santo.

 

97 . 1 - Aparição de Nossa Senhora em Corbie - França

               Ansgário ou Anscário de Hamburgo, O.S.B. Amiens, 8 de setembro de 801 – Brema, 3 de fevereiro de 865), conhecido também por Oscar, foi um monge beneditino franco, mais tarde missionário e Bispo que, após sua morte, foi canonizado pelo Papa Nicolau I. Em 815, quando era muito moço, Nossa Senhora apareceu ao Apóstolo do norte, como ficou conhecido Santo Ansgário, após ter evangelizado a Dinamarca e a Suécia, e pediu-lhe: que dedicasse toda sua existência ao trabalho para Deus. Em toda sua vida destacou-se à devoção filial a Virgem Maria, à oração, à caridade e ao apostolado. Inclusive sendo distinguido pelo Papa Gregório IV como seu representante para toda a Escandinávia, devido à intensa evangelização dos moradores dessa região européia. Esse grande Santo procurou cumprir da melhor maneira que lhe fora possível, a missão designada pela misericordiosa Mãe de Deus. Oscar era um grande estudioso. Desde pequeno foi aluno dos Beneditinos, na abadia de Corbiè, perto de Amiens, no norte da França. Para ali, voltou, mais tarde, como monge e, depois, como "Magister interior", um cargo que desempenhou na nova Corbiè, comunidade nascida na Saxônia.

               Em 826, Oscar partiu para a Dinamarca, com o novo rei Harald, que acabava de ser batizado por ele, mas, depois de apenas um ano, o soberano foi obrigado a renunciar ao trono. Então, Oscar seguiu o monge Vitimaro, em sua missão na Suécia, onde o rei local era tolerante com a pregação do cristianismo, considerado a religião dos estrangeiros, seguido mais pelos prisioneiros de guerra. Os resultados foram tão bons que o novo imperador, Ludovico o Piedoso, encorajou o nascimento, naquelas terras, de uma nova estrutura eclesiástica, que, porém, teve como sede Hamburgo, além-mar. Ali Oscar se tornou Bispo.

               Quando Ludovico morreu, o império começou a desagregar-se, por causa também das incursões de pessoas, como os normandos, que, naqueles anos, devastavam os territórios do norte da Europa. A invasão dos Vikings chega a Hamburgo. Assim, Oscar foi obrigado a refugiar-se em Bremen, onde como Bispo, passou os últimos anos da sua vida: ali, segundo algumas fontes, trabalhou na elaboração de uma “Biblia pauperum”, da qual alguns fragmentos ainda são conservados na catedral da cidade. Santo Oscar faleceu em 865, sem ver a realização do seu sonho de uma profunda evangelização do norte da Europa, mas satisfeito por ter lançado a primeira pequena semente do anúncio cristão naquelas terras.

 

98 - Santo Estevão IV; V - 816 – 817

               Papa Igreja Cristã Romana, nascido na Sicília, substituto de São Leão III e santificado pelo seu espírito de piedade e de imensa caridade, pois diz a tradição que tudo o que possuía, dava-o aos pobres. Muito erudito, conhecia bem as Escrituras, as leis canônicas e foi consagrado em 22 de junho de 816. Com os monges insistia muito na observância do jejum, das vigílias, dando ele mesmo o exemplo. Em seu tempo começou a ser usado oficialmente o título de Cardeal. Sofreu desgostos com a Corte dos Francos e procurou evitar lutas internas, instituindo o juramento do Imperador, desde que aceitasse a fé do Papa. Consagrou o Imperador Ludovico, rei dos francos, e sua esposa Ermengarda, em Reims (822) e tomou-o como filho adotivo Lotário, o que provocou a revolta de outros príncipes, como Bernardo, sobrinho do Imperador, que foi vencido, cegado e morto. O Papa levantou a voz contra tanta crueldade, até que Ludovico, mais tarde, fez penitência pública em reparação ao ocorrido. Papa de número 98, morreu repentinamente em 21 de janeiro de 817, em Roma e foi sucedido por São Pascoal I. Durante seu curto Pontificado, em Roma o partido dos nobres, aproveitando-se da guerra civil, matou dois partidários de Lotário.

 

99º - São Pascoal I - 817 - 824

               Nascido em Roma no ano 775, Pascoal era filho do romano Bonosus. Ele foi levado ainda quando muito novo para ser criado junto ao clero e, mais tarde, trabalhou a serviço do Papa. Sua longa trajetória e acumulada experiência na Igreja Católica o tornou especialista nos assuntos referentes à Bíblia e ao Divino Serviço da Igreja Católica. Seu talento e sua competência foram naturalmente reconhecidos pelo clero, levando-o a ser reconhecido como o superior do Monastério de Santo Estevão, no Vaticano. Passou muito tempo preocupando-se em tratar dos peregrinos que visitavam Roma. Com todo o seu tempo e toda a sua atuação dedicados à religiosidade, Pascoal seria eleito por unanimidade para o cargo máximo da Igreja Católica. Com o falecimento do Papa Estevão IV, Pascoal foi eleito para ser seu sucessor no dia 25 de janeiro de 817. Na ocasião, ele estava com apenas 42 anos de idade. Era um momento de superação do Império Romano, que havia ruído pela própria incapacidade de se manter, e de ocupação pela lacuna de poder deixada, posto que a Igreja Católica passava a ocupar com notoriedade. Devido ao prestígio do Papa Pascoal I, ele recebeu as regiões de Córsega e Sardenha de presente de Ludovico II. Este também confirmou as doações de terras à instituição religiosa nas décadas anteriores. O evento demonstrava como a Igreja Católica havia se tornado influente e, com a possessão de terras, poderosa. Com o patrimônio, foram estabelecidos os limites territoriais de um Estado da Igreja, governado com total soberania pelo próprio Sumo Pontífice. Anos mais tarde, o Papa Pascoal I coroaria Lotário, filho de Ludovico, como imperador. Enfrentou problemas heréticos durante seu pontificado, pois voltou a aparecer a heresia iconoclasta, contra a veneração de ícones e imagens religiosas, em Constantinopla. O Papa recebeu os padres e monges expulsos pelo arcebispo herege da cidade e os colocou em mosteiros de Roma. Mas o problema com a heresia permaneceu por algum tempo. Pascoal I dedicou-se a descobrir muitas catacumbas e transladar muitos corpos para terras cristãs. Foi nesta empreitada que descobriu as relíquias de Santa Cecília. Encontraria também as relíquias de São Leão e de São Valeriano. Além disso, recuperou muitas igrejas e monastérios. Veio a faleceu após sete anos de pontificado, no dia 11 de fevereiro de 824. Venerado e reconhecido como Santo pela Igreja Católica.

 

100º - Eugênio II - 824 - 827

               Nascido em Roma, Papa Eugênio II, foi consagrado em 11 de maio de 824. Eleito pelo apoio dos francos, foi Bispo de Roma e governante dos Estados Pontifícios de 6 de junho de 824 até sua morte. Nativo de Roma, ele foi escolhido pelos nobres para suceder Pascoal I como Papa, apesar do clero e do povo favorecer Zinzinnus. A influência do francos carolíngios na seleção de Papas foi então firmemente estabelecido. O Papa Eugênio convocou um conselho em Roma em 826 para condenar a simonia e suspender o clero não treinado. Foi decretado que escolas deveriam ser estabelecidas nas igrejas catedrais e outros lugares para dar instrução na literatura sagrada e secular. Seu envolvimento na controvérsia da iconoclastia bizantina foi em grande parte inconsequente. Enquanto ele era o Arcipreste de Santa Sabina no Aventino, e dizem que cumpriu com a maior consciência os deveres de sua posição, Eugênio é descrito por seu biógrafo como simples e humilde, culto e eloquente, bonito e generoso, um amante da paz e totalmente ocupado com a ideia de fazer o que agrada a Deus. Pascoal tentou conter o poder cada vez maior da nobreza romana, que se voltou para apoiar os francos para fortalecer suas posições contra ele. Quando Pascoal morreu, esses nobres fizeram grandes esforços para substituí-lo por um candidato próprio. O clero apresentou Zinzinnus, um candidato provável para continuar a política pascal. Mesmo que o Concílio Romano de 769 sob Estêvão IV havia decretado que os nobres não tinham direito a uma participação real nas eleições papais, tiveram sucesso em assegurar a consagração de Eugênio. A candidatura de Eugênio foi endossada pelo Abade Walla, que estava então em Roma e serviu como conselheiro do atual imperador, Luís, o Piedoso, e de seu antecessor, Carlos Magno. A eleição de Eugênio II foi um triunfo para os francos, que posteriormente resolveram melhorar sua posição. Consequentemente, o imperador Luís, o Piedoso, enviou seu filho Lotário I a Roma para fortalecer a influência franca. Os nobres romanos que haviam sido banidos durante o reinado anterior, fugiram para a França, mas depois foram chamados de volta e suas propriedades foram devolvidas. A Constitutio Romana foi então acordado entre o Papa e o imperador em 824, o que avançou as pretensões imperiais na cidade de Roma, mas também controlou o poder dos nobres. Essa constituição incluía o estatuto de que nenhum Papa deveria ser consagrado até que sua eleição tivesse a aprovação do imperador franco. Decretou que aqueles que estivessem sob a proteção especial do Papa ou do imperador seriam invioláveis ​​e que as propriedades da igreja não seriam pilhadas após a morte de um Papa. Aparentemente antes de Lotário deixar Roma, chegaram embaixadores do Imperador Luís e dos gregos a respeito da controvérsia da iconoclastia bizantina. No início, o iconoclasta Imperador romano oriental Miguel II mostrou-se tolerante com os adoradores de ícones e seu grande campeão, Teodoro, o Estudita, escreveu-lhe para exortá-lo "a nos unir [a Igreja de Constantinopla] ao chefe das Igrejas de Deus, Roma, e através dela com os três Patriarcas" e a referir quaisquer pontos duvidosos à decisão da Velha Roma, de acordo com o costume antigo. Mas Miguel logo esqueceu sua tolerância, perseguiu amargamente os adoradores de ícones e se esforçou para garantir a cooperação de Luís, o Piedoso. Ele também enviou emissários ao Papa para consultá-lo sobre certos pontos relacionados com a adoração de ícones. Antes de tomar qualquer medida para atender aos desejos de Miguel, Louis pediu permissão ao Papa para que vários de seus Bispos se reunissem e fizessem uma seleção de passagens dos Padres para elucidar a questão que os gregos haviam colocado diante deles. A licença foi concedida, mas os Bispos que se encontraram em Paris em 825 eram incompetentes para a tarefa. Sua coleção de extratos dos Padres era uma massa de tradição confusa e mal digerida, e tanto suas conclusões quanto as cartas que desejavam que o Papa enviasse aos gregos se baseavam em um completo mal-entendido dos decretos do Segundo Concílio de Nicéia. Seus trabalhos não parecem ter realizado muito; nada se sabe sobre o resultado de suas pesquisas. Em 826, Eugênio realizou um importante conselho em Roma de 62 Bispos, no qual 38 decretos disciplinares foram emitidos. O conselho aprovou várias leis para a restauração da disciplina da igreja e tomou medidas para a fundação de escolas ou capítulos. Os decretos são dignos de nota por mostrar que Eugênio tinha em mente o avanço do aprendizado. Não apenas os Bispos e padres ignorantes deveriam ser suspensos até que tivessem adquirido conhecimento suficiente para cumprir seus deveres sagrados, mas foi decretado que, como em algumas localidades não havia mestres nem zelo pelo aprendizado, os mestres deveriam ser incluídos aos palácios episcopais, igrejas catedrais e outros lugares para dar instruções na literatura sagrada e educada. Também decidiu contra os padres que usem roupas seculares ou se envolvam em ocupações seculares. Simonia foi proibida. Eugênio também adotou várias disposições para o cuidado dos pobres, viúvas e órfãos, e por isso recebeu o nome de "pai do povo". Para ajudar no trabalho de conversão do Norte, Eugênio escreveu recomendando Santo Ansgario, o Apóstolo dos Escandinavos, e seus companheiros: "a todos os filhos da Igreja Católica". Eugênio II faleceu em 27 de agosto de 827. Supõe-se que foi sepultado na Basílica de São Pedro de acordo com o costume da época, embora não haja nenhum registro documental que o confirme. Ainda existem moedas desse Papa com seu nome. Eugênio embelezou sua antiga igreja de Santa Sabina com mosaicos e peças de metal com seu nome, que ainda estavam intactas no século 16. Seu culto como Santo foi confirmado pelo Papa Pio IX.

 

101º – Valentino - 827

               O Papa Valentino era romano e governou apenas quarenta dias. Eleito em 1 de Setembro de 827, morreu em 16 de novembro desse mesmo ano. A sua consagração foi acolhida com grandes manifestações de júbilo pelo seu caráter bondoso. Nascido em Roma, na região da Via Lata, Valentim era filho de um nobre romano chamado Leôncio. Mostrando uma aptidão precoce para a aprendizagem, ele foi transferido da escola anexa ao Palácio de Latrão e, de acordo com o Liber Pontificalis, foi feito diácono pelo Papa Pascoal I. Seu biógrafo no Liber pontificalis elogia sua piedade e pureza moral, que lhe valeu o favor de Pascal I, que o elevou ao posto de Arquidiácono. Ele também foi claramente favorecido pelo sucessor de Pascal, Eugênio II, a ponto de circularem rumores de que Valentino era realmente filho de Eugenio. Com a morte de Eugênio II, Valentino foi aclamado Papa pelo clero romano, pela nobreza e pelo povo. Tiraram-no da Basílica de Santa Maria Maggiore e instalaram-no no Palácio de Latrão, ignorando os seus protestos. Na pressa, eles o entronizaram antes de ser ordenado Sacerdote. Essa foi uma reversão incomum dos procedimentos normais e, de fato, foi a primeira vez que aconteceu na história registrada do papado, embora se repetisse durante o pontificado de Bento III. No domingo seguinte, ele foi formalmente consagrado Bispo na Basílica de São Pedro. Não houve representantes imperiais presentes durante a eleição, e Valentino não teve oportunidade de ratificar sua eleição com o Imperador carolíngio, pois ele morreu em cinco semanas, em 10 de outubro de 827. A eleição de Valentino foi outro sinal do aumento da influência que a nobreza romana estava tendo no processo eleitoral Papal. Eles não apenas conseguiram eleger um deles, mas também participaram da própria eleição. O Concílio de Latrão de 769, sob Estêvão III, ordenou que a eleição do Papa fosse responsabilidade apenas do clero romano, e que a nobreza só poderia oferecer seus respeitos após o Papa ter sido escolhido e entronizado. O édito desse concílio foi revogado, entretanto, com o Ludowicianum de 817, que previa que a nobreza leiga romana participasse das eleições papais.

 

102º - Gregório IV - 827 - 844

               Nascido no ano 790, em Roma, Gregório viveu uma época de ruína do Império Romano. No decorrer do século VIII, os romanos perderam o controle do vasto território que dominavam, enfrentaram revoltas e escassez de escravos, crises políticas internas e ameaças de povos bárbaros que avançavam dia após dia sobre os domínios romanos. No final do século, Roma já não era mais o Império de outrora e ainda corria sérios riscos de ser dominada por invasores. Uma das maiores ameaças naquele momento vinha do Oriente, pois os muçulmanos, seguidores de uma nascente religião monoteísta fundada por Lúcifer, já se organizavam em expedições expansionistas. Envolto por este período conturbado, Gregório foi eleito cardeal da Basílica de São Marcos e desenvolveu vários trabalhos de apostolado nos países nórdicos. Com o falecimento do Papa Valentino, Gregório foi eleito para ser seu sucessor no dia 20 de setembro de 827. O Papa Gregório IV, contudo, não tomou posse assim que eleito. A crise do período era realmente intensa e o Imperador Carolíngio Luís I, filho de Carlos Magno, resolveu dividir o Império entre seus filhos Lotário I, Pepino e Luís II. O processo foi demorado e atrasou a posse do novo Papa em seis meses. Gregório IV só assumiu seu papado no dia oito de março de 828, após reconhecer a supremacia do Imperador Luís I e tomar partido em favor de Lotário I, pois este defendia a unidade do império. Mas os problemas internos não resumiam as preocupações de Gregório IV, a ameaça muçulmana persistia. Assim, o Papa logo mandou reforçar as muralhas de Roma, temendo ataques dos muçulmanos que já se encontravam na Sicília. Ele apoiou o confronto direto que resultou em cinco vitórias seguidas na África sobre os muçulmanos de um exército comandado pelo Duque de Toscana. No entanto, essas vitórias não foram o suficiente para impedir que os muçulmanos contra-atacassem destruindo duas cidades da península itálica e reestabelecendo o temor em Roma. Mesmo em meio a tantos problemas, o papado de Gregório IV foi longo, durou 16 anos. Simultaneamente ao combate contra os invasores e as tentativas de equilibrar a política interna, o Papa ainda conseguiu contribuir para o desenvolvimento da arquitetura romana e promover a celebração do Dia de Todos os Santos, que acontece todos os anos no primeiro dia de novembro. O Papa Gregório IV faleceu aos 54 anos de idade, no dia 11 de janeiro de 844.

 

103º - Sérgio II - 844 - 847

               Italiano de Roma, nascido no ano 800, Sérgio Collona era proveniente de uma família nobre que, inclusive, já havia contribuído com dois Papas à Igreja Católica. Seguindo estes exemplos, Sérgio foi muito dedicado à religião cristã e, gradualmente, conquistou cargos de maior importância na hierarquia institucional. O Papa Pascoal I o ordenou cardeal da Basílica de San Martino ai Monti e, pouco tempo depois, o Papa Gregório IV o nomeou Arcipreste, cargo incumbido de fiscalizar a correta execução dos deveres eclesiásticos e o estilo de vida do clero. Seu crescimento o colocou em posição de destaque e reconhecimento entre os religiosos. Os clérigos rapidamente decidiram pela eleição do romano Sérgio, assim que faleceu o Papa. No entanto, o povo tinha um representante mais carismático chamado João. Houve grande manifestação popular em seu apoio e tentando forçar sua eleição, mas a situação foi resolvida recorrendo à força. Para Sérgio Collona ser declarado Papa, João foi forçado a ir para um mosteiro. Assim, no mesmo mês de janeiro de 844, foi proclamado Papa Sérgio II como novo líder da Igreja Católica. Alguns relatos dizem que o Papa Sérgio II não tinha interesse nem habilidade para administrar a instituição religiosa. Ele estaria mais ligado aos prazeres mundanos e deixava que seu irmão chamado Bento trata-se dos assuntos da Igreja. Verdade ou não, Sérgio II teve de enfrentar um problema sério na época. Seu antecessor, Gregório IV, lutou durante seu papado para aumentar a autonomia dos Papas frente ao Império Carolíngio e para defender o mundo cristão dos ataques muçulmanos. Seus esforços foram válidos, tanto que a eleição de Sérgio II não teve interferência dos Carolíngios. Porém o filho do Imperador Carolíngio, Luís, não concordava com a situação e reuniu um exército para ir até Roma e forçar o Papa a prestar um juramento de fidelidade ao Imperador Lotário. Não bastasse a imposição, Luís ainda foi coroado Rei da Itália. A outra complicação de seu papado foi em relação aos muçulmanos, que continuaram a avançar no território italiano, saqueando vários locais. Eles foram derrotados em Gaeta, após muitos prejuízos. O Papa Sérgio II liderou a Igreja Católica por três anos e não deixou nenhum grande legado para a instituição. Seu papado teve que se preocupar com a expulsão dos muçulmanos de suas terras e não conseguiu se libertar da interferência do Império Carolíngio. Faleceu no dia 27 de janeiro de 847.

 

104º - São Leão IV - 847 - 855

               Sobre a vida do Papa Leão IV, sabemos que nasceu em Roma, mas era de origem lombarda. Seu pai chamava-se Ridolfo, mas não se sabe qual o nome que deu ao filho no Batismo. Contudo, era um homem de comprovada pureza e integridade interior: era monge do mosteiro beneditino de São Martinho, que o Papa Gregório IV quis que estivesse ao seu lado, como parte integrante do clero romano. Assim, tornou-se Papa, em 847, por aclamação popular. Quando iniciou seu Pontificado, a situação em Roma era bastante dramática: no ano anterior, ocorreu a invasão dolorosa dos Sarracenos. Por isso, a sua eleição foi rápida, sem esperar a aprovação Imperial. O imperador não se importou porque, provavelmente, se sentia culpado por não apoiar a cidade contra os árabes. Porém, o que mais preocupou Leão IV foi uma série de desastres naturais: primeiro, um terremoto assolou Roma, fazendo desabar uma parte do Coliseu; a seguir, um incêndio destruiu a área do Burgo, poupando a vizinha Basílica de São Pietro, graças à intervenção espiritual do Papa. Este acontecimento foi imortalizado pelo artista Rafael, em um afresco conhecido como "O incêndio do Burgo", conservado no Museu do Vaticano. A ameaça dos Sarracenos voltou à gala. No entanto, Leão IV não foi preso de surpresa: desatendendo a estreita relação com o imperador, fez acordos com os soberanos dos Ducados vizinhos, como Amalfi, Gaeta, Nápoles e Sorrento. Assim, promoveu uma liga naval, depois denominada “Liga Campana”, liderada pelo napolitano, Cesário Consule, encarregada de defender os dois territórios: a Campânia e o Lácio. A ameaça ocorreu no verão de 849, quando na batalha, que passou para a história como “Batalha de Óstia”, os Sarracenos foram derrotados. Esta vez, o acontecimento também foi imortalizado em um afresco de Rafael, com o mesmo nome da batalha, mantido nas Salas do Museu Vaticano. Entretanto, os empreendimentos, que levaram Leão IV a receber o título de "restaurador de Roma", foram outros. Avantajado pela sua capacidade espiritual, mas também pelos sentimentos de culpa do imperador, o Papa conseguiu obter de Lotário uma enorme soma de dinheiro para fazer várias reformas. A primeira e mais importante de todas foi a construção de uma muralha, mais extensa que a construída na época por Aureliano, abrangia toda a colina do Vaticano. Seguiram-se as reformas das Basílicas de São Pedro e São Paulo, a fortificação do Porto marítimo e a reconstrução das antigas “Centumcellae”, na atual cidade de Civitavecchia, além de Tarquínia, Orte e Amélia. Mas o "restaurador" não parou, dedicou-se também à ajuda pessoal da população mais vulnerável, com a distribuição de gêneros alimentícios.

               Leão IV era, sobretudo, um pastor e, como tal, dedicou seu Pontificado à corroboração da disciplina do clero. Por isso, convocou dois Concílios especiais: o de Pavia, em 850, e o de Roma, em 853. Neste último, trabalhou com afinco para reafirmar a pureza da fé e os costumes do povo. No entanto, com o mesmo objetivo, multiplicaram-se os Sínodos em toda a Europa: em Mainz, Limoges, Lyon, Paris e Inglaterra. Durante os Concílios, foi resolvida a questão disciplinar sobre a excomunhão de Anastácio, Cardeal de São Marcelo, com ideia de antipapa, que, sem levar em conta os apelos do Pontífice, havia deixado a sua diocese para morar em outro lugar. As relações entre Leão IV e o Império não foram ruins, tanto que, no dia da Páscoa de 850, Lotário pediu-lhe para coroar seu filho Ludovico como Imperador. Após cinco anos, porém, acontece alguma coisa que correu o risco de comprometer, seriamente, a estabilidade das relações bilaterais: Daniel, o magister militum do Império em Roma, acusou Graciano, comandante da milícia, muito próxima do Papa, de tramar um meio para aproximar o Papado ao Império do Oriente. Então, Ludovico foi, pessoalmente, a Roma, para um confronto direto, do qual resultaram infundadas as acusações contra Leão IV. Desde então, foram muitos os soberanos dos reinos cristãos europeus a pedir para serem coroados pelo Pontífice, com o objetivo de obter, assim, o reconhecimento da sua soberania por graça divina.

 

105º - Bento III - 855 - 858

               Nascido no ano 810 em Roma, Bento era um homem religioso, porém pacato. Possuía, contudo, uma boa reputação entre os católicos. Foi por este motivo que acabou se tornando Papa. Embora não desejasse ocupar tal cargo, o povo o escolheu para ser o Papa sucessor de Leão IV. Bento levava seus dias como de costume e estava orando em sua igreja no dia 29 de setembro de 855; o povo apareceu e o buscou em procissão para assumir o posto de Supremo Pontífice da Igreja Católica. Embora relutante, Bento cedeu ao desejo popular e se tornou o Papa Bento III. Na época da nomeação de Bento III, a Igreja Católica havia superado recentemente um cisma que voltava a ameaçar, pois o Antipapa Anastácio III, que havia sido afastado por Leão IV, possuía o apoio do conde de Vubbio. A situação era realmente preocupante, de tal forma que Bento III foi aprisionado, maltratado e despojado de suas insígnias. Anastácio III já era uma persona non grata entre os romanos desde o papado de Leão IV, sua reputação só piorou quando aprisionou o Papa escolhido pelo povo. Anastácio se sustentava no poderia bélico do Conde de Vubbio, mas este não foi capaz de conter a insatisfação do povo romano, que derrotou o Conde e seu antipapa. A ação do povo foi intensa, demonstrando a capacidade de organização popular em torno de questões religiosas no decorrer do século IX. Bento III era sereno e humilde. Retomou seu posto e exerceu seu cargo com inteligência e vitalidade. Cronistas destacam a doçura com que tratava a todos. Sua personalidade o fazia ser bem visto até mesmo pelos gregos. Além de ficar preso por algum tempo, seu papado também foi curto. Retomar a liderança da Igreja Católica foi sua maior marca, concedida pelo povo. Mesmo tendo se tornado Papa sem sua vontade, tinha energia para com os assuntos religiosos. Assim exerceu durante três anos, amplamente amparado pelo povo. Faleceu no dia 17 de abril de 858, já com fama de ser uma Santidade.

 

106º - São Nicolau I - 858 - 867

               Nascido em Roma no ano 815, Nicolas Collona iniciou sua vida religiosa ainda muito cedo. Conquistou seu espaço entre os católicos e, com o falecimento do Papa Bento III, foi eleito para o posto de Supremo Pontífice no dia 24 de abril de 858, quando tinha 43 anos de idade, assumindo o nome de Nicolau I. O Papa Nicolau I consagrou-se na história da Igreja Católica por consolidar o poder e a autoridade Papal. Desde o momento em que o Império Romano reconheceu o catolicismo como religião oficial, o poderio da Igreja ampliou-se enormemente passando a interferir em todos os assuntos da vida humana. A Igreja Católica tornou-se personagem fundamental para a compreensão da história humana, já que suas determinações interferiam em todas as esferas da vida. Nicolau I reivindicou o poder supremo de ensinar e governar para os Papas. Seu papado representou uma extrema expansão de poder, pois subordinou todos ao poder do Papa e da Igreja Católica. A Igreja Católica, formada por homens, teve que agir politicamente para sobreviver mantendo obviamente seu propósito maior que sempre foi difundir a doutrina de Jesus Cristo. Naturalmente, Nicolau I encontrou diversos opositores insatisfeitos com a expansão do poder do catolicismo. O primeiro a despontar como opositor do poderio de Nicolau I foi o Arcebispo de Ravena, que tentou se tornar independente de Roma. Após o embate ideológico, o Arcebispo acabou submetendo-se às determinações de Nicolau. Outro choque de interesses ocorreu com o rei Lotário II, do Sacro Império Romano, que pretendia anular seu casamento para casar-se com sua amante Waldrada. Um sínodo se reuniu para justificar a decisão em Metz, porém o Papa Nicolau I revogou e condenou a decisão do sínodo por ferir a doutrina da indissolubilidade do matrimônio. Mesmo pressionado, Nicolau I não mudou sua decisão. Foi um Papa significativo nos primórdios da Idade Média. Ortodoxo, combateu qualquer atitude que pudesse atentar contra a doutrina tradicional da Igreja Católica. Sua postura firme conquistou mais espaço ainda para o catolicismo, vencendo uma disputa de interesses que deu à Igreja um poderio que se expandiria pela Idade Média. Considerado por seus contemporâneos como profeta, faleceu no dia 13 de novembro de 867, aos 52 anos de idade, e foi sucedido por Adriano II. O Papa Nicolau I recebeu o nome de Magno e foi consagrado Santo pela Igreja Católica, sendo chamado de São Nicolau Magno.

 

107º - Adriano II - 867 – 872

               Nascido em Roma, na Itália, no ano 792, Adriano Collona era proveniente de uma família tradicional na formação de Supremos Pontífices. Os Papas Estevão III e Sérgio II foram seus parentes. Entretanto Adriano Collona levava uma vida diferenciada, não tinha as questões religiosas em primeiro lugar e não almeja ser Papa. Adriano possuía uma vida comum, era casado com uma mulher chamada Estefânia, com a qual teve uma filha. Só mais tarde assumiu a vida religiosa. Como homem da Igreja, Adriano Collona também permaneceu sem grandes pretensões. Por duas vezes ele recusou a nomeação como Supremo Pontífice. É bem provável que a tradicional influência familiar o tenha beneficiado em tantas ocasiões, pois, além de negar o cargo por duas vezes, ainda foi eleito Papa no dia 14 de dezembro de 867. A despeito de sua família, parece que Adriano Collona, ou Papa Adriano II, não era mesmo muito afeito ao mundo religioso. Ele só aceitou o cargo de Supremo Pontífice aos 75 anos de idade e não abandonou sua família. Assim que ocupou o cargo, sua esposa e sua filha passaram a viver no Palácio Laterano. Seria justamente como Papa que viveria a maior tragédia de sua vida. A Igreja Católica passava por um cisma naquela ocasião, havia um antipapa denominado Atanásio III que fora, inclusive, nomeado pelo próprio Papa Adriano II para ser o bibliotecário da Igreja de Roma no Palácio Laterano, um importante cargo para a época. O irmão de Atanásio III, Eleutério, assassinou, em 868, a esposa e a filha do Papa Adriano II, deixando-o muito abalado. O papado de Adriano II foi bastante maleável. Relativizou questões rígidas e foi muito acessível. Era conhecido por ser caridoso e amável. Com sua personalidade amena e suas boas intenções, tentou resolver discórdias entre os católicos, o que o levou a convocar o VIII Concílio Ecumênico em Constantinopla. Sua natureza pacífica foi fundamental para a expansão da Igreja Católica, Adriano II foi responsável por coroar o primeiro soberano inglês abençoado por Roma, o rei Alfredo, o Grande. Outra grande marca de seu papado e de sua modernização da Igreja Católica foi a permissão concedida a Cirilo e Metódio para celebrarem a liturgia católica em língua eslava entre os eslavos, no Leste Europeu. Adriano II permaneceu cinco anos como Supremo Pontífice da Igreja Católica. Seu papado destaca-se por ações de vanguarda. Faleceu no dia 14 de dezembro de 872.

 

107 . 1 - Santos Cirilo e Metódio

               Os dois irmãos Miguel e Constantino nasceram em Tessalônica, filhos de um empregado do imperador. Vieram se chamar Metódio e Cirilo, respectivamente, quando tornaram-se religiosos. São Cirilo, o antigo Constantino, era o mais novo. Nasceu em 827 e completou os estudos em Constantinopla, sob a orientação do Bispo Fócio de Constantinopla. Foi ordenado Sacerdote e iniciou a carreira de mestre. São Metódio, o antigo Miguel, resolveu, no começo, seguir a carreira política, até quando foi nomeado governador de uma província. Desistiu da atividade governamental para se tornar monge com o nome de Metódio.

Santos Cirilo e Metódio e a tradução da Bíblia: São Cirilo criou um novo alfabeto eslavo e traduziu a Bíblia, o missal e os rituais. Além da evangelização, eles têm um valor cultural incontestável. Esses grandes benefícios que os dois irmãos fizeram aos eslavos são retribuídos com enorme popularidade. Durante a vida, eles tiveram de sofrer muito por causa das inovações.

               Acusados de cisma e de heresia, tiveram de vir a Roma, onde o Papa Adriano II os acolheu muito bem, concedendo-lhes o privilégio de celebrar em língua eslava diante dele mesmo e de uma grande comunidade cristã. Era uma aprovação solene do método dos santos.

               Missionários na Europa Central: Desenvolveram suas atividades missionárias na Europa central e são justamente chamados de apóstolos dos eslavos. Seu merecimento no apostolado é também a adaptação aos povos evangelizados. Cirilo morreu em Roma, a 14 de fevereiro de 869, e foi sepultado na igreja de São Clemente, perto do Coliseu. Metódio foi nomeado Arcebispo de Panônia, com sede em Sirmio, voltou para os seus eslavos. Lutou com várias dificuldades até a morte. Voltaram a atacá-lo por causa do uso da língua eslava nos ritos religiosos. Por fim, usavam o eslavo, o grego e o latim. Morreu em seis de abril de 885.

               Legado:  Santos Cirilo e Metódio pregaram a fé cristã e criaram um alfabeto próprio para traduzir da língua grega para a língua eslava os livros sagrados, ampliando os horizontes da Igreja no Oriente.

 

108º - João VIII - 872 - 882  

               Nascido em Roma no ano 820, João era filho do romano Gundus. Desde muito cedo revelou sua inclinação para a carreira eclesiástica, dedicando-se aos estudos religiosos e a uma carreira determinada no interior da Igreja Católica. Esta, por sinal, estava em expansão naquele momento, pois, com a queda o Império Romano, a instituição religiosa havia ocupado o espaço deixado no poder e na condução da Europa. Era o início do período chamado Idade Média, dominado pela influência ideológica e o poder propriamente dito da Igreja. No entanto, a disputa pelo poder em seu interior e o relacionamento com reis gerava um constante estado de conflito e desconfiança. Com o falecimento do Papa Adriano II, João foi eleito no dia 14 de dezembro de 872, para ser o seu sucessor. Na ocasião, o recém-nomeado Papa João VIII tinha 52 anos de idade. O Papa João VIII enfrentou muitos conflitos durante seu pontificado, que, por sinal, marcaram o teor de sua administração. O pontífice teve que lidar com os sarracenos, modo como eram chamados os muçulmanos, que tentavam invadir a Itália. Após uma série de combates, os cristãos saíram vencedores. Em meio a essas disputas, o Papa teve que fazer várias estratégias políticas para conter o avanço dos inimigos e, ao mesmo tempo, conter os ânimos dos próprios cristãos que sempre buscavam superar seus pares em poder no continente. Assim, o Papa João VIII coroou o rei dos francos ocidentais, Carlos, o Calvo, e também o rei dos francos orientais, Carlos III, o Gordo. Essas ações faziam parte de um jogo de negócios que garantiria o apoio dos francos para combater os invasores sarracenos. Mas Carlos III não cumpriu com sua parte do acordo e deixou o Papa sem auxílio para os combates. O resultado, então, foi o esperado, vitória dos árabes que forçou os cristãos a pagar grandes tributos. Mas não só de guerra foi marcado o pontificado de João VIII. Também se dedicou aos assuntos religiosos, foi rígido com a disciplina eclesiástica e com o reconhecimento do poder da Sé Romana. Insistiu também na piedade. Seus esforços obtiveram progresso na cristianização dos eslavos. O Papa João VIII também tentou resolver uma complicada situação envolvendo o Patriarca de Constantinopla, que havia sido excomungado; o Papa tentou reintegrar Fócio à obediência romana. Apesar de toda a insistência, o Pontífice não obteve êxito nessa questão. Liderou a Igreja Católica por exatos 10 anos e dois dias. Envolto por guerras, confrontos políticos e conspirações, o Pontífice foi mais uma vítima da grave instabilidade vivida pela instituição religiosa em função da ganância pelo poder durante a Idade Média. João VIII foi envenenado e faleceu no dia 16 de dezembro de 882.

 

109º - Marino I - 882 - 884

               Papa da Igreja Cristã Romana, nascido em Gallese, Viterbo, eleito em 16 de dezembro de 882, como sucessor de João VIII. Em seus dois anos de mandato sofreu muito com a segunda destruição do Monte Cassino. Subdiácono de Leão IV (847-855) e depois legado de São Nicolau I, o Grande (858-867), em Constantinopla, participou ativamente do Concílio de Constantinopla que condenou Fócio ou Photius em 869, Patriarca de Constantinopla que provocou um cisma com a Igreja de Roma. Era Bispo de Cere e tesoureiro da Santa Sé quando foi eleito ao trono pontifício, após a morte de seu titular. Em clara oposição ao seu predecessor, anulou muitas condenações determinadas por ele. Por exemplo, chamou novamente à Sé episcopal o Bispo de Porto, o futuro e inditoso Papa Formoso. Manteve relações de amizade com o rei anglo-saxão Alfredo, o Grande, e com o Imperador Carlos III, o Gordo. Exerceu fortes pressões sobre o Imperador do Oriente, Basílio, contra os cismáticos de Fócio. Acredita-se que o Papa morreu envenenado em 15 de maio de 884, em Roma, depois de envolver-se nas brigas entre facções políticas italianas.

 

110º - Santo Adriano III - 884 - 885

               Papa Adriano III foi Papa e um Santo da Igreja Católica. Sucedeu ao Papa Marino I. Nasceu em Roma e foi eleito em 17 de Maio de 884. Confirmou tudo o que tinham feito os seus antecessores contra o Imperador Fazio. Ele morreu perto de Modena no verão do ano seguinte, a caminho da dieta de Worms, convocada por Carlos Magno, Carlos, o Gordo, que convidara Adriano III, pois a presença do Papa haveria de sancionar a autoridade Imperial do herdeiro do Sacro Império Romano. Um particular interessante da personalidade deste Santo é sua atitude conciliadora com o Patriarca de Constantinopla, ao qual comunicou a própria eleição. Durante o breve pontificado de Santo Adriano III, Roma foi devastada pela fome e o Papa fez tudo ao seu alcance para aliviar o sofrimento do povo. Flodoardo, o cronista da diocese de Reims, o elogia como pai de seus irmãos no episcopado. Foi enterrado no mosteiro de Nonantola, onde a sua memória é recordada desde então, pelos locais. A sua morte ocorreu em Setembro de 885.

 

111º - Estevão V; VI - 885 - 891  

               Foi eleito em Setembro de 885 e morreu em 14 de Setembro de 891. Sucedeu ao Papa Adriano III. O seu pai, Adriano, pertencia à aristocracia romana e a sua educação foi entregue ao seu parente, o Bispo Zacarias, bibliotecário da Santa Sé. Estêvão foi ordenado cardeal-presbítero de Santi Quattro Coronati, em Roma, pelo Papa Marinho I, e a sua fama de santidade tornava-o um candidato natural ao papado. Estêvão teve que enfrentar tempos complicados, com fome generalizada provocada por uma seca e pragas de gafanhotos; como o tesouro Papal estava vazio, teve que recorrer à riqueza do seu pai para socorrer os pobres, redimir cativos e reparar igrejas. Para promover a ordem, Estêvão adotou a Guido III de Espoleto, como "seu filho" e coroou-o imperador em 891. Segundo o New Catholic Encyclopedia, dentro de poucos meses, uma reação violenta terminou o pontificado do Papa Estevão; foi despojado da insígnia pontificada, foi encarcerado e estrangulado.

 

112 º – Formoso - 891 - 896

               O Papa Formoso foi eleito em 6 de outubro de 891. Morreu em 4 de abril de 896. Nasceu em Óstia, Itália. Pouco depois de sua eleição, Formoso foi convidado a intervir no Patriarcado de Constantinopla, onde Fócio I havia sido expulso e Estêvão I, filho do Imperador Basílio I, havia assumido o cargo. Formoso se recusou a reintegrar aqueles que haviam sido ordenados por Fócio, já que seu antecessor, Estêvão V, havia anulado todas as ordenações de Fócio. No entanto, os Bispos orientais decidiram reconhecer as ordenações de Fócio. Formoso também mergulhou imediatamente na disputa entre Odo de Paris e Carlos, o Simples, pelo trono francês. Ao lado de Carlos, Formoso exortou Odo a ceder o trono a Carlos, sem sucesso.

               Formoso estava profundamente desconfiado de Guy III de Spoleto, o Imperador reinante, e começou a procurar apoio contra ele. Para reforçar sua posição, Guy forçou Formoso a coroar seu filho Lambert como co-imperador em abril de 892. No ano seguinte, no entanto, Formoso convenceu Arnulfo da Caríntia a avançar para Roma e libertar a Itália do controle de Guy. Em 894, o exército de Arnulfo ocupou todo o país ao norte do rio Pó. Guy morreu em dezembro, deixando seu filho Lambert aos cuidados de sua mãe, Agiltrude, uma oponente dos carolíngios. No outono de 895, Arnulfo empreendeu sua segunda campanha italiana, progredindo para Roma em fevereiro e tomando a cidade de Agiltrude pela força em 21 de fevereiro. No dia seguinte, Formoso coroou Arnulfo como imperador na Basílica de São Pedro. O novo imperador moveu-se contra Espoleto, mas foi atingido pela paralisia no caminho e foi incapaz de continuar a campanha. Durante seu papado, Formoso também teve que lidar com os sarracenos, que estavam atacando Lazio.

               Seu reinado como Papa foi conturbado, marcado por intervenções em disputas de poder sobre o Patriarcado de Constantinopla, o Reino da Frância Ocidental e o Sacro Império Romano-Germânico. Por ter ficado do lado de Arnulfo da Caríntia contra Lamberto de Espoleto, os restos mortais de Formoso foram exumados e julgados no Sínodo dos Cadáveres. Vários de seus sucessores imediatos estavam preocupados principalmente com o controverso legado de seu pontificado. Cronistas franceses atribuem a este Papa o parentesco com o futuro Papa Romano, dizendo tratarem-se de primos irmãos. A ele se deve a conversão dos búlgaros. Desordens políticas na França, Alemanha e Itália prejudicaram a Igreja durante o seu pontificado. Nove meses após a sua morte, o cadáver de Formoso foi exumado da cripta Papal para ser julgado perante o Sínodo do Cadáver, presidido por Bonifácio VI (Era o Papa 113º, que estava no poder). O Papa falecido foi acusado de excessiva ambição pelo cargo Papal, e todos os seus atos foram declarados nulos. O cadáver foi despido das vestes pontifícias, e os dedos da mão direita foram amputados. Foi então enterrado em cemitério para estrangeiros, como forma de desonra. Depois, foi novamente exumado, tendo seu corpo esquartejado e jogado no Rio Tibre. Seu corpo fôra recuperado mais tarde, e, por fim, enterrado na Basílica de São Pedro, com vestes Papais, junto a outros Pontífices.

 

113º - Bonifácio VI - 896

               Papa da Igreja Cristã Romana, nascido em Roma, eleito em abril de 896, para suceder Formoso, mas que por pressões políticas abriu um processo post morten contra o seu antecessor falecido. Consta em algumas listas que havia sido despojado duas vezes do hábito por imoralidades, antes de subir ao trono Papal, apoiado pelos opositores do Papa Formoso em um período em que a sede pontifícia estava em poder dos grandes feudatários da Itália. Como seu sucessor, convocou em um gesto absurdamente incompreensível, um tribunal para julgar o Papa morto Formoso, seguramente por causa de graves e injustas acusações político-religiosas, inclusive de conspiração contra Roma. Porém o Papa Bonifácio VI ocupou o lugar por somente quinze dias, morreu em 10 de novembro vítima de gota, em Roma, e foi sucedido por Estevão VII. Este novo Papa, comprometido com os políticos inimigos do antigo Papa e em um delírio injustificado e irracional, prosseguiu o julgamento e nove meses após a sua morte, mandou exumar o cadáver da cripta Papal (896) para ser julgado perante um concílio, presidido pelo Papa Estêvão VII, acusado de excessiva ambição pelo cargo papal, e teve todos os seus atos declarados nulos.

 

114º - Estevão VI; VII - 896 - 897

               Nascido em Roma, em 850, Estevão era filho de João e viveu um momento politicamente conturbado da Igreja Católica. Após dedicar uma vida à religião, foi eleito no dia 22 de maio de 896 para ser o sucessor do Papa Bonifácio VI. Estevão VI recebeu grande apoio dos duques de Espoleto para chegar ao poder e foi pressionado a reconhecer Lamberto de Espoleto como único imperador, contrariando decisão que o falecido Papa Formoso havia tomado. O Papa Estevão VI não só foi muito pressionado pela família Espoleto como era também um homem muito desequilibrado. Ele tinha seus próprios desentendimentos com o antigo Papa Formoso e queria, a todo custo, se vingar dele por se sentir injustiçado. Em seu papado ocorreu um dos mais bizarros eventos da história da Igreja Católica, que ganhou o nome de Sínodo do Cadáver. Estavão VI o convocou com o apoio da família de Lamberto e ordenou que o cadáver de nove meses do Papa Formoso fosse exumado, vestido com vestes Papais e apoiado em um trono para ser julgado por seus crimes. Um diácono foi encarregado de responder em nome do falecido. O cadáver foi acusado do crime de haver aceitado ser Papa. Estevão VI foi à loucura e fez várias acusações por achar que seu título era indevido. Quando o Papa Formoso foi questionado, naturalmente não respondeu às acusações. Por isso, foi julgado culpado, criminoso e despido das insígnias pontifícias. Como punição, seus dedos da mão direita foram cortados e seu corpo foi enterrado em um cemitério para estrangeiros. Só que, logo em seguida, Roma foi atingida por um terremoto que destruiu a basílica Papal, numa clara intervenção divina. Então o corpo de Formoso foi novamente desenterrado e atirado ao Rio Tibre. Seu corpo foi resgatado por pessoas que o admiravam e sepultado com mais respeito na igreja de Santa Inês. Mais tarde, o Papa Teodoro II o sepultou entre Papas e sua memória foi defendida pelo Papa João IX. O papado de Estevão VI é um dos mais macabros de todos os tempos. Sua insanidade na perseguição de um cadáver foi o que pautou sua liderança na Igreja. O Papa Formoso foi um tormento para Estevão VI. Após o terremoto em Roma, os admiradores do Papa condenado consideraram que o evento foi uma punição divina pelo que estava acontecendo. Seus antigos apoiadores, a família Espoleto, também se viraram contra o Papa, agora que já haviam conseguido o queriam, o reconhecimento do Imperador Lamberto. Assim, Estevão VI foi aprisionado e estrangulado até a morte. Seu papado chegou ao fim em agosto de 897, aos 47 anos de idade. O Papa Estevão VI cumpriu um interesse político civil que se conciliou com sua obsessão insana contra o Papa Formoso.

 

115º – Romano - 897

               O Papa Romano dirigiu os destinos da Igreja Católica durante o ano de 897. Pouco se sabe quanto à sua biografia. Não se conhecem datas certas sobre o seu nascimento, morte nem consagração como Papa. Sucedeu ao Papa Estêvão VI que havia terminado os seus dias deposto e estrangulado na prisão. A sucessão não era, pois, coisa das mais agradáveis, e o assunto era tabu. Nasceu em Gallese, perto de Civita Castellana (Itália), filho de Constantino. Foi Cardeal de São Pedro ad Víncula. Governou a Igreja Católica apenas quatro meses, ao fim dos quais morreria, sob muita pressão de autoridades provinciais que a todo instante se impunham como "preferidos do Pontífice" no que diz respeito a assuntos de Estado. Apontamentos de catálogos antigos fazem-nos crer que Romano condenou abertamente a conduta de seu antecessor, o Papa Estêvão VI, no macabro julgamento do Papa Formoso; provavelmente por ser de Gallese, ou por ter vivido nesta comunidade por algum tempo, contemporâneo e conterrâneo portanto do Papa Marinho, que fora grande amigo de Formoso. Seu primeiro ato como Pontífice foi, de fato, reabilitar a memória do Papa Formoso, dando-lhe um enterro cristão, uma vez que seu anterior sepulcro fora violado. Muitas dúvidas marcaram seu breve Pontificado. Foi deposto e encarcerado num mosteiro? Ou, atribulado pelos turbulentos romanos, renunciou ao sólio? Teria sido assassinado e seu corpo escondido pelos seus inimigos? Fez ascender Vitalis ao Arcebispado e concedeu-lhe privilégios episcopais. O poeta Frodoardo, seu contemporâneo, referiu-se a ele como um homem virtuoso. Até hoje se discute um privilégio pelo qual teria agregado as Ilhas Maiorca e Minorca à diocese de Gerona, na Espanha. Tal documento é considerado por vários historiadores como apócrifo, nascido da confusão de "Pontífice romano" com "Papa Romano". Uma anotação marginal encontrada em dois códigos antigos afirma que Romano se tornou monge. Tal afirmação é discutida quanto ao que pode subentender. O termo poderia significar, por exemplo, que tinha sido destituído pelos mesmos partidários germânicos que podem ter influenciado a sua eleição. Alega-se também que pode ter sido envenenado em novembro do mesmo ano, de modo a não atender aos apelos do povo de Roma para que voltasse a ocupar o trono pontifício. Mistérios que só poderão ser revelados por Deus no último dia.

 

116º - Teodoro II - 897

               O Papa Teodoro II, foi Bispo de Roma e governante dos Estados Papais por vinte dias em dezembro de 897. Seu curto reinado ocorreu durante um período de conflitos partidários na Igreja Católica, que estava enredada de violência e desordem na Itália. Seu principal ato como Papa foi anular o recente Sínodo do Cadáver, restabelecendo os atos e ordenações do Papa Formoso, que haviam sido anulados pelo Papa Estevão VI. Ele também recuperou o corpo de Formoso do rio Tibre e enterrou-o com honra. Morreu no cargo no final de dezembro de 897. Pouco se sabe sobre os antecedentes de Teodoro; ele é descrito como nascido romano e filho de Fócio. Seu irmão Teodósio (ou Teósio) também foi Bispo.Teodoro foi ordenado Sacerdote pelo Papa Estêvão V. As datas exatas do reinado de Teodoro II são desconhecidas, mas as fontes modernas geralmente concordam que ele foi Papa por vinte dias durante dezembro de 897. Como Romano, Teodoro era um defensor de Formoso. Alguns historiadores acreditam que Romano foi deposto porque ele não agiu para restaurar a honra de Formoso com bastante rapidez, embora outros sugeriam que ele foi removido pelos apoiadores de Estevão VI. Em ambos os casos, Teodoro imediatamente se lançou na tarefa de desfazer o Sínodo do Cadáver. Ele chamou seu próprio sínodo, que anulou as decisões estabelecidas por Estevão VI. Ao fazer isso, ele restaurou os atos e ordenações de Formoso, incluindo a restauração de um grande número de clérigos e Bispos em seus cargos. Teodoro também ordenou que o corpo de Formoso fosse recuperado do ancoradouro conhecido como Porto, onde havia sido enterrado secretamente e restaurado no túmulo original na Basílica de São Pedro. Como Romano, antes dele, Teodoro concedeu um privilégio à Sé de Grado.  Tinha uma moeda cunhada, com o nome de Lamberto no anverso, e "Scs. Petrus" e "Thedr", no reverso) Flodoardo projetou Teodoro sob uma visão positiva, descrevendo-o como "amado pelo clero, um amigo da paz, temperado, casto, afável e um grande amante dos pobres". Ele morreu no cargo, apesar da causa de sua morte ser desconhecida. Teodoro foi enterrado na Basílica de São Pedro, mas seu túmulo foi destruído durante a demolição da antiga Basílica no século XVII. Após a morte de Teodoro, João IX e Sérgio III alegaram ter sido eleitos Papas; este foi excomungado e expulso da cidade, embora mais tarde tenha se tornado Papa em 904. João IX realizou sínodos que reafirmavam o de Teodoro II, e proibiu ainda mais o julgamento de pessoas após sua morte. Por sua vez, Sérgio III mais tarde anulou os sínodos de Teodoro II e João IX e restabeleceu a validade do Sínodo de Cadáver.

 

117º - João IX - 898 - 900

               Papa da Igreja Católica Romana, nascido em Tívoli, eleito com o apoio do imperador germânico Lamberto de Spoleto, em janeiro de 898, como sucessor de Teodoro II (897), o último Papa monge beneditino. Eleito Papa em um período conflituoso, reconheceu a validade da eleição do Papa Formoso e convocou vários sínodos para restaurar a paz na Igreja. No polêmico, político e irracional episódio do Papa Formoso, o povo de Roma revoltou-se com o tratamento dado ao seu cadáver e conseguiu que o Papa Estêvão VII fosse deposto e encarcerado e depois morto estrangulado na prisão. Foi sucedido por Romano e depois por Teodoro II, que anulou o resultado do Synodus Horrenda, como ficou conhecido o episódio, e tornou oficiais novamente todos os atos Papais de Formoso. O Papa de Tivoli procurou colocar uma pedra sobre este episódio bizarro e, além de queimar todos os documentos do Synodus Horrenda, proibiu que voltassem a colocar pessoas mortas em julgamento. Durante seu pontificado, acabou com as pilhagens que ocorriam nos palácios dos Bispos e do Papa, especialmente após a morte destes e restabeleceu a supremacia da Igreja sobre todos os territórios e sobre Roma. Para evitar novas lutas, repôs a intervenção imperial sobre a consagração dos Pontífices. Agiu para afirmar a autoridade direta da Santa Sé sobre os países eslavos. Faleceu em janeiro, em Roma.

 

118º - Bento IV - 900 - 903

               Bento IV, natural de Roma, mas cuja data de nascimento é ignorada, foi escolhido em 1 de fevereiro de 900, como sucessor de João IX. Apesar de bem intencionado, lutou infrutiferamente contra a corrupção e degradação dos costumes do seu tempo, pontificando em meio a uma corrupção generalizada, ódios, intrigas e injustiças. Filho de um homem chamado Mamalus, teve condições financeiras de receber uma boa educação e se dedicar a carreira eclesiástica. Foi eleito Papa diante de uma conjuntura totalmente desfavorável. Soube conservar a integridade da Santa Sé e buscou o caminho da justiça. Durante seu pontificado teve que enfrentar situações que requeriam capacidades que ele não possuía. Os húngaros invadiram o norte da Itália e os sarracenos, depois de cruzarem toda a Europa, invadiram o sul da península. Sem socorro militar o Papa e Roma ficaram praticamente indefesos. Em meio a corrupção generalizada, conservou a integridade da Santa Sé e consagrou Ludovico de Borgonha imperador de Roma. Morreu em julho, na cidade de Roma.

 

119º - Leão V - 903

               Papa Leão V, foi consagrado em agosto de 903, sucessor de Bento IV. Era da "campanha romana", isto é das planícies adjacentes a Roma. Julga-se, que tenha nascido em Priapo, perto de Ardea. Filho de um humilde pastor. Alguns cronistas de documentos mais antigos alegam entre outras considerações, que teve esmerada educação devido à intervenção materna e de sua família. Segundo um catálogo antigo era ele "padre forasteiro": não pertencia, pois, a nenhuma das igrejas cardinalícias da cidade eterna. Não há informações em documentos da Igreja Católica que deem informações mais precisas sobre a que ordem pertencia ou que forneçam dados mais seguros sobre a sua origem concreta. O fato, todavia, de não pertencer a nenhuma das principais igrejas de Roma, leva a crer que seria homem de valor, elevado no conceito moral, e que teria sido escolhido para conciliar divergências. As facções em Roma estavam em ebulição. Leão V governou a Igreja menos de dois meses. Um dos partidos, não satisfeito com a escolha de Leão, insurgiu-se, tumultuou pelas ruas da cidade, e, nessa desordem, o Pontífice foi preso, arrastado a uma prisão e morto misteriosamente. Estas são notícias dadas por alguns contemporâneos e repetidas, dois séculos mais tarde, por Sigeberto de Gembloux. O cronista Flodoardo, grande biógrafo europeu, costuma atribuir, junto de outros cronistas e historiadores ingleses e franceses de seu tempo, que certos eventos de insurreição popular e insatisfação política com Leão V foram fruto das tensões promovidas pelo capelão de nome Cristóvão. Curiosamente esse mesmo capelão sucederia ao Papa Leão, visto que desde longa data Cristóvão ambicionava o trono pontifício. Esse homem, movido por grande ambição, alimentou o interesse dos insurretos em depor o Pontífice com promessas difíceis de cumprir, e que macularam a sua reputação por toda a posteridade. Os tempos eram particularmente difíceis, tão bárbaros que subsiste como provável o fim trágico deste Papa, terminando seus dias como o de muitos príncipes: assassinado. Em seu breve e agitado pontificado não foi, pois, anotado qualquer fato de relevo ou importância em Roma.

 

120º - Sérgio III - 904 - 911

               Papa da Igreja cristã Romana, nascido em Roma, eleito como sucessor de Leão V, radical adversário do Papa Formoso e suspeito da morte do Papa Teodoro II e que governou durante um período de grande degeneração moral. Aristocrata da família dos condes de Túsculo, uma antiga cidade da hoje Região do Lázio, ao sul de Roma, próxima do vulcão de Alban, que seria destruída pelos romanos (1191), foi eleito pelo partido aristocrata, enquanto o popular elegia João IX (898-900). Consagrado em 903, foi expulso de Roma pelas tropas de Lamberto de Spoleto e obrigado a refugiar-se junto a Adalberto, marquês da Toscana. Voltou à Roma em 904, com o apoio de Alberico I, senhor de Camerino e Spoleto, e se livrou de Leão V, que sucedera João IX. Depois de subir de fato ao trono pontifício, deu continuidade à política antiformosiana que caracterizaria toda a sua ação, anulou todas as disposições emanadas pelos predecessores e, para ter o apoio de um poderoso, apoiou o rei da Itália, Berengário I, na conquista do título Imperial. De sua presumível relação com Marócia, patrícia e senatriz romana, corrupta e cortesã da alta classe, da nobre família de Teofilato, teria nascido o futuro papa João XI (931-935). Mandou reconstruir a Basílica de São João de Latrão, destruída por um incêndio e reivindicou e defendeu os direitos da Igreja contra os senhores feudais.

 

121º - Anastácio III - 911 - 913

               Papa da Igreja cristã Romana, nascido em Roma, que eleito Papa como sucessor de Sérgio III, em seus dois anos de pontificado, não pôde fazer muito por causa das lutas internas. Determinou a divisão eclesiástica da Alemanha, apesar das fortes pressões de Berengário I, rei da Itália. Apesar de considerado por seus contemporâneos como homem culto e generoso, foi assassinado em Roma, asfixiado por Sagarius, amante de Marócia, patrícia romana, conhecida universalmente por sua libertinagem e seus crimes, manchada por uma longa série de adultérios e uniões incestuosas, recebeu dos príncipes italianos, como preço de sua devassidão, a propriedade do Castelo de Santângelo e o governo da cidade de Roma com o título de Senatrix e Patricia romana. O assassinato foi tramado por ela e pelo próprio clero, que temia a simpatia do Papa às causas estrangeira.

 

122º – Lando - 913 - 914

               Papa da Igreja cristã Romana, nascido em Fornovo, na Sabina, eleito em junho de 913, como sucessor de Anastácio III, foi Papa consagrado por cerca de 6 meses, de agosto (913) a fevereiro (914) em meio a um mar de intrigas de uma das várias facções romanas. Sabe-se muito pouco a respeito de seu pontificado e o que se apresenta é impreciso, apenas podendo se concluir que era um homem meritório por ser nato da Sabina e ter chegado ao papado. Papa em um tempo em que o poder em Roma estava nas mãos dos marqueses de Túsculo ou Tusculum, uma antiga cidade da hoje Região do Lázio, ao sul de Roma, próxima do vulcão de Alban, que seria destruída pelos romanos em 1191, que também mandavam e desmandavam na Santa Sé, e dividido entre as má afamadas Marócia, patrícia romana, e de sua irmã Teodora, parece ter sido um protegido desta última, mãe de Teofilato, futuro Papa. Subiu ao trono de São Pedro por intriga de uma das várias facções e morreu misteriosamente em Roma, depois de ter conseguido estabelecer a paz no meio de tantas lutas internas.

 

123º - João X - 914 - 928

               Papa da Igreja Católica Romana, nascido em Tossignano di Imola, Bolonha, foi eleito em março de 914, sucessor de Lando, em uma eleição marcadamente influenciada por Teodora, irmã e rival da senhora senatriz Marócia, então casada com Alberico I, conde de Túsculo, um casal de devassos que dominava Roma. Eleito, só conseguiu assumir o trono de São Pedro após uma série de tramóias que ele mesmo desaprovou, fomentadas pelas intrigas romanas criadas pelas influentes famílias. No trono de São Pedro foi um Papa enérgico e independente, lutou contra os maometanos, que há cerca de três décadas assolavam o sul da Itália, destruindo os grandes mosteiros de Subiaco e de Farfa, assaltando e aprisionando peregrinos, levando-os para Roma, para vendê-los como escravos. Coroou Berengário Imperador em Roma (915), armou uma poderosa liga entre os duques e, auxiliado pela esquadra bizantina, derrotou os maometanos perto de Garillano, e expulsou-os para sempre. Apesar das incessantes revoluções que ocorreram em seu pontificado, fez muito pela conversão dos Bárbaros, da reconstrução de mosteiros e da pureza da fé. Por não querer participar de tramas desonestas, viu seu irmão Pedro, comandante pontifício, ser trucidado pelas tropas do borgonhês Guido de Túscia, duque de Toscana e segundo marido da dissoluta e violenta Marócia, após atacarem Roma. O pontífice foi deposto, aprisionado e assassinado no cárcere, por capangas de Marócia. Faleceu em 26 de maio, em Roma, e foi sucedido por Leão VI, sobrinho de Marócia e colocado por ela no trono Papal, um simples leigo, que foi expulso como intruso pelo povo romano poucos meses depois.

 

124º - Leão VI - 928

               Papa Igreja cristã Romana, nascido em Roma, eleito em 28 de maio de 928, por vontade da poderosa senadora Marócia, por vontade do pai dela, Teofilato para substituir João X, que durante os sete meses de pontificado procurou apaziguar as lutas entre as famílias nobres romanas, fazendo todo o possível para levar a paz a Roma. Foi Primeiro-Ministro do Papa João VIII e depois Cardeal. A poderosa senadora Marozia, matriarca da família de Crescentii romana, depôs e prendeu o Papa João X e organizou sua eleição canonicamente para o trono de São Pedro. O seu pontificado esteve dominado pela poderosa senatriz romana e seu maior ato político foi regulamentar a jurisdição da hierarquia na Dalmácia. Fez todo o possível para pacificar Roma e lutou contra os sarracenos e os ferozes húngaros. Apesar de um pontificado violento, levou uma vida razoavelmente modesta e reclusa e fez ressurgir as artes, o comércio e a indústria. Não governou mais que sete meses e foi morto a mando de Marócia, em dezembro de 928, em Roma, e foi sucedido por Estêvão VIII, que governou por dois anos, mas também morreu repentinamente. Os maridos dessa corrompida, perigosa e violenta mulher não tinham vida muito longa e como os Papas, eles se sucediam uns aos outros com rapidez incrível, justificando todas as suspeitas. Não confundir com Leão VI, o Sábio, co-Imperador (870-886) e Imperador bizantino (886-912) nascido em Constantinopla.

 

125º - Estevão VII; VIII - 929 - 931 

               Papa Igreja cristã Romana, nascido em Roma, escolhido em 3 de janeiro de 929, como sucessor de Leão VI, graças às intrigas dos condes de Túscolo, enquanto em Roma governava Marócia, marquesa de Túscia. Marócia tinha colocado no trono Papal um de seus sobrinhos, e embora eleito canonicamente, Leão VI que era um simples leigo, foi expulso como intruso pelo povo romano sete meses depois e morreu subitamente, possivelmente envenenado pela própria Marócia. Essa poderosa mulher era uma política romana, corrupta, e mãe dos Papas Sérgio III e João XI. O novo Papa, substituto de Leão VI, governou por dois anos e favoreceu os mosteiros de S. Vicente, em Volturno, e aos dois conventos na Gália. Seu pontificado também coincidiu com o crescimento desproporcional da fortuna de Marócia, agora esposa de Hugo, rei da Itália. Sua morte repentina, em Roma em 931, também deixou suspeitas de envenenamento promovido pela libertina política. Foi sucedido por João XI, um filho da senatriz com o marquês Alberico de Túsculum, e com aproximadamente 20 anos de idade e que também se revelaria extremamente irresponsável no cargo.

 

126º - João XI - 931 - 935  

               Era filho do primeiro casamento de Marózia com Alberico I de Espoleto. Através de intrigas da mãe, que governava Roma, foi eleito Papa em Março de 931, ficando completamente sob a influência da Senatrix e Patricia romana. Para fortalecer o seu poder, Marózia casou com o cunhado Hugo, rei da Provença e Itália, levando a um governo tirânico em Roma. Uma forte oposição apareceu entre os nobres, liderados por Alberico II, filho mais novo de Marózia. Esta foi presa e o marido fugiu. Alberico tornou-se o novo governante de Roma, dando ao Papa apenas o poder de exercer os seus deveres espirituais. Todas as outras jurisdições inerentes ao cargo pontifício foram exercidas por Alberico. João XI refugiou-se nos monges de Cluny e, em agradecimento concedeu à Congregação vários privilégios, tornando-a mais tarde um poderoso agente da reforma da Igreja.

 

127º - Leão VII - 936 - 939

               Papa Leão VII (Roma, 895 - Roma, 13 de julho de 939), romano e provavelmente Monge Beneditino, era abade de São Sixto quando foi eleito Papa a 3 de Janeiro de 936, por influência de Alberico II, príncipe e senador de Roma. Hugo, ostentando o título de rei de Itália (Lombardia) disputava o poder com Alberico, pelo que cercou Roma. Leão sabendo que o abade de Cluny, Odon, tinha certa influência sobre os dois, aconselhou-o a dirimir a disputa. Para tanto bastou o casamento entre Alberico e Alda, filha de Hugo, o que levou a um interregno entre os beligerantes. As bulas Papais consistiram na sua maior parte em garantir privilégios a vários mosteiros, especialmente aos da Ordem de Cluny. Escreveu aos Bispos da França e da Alemanha dando diretrizes para empreender uma reforma monástica. Não permitiu ao Arcebispo Frederico de Mainz (Alemanha) batizar judeus à força, mas autorizou a expulsão das cidades, daqueles que recusavam abraçar o cristianismo. Tentou estabelecer o celibato sacerdotal e lutou contra o fenômeno dos bruxos e adivinhos. Mandou reedificar o antigo Cenóbio, perto da Igreja de São Paulo, fora das muralhas de Roma. A sua morte ocorreu em 13 de Julho de 939, após um ataque cardíaco. Morreu em julho 939, e enterrado na Basílica de São Pedro.

 

128º - Estevão VIII; IX - 939 - 942

               Papa Estêvão VIII, Romano, eleito em 14 de Julho de 939. Tratou de inculcar os princípios cristãos do Evangelho aos poderosos do Oriente e do Ocidente. Apoiou a dinastia carolíngia em declínio e pela ameaça de excomunhão, forçou os nobres francos a jurarem fidelidade a Luis IV d'Outre-Mer. Sofreu a tirania de Alberico II de Espoleto, príncipe de Roma, que o manteve confinado no Palácio de Latrão. Faleceu em Outubro de 942.

 

129º - Marino II - 942 - 946

               Marinho II, ou Marino II, foi elevado ao papado graças à intervenção de Alberico II de Spoleto, tendo focado a sua atividade em aspectos administrativos do Papado. Marino nasceu em Roma e, antes de se tornar Papa, foi vinculado à Igreja de São Cyriacus nas Termas de Diocleciano. Diz-se que ele encontrou Ulrico de Augsburgo em sua visita a Roma em 909, e previu a eventual nomeação de Ulrico como Bispo de Augsburgo. Marino foi elevado ao papado em 30 de outubro de 942. Esse período é conhecido como Saeculum obscurum devido ao poder de Alberico e seus parentes sobre os Papas. Marino concentrou-se nos aspectos administrativos do papado e procurou reformar o clero secular e regular. Ele estendeu a nomeação do Arcebispo Frederico de Mainz como vigário Papal e missus dominicus por toda a Alemanha e França. Marino mais tarde interveio quando o Bispo de Cápua apreendeu sem autorização uma igreja que havia sido dada ao local a Monges beneditinos. Na verdade, ao longo de seu pontificado, Marino favoreceu vários mosteiros, emitindo uma série de bulas em seu favor. Marino ocupou o Palácio construído pelo Papa João VII no topo do Monte Palatino nas ruínas da Domus Gaiana. Morreu em maio de 946.

 

130º - Agapito II - 946 - 955

               Homem prudente e enérgico, que governou com sabedoria por dez anos. Com este Papa, Roma retomou a iniciativa de tratar firmemente com países e soberanos. Em 950 morria em Turim o jovem rei Lotário, filho de Hugo de Provença, dizem os cronistas florentinos, que de febres, dizem os seus contemporâneos mais próximos, que de veneno por obra de Berengário II, marquês de Ivréa. O certo é que Berengário apoderou-se depressa da coroa lombarda e pretendeu que seu filho Adalberto se casasse com Adelaida, rainha viúva de Lotário. Uniria assim, num reino único, o sul da França e o norte da Itália, e ocupada Roma, proclamar-se-ia Imperador. Opôs-se, porém, a jovem viúva Adelaida. Foi então aprisionada numa torre do "Lago de Guarda", de onde fugiu com a ajuda do Bispo de Reggio e foi abrigar-se no forte Castelo do Conde Azzo de Canossa. De lá foi invocado auxílio do jovem rei germânico Oto I, o qual, com forte exército, desceu à Itália, libertou e desposou Adelaide e foi aclamado rei da Lombardia em 951. Não ousou, entretanto, ir receber a coroa imperial em Roma, onde o Papa recusou recebê-lo e onde Alberico, lembrando antigo orgulho romano, rejeitava um Imperador "bárbaro". Alberico morreu em 954. Impôs ordem e deu paz ao povo; respeitou a autoridade do Papa, fazendo, porém, cunhar moedas com sua efígie junto à do Pontífice. Cometeu afinal um ato imperdoável: sentindo que ia morrer mandou que o transportassem à Basílica de São Pedro e lá obteve de todos o juramento de que elegeriam Papa seu filho Otaviano, após sua morte. Assim, depois de uma vida gloriosa, traiu-se o filho de Marózia. Agapito II morreu em agosto de 956. O cronista florentino Guy de Passapant teria-lhe dito instantes antes do momento fatal: devia ter vivido muito mais, para o bem de Roma e da Igreja.

 

131º - João XII - 955 - 963

               João XII (Roma, c. 937 – Roma, 14 de maio de 964), nascido Otaviano. Era inexperiente como governante, entretanto era audacioso. Ele foi responsável por reivindicar os direitos temporais da Igreja e por criar os Bispos-Condes, além de reconstruir o Sacro Império. Mas, apesar de toda a sua audácia, não demorou para que sua fama negativa repercutisse. Rapidamente foi considerado preguiçoso e infantil e recebeu as mais severas críticas de Sacerdotes e de outras autoridades religiosas. Sua fama estava muito longe de ser agradável ou respeitada. Alguns o descreviam como libertino, criminoso e sanguinário. Há relatos de líderes católicos que alegam que João XII invocava demônios e que gostava de jogos de azar e cometia atrocidades com frieza, como assassinar e mutilar pessoas e incendiar casas. João XII teria transformado o Palácio Papal em um bordel e tido relações com viúvas, com sua própria sobrinha e com a namorada de seu pai. A vida de Otaviano era completamente desregrada e promíscua. O Papa João XII, contudo, foi quem coroou o imperador Oto I, na Alemanha, e criou uma aliança que deixaria um legado para a Igreja Católica e sua influência na sociedade. Nenhum Papa poderia ser coroado sem a presença do imperador ou de seus enviados. Ironicamente, o mesmo Imperador que o coroou foi quem liderou o movimento de deposição do Papa. João XII foi considerado inadequado para ser Papa por levar uma vida muito imoral e deposto pelo imperador Oto I depois de nove anos como Papa. O imperador germânico o substituiu por Leão VIII. No entanto, seu sucessor foi assassinado rapidamente. Otaviano de Túsculo manteve sua vida libertina após ser afastado do cargo e, como consequência, faleceu vítima de um derrame quando, supostamente, estava na cama com uma mulher casada. É famoso por ser um dos piores Papas da história da Igreja Católica.

 

132º - Leão VIII - 963 – 964

               Nascido em Roma, eleito como um antipapa por Otão I, depois de várias disputas com o predecessor João XII e com seu sucessor Bento V. Era leigo ao ser escolhido num concílio em Roma em 6 de dezembro de 963. Seu papado se deu numa época em que o novo imperador alemão estava ansioso para se apoderar da Itália e do papado. Em Roma, o Papa João XII, aceitou uma aliança com Oto I em que no futuro nenhum Papa seria consagrado sem a presença dos enviados do imperador. Porém quando Otão saiu da cidade, João uniu-se aos nacionalistas feudais, para expulsar os alemães da Itália. O imperador, revoltado, retornou a Roma e depôs João XII, sob a acusação de vários crimes e colocou Leão VIII como seu sucessor no trono de São Pedro em 6 de Dezembro de 963, governando como um antipapa, pois João XII, apesar do mau caráter, ainda estava vivo. Mas também ele não caiu nas graças dos romanos por ter servido de instrumento aos interesses do imperador germânico. Leão acabou deposto no início do ano seguinte, durante um sínodo em 964, permitindo que João reassumisse o trono e ele agora mostrou-se reconhecido ao Imperador. Por exemplo, por decreto promulgado em concílio, concedeu-lhe e a seus sucessores, o direito de nomear o Papa, Bispos e Arcebispos, punindo com a excomunhão quem se opusesse a esse decreto. Em outra medida, proibiu aos leigos de entrarem no presbitério durante as funções solenes. Com a súbita morte de João, Leão VIII poderoso antipapa governou a Igreja ainda mais um ano, totalizando dois anos de pontificado, até ser deposto por forças franco-suíças leais ao legítimo Papa que os italianos haviam eleito, Bento V, em 964, homem virtuoso e de reconhecida capacidade para o cargo. O imperador voltou a Roma, invadiu a cidade, mandou Bento V para o exílio e recolocou Leão VIII no trono em Julho de 964, mas ele morreu no ano seguinte. O imperador reconheceu a autoridade pontifícia de Bento V, sob pressão dos francos e romanos, porém o restante do pontificado deste não duraria mais que poucos dias.

 

133º - Bento V - 964 - 965  

               Natural de Roma, foi escolhido em 22 de Maio de 964, durante a desordem do pontificado de João XII. Foi exilado em Hamburgo, por Otão I, que forçou-o a renunciar em favor de Leão VIII, em 23 de Junho de 964. Com a morte do Papa Leão VIII, o imperador Otão I, sob pressão dos francos e romanos, reconheceu-lhe a investidura. Morreu em Hamburgo, antes de regressar a Roma com fama de santidade, a 4 de Julho de 965. Otão III mandou transladar seus restos mortais para a Cidade Eterna, onde jazem na Cripta Vaticana.

 

134º - João XIII - 965 - 972

               O Papa João XIII exerceu o papado de 1 de outubro de 965 a 6 de setembro de 972, por exatos 6 anos, 11 meses e 5 dias. Nasceu em Roma. Foi imposto pelo imperador do Sacro Império Romano-Germânico e, por isso, não era bem aceito pelos romanos. A data do seu nascimento é desconhecida. Depois da morte do Papa João XII, em 964, Grammaticus Benedictus foi eleito seu sucessor com o nome de Bento V. Mas o imperador Otão I trouxe de volta a Roma o antipapa Leão VIII, nomeado por ele em 963, depois de ter banido a Bento para Hamburgo. Leão morreu em março de 965, pelo que os romanos pediram a Otão que enviasse de volta Bento. Mas Otão recusou e Bento morreu pouco depois, em julho de 965. Na presença dos enviados imperiais, João, Bispo de Narni, foi eleito Papa e consagrado a 1 de Outubro de 965 como João XIII. Pertencia à família de Teodora, que pelo seu casamento com o senador e conde de Túsculo, Teofilato I, teve, além de Marózia, outra filha conhecida por Teodora, a Jovem, que se casou com o cônsul João. Este João entrou posteriormente na carreira eclesiástica e tornou-se Bispo. Da união com Teodora teve duas filhas e três filhos, entre eles João que, ainda jovem, se tornou Sacerdote e mais tarde Bispo de Narni. Foi neste descendente da nobreza romana que caiu a escolha dos eleitores. Mas alguns nobres eram hostis ao novo Papa, por ser o candidato Imperial e, quando o Papa tentou reprimi-los, eles contra-atacaram e, em dezembro de 965 conseguiram capturá-lo e aprisioná-lo, primeiro no Castelo de Santo Ângelo e depois numa fortaleza na Campânia. João, no entanto, conseguiu escapar e encontrou proteção no príncipe Pandulfo I de Cápua, príncipe de Benevento. Em Roma mantinha-se a oposição ao novo Papa, mas quando, em 966, o imperador Otão realizou uma expedição a Itália, os romanos, aterrorizados, permitiram que João XIII regressa-se à cidade em 14 de novembro. O Papa não perdeu tempo em castigar os conspiradores, alguns dos quais foram enforcados e os outros expulsos. João XIII aliou-se intimamente com o Imperador. Em Abril de 967, viajou com Otão até Ravena, onde num sínodo, confirmou a elevação de Magdeburgo à dignidade metropolitana, resolveu várias disputas sobre os privilégios concedidos a igrejas e conventos e, restaurou Ravena como parte do território dos Estados Pontifícios. As relações entre João e o Imperador continuaram cordiais e no dia de Natal de 967, João coroou Otão II, de treze anos, como imperador em conjunto com o seu pai. João também participou nas negociações para o casamento de Otão II com a princesa bizantina Teofânia Escleraina. O casamento teve lugar em Roma e foi abençoado pelo próprio Papa a 14 de abril de 972. O Papa João XIII trabalhou intensamente nos assuntos da Igreja. No início do seu pontificado elevou Cápua ao estatuto de metropolitana, em sinal de gratidão pela ajuda prestada pelo príncipe Pandulfo. Em 969 Benevento recebeu a mesma dignidade. Confirmou decretos de sínodos realizados na Inglaterra e França. Concedeu muitos privilégios a igrejas e conventos, principalmente da Ordem de Cluny e decidiu várias questões de direito eclesiástico de vários países que a ele apelaram.

 

135º - Bento VI - 973 - 974

               Papa Bento VI, nascido Ricobaldi de Ferrara (Data de nascimento desconhecida - morto em junho de 974). Foi Papa de 19 de Janeiro de 973 até a data de sua morte. Romano, teve sua eleição confirmada pelo Imperador em 19 de janeiro de 973. Pouco se sabe do seu Pontificado, exceto que confirmou os privilégios de várias igrejas e mosteiros. O mais importante foi mesmo o seu fim trágico. Seu breve pontificado veio no contexto político da fundação do Sacro Império Romano, durante a transição entre os reinados de imperadores alemães Oto I e Oto II e da luta pelo poder de famílias aristocráticas, como o Crescentii e Tusculani na região de Roma. E por isso a necessidade de esperar pela ratificação do Imperador Otão atrasou sua consagração até 19 de Janeiro de 973. Bento VI nasceu em Roma, foi Cardeal-diácono de São Teodoro, filho de Hildebrand. Ele foi eleito e instalado como Papa sob a proteção de Oto I, cujo domínio nos assuntos romanos e eclesiais foi resistido pela aristocracia local. Registro de seu pontificado como Papa é escassa, embora ele é conhecido por ter privilégios confirmados assumidas por alguns mosteiros e igrejas. Após a morte de Oto I, um movimento antialemão conquistou Roma, depois de um duro assédio do Castelo Sant'Angelo contra o Papado, Bento foi preso no Castelo, na época um reduto da Crescentii. Crescentius I, irmão do Papa João XIII e o Cardeal-diácono Franco Ferrucci, que iria posteriormente tornar-se Bonifácio VII, um antipapa, prenderam o Papa Bento VI. Foi quando Oto II enviou um representante imperial, Conde Sicco, para garantir a sua libertação, no entanto Bento, depois de dois meses aprisionado foi assassinado estrangulado. Converteu ao cristianismo o povo húngaro, e veio a falecer em junho de 974.

 

136º - Bento VII - 974 - 983

               Bento VII (Roma 930 - 10 de julho de 983), Conde de Túsculo e Bispo de Sutri, foi eleito em outubro de 974. Sucedeu Bento VI que tinha sido assassinado numa revolta provocada por Crescentius I, um nobre romano, e que logo guindou ao trono Francone, que se intitulou "Bonifácio VII" – alguns especulam que ele esteve envolvido com o assassinato, pois era financiado pelo Conde Crescentius e adversário de Otão II, imperador do Sacro Império Romano-Germânico. Benedito VII foi escolhido por Otão II, tornando-se Papa quando o Conde Sicco, um representante de Otão vetou a eleição de Bonifácio, em 974, e numa operação militar expulsou-o de Roma. O antipapa fugiu com alguns partidários para Constantinopla levando parte do tesouro Papal. Na capital imperial, Bonifácio conseguiu o apoio de Basílio II Bulgaróctono, o Imperador bizantino, que derrubou dois Patriarcas por apoiarem Bento na disputa (Basílio I e Antônio III Estudita). Quatro anos mais tarde Bonifácio retornou usurpando o trono de Bento VII, que foi aprisionado no Castelo de Santo Ângelo e precisou novamente da ajuda de Otão para reassumir o trono Papal. Otão outorgou-lhe privilégios para a Mogúncia e Tréveris, nomeou um Bispo para Praga e fechou o Episcopado de Mersebourg. Combateu os abusos e a ignorância que reinavam na Itália e no mundo cristão e também firmemente a simonia, ou seja, o tráfico de objetos sagrados: sacramentos, dignidades, benefícios eclesiásticos. Em 981 redigiu uma encíclica. Colaborou nas reformas da Igreja em conjunto com as ordens monásticas, fundou um monastério no Monte Aventino. O restante de seu Pontificado até a sua morte em 983 foi pacífico. Enviou ajuda à Cartago, quando houve fome naquela cidade. Morreu em 10 de julho de 983, em Roma, e foi sucedido por João XIV, que era Bispo de Pávia também apontado por Otão II.

 

137º - João XIV - 983 - 984

               O Papa João XIV, nascido Pedro Canepanova foi o Pontífice romano nos anos agitados de seu tempo. Nasceu em Pavia e, antes da elevação à dignidade Papal, era Chanceler do Império de Oto II, bem como Bispo de Pavia. As influências do Imperador foram decisivas na eleição de João XIV. Mudou o seu nome para João XIV já que o seu nome original, Pedro, deveria, na sua opinião, ser reservado apenas para o fundador do Papado - tradicionalmente, São Pedro. Oto morreu pouco depois da sua eleição, a 7 de Dezembro de 983, com 28 anos de idade, vítima de peste bubônica, deixando como herdeiro Oto III, apenas com três anos de idade. Foi o próprio João XIV que lhe deu a extrema unção, em presença dos Cardeais e Bispos. A morte de Oto trouxe consigo um período de confusão política e lutas por todo o império, com duques germânicos a pretender usurpar o trono. Os nobres de Roma aproveitaram o clima de insurreição e revoltaram-se contra o Pontífice, sob o pretexto de que este não era romano. Bonifácio VII, antipapa aproveitou o contexto e, voltando do exílio em Constantinopla, prendeu o seu rival no Castelo de Santo Ângelo. João XIV viria, depois, a morrer envenenado na prisão em 20 de agosto.

 

138º - João XV - 985 - 996

               João XV, nascido Giovanni di Gallina Alba (Roma, c. 950 — Roma, 1 de abril de 996), foi Papa da Igreja Católica de agosto de 985 até sua morte. Nos últimos dias, obscuros e tristes, do antipapa Bonifácio, fora indicado para Pontífice um monge João, filho de Roberto. Não foi reconhecido, nem consagrado. Após quatro meses acordaram os partidos e o Clero na escolha do Sacerdote João Leão. Daí a dúvida dos autores (João XV e XVI), cuja maioria, porém, chama a este de João XV, não contando o primeiro. Foi consagrado em setembro de 985. Era erudito e piedoso. Procurou defender os direitos da Igreja. Seu epitáfio em São Pedro chama-lhe: "invencível ao temor e ao lucro, egrégio doutor". O imperador Oto III era muito jovem e estava longe. Então Crescêncio Nomentano, senador em Roma, tornou-se ditador. João XV solicitou auxílio à imperatriz regente Teofania, que veio a Roma em 989 e governou em Ravena com o estranho título de "Imperador". Ela celebrou o Natal em Roma; uma grande benfeitora dos pobres e dirigida espiritual de São Adalberto, mas morreu na Alemanha em 991. A regência passou a santa Adelaide, avó de Oto III. Rebelou-se Crescêncio, que obrigou o Papa a fugir de Roma em 995; mas quando soube que Oto marchava contra a cidade com gigantesco exército, o povo, sempre volúvel, chamou o Pontífice de volta e preparou grandiosas festas ao soberano. João morreu em abril de 996. Fora fraco no governo civil da cidade, mas forte, vigoroso no trato da Igreja. Conseguiu promover a paz entre Etelredo, rei da Inglaterra, e Ricardo, duque da Normandia (991). Num sínodo, realizado em Roma, canonizou São Ulrico, Bispo de Augusta, primeiro exemplo de canonização feita por um Papa. Por meio de missões aproximou os povos da Polônia ao Cristianismo. Defendeu com energia os Bispos franceses contra o rei Hugo Capeto.

 

139º - Gregório V - 996 - 999

               Gregório V, nascido Bruno da Caríntia. Governou a Igreja com energia, cercado de inúmeros inimigos. A confusão provocada em Roma por Crescêncio II e seus partidários impediu ao clero a eleição de um novo Papa em 996. Foi então enviada uma comissão ao Imperador Otão III, pedindo-lhe como "defensor da Igreja", uma intervenção. Otão III indicou Bruno, filho do Duque da Caríntia, que, após eleito, tomou o nome de Gregório V. Os dois eram primos. Embora muito jovem, Bruno era culto, severo e resoluto. Acompanhou-o luzida comitiva de Arcebispos e Príncipes e os romanos confirmaram com júbilo a escolha. Um dos objetivos de Gregório era a universalidade da Sé Apostólica de Roma. Em 21 de maio de 996, em Roma, coroou o imperador Otão. Os dois jovens, Otão com 16 e Gregório V com 25 anos, idealizaram um programa para a Igreja e para o Império em um sínodo que se seguiu à coroação. Foram anistiados os chefes de passadas rebeliões, ato de bondade pago com grande gratidão. Crescêncio tramou contra o Papa, que insistia em moralizar a cidade. A nobreza dissoluta aprovou a revolta contra o rigoroso Papa alemão. Crescêncio II obrigou Gregório a fugir, alçou o antipapa Filagato de Piacenza com o nome de João XVI e entregou Roma ao imperador grego. Otão III voltou com grande pompa e enorme exército em 998, depondo Filagato e humilhando Crescêncio publicamente antes de executá-lo. São Nilo de Rossano repreendeu Otão e Gregório pelas torturas e execuções e quis fazer do antipapa um monge, mas os próprios soldados do rebelde mutilaram-no na fuga desastrada que empreendeu. Gregório V defendeu o Arcebispo Arnolfo contra o mal casado rei Roberto II de França. Os mais ilustres homens de ciência do tempo gozaram da amizade sincera de Gregório V, do qual se recorda que, em Roma, pregava sempre em três línguas. Gregório morreu em 16 de fevereiro de 999 com apenas 27 anos, suspeita-se que de envenenamento pelos partidários de Crescêncio.

 

140º - Silvestre II - 999 - 1003

               Silvestre II, O.S.B. (ca. 950 — 12 de maio de 1003), nome de batismo Gerbert d'Aurillac, foi Papa de 2 de Abril de 999 até sua morte, sucedeu Gregório V. Como monge beneditino, Gerbert, nasceu em Auvérnia, França, de origens obscuras, mas certamente humildes, foi educado e encaminhado aos estudos teológicos no mosteiro de Saint-Géraud de Aurillac, no Auvérnia; acompanhando o Duque da Espanha, Borel, estabeleceu-se na Península Ibérica, onde pôde aprofundar, também graças aos contatos com a ciência árabe, a própria cultura no campo filosófico e matemático. Foi um dos primeiros divulgadores dos numerais indo-arábicos na Europa cristã. Lecionou por alguns anos em Roma, depois em Reims (972), onde por uma década desenvolveu a parte mais produtiva e interessante de sua obra didática e cultural. Atendendo a um pedido do Imperador Oto II, dirigiu por um breve período a abadia de São Columbano em Bobbio e depois voltou a Reims em 983, onde, como conselheiro do Arcebispo Adalberon, deteve o controle da política francesa, favorecendo a ascensão ao trono de Hugo Capeto. À morte de Adalberon em 989, seguiu-se um período agitado para Gerbert que, indicado para a sucessão deste, viu-se preterido por Arnulfo por desejo do próprio rei Hugo. Com a deposição de Arnulfo, Gerbert foi nomeado para substituí-lo em 991, mas foi deposto em 995, uma vez que sua nomeação havia sido considerada ilegal. Refugiou-se então na Alemanha, protegido pelo Imperador Oto III, que, vinte anos antes, havia sido seu discípulo em Roma. Oto levou-o consigo, como conselheiro à Itália, onde fez com que fosse nomeado primeiramente Arcebispo de Ravena (998), e depois, com a morte de Gregório V, favoreceu sua eleição ao papado em 999. Como Papa Silvestre II, Gerbert considerou que chegara finalmente o momento de dar livre vazão aos projetos reformadores aos quais a sua cultura e a sua formação clunicense naturalmente o impeliam, mas o estreito vínculo com o Imperador induziu-o a expressar tal reforma na aliança império universal-cristandade, que encontrava sua fórmula na Renovatio imperii, ou seja, na convivência pacífica e na colaboração entre Império e Papado. Os ideais do Papa francês e do imperador alemão, contudo, não eram compartilhados pela população romana; ambos foram expulsos da cidade em fevereiro de 1001. O Papa pôde voltar a Roma alguns meses depois, mas, nos dois últimos anos de vida e de reinado, toda sua vontade reformadora desaparecera; suas últimas esperanças foram destruídas com a morte de Oto em 1002. Segundo o historiador Thomas E. Woods Júnior “o primeiro relógio de que se tem notícia foi construído pelo futuro Papa Silvestre II para a cidade germânica de Magdeburgo, por volta do ano 996. Posteriormente, outros monges foram aperfeiçoando essa técnica”.

 

141º - João XVII - 1003

               Giovanni Sicco, feito Papa, adotou o nome de Papa João XVII, foi eleito em 16 de Maio de 1003 e morreu em 6 de Novembro de 1003. Não havia em Roma nenhuma autoridade que fizesse frente aos nobres. Assim, a facção de Crescêncio II ganhou novamente vantagem. João Crescêncio, filho do patrício derrotado e morto por Otão III, aproveitou para tomar o poder. Os três Papas que se seguiram, devem-lhe a sua eleição. João XVII, antes de tomar ordens, tinha sido casado e era pai de três filhos, que também eram eclesiásticos. Do seu Pontificado de poucos meses nada se sabe.

 

142º - João XVIII - 1003 - 1009

               O Papa João XVIII, foi Bispo de Roma e governante nominal dos Estados Pontifícios de 25 de dezembro de 1003, até sua abdicação em julho de 1009. Ele exerceu pouco poder temporal, governando durante a luta entre João Crescêncio e o Imperador Henrique II pelo controle de Roma. Nascido Giovanni Fasano di Roma, foi eleito sucessor do Papa João XVII, cujo pontificado durou poucos meses. João nasceu na família Fasano em Roma. Seu pai era um Sacerdote. João deve sua eleição à influência e poder do clã Crescêncio. Durante todo o seu Pontificado, ele foi supostamente subordinado ao chefe dos Crescêncios, que controlava Roma, o patricius (um líder militar aristocrático) João Crescêncio III. Este período foi interrompido por contínuos conflitos entre o Imperador otoniano Henrique II e o Arduíno de Ivrea, que reivindicou o Reino da Itália em 1002 após a morte do Imperador Otto III. Roma foi assolada por surtos de peste e os sarracenos operavam livremente a partir do emirado da Sicília devastando as costas do Tirreno. Como Papa, João XVIII ocupou seu tempo principalmente com detalhes da administração eclesiástica. Ele autorizou uma nova Diocese de Bamberg para servir de base para a atividade missionária entre os eslavos, uma preocupação de Henrique II. Ele também julgou o exagero dos Bispos de Sens e de Orléans em relação aos privilégios do abade de Fleury. João teve sucesso em criar, pelo menos temporariamente, uma reaproximação entre as igrejas oriental e ocidental. Seu nome podia ser encontrado em dípticos orientais e ele era orado em missas em Constantinopla. João XVII abdicou em julho de 1009 e, de acordo com um catálogo de Papas, retirou-se para um mosteiro, onde morreu pouco depois, em junho ou julho de 1009.

 

143º - Sérgio IV - 1009 - 1012

               Papa Sérgio IV (nascido Pietro Buccaporci: Roma, 970 — Roma, 12 de Maio de 1012). Foi Bispo de Roma e governante nominal dos Estados Papais de 31 de Julho de 1009 até sua morte. Seu poder temporal foi eclipsado pelo patrício João Crescêncio. Nasceu em Roma no bairro "Pina", em data desconhecida, filho de Pedro, o Sapateiro e de Estéfânia. Ele se chamava Pietro Martino Buccaporci, que não era seu nome de nascimento, nem o nome de sua família, mas aparentemente um apelido dado a ele por causa de seus hábitos pessoais. Em 1004, ele se tornou Bispo de Albano. Foi eleito Papa após a abdicação de João XVIII em 1009, e adotou o nome de Sérgio IV. O poder de Sérgio IV era pouco influente e muitas vezes ofuscado pelo patrício, João Crescêncio, governante da cidade de Roma na época. Com a ajuda de Crescêncio, Sérgio resistiu às tentativas do Imperador Otão III de estabelecer o controle sobre Roma. Sérgio IV agiu para aliviar a fome na cidade e isentou vários mosteiros do governo episcopal. Uma bula Papal pedindo que os muçulmanos sejam expulsos da Terra Santa depois que a Igreja do Santo Sepulcro foi destruída em 1009 pelo califa fatímida al-Hakim bi-Amr Allah foi atribuída a Sérgio IV. Sérgio morreu em 12 de maio de 1012 e foi sepultado na Basílica de São João de Latrão. Embora não fosse canonizado, Sérgio às vezes é venerado como Santo pelos beneditinos dos quais era membro. Suspeitou-se que ele foi assassinado, pois morreu uma semana depois de Crescêncio, considerado por muitos como seu patrono.

 

144º - Bento VIII - 1012 - 1024

               Papa Bento VIII (Túsculo, 980 – Roma, 9 de abril de 1024) reinou de 18 de maio de 1012 até sua morte. Era descendente de Alberico I, Conde de Túsculo que teve importante participação na eleição do Papa João X. Frente às dificuldades para eleger-se, pediu ajuda a Henrique II, que se fez coroar em Roma. Conseguiu afastar de Roma o inoportuno Crescêncio. Derrotou os muçulmanos que estavam atacando o litoral da Itália. Tornou obrigatório o celibato dos padres. Tentou controlar, através de leis, a simonia e o dolo. Um notável sucesso de Bento foi exatamente ter restabelecido boas relações com a casa real alemã: ele se dava conta do quão importante era a cooperação entre o Papado e a Coroa germânica. Assim, em fevereiro de 1014, Henrique II foi coroado Imperador em São Pedro; antes da coroação, ele jurou ser fiel protetor da Igreja. No Sínodo que se seguiu à coroação, Bento acolheu o pedido de Henrique de que o símbolo de fé fosse cantado durante a missa segundo o uso nórdico. O Papa e o Imperador, depois, em Ravena, dirigiram um sínodo reformador que estabeleceu as idades mínimas para poder receber as ordens sacras, e criou leis contra a simonia. Em seguida, sempre de comum acordo, o Papa e o Imperador promulgaram cânones que proibiam o matrimônio e o concubinato a todos os clérigos, designando aos filhos de tais uniões o papel de servos da gleba.

 

145º - João XIX - 1024 - 1032

               Papa da Igreja Católica Romana nascido em Túscolo, eleito em maio de 1024 como sucessor do seu irmão Benedito VIII, o primeiro Papa a receber donativos para a Igreja pela concessão de indulgências. Filho mais jovem do violento Gregório de Tuscolo, Conti di Tusculum e tirano de Roma, substituto do patrício romano Crescêncio na liderança de Roma e inimigo radicalmente avesso a toda influência estrangeira. Ele logo se tornou todo poderoso com a morte de Oto III, que tinha apenas 22 anos. Com predomínio dos tusculanos na eleição Pontifícia, foi a segunda indicação consecutiva da série de Papas da corte de Túsculo. Embora fosse um leigo e muito jovem, foi eleito sem nunca ter sido ordenado, mas recebeu todas as ordens e foi consagrado para poder ser então indicado para eleição. Recebeu ajuda dos monges de Cluny, para reformar as disciplinas eclesiásticas e monásticas em toda a Europa. Na política coroou em Roma, o Imperador germânico Conrado II e não atendeu às exigências da corte de Bizâncio. Protegeu Guido d’Arezzo, o inventor das sete notas musicais, cujos nomes foram tirados das primeiras sílabas de um canto a São João Batista. Acabou falecendo na cidade das sete colinas, Roma.

               Guido d'Arezzo (992 - 1050) foi um monge italiano e regente do coro da Catedral de Arezzo (Toscana), província de seu nascimento. Foi o criador das notas musicais com os nomes que conhecemos hoje: dó, ré, mi, fá, sol, lá e si (antes, ut, re, mi, fa, sol, la e san), e é por ele que os países de origem ibérica têm uma fala das notas musicais diferente dos povos Anglo-Saxônicos. O sistema de Guido d'Arezzo sofreu algumas pequenas transformações no decorrer do tempo: a nota Ut passou a ser chamada de Do, para facilitar o canto com a terminação da sílaba em vogal, derivando-se provavelmente da proposta lançada por Giovanni Doni, nome de um musicólogo italiano, que escolheu a primeira sílaba do seu sobrenome (afirmando ser, na verdade, a primeira sílaba do nome Dominus) para essa nova denominação. E foi criada, posteriormente, a nota Si (por esse nome ser as iniciais do nome de São João, no hino a São João Batista em latim: Sancte Ioannes), novamente facilitando o canto com a terminação de uma vogal

 

146º - Bento IX - 1032 – 1044

               Nascido em Túsculo, na Itália, entre os anos 1012 e 1020, o que ainda não foi precisamente determinado pelos pesquisadores, Theophylactus III era filho de Albérico III, o Conde de Túsculo, e membro de uma família com importante linhagem religiosa e representatividade para os católicos. Era sobrinho dos Papas Bento VIII e João XIX. O poder político que sua família possuía no mundo cristão e fora dele era grande o suficiente para fazer de Theophylactus um caso singular na história da Igreja Católica. Por influência de Albérico III, Theophylactus tornou-se Papa muitíssimo jovem, quando tinha entre 18 e 20 anos de idade. No entanto, tudo indica que seu Papado precoce não era reflexo de uma vida de devoção ou de destaque religioso. Muito pelo contrário, Theophylactus não tinha qualquer qualificação para o cargo. Sua fama como Papa é tão negativa que até a Enciclopédia Católica, publicada pelo Vaticano, o chama de desgraça na Cadeira de Pedro. Theophylactus sucedeu o Papa João XIX, herdando, na verdade, o posto de Sumo Pontífice de seu tio graças ao poder e à riqueza da família. Adotando o nome Bento IX, o Papa rapidamente construiu uma imagem cruel e imoral. O jovem Papa era responsável por estupros, assassinatos, orgias, bestialidades e outras atitudes incoerentes com sua posição. Ele chegou ao cargo máximo da Igreja Católica em outubro de 1032 e, após ter sua fama disseminada, foi forçado a sair de Roma em 1036. Porém retornou pouco tempo depois com a ajuda do imperador Conrado II. A oposição o forçou a abandonar a cidade novamente em 1044 e ainda escolheu um novo Papa, Silvestre III. Bento IX foi sucedido por Silvestre III ao ser afastado do posto em janeiro de 1045. Mas rapidamente reuniu forças para retornar como Papa em abril daquele ano. Seu segundo papado duraria pouco tempo. Tudo indica que por foi por consequência de álcool que o Papa Bento IX abdicou de seu papado em troca de matrimônio. O que o levou a vender seu papado a seu padrinho, o Sacerdote João Gratian, que seria nomeado Papa Gregório VI, seu segundo sucessor. Mas rapidamente Bento IX se arrependeu e retornou a Roma para ocupar seu lugar. Silvestre III, que ainda se nomeava Papa, e Bento IX foram declarados depostos pelo rei germânico Henrique III. Um novo Papa, Clemente II, foi, então, coroado como sucessor. Só que este faleceu em outubro de 1047, abrindo espaço para que Bento IX se apoderasse do Palácio de Latrão. Assim começava seu terceiro papado. Mais uma vez, ele ficaria pouco tempo à frente da Igreja Católica, porque enfrentava forte oposição. Tropas germânicas o expulsaram em julho de 1048, deixando vaga a cadeira Papal. Para o seu lugar foi eleito o Papa Dâmaso II, que foi oficialmente reconhecido por todos. Bento IX foi nomeado para atender aos interesses das classes campestres de Roma. Todavia, nada sabia sobre as funções e obrigações de um Papa. Além de ser um dos Papas mais jovens da história, seu papado tem outros destaques atípicos. Foi o único homem a ser Papa mais de uma vez: três vezes, o único a vender seu papado e o primeiro a renunciar ao cargo. Bento IX foi excomungado em 1049 e, depois disso, pouco se sabe sobre sua vida. Acredita-se que ele tenha desistido de tentar retomar a cadeira papal e que tenha sido até perdoado pelo Papa Leão IX. Theophylactus viveu, pelo menos, até a década de 1080, quando faleceu provavelmente em 1085 e foi sepultado na abadia de Grottaferrata. É um dos Papas mais detestados pelos católicos.

 

147º - Silvestre III - 1045

               Papa Silvestre III, nascido João dos Crescêncios (em italiano: Giovanni dei Crescenzi; Roma, 1000 — 1062) foi Papa de 20 de janeiro de 1045 a 10 de fevereiro de 1045, após a expulsão do libertino Papa Bento IX em Setembro de 1044. Antes de subir ao Trono de São Pedro, ele era Bispo de Sabina, cargo a que voltou após acusações de suborno na sua eleição e excomunhão pelo rival Bento IX.

 

148º - Bento IX - 1045

               Eleito Papa pela segunda vez.

 

149º - Gregório VI - 1045 - 1046

               Papa Gregório VI, nascido Giovanni Gratian Pierleoni, foi Papa de 1 de maio de 1045 a 20 de dezembro de 1046. Desde o primeiro momento trabalhou na reforma dos costumes e no restabelecimento da ordem. Em 1045 Bento IX ocupou a cadeira de S. Pedro, mas ansioso por abandonar o cargo que lhe tinha sido imposto pela família e poder casar, pediu a opinião do seu padrinho, João Graciano, Arcipreste de S. João "ad portam Latinam", um homem com grande reputação, de como poderia renunciar ao papado. Quando João o convenceu de que poderia abandonar o pontificado, Bento propôs-se entregá-lo ao padrinho em troca de uma grande soma de dinheiro. Desejoso de ver a Santa Sé livre de um Pontífice tão indigno, João Graciano pagou e foi reconhecido como Papa com o nome de Gregório VI, mas isto não trouxe paz à Igreja. Quando Bento IX deixou a cidade, depois de vender o papado, já havia um outro aspirante à cadeira de S. Pedro, João, Bispo de Sabina, que foi elevado ao papado por uma facção da nobreza e tomou o nome de Silvestre III. Para agravar as coisas, Bento IX voltou a Roma e forçou João a voltar para a sua Sé de Sabina, mas este nunca desistiu das suas pretensões e o seu partido continuava a controlar parte de Roma. Aparentemente Bento não tinha conseguido a noiva que pretendia e não perdeu tempo em reconquistar o Trono Pontifício e em controlar parte da cidade. Colocado perante um panorama de cofres vazios e um clero que tinha perdido o sentido de justiça, Gregório viu-se com uma tarefa quase impossível. No entanto, com a ajuda de Hildebrando, que viria a ser o Papa Gregório VII, ele tentou organizar a vida civil e religiosa. Mas as facções antagonistas eram demasiado poderosas e a confusão aumentou. Convencidos que nada se resolveria sem uma intervenção exterior, um grupo de clérigos apelou ao imperador Henrique III que viesse em socorro da situação. Henrique não hesitou e chegou a Itália no Outono de 1046. Seguro da sua inocência, Gregório dirigiu-se ao seu encontro. Foi recebido pelo Imperador com todas as honras e, atendendo ao pedido Imperial, convocou um concílio a realizar-se em Sutri. Dos dois outros Papas apenas Silvestre se apresentou no Sínodo, inaugurado a 20 de dezembro de 1046. Tanto a sua reivindicação ao papado, como a de Bento IX foram rejeitadas. Silvestre foi condenado a passar o resto dos seus dias num mosteiro. Mas o caso de Gregório era diferente. Os Bispos reunidos no Sínodo consideravam que o modo com que ele obtivera o pontificado era, claramente, um caso de simonia e intimaram-no a renunciar. Sem mais possibilidades de escolha, foi isso que Gregório fez. Em seu lugar foi eleito o Bispo de Bainberg com o nome de Clemente II. Gregório, acompanhado por Hildebrando, seguiu com o Imperador para a Alemanha, onde morreu pouco depois, em Maio de 1047. Instituiu o primeiro exército Pontifício para libertar e defender os territórios da Igreja Católica. Obrigado a abdicar, retirou-se como monge em Cluny, tendo a assistência de Hildebrando de Sovana, o futuro Papa Gregório VII.

 

150º - Clemente II - 1046 – 1047

               Nascido na Saxônia, Alemanha, no ano 1000, Suidgero de Morsleben nasceu em um momento de grande temor da sociedade medieval europeia. Acreditava-se amplamente que o fim do mundo ocorreria naquele ano. É um momento dotado de muitas crenças e lendas envolvendo o fim do mundo, que, obviamente, não se consumou. Superadas as incertezas do ano mil, a Igreja aproveitou-se do temor reinante para aumentar seu poderio e influência sócio-cultural. Suidgero cresceu nesse contexto como homem dedicado à fé. Foi gradativamente crescendo na hierarquia católica e desenvolveu importante papel como Bispo de Bamberg, na Alemanha. Havia uma situação atípica envolvendo os líderes da Igreja, forçados a renunciar por grupos opositores acusando-os de simonia e métodos ilegais para chegar ao posto Papal. Os Papas não tinham como se defender, em função da força da oposição, e abdicavam. Para o lugar do Papa anterior foi escolhido Suidgero de Morsleben, com o nome de Papa Clemente II. A simonia não era um problema restrito ao Papa Gregório VI naquela época, pelo contrário, era um problema generalizado e que se tornou público com a abdicação do Papa. Algo deveria ser feito e Clemente II se propôs a fazê-lo no ano seguinte, em 1047, o Papa reuniu um concílio em Sutri para combater o hábito inadequado. No entanto, não se estipulava grandes punições aos pecadores, o que não colocou fim ao problema disseminado no meio cristão. O Papa Clemente II encontrou um ambiente muito tomado por intensas disputas políticas. Seu antecessor fora deposto por pressão da oposição e havia o grave risco de um cisma na época, pois outros religiosos reclamavam o título de Papa. O novo Papa preocupava-se com o poder que os Bispos-Condes haviam adquirido, o que causava muitos conflitos e gerava tensão por novos a todo momento. O próprio Suidgero de Morsleben recebeu muita resistência para nomeação como Sumo Pontífice, que só foi concretizada pela vontade do rei da Alemanha e pela superação do principal opositor, o Bispo Ariberto de Milão. Em meio a tanta hostilidade, Suidgero foi aceito pelo clero e pelo povo, pois reunia os desejos de pacificação das disputas políticas extremadas. Como Papa, Clemente II deixou como legado para o ritual católico a deliberação de que toda eleição Papal deveria ter origem em uma designação imperial. Retribuindo o apoio do rei alemão, coroou Henrique III como patrício dos romanos, dando a ele peso decisivo na eleição Papal. Clemente II fez algumas viagens à Alemanha e, em uma delas, faleceu. O Papa Clemente II permaneceu menos de um ano como líder da Igreja Católica. Faleceu no dia nove de outubro de 1047, aos 47 anos de idade, de morte dita natural. Seu corpo foi sepultado em Bamberg, onde era Bispo.

 

151º - Bento IX - 1047 – 1048

               Consagrado Papa pela terceira vez, assume o Pontificado.

 

152º - Dâmaso II – 1048

               Nascido na Baviera, Alemanha, no ano 1000, Poppo von Brixen foi destacado líder religioso de sua terra natal, onde exercia a função de Bispo. Sabe-se muito pouco sobre sua história de vida e sobre sua formação eclesiástica, mas acredita-se que tenha sido proveniente de família nobre europeia. Na época em que viveu, os Imperadores eram muito influentes na escolha dos Papas. Foi o que aconteceu quando o Papa Bento IX renunciou. Para ocupar o posto religioso vago causado pela renúncia do Papa Bento IX, o Imperador germânico Henrique III rapidamente indicou Poppo von Brixen para ser o sucessor. Tudo leva a crer que o Bispo tinha bom relacionamento e afinidade com a nobreza germânica, já que se tratava de uma escolha muito significativa. Poppo von Brixen se tornou oficialmente Papa no dia 17 de julho de 1048. O Papa anterior havia renunciado ao cargo com o intuito de reparar seus defeitos, passando a realizar penitência voluntária em um mosteiro alemão no qual ficaria até sua morte. O Papa Dâmaso II é mais um personagem de um tempo repleto de curiosidades. Ele foi o segundo pontífice germânico nomeado pelo imperador Henrique III e o terceiro Papa germânico. Seu papado, contudo, foi um dos mais curtos da história, durou apenas 23 dias. Assim como seu antecessor, o Papa Dâmaso também renunciou ao cargo com o intuito de se purificar, no dia nove de agosto de 1048. Ele retirou-se para a Palestina para viver em penitência, mas acabou sendo vitimado pela malária. O Papa sequer teve tempo para qualquer ato marcante para a Igreja Católica ou para deixar qualquer legado. Não se sabe ao certo o motivo da renúncia dos dois Papas, mas sabe-se que a pressão e a interferência do imperador Henrique III era grande. O que se pode constatar pela própria nomeação de Poppo von Brixen e também de seu sucessor. Com a renúncia de Dâmaso II, Henrique III escolheu seu primo, Bruno de Egisheim e Dagsburgo, que era homem de muita confiança também do Imperador, para se tornar o Papa Leão IX. O papado de Dâmaso encerrou um período turbulento para a Igreja Católica que é chamado por muitos de idade das trevas da instituição, em função dos breves papados, das disputas políticas e da grande interferência dos imperadores na escolha dos líderes religiosos. Esta fase seria seguida por uma época de grande dominação social, econômica e cultural da Igreja Católica, detentora do poder e influente no destino da humanidade durante a Idade Média.

 

153º - São Leão IX - 1049 - 1054

               Papa Leão IX, nascido Bruno de Eguisheim-Dagsbourg (Eguisheim, Alsácia, 21 de junho de 1002– 19 de abril de 1054, Roma), foi Papa de 12 de fevereiro de 1049 até a data de sua morte. Foi principalmente um Papa viajante, trabalhando pela paz na Europa. É Santo da Igreja Católica, nasceu em Eguisheim, na Alsácia, com o nome de Bruno de Eguisheim-Dagsbourg. No entanto, certas pessoas afirmam que ele nasceu em Dabo, outras em Walscheid, ambas na Moselle. Depois de estudar em Toul, tornou-se Cônego de Saint-Étienne em 1017 e Bispo desta cidade em 1026. Torna-se Papa em 1049, e neste mesmo ano proíbe o casamento de Guilherme o Bastardo e de Matilde de Flandres. Apesar disso, o casamento acaba por ser realizado. Leão IX foi um reformador, tendo-se inscrito na reforma dita “Gregoriana”. Convoca durante seu Pontificado 12 Concílios. Suas principais lutas foram contra: a taxa eclesiástica (a simonia); o casamento bem como o concubinato dos padres (o nicolaísmo); os Bispos não deveriam ser príncipes do Império, mas simples teólogos; o retorno dos valores do cristianismo primitivo. De junho de 1053 a março de 1054 ele foi mantido prisioneiro em Benevento, numa prisão honorável; ele não sobreviveu muito tempo após seu retorno a Roma, onde morreu em 19 de abril de 1054. O dia de São Leão é festejado em 19 de abril, dia do aniversário da sua morte. Seu corpo repousa na Basílica de São Pedro. Antes de sua morte, Leão IX enviou um legado Papal, o Cardeal Humberto de Silva Cândida, a Constantinopla, para negociar com o Patriarca de Constantinopla Miguel Cerulário (1043-1059), em resposta a suas ações sobre a Igreja no sul da Itália. Humberto rapidamente parou as negociações, e excomungou e depôs o Patriarca em nome do Papa. Este ato, embora juridicamente inválido devido à morte do Papa da época, foi respondido pelo próprio Patriarca Miguel com a excomunhão contra o Humberto e seus associados e é popularmente considerado a separação oficial entre as Igrejas orientais e ocidentais, no que é chamado de Grande Cisma do Oriente.

CISMA DO ORIENTE

               A ruptura entre bizantinos e ocidentais, que tomou sua forma definitiva no século XI, não é senão o último episódio de uma longa história ou da história das diferenças de duas mentalidades: a grega e a latina. Sobre a união na fé e no amor de Cristo, que estreitavam orientais e ocidentais, prevaleceu, infelizmente, a desunião humana natural.

1. Há uma diversidade fundamental, que se manifestava de maneiras diversas:

               a) O gênio. Os gregos eram intelectuais, cultores da filosofia, das letras e das artes. A elaboração das grandes verdades da fé a respeito da SS. Trindade e de Jesus Cristo deu-se no Oriente (até o Concílio de Constantinopla III, 680/1). Por isto tendiam a desprezar os romanos e, mais ainda, os bárbaros invasores, como rudes e incultos. – Os latinos eram mais amigos da prática, da disciplina, do Direito; por isto tinham os gregos na conta de frívolos, inconstantes e tagarelas (cf. At 17,21); dizia-se no Ocidente: “Graeca fides, nulla fides”, isto é, “palavra de grego, palavra nula”. Essa diversa índole suscitou, a partir do século V, um antagonismo crescente entre orientais e ocidentais.

               b) A língua. Os primeiros documentos da Roma cristã eram redigidos em grego. Depois do século IV, porém, esta língua desaparece do Ocidente, dando lugar ao latim (= dialeto do Lácio ou da região de Roma). O latim era desprezado e desconhecido no Oriente, especialmente após o Imperador Justiniano. É de notar, por exemplo, que o arquidiácono latino Gregório (depois Papa), certamente homem de valor intelectual passou cinco anos na corte de Constantinopla como legado papal, sem aprender o grego; julgava que isto não valia a pena (fim do século VI). – Ora a ignorância mútua de línguas muito contribuiu para que as comunicações entre Oriente e Ocidente se tornassem mais raras e sujeitas a mal-entendidos; era preciso recorrer a intérpretes, que nem sempre eram fiéis (tenham-se em vista as atas do Concílio Niceno II referentes às imagens).

               c) Liturgia e disciplina. Havia tradições diferentes no Oriente e no Ocidente, no tocante, por exemplo, ao calendário de Páscoa, aos dias de jejum (os latinos jejuavam no sábado; os gregos, não), à matéria da Eucaristia (pão sem fermento ou ázimo no Ocidente; pão fermentado no Oriente), ao celibato do clero, ao uso da barba (muito caro aos orientais) Essas tradições, por não afetarem as verdades da fé, eram perfeitamente aceitáveis; haveriam, porém de tornar-se motivo de debates em tempos de controvérsia.

2. Ao lado da diversidade fundamental, levemos em consideração a mentalidade que se foi formando em Bizâncio ou o “bizantinismo”.

               Em 330 Constantino transferiu a capital de Roma para Bizâncio, que ele quis chamar “a nova Roma”. Esta fora até então uma localidade insignificante, que muito sofrera por parte dos Imperadores Romanos. Do ponto de vista eclesiástico, Bizâncio também carecia de significado; a sua comunidade cristã não fora fundada por algum dos Apóstolos (como as de Jerusalém, Antioquia, Alexandria, Roma…); o primeiro bispo que se conhece, Metrófanes, é do início do século IV (315-325) e Sufragâneo do metropolita de Heracléia. Compreende-se então que, o prestígio que Bizâncio não possuía por suas tradições, os bizantinos o quisessem obter por suas reivindicações. De modo geral, ia-se tornando difícil aos bizantinos reconhecer a autoridade religiosa de Roma, já que todo o esplendor da corte imperial se havia transferido para Constantinopla. Acresce que os Imperadores bizantinos, herdeiros do conceito pagão de Pontifex Maximus (Pontífice Máximo no plano religioso), se ingeriam demasiadamente em questões eclesiásticas, procurando manter a Igreja oriental sob o seu controle. Os monarcas, nas controvérsias teológicas, muitas vezes favoreciam as doutrinas heréticas, contrapondo-se assim a Roma e ao seu bispo, que difundiam a reta fé. Os Patriarcas de Constantinopla, por sua vez, muito dependentes do Imperador, procuravam a preeminência sobre as demais sedes episcopais do Oriente e queriam rivalizar com o Patriarca de Roma, sucessor de Pedro, aderindo à heresia e provocando cismas: dos 58 bispos de Constantinopla desde Metrófanes até Fócio (858), um dos vanguardeiros da ruptura, 21 foram partidários da heresia; do Concílio de Nicéia I (325) até a ascensão de Fócio (858), a sede de Bizâncio passou mais de 200 anos em ruptura com Roma. Registraram-se mesmo atos de violência cometidos por imperadores contra alguns Papas: Justino I mandou buscar à força o Papa Vigílio em Roma e quis obrigá-lo a subscrever normas religiosas baixadas pelo monarca (cerca de 550); Constante II procedeu de forma análoga contra o Papa Martinho I, que em Roma (649) se opusera à heresia monotelita, favorecida pelo Imperador; Justiniano II mandou prender em Roma o Papa Sérgio I, que não queria reconhecer inovações promulgadas pelo Concílio Trulano II (692); Leão III, iconoclasta, em 731 subtraiu a Roma a jurisdição sobre a Ilíria e sobre parte do “Patrimônio de S. Pedro” (Itália meridional).

               3. O distanciamento entre orientais e ocidentais ainda foi acentuado pela criação do “Sacro Império Romano da Nação dos Francos”, cujo primeiro Imperador Carlos Magno recebeu a coroa, em 800, das mãos do Papa Leão III. – O descaso ou a hostilidade dos bizantinos associados à opressão dos lombardos no Norte da Itália, dera motivo a que os Papas se voltassem aos poucos, com olhar simpático, para o povo recém-convertido dos francos, pedindo-lhes o auxílio necessário para instaurar nova ordem de coisas no Ocidente. A entrega da coroa imperial a Carlos Magno visava a prestigiar os francos nessa sua missão. Como se compreende, em Bizâncio tal ato foi mal acolhido, os orientais julgavam que só podia haver um Império cristão, como só pode haver um Deus; o Imperador reinava em nome de Cristo e era como que o representante visível da unidade da Igreja; daí grande surpresa e escândalo quando souberam que o bispo de Roma sagrara em 800 um “bárbaro” para governar um segundo Império cristão! Apesar de tudo, deve-se dizer que até o século IX o primado de Roma ainda era satisfatoriamente reconhecido pelos orientais. A tensão de ânimos se manifestou em termos novos e funestos sob a chefia dos Patriarcas Fócio (? 897) e Miguel Cerulário (?1059). Em 858 foi ilegitimamente deposto por adversários políticos o Patriarca Inácio de Constantinopla. Em seu lugar, subiu à cátedra episcopal um comandante da guarda imperial, Fócio, que o Imperador favorecia. O novo prelado recebeu em cinco dias todas as ordens sacras e foi empossado, sem que a Sé estivesse vaga (pois Inácio não renunciara). Não conseguindo impor-se ao bispo de Roma, que em 863 o declarou destituído das funções pastorais, Fócio, ainda apoiado pelo Imperador, abriu violenta campanha contra os cristãos ocidentais. A situação se tornou mais tensa pelo fato de que O Papa Nicolau I enviou missionários latinos à Bulgária, cujo rei Bóris, recém-batizado, hesitava entre a obediência a Roma e a obediência a Constantinopla. A entrada dos latinos em território tão próximo das fronteiras gregas irritou os bizantinos; a cólera chegou ao auge quando estes souberam que legados de Roma estavam a caminho de Constantinopla, onde deveriam informar o Imperador de que a Bulgária se tornara decididamente latina. Presos antes de penetrarem em território imperial, os legados do Papa foram expulsos (866); Fócio enviou uma carta aos bispos do Oriente condenando a conduta dos “ocidentais bárbaros”: além da evangelização da Bulgária, censurava-os por praticarem o jejum no sábado, celebrarem a Eucaristia com pão ázimo e, principalmente, por terem acrescentado o Filioque ao Símbolo da Fé. Como sabemos, o credo niceno-constantinopolitano professava: “Creio no Espírito Santo, que procede do Pai… Todavia a partir de fins do século VI, a Igreja na Espanha propagou a fórmula: …que procede do Pai e do Filho (Filioque)”. Na França este acréscimo foi sendo aceito; Carlos Magno patrocinou-o. Os monges francos o cantavam no Monte das Oliveiras em Jerusalém, ainda que por isto fossem duramente atacados pelos gregos e acusados de heresia (808). 0 Papa Leão III (795-816), em atenção aos gregos, desaprovou o uso dos latinos e aconselhou os francos a deixar de o fazer; mas não foi atendido. – Ora Fócio levantou com veemência contra os ocidentais a acusação de terem alterado o Credo. Por conseguinte, um Concílio reunido em Constantinopla em 867 depôs Nicolau I, que morreu naquele mesmo ano, dez dias depois que o Patriarca Fócio fora destituído por uma revolução palaciana. Inácio foi recolocado na sé patriarcal. Em 869/70 celebrou-se o oitavo Concílio Ecumênico em Constantinopla, sob a direção de três legados papais; foi excomungado Fócio e a comunhão com Roma foi restabelecida. Mas de novo em 879 Fócio assumiu a sé de Constantinopla; reuniu um sínodo nesta cidade em 879/80, que rejeitou o de 869/70 e hostilizou os latinos (os gregos consideram este o oitavo Concílio Ecumênico). Fócio morreu num mosteiro em 897 ou 898. Os Patriarcas seguintes restauraram e confirmaram a união com Roma, a qual, porém, estava gravemente abalada após tantas discórdias. O século X foi marcado pela criação do Sacro Império Romano da Nação Germânica com a dinastia dos Otos (962) – o que muito irritou os bizantinos, que viam nesse fato a renovação do gesto de 800 (coroação de Carlos Magno Imperador). As relações com Roma eram frias; bastaria um pequeno incidente para reavivar as acusações feitas no passado. Isto, de fato, aconteceu em 1014: o Papa Bento VIII introduziu o Filioque no canto da Igreja Romana a pedido do Imperador Henrique II. O Patriarca bizantino Sérgio II reagiu propagando os escritos de Fócio sobre o assunto. Em 1043 tornou-se Patriarca de Constantinopla Miguel Cerulário, homem ambicioso, que deu livre curso à paixão antiromana; em 1053 mandou fechar as igrejas dos latinos em Constantinopla e confiscou os mosteiros destes; acusava-os principalmente de usar pão ázimo na Eucaristia; um dos funcionários imperiais parece ter calcado aos pés as hóstias dos “azimitas” como não consagradas. Estes fatos causaram grande agitação no Ocidente; o Cardeal Humberto da Silva Candida, erudito e talentoso, escreveu um “Diálogo”, em que refutava as objeções dos gregos e os acusava de Macedonismo (por não aceitarem o Filioque). Todavia o Imperador bizantino Constantino IX desejava boas relações com o Papa Leão IX para que este o ajudasse a combater os normandos, que devastavam as possessões bizantinas na Itália Meridional; em resposta a uma carta do Imperador, Leão IX enviou uma legação a Constantinopla em 1054, composta pelo Cardeal Humberto da Silva Candida e por dois outros prelados. O Imperador mandou queimar um libelo acusatório anti-romano para favorecer o diálogo. Mas Miguel Cerulário se mostrou intransigente; chegou a proibir os Ocidentais de celebrar Missa em Constantinopla. A vista disto, os legados romanos reagiram com o recurso extremo: aos 16/07/1054, em presença do clero e do povo depositaram sobre o altar-mor da basílica de Santa Sofia em Constantinopla uma Bula de excomunhão contra Cerulário e seus seguidores; despediram-se do Imperador e tomaram o caminho de volta para Roma. – Os legados papais julgavam que, diante deste gesto, o Patriarca retrocederia. Em vão, porém. Miguel Cerulário excitou tumulto em Constantinopla contra o Imperador acusado de cumplicidade com os romanos; Constantino IX reagiu violentamente. Num Sínodo o Patriarca pronunciou o anátema sobre o Papa e seus legados e promulgou um manifesto que convidava os demais bispos do Oriente a se associarem. Na verdade, o proceder de Cerulário foi em breve imitado pelos outros bispos orientais e pelos povos evangelizados por Bizâncio (servos, búlgaros, romenos, russos), acarretando a grande divisão que até hoje perdura apesar das tentativas de reatamento que se deram nos séculos XIII e XV. Quanto a Cerulário, levou sua paixão ao ponto de reivindicar para si as, insígnias imperiais; por isto em 1057 foi exilado pelo Imperador Isaac I e morreu no desterro em 1059. Em nossos dias verifica-se que a cisão não se fundamenta apenas em motivos teológicos, mas também em razões de rivalidade cultural e política acobertadas por pretextos religiosos. A profissão do Filioque decorre de um estudo mais preciso do dogma trinitário, plenamente consentâneo com as verdades da fé; não é necessário que os orientais o introduzam no seu canto litúrgico. A excomunhão mútua de Roma a Constantinopla foi cancelada após o Concílio do Vaticano II e o caminho está aberto para bom entendimento entre orientais a latinos. Aqueles têm o título de ortodoxos, porque ficaram fiéis à reta doutrina durante as controvérsias cristológicas dos séculos V-VII. A Santa Igreja, representada pelo sucessor de Pedro em Roma e pelos fiéis que estão em comunhão com ele, continua a ser, mesmo após a separação de Bizâncio, a depositaria junto à qual os homens encontram incontaminados os meios necessários à sua santificação.

 

154º - Vitor II - 1055 – 1057

               Vítor II (Gebhard de Hischberg) foi Papa entre 13 de Abril de 1055 e 28 de Julho de 1057. Era Bispo de Eichstädt. Após a morte de Leão IX, o Cardeal-Subdiácono Hildebrando (futuro Papa Gregório VII), encabeçou uma delegação junto do Imperador Henrique III, para que este nomeasse rapidamente um sucessor. Gebhard era o candidato do Imperador, mas rejeitou um primeiro convite e só aceitou o Pontificado quando o Imperador lhe garantiu a restituição de todos os bens que haviam sido tomados da Santa Sé. Foi consagrado a 13 de abril de 1055 com o nome de Vitor II. Foi um digno sucessor do Papa Leão IX na luta conta a simonia e o concubinato clerical. Mas como tinha o apoio firme do imperador, conseguiu sucesso onde Leão tinha falhado. A 3 de junho de 1055, realizou-se em Florença, com a presença do Imperador e de 120 Bispos, um sínodo onde os decretos contra a simonia e a incontinência foram confirmados e vários Bispos suspeitos foram depostos. Antes do Imperador regressar à Alemanha, transferiu para o Papa os ducados de Espoleto e Camerino. No início de 1056 Vitor II enviou Hildebrando de volta a França para retomar o seu trabalho contra a simonia e o concubinato, que tinha iniciado com Leão IX. Acompanhou Henrique III a Botfeld, onde o imperador faleceu a 5 de outubro de 1056. Antes de morrer o Imperador tinha-se confiado o seu sucessor, de seis anos, Henrique IV, e entregue ao Papa a regência do reino. A 28 de outubro, depois do funeral do Imperador, Vitor II garantiu a sucessão imperial a Henrique IV, entronizando-o solenemente em Aachen. Deixando a regência da Alemanha nas mãos de Agnes, mãe de Henrique IV, Vitor voltou a Roma em fevereiro de 1057. Acaba por morrer em Arezzo a 28 de Julho. Os seus restos mortais seguiram para a Catedral de Eichstätt, mas pelo caminho foram roubados por cidadãos de Ravena e enterrados na igreja de Santa Rotonda, onde se encontra sepultado Teodorico, o Grande. No ano em que morreu convocou o sínodo de Latrão, que foi depois transferido para a Toscânia. Morreu em Arezzo, vítima de malária. Foi o último Papa alemão até a eleição de Bento XVI em 2005.

 

155º - Estevão IX; X - 1057 - 1058

               Papa Estêvão IX (Frederico de Lorena) foi um monge beneditino, eleito Pontífice no dia 2 de Agosto de 1057 e faleceu no dia 29 de Março de 1058. O futuro Papa Estêvão IX era filho do duque Godofredo III da Baixa Lorena. Tornou-se bibliotecário da Santa Sé ao ser nomeado pelo seu primo, o Papa Leão IX, cerca de 1051. Acompanhou Leão IX nas suas viagens apostólicas pela Europa e fez parte da embaixada enviada em 1054 a Constantinopla, que deflagrou a separação das Igrejas oriental e ocidental. No seu regresso, foi obrigado a tornar-se monge em Monte Cassino para escapar do Imperador Henrique III (o seu irmão rebelara-se contra o Imperador). O Papa Vitor II fez dele abade e Cardeal-presbítero. Como Papa continuou a reforma iniciada por Leão IX. Promoveu a Cardeais dois ativos membros dessa reforma, Pedro Damião e o monge Humberto, que participara com ele na viagem a Constantinopla. Quanto a Hildebrando (futuro Papa Gregório VII), enviou-o primeiro a Milão, para moralizar o clero local e depois à Alemanha, para induzir a regente: Imperatriz-mãe Agnes, a aceitar a sua eleição, da qual não tinha participado. Tinha combinado com Hildebrando a ida deste a França, começado negociações com a Igreja grega e tentava deter a invasão dos normandos, quando adoeceu gravemente. Antes de morrer, pediu aos Cardeais que não elegessem o seu sucessor antes do retorno de Hildebrando. Foi sepultado na igreja de Santa Reparata em Florença.

 

156º - Nicolau II - 1059 - 1061

               Papa Nicolau II nascido Geraldo de Borgonha (França, 1010 — Roma, 27 de Julho de 1061) foi Papa de 24 de janeiro de 1059 até à data da sua morte. Proibiu a concessão de cargos eclesiásticos através de simonia. Em 1046 era Bispo de Florença. Logo que a notícia da morte do Papa Estêvão IX, em Florença, chegou a Roma (4 de abril de 1058), imediatamente o partido Tusculano nomeou um sucessor na pessoa de João Minicius, Bispo de Velletri, com o nome de antipapa Bento X. A sua eleição, além de contrária aos desejos de Estêvão IX, que pretendia que a escolha do seu sucessor devia esperar pelo retorno de Hildebrando (futuro Papa Gregório VII), estava marcada pela violência e pela corrupção. Vários Cardeais protestaram e foram obrigados a fugir de Roma. Hildebrando, que voltava da sua missão, ao saber destes acontecimentos, interrompeu a sua viagem em Florência e, depois de acordar com o Duque Godofredo de Lorena-Toscânia a elevação do Bispo Gerard (Nicolau II) ao papado, conseguiu apoio em parte da população romana para o seu candidato. Uma embaixada enviada à corte da imperatriz Inês da Aquitânia, conseguiu também o apoio desta. A convite de Hildebrando, os Cardeais reuniram-se em Siena em dezembro de 1058 e elegeram Gerard como Papa Nicolau II. A caminho de Roma, o Papa realizou um sínodo em Sutri, onde pronunciou a deposição de Bento X. Este acabou expulso de Roma, em janeiro de 1059 e a consagração de Nicolau II teve lugar a 24 de janeiro desse mesmo ano. Era um homem culto, duro e com conselheiros capazes, mas tinha sobre ele a ameaça de Bento X e dos seus apoiantes. Nicolau deu poderes a Hildebrando para estabelecer negociações com os normandos, que ocupavam o sul de Itália. O enviado Papal reconheceu Ricardo de Aversa como Príncipe de Cápua e, em troca, recebeu tropas normandas que permitiram ao papado fazer frente às hostilidades de Bento na Campânia. Esta investida não foi decisiva para derrotar a oposição, mas permitiu a Nicolau realizar, no início de 1059, uma visita pastoral a Espoleto, Farfa e Osimo. Durante esta viagem ele elevou o abade Demétrio de Monte Cassino à categoria de Cardeal e designou-o ao legado Papal na Campânia, Benevento, Apúlia e Calábria. Logo no início do seu pontificado Nicolau II tinha enviado Pedro Damião e o Bispo Anselmo de Lucca como seus legados a Milão, onde o clero, deu origem a uma reforma conhecida como Pataria. Um sínodo presidido por estes mensageiros do Papa, apesar de uma revolta que colocou as suas vidas em perigo, conseguiu do Arcebispo Guido e do clero de Milão um solene repúdio da simonia e concubinato. Uma das necessidades mais prementes na época era a reforma das eleições Papais. Tinham que ser libertadas da influência nefasta das facções romanas e do controle secular do Imperador. Para esse fim, Nicolau II realizou, na Páscoa de 1059, um sínodo em Latrão, com a participação de cento e treze Bispos. Resumidamente: com a morte de um Papa, os Cardeais-Bispos devem escolher entre si um candidato e, depois de terem concordado com um nome, eles e os outros Cardeais devem proceder à eleição. O restante do clero e leigos têm o direito de aclamar a sua escolha. (Bula pontifícia In nomine Domini). Nos finais de Junho de 1059, Nicolau partiu para Monte Cassino e dai para Melfi, capital da Apúlia normanda, onde realizou um sínodo e concluiu a aliança com o Duque Roberto de Altavila, que foi investido com a soberania de Apúlia, Calábria e Sicília, caso a reconquistasse dos sarracenos; ele comprometeu-se, em contrapartida, em pagar um tributo anual, ser vassalo do Papa e proteger a Santa Sé. Um acordo semelhante foi feito com o Príncipe Ricardo de Cápua. Nicolau regressou a Roma com um exército normando, reconquistou algumas terras e forçou Bento X a capitular em Galeria, no Outono de 1059. Faleceu a 27 de Julho de 1061 e foi sepultado na igreja de Santa Reparata, em Florença.

 

156 . 1 - Aparição de Nossa Senhora de Walsingham à Richeldis de Faverches - Inglaterra

               O Santuário Nacional de Nossa Senhora, para os ingleses, é o Santuário de Walsingham, o ponto central da veneração de Maria Santíssima na ilha; a sua história está intimamente ligada à história da Igreja Católica na Inglaterra. O que deu origem ao título e à veneração de Nossa Senhora de Walsingham, numa visão que teve Richeldis de Faverches. A esta senhora apareceu a Mãe de Deus conduzindo-a em espírito à sua casinha de Nazaré, perto da qual lhe recomendou que tomasse medidas exatas de sua casa, para que pudesse ser edificada em Walsingham uma casa semelhante; mas só depois que a aparição se repetiu três vezes, começou Richeldis alegremente a dar cumprimento ao desejo de Nossa Senhora. O filho de Richeldis, Geoffrey de Faverches, deixou como seu substituto, antes de sua peregrinação à Terra Santa, o Capelão Edvoy, dando-lhe a incumbência de erigir um convento em suas terras, e confiar a "Santa Casa" à proteção de uma Ordem religiosa. A essa Ordem seria também conferido o padroado da igreja de Todos os Santos. Estas incumbências foram ratificadas por Richard de Clare, duque de Gloucester, sucessor de Geoffrey. Quando Richeldis tratou de começar a construção da "Santa Casa", viu certa manhã, com espanto, olhando para um prado, dois pedaços planos do terreno misteriosamente não atingidos pelo orvalho, e esses dois planos correspondiam exatamente às dimensões dos alicerces da casa de Nazaré, que Richeldis havia medido na sua visão; porém, quando ela fazia começar a  construção num daqueles lugares assinalados, o qual ficava na proximidade de duas fontes, sobrevieram singulares acontecimentos, que estorvavam ou retardavam os trabalhos iniciados. Tudo falhava, e ninguém acreditava que a capela fosse algum dia acabada. Mas Richeldis voltou-se aflita para a Mãe de Deus, pedindo-lhe auxílio e proteção para a sua obra, e eis que, na madrugada de uma noite de oração fervorosa e confiante, seu pedido é satisfeito de modo maravilhoso: Richeldis encontra o Santuário (a "Santa Casa") muito bem construído a 200 pés de distância do lugar que tinham começado a construí-lo. A este grande milagre uniram-se muitas curas maravilhosas e o livramento dos mais variados perigos e necessidades. A fama de Walsingham como lugar de graças extraordinárias espalhou-se rapidamente, e começaram a afluir peregrinos de toda a parte. Ao longo das estradas por onde passavam as peregrinações foram erigidas de espaço a espaço capelas e outros lugares de oração. Duas capelas ainda existem: uma fica em King´s Lynn e é denominada Capela de Nossa Senhora da Colina Vermelha; a outra, situada em Houghton-in-the-Dale, é dedicada a Santa Catarina de Alexandria e conhecida por "Capelinha dos chinelos", porque aí tiravam os peregrinos os sapatos, continuando o trajeto descalços. Já muito antes da extinção deste lugar de culto católico por ordem do Cromwell, no ano de 1538, já muito antes tinha começado o calvário de Walsingham, depois de ter o culto católico florescido durante três séculos naquele lugar bendito.  Mais ou menos trezentos anos depois da destruição da imagem milagrosa de Walsingham, começou o movimento de Oxford, que visava o florescimento da fé católica na Ilha, e, com esse movimento, foi pouco a pouco renascendo a veneração da SS. Virgem Maria; com este fim uniram-se os veneradores de Nossa Senhora em 1848; em 1880 nasceu a Confraria das Filhas de Maria, em 1904 a Liga de Nossa Senhora, e nos anos seguintes muitas outras organizações semelhantes. Em 1921 resolveram mandar fazer uma cópia da antiga imagem, e, como a antiga capela estava ainda como a tinham deixado depois da pilhagem, colocaram a imagem na igreja paroquial. E assim começou a aumentar a devoção a Nossa Senhora, começando também dentro em pouco as romarias a serem organizadas regularmente. Poucos anos depois foi necessário aumentar a igreja, e por isso resolveram reconstruir a "Santa Casa" segundo o modelo e o tamanho da primitiva, encerrando-a, porém, numa construção maior. A obra teve início em 1931, e em 1937 foi consagrada à igreja, que foi anexada ao antigo edifício.

 

157º - Alexandre II - 1061 - 1073

               Nascido em Milão, na Itália, em 1015, Anselmo de Baggio dedicou-se sempre à vida religiosa demonstrando habilidade para administrar as questões da Igreja. Sua competência foi reconhecida após o falecimento do Papa Nicolau II, na ocasião em que foi preciso escolher seu sucessor. Anselmo foi eleito no dia primeiro de outubro de 1061 e assumiu o nome de Alexandre II. O Papa Alexandre II era mais habilidoso que seu antecessor para lidar com as questões políticas de seu tempo. Ele apoiou a libertação das terras cristãs do domínio muçulmano. Já era um estímulo que os nobres recebiam para, no final do mesmo século, se unirem na Primeira Cruzada. Naquela ocasião, os islâmicos já haviam se expandido e ocupado territórios sagrados para os cristãos. O Papa teve influência também na Batalha de Hastings, um conflito entre tropas inglesas e normandas. Alexandre II declarou seu apoio ao duque Guilherme da Normandia contra Haroldo II da Inglaterra. No entanto, o inglês foi o vencedor do conflito. Alexandre II enfrentou um grave problema de poder quando os alemães elegeram o Bispo de Parma, Cadalo, como antipapa Honório II. O desentendimento aconteceu ainda no início do papado de Alexandre II, que não havia sido reconhecido pelos alemães. Criou-se uma tensão na qual Papa e antipapa se excomungaram e se enfrentaram em conflitos. As tropas de Honório II venceram as de Alexandre II, levando à instalação do antipapa em Roma. O Duque de Lorena interveio na situação e fez com que os dois Papas se retirassem para suas dioceses até ser dado o veredito final. Então, em 1064, o Concílio de Mântua reconheceu Alexandre II como legítimo e único Papa, o que permitiu sua estabilização no poder. Alexandre II foi um Papa reformador e apoiou o movimento contra a decadência e a corrupção eclesiástica chamado de pataria. Lutando contra a simonia, Alexandre II atacou os Bispos germânicos obrigando o Bispo de Constança a renunciar. O Papa foi obrigado a excomungar cinco de seus conselheiros também por simonia. Em geral, seu papado de 12 anos foi eficiente e mais dedicado a questões políticas do que religiosas. Faleceu no dia 12 de abril de 1073, aos 58 anos de idade.

 

158º - São Gregório VII - 1073 - 1085 

               O Papa São Gregório VII, nascido Hildebrando, (Sovana, Itália, c. 1020/1025 – Salerno, 25 de maio de 1085) foi Papa da Igreja Católica de 22 de abril de 1073 até a sua morte, tendo sido um dos mais influentes e decisivos Pontífices a se sentar no trono Papal ao longo da história. Nascido na Toscana italiana no seio de uma família de baixa condição social. Segundo o Liber Pontificalis, Gregório figurava entre os “nascidos toscanos, junto à cidadela de Rovacum, de um pai chamado Bonizo”, informação corroborada pelo biógrafo Papal. Gregório cresceu no ambiente da Igreja romana ao ser confiado a seu tio, abade do mosteiro de Santa Maria em Aventino, onde fez os votos monásticos beneditino. Em 1045 Hildebrando foi nomeado secretário do Papa Gregório VI, cargo que ocuparia até 1046 quando acompanhou esse Papa no seu desterro em Colónia depois de ser deposto num concílio, celebrado em Sutri, e acusado de simonia na sua eleição. Em 1046 morre Gregório VI, e Hildebrando ingressou como monge no mosteiro de Cluny onde adquiriu as ideias reformistas que regeram o resto da sua vida e que o fariam encabeçar a chamada Reforma Gregoriana. Até 1049 não regressou a Roma, mas é então chamado pelo Papa Leão IX para atuar como legado pontifício, o que lhe permitiu conhecer os centros de poder da Europa. Atuando como legado estava em 1056 na corte alemã, para informar da eleição como Papa de Vítor II quando este faleceu e se escolheu como seu sucessor o antipapa Bento X. Hildebrando opôs-se a esta eleição e conseguiu que se elegesse Papa Nicolau II. Em 1059 é nomeado por Nicolau II, Arquidiácono e administrador efetivo dos bens da Igreja, cargo que o levou a alcançar tal poder que se chegou a dizer que dava de comer a Nicolau "como a um asno no estábulo".

               A sua eleição é considerada fora do padrão habitual. Não era Sacerdote quando foi eleito Papa, por aclamação popular, em 22 de Abril de 1073. Sendo uma transgressão da legalidade estabelecida em 1059 pelo concílio de Melfi que decretou que na eleição Papal só podia intervir o Colégio Cardinalício, nunca o povo romano. Não obstante, obteve a consagração episcopal em 30 de junho de 1073. Muito combativo em favor dos direitos da Igreja, enfrentou o imperador Henrique IV do Sacro Império Romano, em defesa da superioridade do Poder Espiritual sobre o Poder Temporal. Ao longo do século XX, os historiadores vincularam seu nome a um vasto programa de reforma da cristandade, movimento que ficaria conhecido como reforma gregoriana. Foi monge na Abadia de Cluny, considerada a alma da Idade Média. A pedido da Condessa Matilde, perdoou Henrique IV que, entretanto, voltou a rebelar-se contra a Santa Sé. Devido ao seu carácter combativo granjeou inimigos que o exilaram. Ao morrer, fora de Roma, disse a frase que se tornaria famosa: "Amei a justiça e odiei a iniquidade, por isso morro no exílio".

               Política interna e reformas: Teve sua vida e obra conduzidas pela convicção da Igreja como obra divina e encarregada de abraçar toda a humanidade, para a qual a vontade de Deus é a lei única, e que, na faculdade de instituição divina, a Igreja coloca-se sobre todas as estruturas humanas, em particular sobre o estado secular. A superioridade da Igreja era para Gregório VII um fato indiscutível. Em 1075, Gregório VII publica o Dictatus Papae, que são 27 proposições onde expressa as suas ideias sobre o papel do Pontífice na sua relação com os poderes temporais, especialmente com os imperadores do Sacro Império. Estas ideias poderão resumir-se em três pontos principais: O Papa é senhor absoluto da Igreja, estando acima dos fiéis, dos clérigos e dos Bispos, e acima das Igrejas locais, regionais e nacionais, e acima dos concílios; O Papa é senhor único e supremo do mundo, todos lhe devem submissão em questões religiosas, incluindo os Príncipes, Reis e Imperadores. Gregório centralizava em Roma todas as querelas importantes para intermediação, coincidindo naturalmente numa diminuição do poder dos Bispos locais, o que motivou algumas lutas contra as esferas mais altas do clero. Recentemente, esta caracterização do governo gregoriano com marco da centralização política e administrativa da Igreja medieval foi colocada em xeque. Esta batalha pelos fundamentos da supremacia Papal tem o seu apogeu na obrigatoriedade do celibato do clero e no ataque à simonia. Gregório VII não introduziu o celibato mas conduziu a batalha por tal com maior energia do que os seus antecessores. Em 1074 publicou uma encíclica dispensando da obediência aos Bispos que permitiam o casamento dos Sacerdotes. No ano seguinte, sob fortes protestos e resistência, encoraja medidas contra estes, privando-os dos rendimentos. O seu pontificado decorreu até 25 de maio de 1085, dia em que morreu em Salerno, abandonado pelos romanos e pela maior parte dos seus apoiantes.

 

159º - Vitor III - 1086 - 1087 

               Papa Igreja cristã Romana, nascido em Monte Cassino, Benevento, eleito em 24 de maio de 1086 como sucessor e por desejo de São Gregório VII. Descendente de uma família de Duques lombarda, Lombardos de Benevento, desde cedo mostrou-se inclinado a seguir a careira eclesiástica, apesar dos protestos dos parentes. Após a morte do pai em uma batalha contra os normandos em 1047, ele teve de fugir de um casamento arranjado e, na eventualidade de uma segunda tentativa de forçá-lo a se casar, conseguiu permissão para entrar para o monastério de Santa Sofia, em Benevento, onde recebeu o nome de Desiderius, tornando-se monge beneditino. Depois serviu no monastério da ilha de Tremite, no Adriático e fez retiros espirituais em Majella, Abruzzi (1053). Foi nomeado por Leão IX para trabalhar em Benevento e negociar a paz com os Normandos, após a batalha fatal de Civitate. Depois serviu a Vítor II, em Florença e mudou-se para o monastério de Monte Cassino (1055) e foi nomeado Cardeal (1059). Ao assumir o Trono de São Pedro, diante dos problemas com Henrique IV e seu antipapa Clemente III, e notando que não possuía condições físicas e pessoais para exercer o cargo, retirou-se para o mosteiro de Monte Cassino, quatro dias após a eleição. Proclamado pela segunda vez, foi conduzido a Roma à força e, consagrado, excomungou o antipapa Clemente III. Exerceu o mandato de Papa de aproximadamente 1 ano e 4 meses e morreu em 16 de setembro de 1087, em Monte Cassino.

 

160º - Urbano II – 1088 - 1099  

               Papa da Igreja cristã Romana nascido em Ckâtillon-Sur-Mane, na província de Champagne, França, escolhido como sucessor de Victor III, cuja atividade eclesiástica foi caracterizada pela promoção de importantes reformas na Igreja Católica Romana, pelo planejamento e criação da Primeira Cruzada durante o sínodo de Clermont-Ferrand em 1095. De uma família nobre estudou em Reims, onde se tornou clérigo e posteriormente entrou para a Ordem Beneditina e tornou-se prior no grande mosteiro de Cluny. Requisitado à Roma pelo Papa Gregório VII, foi nomeado Cardeal Bispo de Óstia e foi delegado para a Alemanha (1084), período em que envolveu-se na intensa disputa político-religiosa entre o Papa e o Imperador Henrique IV, que chegou a eleger um antipapa, Clemente III de Ravenna. Com a morte de São Gregório VII, e do seu substituto Vítor III, foi escolhido em Terracina, Sumo Pontífice em 1088 com o nome de Urbano II. Manteve o isolamento do antipapa e seus seguidores e também do imperador Henrique IV e apoiou Conrado, o filho rebelde do Imperador, que juntamente com Matilde da Toscana e Guelfo V da casa da Baviera. Com suas tropas derrotou o antipapa e fez sua entrada triunfal na Basílica de São Pedro, o que lhe deu muito prestígio junto aos Príncipes e reis ibéricos e reconciliou-se com o rei da França, Felipe I (1095). Convocou os Bispos para um concílio (1095), invalidou as ordenações realizadas por eclesiásticos simoníacos e iniciou um trabalho para reunir as duas Igrejas, a ortodoxa e a católica, estabelecendo contatos com o Patriarcado e a corte do Imperador bizantino, Alexus I. Convocou um sínodo em Clermont (1095) e com o apoio dos nobres definiu a criação de um exército, composto de cavaleiros e homens a pé que deveria dirigir-se à Jerusalém, para salvá-la e auxiliar as igrejas da Ásia contra os muçulmanos, a Primeira Cruzada. Promulgando que as pessoas que participassem desta cruzada receberiam a indulgência plenária, tendo todos os seus pecados e suas consequências excluídas, designou Ademar, Bispo de Le Puy (1096), para organizar uma cruzada para libertação da cidade onde Cristo havia pregado e sofrido seu martírio. Os exércitos da nobreza e o povo comum procedente da França, do sul da Itália e das regiões da Lorena, Borgonha e Flandres participaram dessa Cruzada. Os cruzados se agrupariam em Constantinopla e, partindo de lá, realizariam uma campanha contra os muçulmanos da Síria e Palestina, sendo Jerusalém seu objetivo principal. Os cristãos tomaram Jerusalém em 1099 e elegeram um de seus chefes, Godofredo de Bouillon, duque da Baixa Lorena, como governante da cidade. No entanto o Papa faleceu em Roma, poucos dias após a tomada de Jerusalém em 26 de julho de 1099, sem receber a notícia da vitória dos cruzados. A maioria dos cruzados regressou à Europa, permanecendo uma pequena tropa de reserva da força original para organizar e estabelecer o governo e o controle latino sobre os territórios conquistados. Dos quatro estados que surgiram, o maior e mais poderoso foi o reino latino de Jerusalém. As conquistas da primeira Cruzada se deveram em grande parte ao isolamento e à fraqueza relativa dos muçulmanos. Contudo, a geração posterior a essa Cruzada contemplou o início da reunificação muçulmana no Oriente sob a liderança de Imad al-Din Zangi. Sob seu comando, as tropas muçulmanas empreenderam uma reação militar e obtiveram sua primeira grande vitória contra os latinos quando tomaram a cidade de Edessa (1144). Depois disso, os muçulmanos foram avançando e dominando sistematicamente os estados cruzados na região. A resposta da Igreja de Roma aos avanços muçulmanos foi proclamar a segunda Cruzada (1145) quando era Papa o Beato Eugênio III. Morreu em Roma, e foi sucedido por Pascoal II. Foi sepultado na cripta da Basílica de São Pedro, perto da tumba de Adriano, e é venerado pela Igreja Católica, como beato.

 

160 . 1 - Santo Anselmo de Cantuária

               Anselmo de Cantuária, conhecido também como Anselmo de Aosta por conta de sua cidade natal e Anselmo de Bec por causa da localização de seu mosteiro, foi um monge beneditino, filósofo e prelado da Igreja que foi Arcebispo de Cantuária entre 1093 e 1109. Chamado de fundador do escolasticismo, Anselmo exerceu enorme influência sobre a teologia ocidental e é famoso principalmente por ter criado o argumento ontológico para a existência de Deus e a visão da satisfação sobre a teoria da expiação. Entrou para a Ordem de São Bento na Abadia de Bec aos vinte e sete anos e tornou-se abade em 1079. Tornou-se Arcebispo de Cantuária durante o reinado de Guilherme II da Inglaterra. Foi exilado por duas vezes, entre 1097 e 1100 e novamente entre 1105 e 1107 por Henrique I por causa da controvérsia das investiduras, o mais importante conflito entre a Igreja Católica e os estados medievais durante a Idade Média. Anselmo foi proclamado Doutor da Igreja numa bula Papal de Clemente XI em 1720. Ele é venerado como Santo e comemorado em 21 de abril. Anselmo nasceu em Aosta, parte do Reino de Arles, por volta de 1033. Sua família tinha fortes relações com a poderosa Casa de Saboia e era muito rica. Seu pai, Gundulfo, era lombardo de nascimento. Sua mãe, Ermemberga, que foi descrita como prudente e virtuosa, veio duma antiga família burgúndia. Aos quinze anos, Anselmo desejava entrar para um mosteiro, mas não conseguiu o consentimento do pai e acabou sendo recusado pelo abade. O desapontamento aparentemente provocou-lhe uma doença psicossomática. Depois de se recuperar, Anselmo desistiu de estudar e passou a viver despreocupadamente; neste período, sua mãe morreu. Aos vinte e três, Anselmo saiu de casa, cruzou os Alpes e viajou por toda a Borgonha e a França. Atraído pela fama de seu conterrâneo Lanfranco (que era o Prior da beneditina Abadia de Bec), chegou à Normandia em 1059. No ano seguinte, depois de algum tempo em Avranches, Anselmo finalmente entrou para a abadia como noviço aos vinte e sete. Ao fazê-lo, submeteu-se à "Regra de São Bento", um evento que reformularia todo o seu pensamento na década seguinte. Em 1063, Lanfranco foi nomeado abade de Caen e Anselmo foi eleito Prior em Bec, um cargo que manteve por quinze anos antes de tornar-se abade depois da morte de Herluin, o fundador da abadia, em 1078. Foi consagrado abade em 22 de fevereiro de 1079 pelo Bispo de Évreux, o que foi acelerado por que, na época, a Arquidiocese de Ruão (a quem se subordinava Bec) estava vaga. Se Anselmo tivesse que ser consagrado pelo Arcebispo de Ruão, teria sido pressionado a jurar obediência, o que comprometeria a independência de Bec. Sob o comando de Anselmo, Bec tornou-se o principal centro de ensino na Europa, atraindo estudantes de toda a França, Itália e outras regiões. Foi durante esta época que escreveu suas primeiras obras filosóficas, o "Monológio" (1076) e o "Proslógio" (1077–8). A elas se seguiram "Os Diálogos sobre a Verdade", "Livre Arbítrio" e "A Queda do Diabo". Neste período, Anselmo também lutou para manter a independência da abadia tanto dos poderes seculares quanto do Arcebispo. Posteriormente, Anselmo teve que lutar ainda contra Roberto de Beaumont, Conde (earl) de Leicester. Anselmo ocasionalmente visitava a Inglaterra para supervisionar as propriedades da abadia lá e também para visitar Lanfranco que, a partir de 1070, havia sido nomeado Arcebispo de Cantuária, de quem era considerado o sucessor natural. Com a morte dele em 1089, porém, Guilherme II da Inglaterra tomou as propriedades e as rendas da sé e não nomeou um novo Arcebispo. Em 1092, a convite de Hugo de Avranches, 1º Conde (earl) de Chester, Anselmo cruzou o Canal da Mancha. Na Inglaterra, permaneceu envolvido em assuntos da abadia por quase quatro meses e então foi proibido de voltar a Bec pelo rei. Guilherme ficou seriamente doente de forma súbita em Alveston no ano seguinte e, movido por um desejo de compensar por seus atos pecaminosos que acreditava serem a causa de sua doença, permitiu que Anselmo fosse nomeado para a sé de Cantuária em 6 de março de 1093. Nos meses seguintes, Anselmo tentou recusar o posto alegando estar velho e doente. Em 24 de agosto, apresentou a Guilherme as condições nas quais estaria pronto a aceitar o posto. Elas eram parte de uma agenda de reformas gregorianas: Guilherme deveria devolver as terras da sé que havia tomado; deveria aceitar a preeminência dos conselhos espirituais de Anselmo e deveria reconhecer Urbano II como Papa (e não Clemente III, o antipapa). As recusas de Anselmo ajudaram a melhorar sua posição na barganha enquanto os termos eram discutidos com o rei, que estava profundamente relutante em aceitar as condições impostas por ele. Guilherme cederia apenas à primeira. Alguns dias depois, Guilherme tentou voltar atrás até mesmo nisso e suspendeu a investidura de Anselmo, mas, pressionado pela população, foi obrigado a seguir adiante com a nomeação. No fim, Anselmo e Guilherme concordaram que a devolução das terras de Cantuária seria a única condição aceita. Finalmente os Bispos ingleses colocaram-lhe nas mãos o báculo e o levaram para igreja para ser investido. Anselmo em seguida prestou homenagem a Guilherme e, em 25 de setembro de 1093, recebeu de volta as terras de sua nova sé. Ele foi entronado no mesmo dia depois de receber a dispensa de suas obrigações na Normandia. Por fim, foi consagrado Arcebispo de Cantuária em 4 de dezembro. Tem se discutido sobre se a relutância de Anselmo em assumir a sé teria sido ou não sincera. Estudiosos como Southern defendem que sua preferência teria sido permanecer em Bec. Porém, a relutância em aceitar postos importantes era um costume medieval. Vaughn afirma que Anselmo não poderia ter expressado um desejo pela posição sem correr o risco de ser visto como um carreirista ambicioso. Ela afirma ainda que Anselmo percebeu a situação política e os objetivos de Guilherme e agiu no exato momento que lhe daria a melhor condição de negociar pelos interesses de sua futura sé e do movimento reformista. Por outro lado, a vida de eremita era uma das opções que Anselmo considerou antes de aceitar o conselho do Arcebispo de Ruão e entrar para o mosteiro. William Kent acreditava que não havia razão para suspeitar da sinceridade de sua resistência. Naturalmente atraído pela vida contemplativa, Anselmo não tinha atração alguma por este tipo de cargo mesmo em períodos de paz e, assim, teria ainda menos em tempos conturbados. Anselmo sabia bem o que o esperava na função. Anselmo continuou a combater por suas reformas e pelos interesses de Cantuária. Sua visão sobre a Igreja era de uma Igreja universal, com sua própria autoridade interna, capaz de conter a visão de Guilherme de controle real sobre o estado e sobre a Igreja. Por isso, tem sido descrito ora como um monge contemplativo ora como um homem politicamente engajado, determinado a defender os privilégios da sé episcopal de Cantuária. Um dos primeiros conflitos com Guilherme irrompeu já no seu primeiro mês. O rei preparava-se para combater seu irmão mais velho, Roberto II Curthose, duque da Normandia, e precisava de dinheiro. Anselmo estava entre os nobres de quem se esperava ajuda e ele ofereceu £500, mas Guilherme recusou exigindo mais. Posteriormente, um grupo de Bispos convenceu Guilherme a aceitar a quantia original e foram até Anselmo, que afirmou ter doado o dinheiro aos pobres. Neste episódio, Anselmo foi cuidadoso e conseguiu evitar tanto acusações de simonia quanto mostrar-se um líder generoso.

               As leis da igreja determinavam que os Bispos metropolitanos não poderia ser consagrados sem que antes recebessem o pálio das mãos do Papa. Anselmo, portanto, insistiu em ir à Roma para receber o seu, mas Guilherme não autorizou. O antipapa Clemente III estava lutando contra Urbano II, que havia sido reconhecido pela França e pela Normandia. Não parece que Guilherme fosse partidário de Clemente, mas claramente desejava fortalecer seus próprios interesses colocando-se na posição de decidir entre os dois rivais. Assim, quando Anselmo pediu permissão para ir ver o Papa, o rei afirmou que ninguém na Inglaterra deveria reconhecer nenhum dos dois Papas antes que ele, o rei, se decidisse. Em 25 de fevereiro de 1095, os Bispos e nobres da Inglaterra realizaram um concílio no castelo de Rockingham para discutir o tema no qual os Bispos se alinharam ao rei, com Guilherme de Saint-Calais, o Bispo de Durham, chegando ao ponto de recomendar ao rei que depusesse Anselmo. Os nobres, por outro lado, escolheram a posição de Anselmo e a conferência terminou num impasse. Logo depois, Guilherme enviou mensageiros em segredo para Roma. Eles convenceram Urbano a enviar um legado (Gualtério de Albano) até o rei levando consigo o Pálio Arcebispal e os dois imediatamente deram início às negociações secretas. Guilherme concordou em reconhecer Urbano como Papa e assegurou para si o direito de autorizar que membros do clero recebessem cartas Papais e as obedecessem; Gualtério, negociando em nome de Urbano, concedeu que Urbano não enviaria legados à Inglaterra sem que eles fossem antes convidados pelo rei. O maior desejo de Guilherme era que Anselmo fosse deposto e outro recebesse o pálio, ao que Gualtério respondeu que "...há boas razões para que se espere um bom resultado de acordo com os desejos do rei". Guilherme então reconheceu publicamente Urbano, mas Gualtério se recusou a depor Anselmo. Enfurecido, Guilherme tentou extorquir dinheiro de Anselmo em troca do pálio, também sem sucesso. Depois, tentou entregar-lhe o pálio pessoalmente, o que também não lhe foi permitido. Finalmente, o rei cedeu e Anselmo recebeu o pálio no altar de Cantuária em 10 de junho de 1095. No decorrer dos dois anos seguintes, não se conhece nenhuma disputa aberta entre Anselmo e Guilherme. Porém, o rei bloqueou todos os esforços do Arcebispo em suas reformas. A tensão finalmente explodiu em 1097, depois que Guilherme esmagou uma revolta galesa. Ele acusou Anselmo de ter lhe fornecido um número insuficiente de cavaleiros para a campanha e tentou multá-lo. Anselmo decidiu seguir para Roma para se aconselhar com o Papa, pois Guilherme se recusava a cumprir sua promessa de ajudar na reforma da igreja, mas o rei não lhe permitiu. As negociações terminaram com Guilherme declarando que se Anselmo partisse, tomaria de volta a sé de Cantuária e jamais o receberia de volta como Arcebispo. Por outro lado, se Anselmo resolvesse ficar, seria multado e teria que jurar que jamais apelaria novamente a Roma: "Anselmo recebeu a opções de se exilar ou de se submeter completamente".

Primeiro exílio

               Exilado, Anselmo partiu para Roma em outubro de 1097. Guilherme imediatamente se apoderou das receitas da sé e as manteve até morrer, embora Anselmo tenha permanecido titular da sé. Ele escolheu o exílio para defender sua visão da Igreja universal, sublinhando os pecados de Guilherme em relação a ela. Embora ele tenha de fato prestado homenagem a Guilherme, Anselmo a desqualificou frente ao seu dever para com Deus e o Papa. Ele foi recebido com grandes honras por Urbano durante o cerco de Cápua, durante o qual foi muito elogiado pelas tropas sarracenas de Rogério I da Sicília (r. 1071–1101). Num grande concílio provincial realizado em Bari em 1098, que contou com a presença de 183 Bispos, Anselmo recebeu a incumbência de defender a cláusula Filioque e o uso do pão ázimo durante a Eucaristia contra representantes da Igreja Ortodoxa. Em 1099, Urbano renovou a proibição da investidura secular do clero e do clero prestar homenagem a poderes seculares. No mesmo ano Anselmo se mudou para Lyon. A vitória de Anselmo marcou o sucesso da Igreja Católica contra os monarcas ingleses na Questão das Investiduras. Guilherme foi morto em 2 de agosto de 1100. Seu sucessor, Henrique I, convidou Anselmo de volta, escrevendo que se comprometia a ouvir os conselhos do Arcebispo. Henrique cortejava Anselmo por que precisava de seu apoio para se consolidar no trono, uma vez que o Arcebispo poderia a qualquer momento declarar seu apoio ao irmão mais velho de Henrique. Quando Anselmo retornou, Henrique exigiu que ele lhe prestasse homenagem em relação às propriedades de Cantuária e recebesse dele sua investidura em seu posto de Arcebispo. Como o papado havia recentemente proibido o clero de fazer as duas coisas, a relação de Anselmo com Henrique já começou em conflito. O rei se recusou a desistir do privilégio desfrutado por seus predecessores e propôs que o tema fosse levado ao Papa. Duas embaixadas foram enviadas ao Papa Pascoal II sobre a legitimidade da investidura de Henrique; ambas receberam a confirmação da ordem Papal anterior. Neste ínterim, Anselmo ajudou Henrique, que estava ameaçado pela invasão de seu irmão, Roberto Curthose, e Anselmo publicamente apoiou-o, convencendo os barões ainda indecisos e ameaçando Curthose com a excomunhão. Na festa de São Miguel de 1102, Anselmo realizou um concílio em Londres no qual ele proibiu o casamento e o concubinato aos membros das ordens sagradas (além de condenar a simonia e reformando os regulamentos de sobriedade e vestuário do clero). Ele estava entre os primeiros a opinar publicamente contra o tráfico de escravos em 1102, num concílio na igreja de São Pedro em Westminster, e conseguiu aprovar uma resolução contra a prática de vender homens como gado. Por outro lado, Henrique concedeu a Anselmo autoridade sobre toda a Igreja na Inglaterra e concordou em obedecer o Papa. Porém, como Pascoal havia reafirmado as regras sobre a investidura e as homenagens seculares, Henrique se voltou novamente contra Anselmo. Em 1103, o próprio Arcebispo e um enviado real, Guilherme Warelwast, partiram novamente para Roma. Furioso, Pascoal excomungou os Bispos investidos por Henrique.

Segundo exílio

               Anselmo se refugiou em Lyon depois disso e aguardou os próximos passos de Pascoal. Em 26 de março de 1105, o Papa excomungou o principal conselheiro de Henrique, Roberto de Meulan, por ter convencido Henrique a continuar com as investiduras seculares, os prelados investidos por Henrique e outros conselheiros, ameaçando o próprio rei com o mesmo destino. Em abril, Anselmo ameaçou excomungá-lo pessoalmente, provavelmente para forçar a mão de Henrique nas negociações. Como resposta, o rei arranjou um encontro com Anselmo e eles conseguiram chegar numa solução de compromisso em Laigle em 22 de julho de 1105. Parte do acordo era que as excomunhões de Roberto e de seus associados fossem revogadas (dado que eles agora aconselharam o rei a obedecer o Papa); Anselmo fê-lo por sua própria autoridade, um ato que depois teve que explicar a Pascoal. Outras condições do acordo foram que Henrique deveria abandonar a investidura secular se Anselmo obtivesse de Pascoal permissão para que clérigos prestassem homenagem aos seus nobres; que as receitas da sé de Cantuária fossem devolvidas a Anselmo; e que os Sacerdotes fossem proibidos de casar. Anselmo então insistiu em ter o acordo de Laigle sancionado por Pascoal antes de aceitar voltar para a Inglaterra. Por carta, Anselmo também pediu ao Papa que aceitasse o compromisso de prestar homenagem ao rei, pois seria um pequeno preço a pagar por uma vitória maior, o fim do conflito sobre as investiduras seculares. Em 23 de março de 1106, Pascoal escreveu a Anselmo aceitando a solução, embora ambos vissem o acordo como um compromisso temporário e pretendiam continuar pressionando pelas reformas gregorianas, incluindo o fim das homenagens.

               Mesmo depois disso, Anselmo continuou se recusando a voltar para a Inglaterra. Henrique viajou para Bec e encontrou-se com ele em 15 de agosto de 1106. Lá, o rei fez mais algumas concessões, restaurando a Anselmo todas as igrejas que havia tomado. Ele prometeu ainda que nada mais seria tomado das igrejas, que prelados que haviam pago seu controverso imposto (que havia começado como um imposto sobre clérigos casados) seriam isentados de impostos por três anos e, finalmente, que tudo o que havia sido levado de Cantuária durante o exílio de Anselmo seria devolvido. Anselmo finalmente aceitou voltar depois de reforçar ainda mais a posição da igreja frente à do rei. Já em 1107, a longa disputa sobre as investiduras estava finalmente resolvida. A Concordata de Londres anunciou os compromissos de Anselmo e Henrique em Bec. Os dois anos finais da vida de Anselmo foram tranquilos e dedicados às suas funções em Cantuária. Como Arcebispo, viveu à altura de seus ideais monásticos, que incluíam zelo, prudência e instrução adequada ao seu rebanho, além de oração e contemplação. Anselmo morreu na Quarta-Feira Santa, 21 de abril de 1109, em Cantuária, e foi enterrado na Catedral de Cantuária.

Visão do Inferno

               Jazem nas trevas exteriores. Pois, lembrai-vos, o fogo do inferno não emite nenhuma luz. Assim como, ao comando de Deus, o fogo da fornalha babilônica perdeu o seu calor mas não perdeu a sua luz, assim, ao comando de Deus, o fogo no inferno, conquanto retenha a intensidade do seu calor, arde eternamente nas trevas.

               É uma tempestade que nunca mais acaba de trevas, de negras chamas e de negra fumaça de enxofre a arder, por entre as quais os corpos estão amontoados uns sobre os outros sem uma nesga de ar. De todas as pragas com que a terra dos faraós foi flagelada, uma praga só, a da treva, foi chamada de horrível. Qual o nome, então, que devemos dar às trevas do inferno, que hão de durar não por três dias apenas, mas por toda a eternidade?

               O horror desta estreita e negra prisão é aumentado por seu tremendo cheiro ativo. Toda a imundície do mundo, todos os monturos e escórias do mundo, nos é dito, correrão para lá como para um vasto e fumegante esgoto quando a terrível conflagração do último dia houver purgado o mundo. O enxofre, também, que arde lá em tão prodigiosa quantidade, enche todo o inferno com o seu intolerável fedor; e os corpos dos danados, eles próprios, exalam um cheiro tão pestilento que, como diz São Boa-ventura, só um deles bastaria para infeccionar todo o mundo.

               O próprio ar deste mundo, esse elemento puro, torna-se fétido e irrespirável quando fica fechado longo tempo. Considerai, então, qual deva ser o fétido do ar do inferno. Imaginai um cadáver fétido e pútrido que tenha jazido a decompor-se e a apodrecer na sepultura, uma matéria gosmenta de corrupção líquida. Imaginai tal cadáver preso das chamas, devorado pelo fogo do enxofre a arder e a emitir densos e horrendos fumos de nauseante decomposição repugnante. E a seguir imaginai esse fedor malsão multiplicado um milhão e mais outro milhão de milhões sobre milhões de carcaças fétidas comprimidas juntas na treva fumarenta, uma enorme fogueira de podridão humana. Imaginai tudo isso e tereis uma certa idéia do horror do cheiro do inferno.

               Mas tal fedentina não é, horrível pensamento é este, o maior tormento físico ao qual os danados estão sujeitos. O tormento do fogo é o maior tormento ao qual o demo tem sempre sujeitado suas criaturas. Colocai o vosso dedo por um momento na chama duma vela e sentireis a dor do fogo. Mas o nosso fogo terreno foi criado por Deus para benefício do homem, para manter nele a centelha de vida e para ajudá-lo nas artes úteis, ao passo que o fogo do inferno é duma outra qualidade e foi criado por Deus para torturar e punir o pecador sem arrependimento.

               O nosso fogo terrestre, outrossim, se consome mais ou menos rapidamente, conforme o objeto que ele ataca for mais ou menos combustível, a ponto de a ingenuidade humana ter-se sempre entregado a inventar preparações químicas para garantir ou frustrar a sua ação. Mas o sulfuroso breu que arde no inferno é uma substância que foi especialmente designada para arder para sempre e ininterruptamente com indizível fúria. Além disso, o nosso fogo terrestre destrói ao mesmo tempo que arde, de maneira que quanto mais intenso ele for mais curta será a sua duração; já o fogo do inferno tem esta propriedade de preservar aquilo que ele queima e, embora se enfureça com incrível ferocidade, ele se enfurece para sempre.

               O nosso fogo terrestre, ainda, não importa que intensidade ou tamanho possa ter, é sempre duma extensão limitada; mas o lago de fogo do inferno é ilimitado, não tem praias nem fundo. E está documentado que o próprio demônio, ao lhe ser feita a pergunta por um soldado, foi obrigado a confessar que se uma montanha inteira fosse jogada dentro do oceano ardente do inferno seria queimada num instante como um pedaço de cera. E esse terrível fogo não aflige os danados somente por fora, pois cada alma perdida se transforma num inferno dentro de si mesma, o fogo sem limites se enraivecendo mesmo em sua essência. Oh! Quão terrível é a sorte desses desgraçados seres! O sangue ferve e referve nas veias; os cérebros ficam fervendo nos crânios; o coração no peito flamejando e ardendo; os intestinos, uma massa vermelha e quente de polpa a arder; os olhos, coisa tão tenra, flamejando como bolas fundidas.

               Ainda assim, quanto vos falei da força, da qualidade e da ilimitação desse fogo é como se fosse nada quando comparado com a sua intensidade, uma intensidade que é justamente tida como sendo o instrumento escolhido pelo desígnio divino para punição da alma assim como do corpo igualmente. Trata-se dum fogo que procede diretamente da ira de Deus, trabalhando não por sua própria atividade, mas como um instrumento da vingança divina. Assim como as águas do batismo limpam tanto a alma como o corpo, assim o fogo da punição tortura o espírito junto com a carne.

               Todos os sentidos da carne são torturados; e todas as faculdades da alma outro tanto: os olhos com impenetráveis trevas; o nariz com fétidos nauseantes; os ouvidos com berros, uivos e execrações; o paladar com matéria sórdida, corrupção leprosa, sujeiras sufocantes inomináveis; o tato com aguilhões e chuços em brasa e cruéis línguas de chamas. E através dos vários tormentos dos sentidos a alma imortal é torturada eternamente, na sua essência mesma, no meio de léguas e léguas de ardentes fogos acesos nos abismos pela majestade ofendida de Deus Onipotente e soprados numa perene e sempre crescente fúria pelo sopro da raiva da Divindade.

               Considerai, finalmente, que o tormento dessa prisão infernal é acrescido pela companhia dos condenados mesmos. A má companhia, sobre a terra, é tão nociva que as plantas, como que por instinto, apartam-se da companhia seja do que for que lhes seja mortal ou funesto. No inferno, todas as leis estão trocadas lá não há nenhum pensamento de família, de pátria, de laços, de relações. O danado goela e grita um com o outro, sua tortura e raiva se intensificando pela presença dos seres torturados e se enfurecendo como ele.

               Todo o senso de humanidade é esquecido. Os lamentos dos pecadores a sofrerem enchem os mais recuados cantos do vasto abismo. As bocas dos danados estão cheias de blasfêmias contra Deus e de ódio por seus companheiros de suplício e de maldições, contra as almas que foram seus companheiros no pecado. Era costume, nos antigos tempos, punir o parricida, o homem que havia erguido sua mão assassina contra o pai, arremessando nas profundezas do mar num saco dentro do qual também eram colocados um galo, um burro e uma serpente.

               A intenção desses legisladores, que inventaram tal lei, a qual parece cruel nos nossos tempos, era punir o criminoso pela companhia de animais malignos e abomináveis. Mas que é a fúria dessas bestas estúpidas comparada com a fúria da execração que rompe dos lábios tostados e das gargantas inflamadas dos danados no inferno, quando eles contemplam em seus companheiros em miséria aqueles mesmos que os ajudaram e incitaram no pecado, aqueles cujas palavras semearam as primeiras sementes do mal em pensamento e em ação em seus espíritos, aqueles cujas sugestões insensatas os conduziram ao pecado, aqueles cujos olhos os tentaram e os desviaram do caminho da virtude? Voltam-se contra tais cúmplices e os xingam e amaldiçoam. Não terão, todavia, socorro nem ajuda; agora é tarde demais para o arrependimento.

               Por último de tudo, considerai o tremendo tormento daquelas almas condenadas, as que tentaram e as que foram tentadas, agora juntas, e ainda por cima, na companhia dos demônios. Esses demônios afligirão os danados de duas maneiras: com a sua presença e com as suas admoestações. Não podemos ter uma ideia de quão terríveis são esses demônios. Santa Catarina de Siena uma vez viu um demônio e escreveu que preferia caminhar até o fim de sua vida por um caminho de carvões em brasa a ter que olhar de novo um único instante para tão horroroso monstro.

               Tais demônios, que outrora foram formosos anjos, tornaram-se tão repelentes e feios quanto antes tinham de lindos. Escarnecem e riem das almas perdidas que arrastaram para a ruína. É com eles que são feitas, no inferno, as vozes da consciência. Por que pecaste? Por que deste ouvido às tentações dos amigos? Por que abandonaste tuas práticas piedosas e tuas boas ações? Por que não evitaste as ocasiões de pecado? Por que não deixaste aquele mau companheiro? Por que não desististe daquele mau hábito, aquele hábito impuro? Por que não ouviste os conselhos do teu confessor? Por que, mesmo depois de haveres tombado a primeira, ou a segunda, ou a terceira, ou a quarta ou a centésima vez, não te arrependeste dos teus maus passos e não voltaste para Deus, que esperava apenas pelo teu arrependimento para te absolver dos teus pecados? Agora o tempo para o arrependimento se foi. Tempo existe, tempo existiu, mas tempo não existirá mais!

               Tempo houve para pecar às escondidas, para se satisfazer na preguiça e no orgulho, para ambicionar o ilícito, para ceder às instigações da tua baixa natureza, para viver como as bestas do campo, ou antes, pior do que as bestas do campo, porque elas, ao menos, não são senão brutos e não possuem uma razão que as guie; tempo houve, mas tempo não haverá mais. Deus te falou por intermédio de tantas vozes, mas não quiseste ouvir. Não quiseste esmagar esse orgulho e esse ódio do teu coração, não quiseste devolver aquelas ações mal adquiridas, não quiseste obedecer aos preceitos da tua Santa Igreja nem cumprir teus deveres religiosos, não quiseste abandonar aqueles péssimos companheiros, não quiseste evitar aquelas perigosas tentações. Tal é a linguagem desses demoníacos atormentadores, palavras de sarcasmo e de reprovação, de ódio e de aversão. De aversão, sim! Pois mesmo eles, os demônios propriamente, quando pecaram, pecaram por meio dum pecado que era compatível com tão angélicas naturezas: foi uma rebelião do intelecto; e eles, estes mesmos, têm que se afastar, revoltados e com nojo de terem de contemplar aqueles pecados indizíveis com os quais o homem degradado ultraja e profana o templo do Espírito Santo, e se ultraja e avilta a si mesmo.

 

161º - Pascoal II - 1099 - 1118

               Papa da Igreja cristã Romana, nascido em Bieda, Ravena, eleito em 14 de agosto de 1099 como sucessor de Urbano II. Com um Pontificado de dezoito anos foi uma das fases mais violentas da luta pelas investiduras. Monge cisterciense, foi nomeado Cardeal em 1080 por Gregório VII. Consagrado no trono, sua ação contra o rei da Alemanha, Henrique V, e contra os antipapas nomeados por este, foi quase sem tréguas, embora não tenha conseguido obter resultados decisivos. Henrique V era filho do imperador Henrique IV a quem destituiu e tornou-se o Imperador, e acirrou a disputa com o Papa para se afirmarem como poder maior no mundo ocidental. O Papa convenceu dois antipapas a submissão e os enviou a um mosteiro para se penitenciarem, enquanto que o terceiro desapareceu por falta de seguidores. Conseguiu que o Imperador Henrique V fosse a Roma (1110) para ser coroado pelo Papa, após abdicar do direito de investidura. Com o rei da França, Luís, o Gordo, e com o rei da Inglaterra, Henrique I, mesmo depois de algumas divergências, ele conseguiu por fim regulamentar a espinhosa questão das investiduras. Realizou, embora sem êxito, negociações com o Imperador do Oriente, Aleixo Comneno, para uma reaproximação das Igrejas grega e romana. Construiu a igreja de Santa Maria do Povo, em Roma, e instituiu a ordem dos Cavaleiros Templários. Lutou contra as investiduras e animou as cruzadas, enquanto prelados e nobres dificultaram seu trabalho de reforma. O Papa de número 161, morreu em meio a protestos de Cardeais e padres que perdiam suas propriedades, exilado pelo Imperador, em 21 de janeiro de 1118, em Roma.

               Os Templários, ou Ordem do Templo, foi uma ordem religiosa e militar medieval. Fundada em 1118 por Hugo Payens e Godofredo de Saint-Omer, foi reconhecida pela Igreja Católica em 1128, no Concílio de Troyes. O objetivo da Ordem era proteger os peregrinos cristãos que partiam da Europa rumo a Jerusalém no contexto das Cruzadas. Mais tarde, ela passou a participar de batalhas e construiu uma rede de ajuda financeira aos reis europeus, senhores feudais e peregrinos.

 

162º - Gelásio II - 1118 - 1119

               Papa da Igreja cristã Romana nascido em Gaeta, monge da Ordem de São Bento, de Monte Cassino, foi eleito secretamente pelos Cardeais, num mosteiro beneditino em Roma, em 16 de março de 1118 como sucessor de Pascoal II, e teve um Pontificado breve e atormentado. Eleito foi agredido pelo rebelde Frangipane, na Basílica de São João de Latrão, pisoteado, acorrentado e arrastado até o Castelo mais próximo, onde foi encarcerado. Libertado por alguns marinheiros genoveses, refugiou-se em Gaeta e, vestido de peregrino, conseguiu regressar à Roma, onde foi carregado ao Palácio de Latrão e elevado ao Trono Pontifício, mesmo não sendo ordenado Sacerdote e Bispo. Em Roma, teve que enfrentar o tirânico e opressor imperador Henrique IV, filho indigno do sábio e moderado Henrique III. O imperador ainda possuía o direito exorbitante de escolher o Romano Pontífice e contrariado invadiu Roma, destronou o Papa legítimo, e declarou nula a sua eleição e empossou em seu posto um religioso de sua confiança, Burdino, Arcebispo da Braga, como um antipapa, com o nome de Gregório VIII. Henrique IV pretendia o direito exclusivo de nomear abades, Bispos e Papas, mas os antipapas que indicou para Roma, foram considerados como anticristos pela cristandade e só obedecia aos legítimos sucessores de Gregório VII (1073-1085), o que levou o Imperador germânico a perder sua influência com o tempo. Depois destes eventos o Papa convocou um sínodo e excomungou a ambos (1118), mas depois de muitas atribulações, teve que refugiar-se no Mosteiro de Cluny, onde permaneceu até seu falecimento, em 29 de janeiro de 1119. A Igreja Católica o festeja como Santo no dia 29 de janeiro.

 

163º - Calixto II - 1119 - 1124

               Papa da Igreja cristã Romana nascido na Borgonha, eleito para sucessão de Gelásio II, restituiu poder e prestígio à Igreja romana. Filho do Conde de Borgonha, nomeado Arcebispo de Viena, no Delfinado, durante a querela das investiduras voltou-se contra o imperador Henrique V e presidiu o Concílio de Vienne no ano de 1112, que excomungou o Imperador. Foi eleito Papa em 1119 embora não pertencesse ao colégio cardinalício. Eliminado o antipapa Gregório VIII, indicado em 1120, por Henrique V, o Papa retomou as negociações para chegar a um acordo com o Imperador. A Concordata de Worms (1122) sancionou o acordo que pôs fim à longa luta entre Império e Papado. Esse acordo consistiu de um compromisso firmado pelo Papa e o Imperador Henrique V, mediante o qual se regulamentou a questão da querela das investiduras de acordo com as doutrinas já formuladas pelo canonista Ivo de Chartres. Este separava nitidamente os dois tipos de investidura: a eclesiástica, que concedia a função espiritual ao Bispo eleito pelo clero local, com a consignação do anel e do pastoral por parte do Papa ou de um enviado deste; e a laica, feita com a espada e o cetro, em que o Imperador conferia ao Bispo os poderes de Condes, ou seja, um governo de caráter temporal com os respectivos benefícios. Convocou o I Concílio Lateranense, reconhecido como o IX ecumênico (1123), para ratificar a concordata de Worms de 1122, que pôs fim à querela das investiduras. Com a presença de cerca de 300 Bispos, a aprovação da concordata foi acompanhada pela promulgação de 25 cânones, que reiteravam deliberações canônicas anteriores ou se inspiravam na reforma gregoriana, especialmente cânones contra a simonia e a clerogamia. Também durante o concílio, em 27 de março, Conrado, Bispo de Constança, foi canonizado pelo Papa. Veio a falecer em Roma.

 

164º - Honório II - 1124 - 1130

               Papa da Igreja cristã Romana nascido em Fagnano, Ímola, eleito em 21 de dezembro de 1124 como sucessor de Calisto II, cujo Pontificado foi marcado pela consolidação da autoridade do Papa perante as Igrejas da Inglaterra, na qual os Bispos tiveram de se curvar à vontade da cúria romana, e da França, onde os conflitos entre a Coroa e o Episcopado resolveram-se com a intervenção Papal em favor do Episcopado. Descendente de uma família pobre, como eclesiástico ocupou as mais elevadas funções da hierarquia durante os Pontificados de Pascoal II e de Calisto II. Cardeal, Bispo de Óstia, signatário da concordata de Worms entre a Igreja e o Império e membro influente do nono concílio de Latrão (1123). Eleito Papa com o apoio da família Frangipane, após a morte em 1125 do Imperador Henrique V, apoiou Lotário de Suplimburgo contra Conrado de Hohenstaufen, para herdeiro do Império, obtendo a submissão de Conrado (1126) sob ameaça de excomunhão. Restabeleceu relações com quase todas as cortes europeias, para lutar contra os maometanos, porém teve muitas dificuldades para se impor no sul da Itália e em Roma, principalmente no Ducado da Puglia, onde Guilherme deixou (1127) a coroa para Rogério II, futuro rei da Sicília, contra a vontade do Pontífice. Também em Roma, os últimos meses de seu Pontificado foram extremamente conturbados pelo acirramento das lutas entre os Frangipane, seus aliados, e os Pierleoni. Acuado o Papa refugiou-se no convento de S. Gregorio al Celio, onde morreu em 13 de fevereiro de 1130. Foi durante seu pontificado que surgiram na Itália as seitas dos Guelfos, partidários do Papa, e a dos Gibelinos, partidários do Imperador.

 

165º - Inocênio II - 1130 – 1143  

               O Papa Inocêncio II, nascido Gregorio de Papareschi, foi Papa de 14 de fevereiro de 1130 até 24 de setembro de 1143. Sofreu uma forte oposição do   Anacleto II e um grande apoio de São Bernardo de Claraval. Instituiu o celibato, combateu a usura, a simonia, os falsos pontífices, e também os falsos sacramentos e as falsas penitências. Inocêncio II, no II Concílio de Latrão, em 1139, determinou: "Cânon 18 - Condenamos, ademais, aquela detestável e ignominiosa rapacidade insaciável dos prestamistas - (usurários, emprestadores) - repudiada pelas leis humanas e divinas, por meio das Escrituras no Antigo e no Novo Testamento, e separamos de todo consolo da Igreja, mandando que nenhum Arcebispo, nenhum Bispo, ou Abade de qualquer ordem, quem quer que seja na ordem ou no clero, se atreva a receber aos usurários, senão com suma cautela, antes bem, em toda a sua vida sejam estes considerados como infames, e se não se arrependem, sejam privados de sepultura eclesiástica" (Inocêncio II, II Concílio de Latrão, cânon 18, Denzinger, 365).

Inocêncio II e as profecias de São Malaquias

               O homem que se tornou são Malaquias nasceu no ano de 1094, em Armagh, na Irlanda. Seu nome de batismo era Maelmhaedhoc O'Morgan; que depois foi latinizado para Malaquias. Estava ainda em plena adolescência quando se tornou o Ábade de Armagh. Todos os que o conheciam ficavam surpreendidos pela sua devoção a Deus e pela sua forte presença. Ele era alto, grande, magro e luminoso; mas, o mais importante - ele era sábio além de seus anos. Isso estava claro. Em 1119 ele foi ordenado padre. Mas só em sua primeira viagem a Roma, aos 45 anos em 1139, que suas visões começaram. No princípio, ele ficou muito atormentado pelas imagens que via. Sua maior preocupação foi a visão da destruição da Santa Igreja. Ele rezou e se fortaleceu, sem nunca ter questionado o testamento de Deus. Lhe foi dito que não revelasse o conteúdo de suas visões abertamente. Ao invés, ele escreveu lemas curtos ou sátiras que descreviam cada Papa, até o último deles, de forma que eles serviriam como um esboço do tempo até o fim desta Era. Antes do outono de 1140, todas as suas profecias haviam sido transcritas para o papel. Malaquias confiou as visões encadernadas ao então Papa Inocêncio II. No princípio ele não levou Malaquias a sério. Foi então que o próprio Papa Inocêncio II recebeu uma visão e uma advertência dura de Deus. Dali em diante, o Papa levou fé em tudo aquilo Malaquias lhe falou. Inocêncio II trancafiou os lemas na Igreja onde lá permaneceram, não lidos, por quase 400 anos. Malaquias passou o resto de sua vida servindo a Deus, curando e alimentando os famintos. Ele recebeu visões até o fim de sua vida - predizendo, com 19 dias de antecedência, a própria morte com exatidão de data e hora. Morreu nos braços de São Bernardo, em Claraval, França. Agora que estamos no final dos tempos, sabemos que São Malaquias também acertou quanto ao último Papa legítimo da Igreja, o Papa Bento XVI, e o “Pedro o Romano”, se refere a devolução da Chave da Santa Sé para Pedro Apóstolo. O antipapa Francisco é aquele que irá trazer a Abominação para a Desolação no Lugar Santo: na Cadeira de Pedro.

               Em 29 de março de 1139, na bula "Omne datum optimum", Inocêncio estabeleceu privilégios para a Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão, conhecida mais popularmente como Ordem dos Cavaleiros Templários. O principal desses privilégios foi a isenção da jurisdição Episcopal, assim a Ordem tinha os seus próprios padres, os seus capelães, garantindo a assistência religiosa e o culto litúrgico, e que não dependiam dos Bispos da região em que estivessem. Em 1142, o senado romano sublevou-se contra o Pontífice. Em ato instigado por Arnaldo de Brescia, o senado toma o poder civil dos Papas, tendo como objetivo elevar a municipalidade ao status de comuna ou república, a exemplo de outras cidades do norte de Itália, desencadeando distúrbios que se estenderam por quarenta e quatro anos.

 

166º - Celestino II - 1143 - 1144  

               Papa Celestino II, nascido Guido Guelfucci, Guido Ghefucci ou Guido di Castello; 8 de março de 1144.  Foi eleito em 26 de setembro e de 1143, consagrado a 3 de outubro do mesmo ano, e morreu em 8 de março de 1144. Guido di Castello, um possível filho do nobre Niccolo di Castello, nasceu em Città di Castello, na região da Umbria, província de Perugia. Guido havia estudado com Pedro Abelardo, e se tornou um mestre distinto nas escolas. Eventualmente Guido começou sua carreira em Roma como um subdiácono e um apostolo escritor para o Papa Calixto II. Ele foi criado Cardeal-diácono de Santa Maria em Via Lata pelo Papa Honório II em 1127; como tal, ele assinou as bulas Papais emitidas entre 03 de abril de 1130 e 21 de Dezembro 1133. Era conhecido pelo apelido carinhoso de "trabalhador de Deus" e sempre que empreendia uma viagem pastoral pela província romana, os populares diziam "lá vai a águia sobrevoar seu planalto em volta de seu ninho". Parece até ter tido ótimas relações com São Bernardo de Claraval e suas ideias, pois é sabido com ajuda dele resolveu diversos desacordos internos da Igreja, mas isso não invalidou de ter sido severamente repreendido por ele, pelo abade cirterciense, de ter sido durante algum tempo discípulo e provável seguidor do teólogo Abelardo. Editou uma coleção de ordenações que mais tarde seriam úteis para classificar os Pontífices que foram seus antecessores e os seus póstumos. Pode-se dizer que se não fosse Pontífice, Celestino II deveria ter sido um excelente catalogador de biblioteca das Universidades que estavam tão na moda na época.

 

167º - Lúcio II - 1144 - 1145

               Nascido na Bolonha, Itália, no ano 1095, Gherardo de Caccianemici foi um homem dedicado à vida religiosa desde cedo. Certo de sua aptidão, tornou-se padre em sua cidade natal, de onde iniciaria uma escalada hierárquica na Igreja Católica que o levaria a posições de destaque. Os méritos de seu empenho foram reconhecidos, levando Gherardo a ser nomeado como Cardeal da Basílica de Santa Cruz de Jerusalém. Entre os membros mais importantes do alto clero, ele desenvolveria funções de destaque diretamente a serviço dos Papas. Durante os Pontificados de Honório II e de Inocêncio II, Gherardo desempenhou os cargos de tesoureiro da Igreja e de representante Papal na Alemanha. A relevância de suas funções, por si só, já demonstram o grau de influência que possuía. Não é difícil de compreender que após a morte do Papa Celestino II, Gherardo tenha sido eleito, em 12 de março de 1144, para ser o seu sucessor. O Papa Lúcio II assumiu o comando da Igreja Católica em meio a um movimento revolucionário que abalava Roma. Naquela ocasião, havia uma república estabelecida que tentava privar o Papa dos poderes temporais que havia conquistado ao longo dos séculos. Era um péssimo momento para a Igreja Católica, que, acostumada com o crescente poderio, se via em meio a contestações que procuravam limitar sua influência e atuação na sociedade. Lúcio II foi obrigado a articular da maneira que fosse possível para tentar reverter ou, ao menos, relativizar a situação. No mesmo ano em que tomou posse, o Papa se encontrou com Rogério II da Sicília para deixar claro seus deveres com a Santa Sé. No entanto, Rogério estava do lado do movimento revolucionário republicano e tentou também impor sanções ao Sumo Pontífice. Só que este não estava disposto a aceitá-las, como seria de se esperar, e manteve firme a posição de independência da Igreja. Rogério então revidou enviando seu general Roberto de Selby para forçar o Papa a aceitar suas condições. O cenário era completamente desfavorável à Igreja Católica. Os nobres de várias regiões de Roma estavam unidos em prol da diminuição dos poderes da Igreja e sua submissão aos interesses temporais. O Senado Romano já havia esvaziado o Papa de poderes durante o pontificado de Inocêncio II e, mesmo após ser dissolvido por Lúcio II, estava de volta. Por sinal, a ação do Papa serviu para incendiar mais ainda a situação. Em um momento no qual todos se viravam contra a Igreja, uma ação como essa de dissolver o Senado estimulou mais ainda a oposição insatisfeita com o poderio do clero. Ameaçado e em desespero, o Papa Lúcio II pediu o auxílio do Imperador Conrado III contra o Senado, o que também foi um fracasso, pois o Imperador se recusou. Havia ainda outro adversário político que causava desequilíbrios às tentativas do Papa. Giordano Pierleoni era irmão do Antipapa Anacleto II, cujo cisma se encerrou no papado de Inocêncio II. Giordano era influente e conseguia estimular a oposição ao Papa. Quando Lúcio II finalmente conseguiu reunir um pequeno exército para enfrentá-lo, foi derrotado novamente. Mas desta vez a derrota custaria muito caro, já que, durante os combates, o Papa Lúcio II seria ferido seriamente por uma pedrada que deixariam ferimentos graves, resultando em seu falecimento alguns dias depois. O Papa Lúcio II teve um Pontificado muito turbulento e um fim humilhante para um líder da Igreja. Incapaz de controlar a situação, ele permaneceu menos de um ano como líder cristão e faleceu no dia 15 de fevereiro de 1145, aos 50 anos de idade.

 

168º - Eugênio III - 1145 - 1153

               O Beato Eugênio III OCist, foi Papa de 15 de fevereiro de 1145 até 8 de julho de 1153. Nascido em Montemagno, próximo de Pisa, Itália, no seio de uma rica família cristã, pertencente à nobreza italiana, com o nome de Pier Bernardo Pignatelli, o futuro Papa Eugênio III foi ordenado Sacerdote na cidade de Pisa. Segundo os registos da época, era inteligente, mas reservado e muito ponderado. Em 1135, ingressou na Ordem Cisterciense. Foi designado pelo seu superior para abrir outro mosteiro da Ordem na cidade de Farfa, diocese de Viterbo, onde foi nomeado abade pelo Papa Inocêncio II. Em 1145, Bernardo Pignatelli foi eleito Papa e adotou o nome de Eugênio III. O Papa teve que enfrentar a difícil situação política na Itália, provocada por Arnaldo de Bréscia – o grande opositor do poder temporal dos Papas - que exigia a eleição de um Papa que favorecesse as suas ambições políticas, fazendo pressão junto do Colégio Cardinalício. O abade Bernardo não era Cardeal e foi eleito pelo Colégio Cardinalício, justamente para contrarrestar as exigências políticas de Arnaldo. Contudo, horas após a sua eleição, partiu de Roma para ser coroado no seu mosteiro de Farfa, em Viterbo, onde os seus Cardeais também foram residir. Mas a população romana desejava a volta do Pontífice, que pouco depois, retornou a Roma. Em 1146, Arnaldo de Bréscia exigiu do Papa a entrega da cidade de Tívoli. Não concordando, Eugênio III mudou-se para Siena e, mais tarde, foi estabelecer-se, durante três anos, na França. Tendo tomado conhecimento da queda da cidade de Edessa, a capital do Condado de Edessa, nas mãos dos turcos, em Dezembro de 1145, Eugênio III escreveu uma carta a Rei Luís VII de França, convidando-o a fazer parte de uma cruzada. Em uma grande dieta ocorrida na cidade de Espira, na Alemanha, em 1146, o Imperador Conrado III, e muitos dos seus nobres, foram convencidos pela eloquência do Papa Eugênio III a dedicar-se a uma cruzada. Defendeu a Igreja contra os invasores turcos e iniciou a construção do Palácio Pontifício. Morreu no dia 8 de julho de 1153, depois de governar a Igreja durante oito anos e cinco meses, num período histórico muito complicado e violento. O Papa Eugênio III foi beatificado em 1872 pelo Papa Pio IX.

 

168.1 – Santa Hildegarda de Bingen

               Hildegarda de Bingen (Bermersheim vor der Höhe, verão de 1098 — Mosteiro de Rupertsberg, 17 de setembro de 1179), apelidada Sibila do Reno, foi uma monja beneditina, mística, escritora (misticismo, teologia, ciência natural, poesia, dramaturgia, hagiografia, linguística, cartas), pregadora, compositora e médica informal alemã. Foi mestra do Mosteiro de Rupertsberg em Bingen am Rhein, na Alemanha. É uma Santa e doutora da Igreja Católica.

               Personalidade muito citada mas de fato pouco conhecida pelo grande público moderno, rompendo as barreiras dos preconceitos contra as mulheres que existiam em seu tempo, se tornou respeitada como uma autoridade em assuntos teológicos, louvada por seus contemporâneos em altos termos. Hoje é considerada uma das figuras mais singulares e importantes do século XII europeu, e suas conquistas têm poucos paralelos mesmo entre os homens mais ilustres e eruditos de sua geração. Seus vários e extensos escritos mostram que ela possuía uma concepção mística e integrada do universo, ainda que essa concepção não excluísse o realismo e encontrasse no mundo muitos problemas. A solução para eles, de acordo com suas ideias, devia advir de uma união cooperativa e harmoniosa entre corpo e espírito, entre natureza, vontade humana e graça divina. Mas não tentou inaugurar uma nova corrente de pensamento religioso; sempre permaneceu fiel à ortodoxia do Catolicismo, e combateu as heresias e a corrupção do clero. Quis acima de tudo desvelar para seus semelhantes os mistérios da religião, do cosmos, do homem e da natureza. Para ela o universo era a resposta para as dúvidas da humanidade, e a humanidade era a resposta para o enigma do universo. Mas, como escreveu, se a humanidade não fizesse a pergunta, o Espírito Santo não poderia respondê-la. Foi a primeira de uma longa série de mulheres influentes tanto na religião como na política, e um representante típico da aristocracia cultural beneditina. Orgulhosa de pertencer a uma elite social e espiritual, mostrou-se no entanto humilde e submissa a Deus.

               Além de mística, teóloga e pregadora, foi poetisa e compositora talentosa, deixando obra de vulto e original. Também fez muitas observações da natureza, com uma objetividade científica até então desconhecida, especialmente sobre as plantas medicinais, compilando-as em tratados onde abordou ainda vários temas ligados à medicina e ofereceu métodos de tratamento para várias doenças. Seus primeiros biógrafos a mencionaram como Santa e lhe atribuíram alguns milagres, em vida e logo após a sua morte. Abriu-se um processo de canonização, mas sua causa parou na beatificação. Entretanto, em 1584 o Papa Gregório XIII autorizou a inclusão do seu nome no Martirológio Romano como Santa. Seu dia é festejado em muitas dioceses alemãs. O Papa Bento XVI reafirmou oficialmente sua santidade e a proclamou Doutora da Igreja através de carta apostólica de 7 de outubro de 2012. Depois de um longo período de obscuridade, sua vida e obra vêm recebendo atenção crescente desde a segunda metade do século XX; seus escritos começaram a ser traduzidos para várias línguas, muitos livros e ensaios já lhe foram dedicados, e foram feitas diversas gravações com sua música.

               Hildegarda de Bingen nasceu em uma família da pequena nobreza de Bermersheim, que estava a serviço dos condes de Sponheim, e que produziu diversas personalidades religiosas e culturais, entre elas dois de seus irmãos, Hugo, mestre do coro da Catedral de Mogúncia e mentor do Bispo de Liège, e Roricus, que se tornou cônego da abadia beneditina de Tholey. O nome da família não foi transmitido com segurança à posteridade, mas é possível que fosse Von Stein, a partir de algumas indicações nos documentos primitivos. Hildegarda foi a décima filha de Hildebert e Mechtild, e por esse motivo teria sido oferecida como dízimo à Igreja, mas é possível que o fato de ela desde tenra infância experimentar visões, combinado à sua saúde precária, teriam sido os motivos principais para destiná-la à vida religiosa. Segundo a Vita Sanctae Hildegardis, a mais importante biografia antiga sobre ela, aos três anos de idade ela teve sua primeira experiência espiritual, quando viu uma luz de brilho deslumbrante que fez sua alma tremer, e nos anos seguintes essas visões se repetiram com frequência. Hildegarda relatou algumas delas para as pessoas de sua família, mas, intimidada com a reação de surpresa e desconfiança que causavam, logo cessou de mencioná-las.

               Com oito anos foi confiada aos cuidados de Jutta, filha do conde de Sponheim, e que era a mestra de um pequeno grupo de monjas enclausuradas de um eremitério anexo ao Mosteiro de Disibodenberg, que as supervisionava. Jutta introduziu Hildegarda no modo de vida dos Beneditinos e deu-lhe as primeiras letras através da leitura das Escrituras. Possivelmente também lhe ministrou elementos de música. Em sua época os mosteiros beneditinos eram uma das melhores opções para os membros da aristocracia germânica que desejavam se dedicar à religião; estavam entre os mais importantes centros de cultura da Europa medieval, e podiam prover uma educação esmerada para os filhos da nobreza. Mas parece que, no seu caso, a julgarmos por suas repetidas declarações anos mais tarde, essa educação inicial foi apenas rudimentar. Suas experiências visionárias continuavam, mas ela mesma ainda não sabia definir sua origem. Dizia que via e ouvia as coisas "em sua alma", chegava a ter sensações táteis e olfativas, e ao mesmo tempo continuava alerta para com o que se passava no mundo físico, e em plena posse de suas faculdades mentais e corpóreas, mas também disse que elas a exauriam, a ponto de deixá-la constantemente doente.

               Em 1114 fez seus votos definitivos e ingressou na Ordem, mas a reconstituição de sua vida nesse eremitério é muito difícil; não há relatos descritivos, salvo breves alusões. A partir de crônicas deixadas sobre outras comunidades semelhantes de seu tempo, é provável que seu eremitério tenha seguido em linhas gerais, mas com maior pobreza, a rotina dos monges beneditinos que o supervisionava, passando a maior parte do dia em orações ou trabalhos manuais. O contato com o mundo profano era rigorosamente vedado, e ao que tudo indica não podiam sequer sair para exercitar-se. Em todos os assuntos devem ter dependido dos monges vizinhos, mas não há como saber em que medida Hildegarda se beneficiou da rica vida cultural de que desfrutavam os integrantes masculinos da Ordem. Entretanto, mesmo em todos os outros momentos isoladas do mundo, parece garantido que as missas eram assistidas pelas monjas na igreja dos monges, pois não possuíam uma própria, e pelo menos no que diz respeito à vivência musical e ao aprendizado do latim, da retórica sacra e da doutrina católica, essa frequência deve ter sido de grande importância para a futura carreira de Hildegarda. Logo a fama de virtude de sua mestra, que veio a ser santificada, e a dela própria, começaram a atrair outras monjas, o pequeno eremitério, que inicialmente possuía apenas uma porta e uma janela, foi gradualmente ampliado e se tornou quase um mosteiro autônomo, e o rigor de sua clausura parece ter sido suavizado. É possível que tenha se envolvido então com o cuidado de doentes e gestantes e incrementado suas práticas musicais. Segundo o que disse anos depois, sua saúde melhorou, ela se sentia mais confiante e sua habilidade clarividente se desenvolveu, passando a ser capaz de prever o futuro.

               Até a ocasião da morte de Jutta, em 1136, quando foi eleita mestra das monjas de Disibodenberg, as fontes primitivas não dão dados relevantes; ela mesma afirmou em um de seus escritos que sua juventude fora de pouco interesse salvo pelas visões que tinha. Mas em 1141 teve uma visão que abriu-lhe o entendimento para o significado profundo do texto das Escrituras. Numa de suas notas autobiográficas, disse:

               "E sucedeu no 1141º ano da encarnação de Jesus Cristo, Filho de Deus, quando eu tinha quarenta e dois anos e sete meses, que os céus se abriram e uma luz ofuscante de excepcional fulgor fluiu para dentro de meu cérebro. E então ela incendiou todo o meu coração e peito como uma chama, não queimando, mas aquecendo… e subitamente entendi o significado das exposições dos livros, ou seja, dos Salmos, dos Evangelhos e dos outros livros católicos do Velho e Novo Testamentos".

               Ao mesmo tempo uma voz lhe ordenou: "Oh mulher frágil, cinza de cinza e corrupção de corrupção, proclama e escreve o que vês e ouves". Para que não restassem dúvidas, a ordem lhe foi repetida por três vezes. Mas não pôde colocar em prática de imediato o mandado divino. Imaginava-se indigna e isso a atormentava, e temendo o que os outros iriam dizer dela se aparecesse como profeta, entrou em uma crise interior, e adoeceu. Por incentivo do monge Volmar, que provavelmente deu-lhe uma educação complementar mais sólida e ajudou-a na correção do seu latim ainda precário, transcreveu alguma coisa em segredo, os primeiros esboços de seu Liber scivias Domini, mas somente em 1147, ainda hesitante, procurou Bernardo de Claraval, já famoso, em busca de orientação. Escreveu-lhe uma carta onde expunha suas dúvidas e receios, e pedia uma confirmação para seu dom, mas a resposta do celebrado religioso foi circunspecta e evasiva. Não quis assumir a responsabilidade por seus atos, mas encorajou-a a confiar no seu próprio julgamento e através dele atender ao chamado que recebera. Mas logo passou a apoiá-la mais efetivamente, persuadindo o Papa Eugênio III a ler alguns de seus escritos iniciais diante do sínodo reunido em Trier em 1147-1148. O Papa enviou uma comissão de clérigos para verificar a autenticidade do que tinha em mãos como sendo dela, e, confirmada a autoria, o Papa enviou-lhe uma carta louvando seu amor a Deus e sua reputação honrada, aprovando suas visões, o que lhe deu o impulso decisivo para assumir publicamente seu dom profético como uma missão evangelizadora e passasse a lançar ao papel resolutamente e em detalhe o que lhe era revelado. Escrevia em latim, o que de imediato excluía um público popular, e o próprio conteúdo de seus escritos também os direcionava para a elite. Torna-se surpreendente a sua produção quando se lembra que em seu tempo as mulheres em geral tinham pouquíssimo espaço na vida cultural, civil e religiosa, havia muitos preconceitos contra elas a respeito de sua moralidade e de suas capacidades físicas e intelectuais, e não tinham nenhuma autoridade. Ao mesmo tempo, ela própria se sentia pouco qualificada, alegando ter recebido uma educação pobre e que, comparada com a refinada cultura nas artes liberais que muitos monges recebiam, fazia dela, aos olhos de seus contemporâneos, uma semi-analfabeta. Mas imediatamente depois da aprovação papal, tornou-se uma celebridade em toda a Europa.

               Em 1148, obedecendo uma ordem recebida em uma visão, deixou Disibodenberg junto com outras monjas a fim de revitalizar o antigo Mosteiro de Rupertsberg, então arruinado. Era localizado numa região erma, e lá continuou seu trabalho religioso e assistencial, bem como seus escritos. A mudança encontrou resistência no clero e nos monges de Disibodenberg, e inclusive entre suas monjas, mas finalmente, em torno de 1150, o prédio estava restaurado, e o grupo, instalado. Sua primeira obra, o Liber scivias Domini (Livro do conhecimento dos caminhos do Senhor), foi concluída ali em 1151, contendo uma coleção de relatos sobre suas visões até então. Esse período inicial em Rupertsberg foi marcado por várias dificuldades, lutando por verbas para o sustento da comunidade e pela regularização de seu estatuto jurídico, e enfrentando a deserção de várias monjas, perdendo inclusive a sua assistente e discípula favorita, Richardis von Stade, que foi indicada superiora de outro mosteiro. Por outro lado, foi favorecida pelas boas relações de sua família com a nobreza local e com o alto clero. Ela mesma já era famosa e se correspondia com várias personalidades importantes, e ganhou a amizade e a proteção de Frederico II, até que as diferenças dele com o Papa fizeram essa amizade esfriar. Também desta fase datam suas primeiras composições musicais e poéticas conhecidas, bem como suas primeiras observações científicas da natureza e textos médicos. A partir de 1158 iniciou sua próxima obra importante, o Liber vitae meritorum (Livro dos méritos da vida), onde examinou os vícios e as virtudes da vida humana, mas esteve doente ao longo de quase todo o período em que o escreveu.

               A partir de 1160, sempre por força de comandos divinos que lhe impunham doenças até que ela anuísse ao chamado, o que fazia nem sempre de boa vontade ou imediatamente, por temor da rejeição das pessoas, empreendeu diversas viagens pela Alemanha e França a fim de pregar, um privilégio nunca outorgado a mulheres, indo primeiro a Mogúncia, Würzburg, Ebrach e Bamberg. Depois viajou para a Lorena, passando por Trier e Metz. No ano seguinte visitou Colônia e outras cidades, indo até o Ruhr. Em 1163 terminou o Liber vitae e imediatamente iniciou sua obra teológica mais notável, o Liber divinorum operum (Livro das obras divinas), um comentário sobre o prólogo do Evangelho de São João e sobre o livro do Gênesis, aprofundando os temas já tratados no Scivias. A escrita dessa obra sofreu várias interrupções, e só foi terminada em 1174, pouco antes de sua morte. Em 1165 suas tarefas duplicaram com a fundação de um novo mosteiro em Eibingen, para acomodar o crescente número de monjas sob seus cuidados. Visitava-o duas vezes por semana, e nesse período seus biógrafos dizem que fez suas primeiras curas milagoras e exorcismos.

               Em torno de 1170, já idosa, uma visão ordenou que ela fizesse uma última viagem, agora para Maulbronn, Hirsau, Zwiefalten e outras cidades. De início relutou, como costumava fazer, mas então foi atacada por uma hoste de espíritos malignos que se compraziam em humilhá-la e infligir-lhe intensas dores físicas. Quando finalmente aceitou a incumbência, foi recompensada com a visão de um homem de aparência extraordinariamente formosa e de bondade amantíssima:

               "Ao vê-lo senti todo meu ser infuso de um perfume balsâmico. Então exultei com alegria imensa, e desejei permanecer na sua contemplação para sempre. E ele ordenou que os que me afligiam partissem e me deixassem em paz, dizendo: 'Vão, não quero que a atormentem mais!', e eles, partindo, gritaram: 'Ah, sempre que viemos aqui saímos confundidos!' Imediatamente, às palavras do homem, a doença que me afligia, como água empurrada pelo vento, se foi, e eu recuperei as forças".

               Suas pregações eram audaciosas e veementes, denunciando os vícios do clero e combatendo as heresias, em particular a dos cátaros, que naquela altura estavam penetrando rapidamente na Germânia, fazendo muitos seguidores. Esses périplos exigiam muito de sua saúde, e seus anos finais foram perturbados por uma série de moléstias. Algumas lhe causavam grandes sofrimentos, mas seus dotes intelectuais e espirituais pareciam crescer à medida que o corpo fraquejava. Permaneceu sempre em atividade, escrevendo, debatendo com outros religiosos e atendendo à crescente multidão de pessoas que vinham em busca de seu conselho e dos remédios que preparava. Nesse período escreveu as biografias de São Rupert e São Disibod, um comentário sobre a Regra Beneditina, e outras peças menores. Além de seus problemas de saúde e os administrativos, perdeu em 1173 seu colaborador de longa data, o monge Volmar, e custou a encontrar um substituto. Teve de apelar para o Papa Alexandre III, e após longas negociações foi-lhe enviado o monge Gottfried em fins de 1174 ou no início de 1175, que começou a servir de seu assistente e iniciou a compor uma biografia sobre Hildegarda, mas faleceu em 1176 sem terminá-la. Foi então substituído pelo monge Guibert de Gembloux, que também se dedicou a escrever sobre sua vida, e igualmente não terminou o trabalho, abordando apenas seus anos iniciais, o que foi uma lástima dado o vulto do fragmento que sobreviveu.

               No último ano de sua vida enfrentou uma outra crise, agora a do interdito que o clero de Mogúncia impôs sobre o seu mosteiro, impedindo a celebração da missa e a prática dos cânticos sacros. O motivo foi o de ela ter permitido o enterro de um nobre alegadamente excomungado no cemitério de seu mosteiro, mas segundo ela este nobre havia sido absolvido in extremis e recebido a eucaristia. A despeito de ter feito apelos às autoridades, explicando o ocorrido, o conflito só piorou e foi necessário o concurso do arcebispo de Mogúncia, que decidiu levantar o interdito em 1179. Mas todo o caso a desgastou profundamente, e depois de conseguir uma solução favorável para si, perdeu as forças e desejou ser liberta do corpo para encontrar a Cristo. Previu a iminência de sua morte e faleceu pacificamente em 17 de setembro do mesmo ano.

               No Livro das Obras Divinas, Santa Hildegarda de Bingen, a “Sibila do Reno”, interpreta a propósito do versículo 6,8 do Livro do Apocalipse:

               Ap 6:8 - “E vi aparecer um cavalo esverdeado. Seu cavaleiro tinha por nome Morte; e o inferno o seguia. Foi-lhe dado poder sobre a quarta parte da terra, para matar pela espada, pela fome, pela peste e com as feras da terra.”

               “Isto se interpreta assim: o cavalo descrito deste modo é o tempo em que todas as coisas conformes com a lei e cheias da justiça de Deus serão consideradas nada, como as coisas sem cor, e então os homens dirão: “Não sabemos o que fazemos e os que nos deram estas ordens, não sabiam o que diziam”. E assim, sem medo nem temor pelo julgamento de Deus, desprezarão todos os bens, persuadidos pelo diabo a fazer estas coisas.

               Mas Deus em sua cólera julgará estas obras e se vingará destruindo-as completamente, porque dará morte àqueles que não se arrependam e os condenará ao inferno. Nesse tempo, haverá por todas as partes da terra combates com a espada, os frutos da terra desaparecerão, e os homens morrerão de morte súbita ou pelas mordidas das feras.

               A antiga serpente se regozija com todos estes castigos com os quais o homem se vê castigado na alma e no corpo. Ela que perdeu a glória celeste, não quer que o homem a alcance. Na verdade, quando percebeu que o homem ouviu seu conselho, começou a planejar fazer guerra a Deus, dizendo: ‘Através do homem, levarei a cabo todos os meus propósitos.

               Pois, em seu ódio, inspirou todos os homens a se odiarem com o mesmo mau sentimento, para que se matassem uns aos outros. E disse: ‘Farei com que os homens morram, perdê-los-ei mais do que a mim mesma, que já estou perdida, porque eu estou viva, mas eles não estarão. E enviou seu sopro para que a sucessão dos filhos dos homens se extinguisse, e então os homens se tomaram de paixão por outros homens, perpetrando atos vergonhosos.

               E a serpente, sentindo gozo nisso, gritou: ‘Esta é a suprema ofensa contra quem deu o corpo ao homem, que a forma deste desapareça, por ter evitado a relação natural com as mulheres. É, pois, o diabo quem os persuade a se tornarem infiéis e sedutores, para se odiarem e se matarem, convertendo-se em bandidos e ladrões, porque o pecado da homossexualidade leva às mais vergonhosas violências e a todos os vícios.

               E quando todos estes pecados tiverem se manifestado ao mesmo tempo no povo, então a vigência da Lei de Deus será quebrada e a Igreja será perseguida como uma viúva. E os príncipes, os aristocratas e os ricos serão despojados de suas posses pelas pessoas de menor condição, e serão expulsos de cidade em cidade, sua nobreza será aniquilada e os ricos se verão reduzidos à pobreza.

               Todas estas coisas acontecerão quando a antiga serpente instilar no povo a vontade de mudar de roupas e costumes. Os homens obedecerão a ela, acrescentando aqui um detalhe, tirando outro em outro lugar, ansiosos de novidades e mudanças constantes. O antigo inimigo e todos os outros espíritos malignos, que perderam sua beleza, mas não o sopro da racionalidade, por medo de seu Criador não mostram a nenhuma criatura mortal a forma de sua perdição tal como ela é. Mas com suas sugestões infundem insídias entre todos os homens, a cada um de um modo diferente, porque em todas as criaturas acham algo de sua malícia.

               Entretanto, Deus iniciou uma grande batalha contra a sua impiedade através da razão do homem que resiste aos raciocínios diabólicos e os confunde. Esta luta durará até o fim dos tempos, quando serão confundidos em tudo e por tudo, e o homem que os tiver vencido obterá como recompensa a vida eterna.”

Santa Hildegarda assim relatou sua visão do anticristo:

               "... O filho da perdição... fará morrer quem se recusar a crer nele. Ele subjugará o universo inteiro por meios diabólicos... dará a impressão de mover-se no ar, fazer descer fogo do céu, produzir relâmpagos, trovões e granizos, nivelar montanhas, secar rios, fazer desaparecer o verde das florestas e devolvê-lo a seguir. Parecerá também, à sua vontade, de tornar os homens doentes ou sãos, de exorcizar demônios, às vezes até de ressuscitar mortos, de dar vida aos cadáveres momentaneamente... Tudo quanto vive na Terra perecerá, pois o mundo sentirá debilitar as suas forças..."

 

169º - Anastácio IV - 1153 - 1154

               Papa da Igreja cristã Romana nascido no bairro romano de Suburra, que eleito Papa, apesar da avançada idade, como sucessor de Eugênio III, em um período extremamente agitado no seio da Igreja cristã, em que o povo da Cidade Eterna, liderado por Arnaldo de Brescia, não aceitava o poder do Papa sobre a cidade. Com espírito de bondade, conseguiu a pacificação nos domínios da Igreja. Filho de um popular de nome Benedetto, pouco se sabe sobre seu nascimento e sua formação, mas começou a aparecer no cenário da Igreja de Roma quando em 1130 participou ativamente da eleição Papal e se opôs ferrenhamente contra Pietro Perloni, o antipapa Anacleto II. Tinha sido nomeado Cardeal e Bispo de Sabina (1126), durante o cisma provocado pela eleição de Inocêncio II (1130), apoiado pela facção dos Frangipanes, em oposição a Anacleto II, antipapa sustentado pelos Pierleonis, apoiou o primeiro e foi nomeado Vigário para a Itália (1130-1131), o responsável pela gestão dos interesses do Pontífice em Roma, quando Inocêncio foi para Siena e, depois, para França, temeroso da hostilidade do povo da cidade. Eleito Papa, em seu breve Pontificado mostrou-se benevolente para com o povo romano, então em agitação. Confirmou São Guilherme de Yorque, na diocese de York, apesar da oposição da poderosa Ordem de Cister, e cedeu à vontade Imperial na nomeação do Bispo de Magdeburgo, em uma atitude conciliadora em relação a Frederico Barba-Ruiva, a quem prometeu coroar em troca da proteção. Investiu na restauração do Panteão de Roma. Governou apenas um ano e meio, vindo a morrer em 3 de dezembro, em Roma.

 

170º - Adriano IV - 1154 - 1159

               Papa Adriano IV, C.R.S.A, de nome Nicolau de Breakspear ou Nicholas Breakspear; inglês, nascido perto de Saint Albans, ca. 1100 — 1 de setembro de 1159, foi Papa da Igreja Católica de 4 de dezembro de 1154 até a data da sua morte. Adriano IV foi o único inglês a ocupar a cadeira Papal. Acredita-se que Nicolau nasceu na Fazenda Breakspear na paróquia de Abbots Langley em Hertfordshire e recebeu sua educação na Abbey School, St Albans (St Albans School). O seu pai, Roberto, era Sacerdote na diocese de Bath, e se tornou monge em St. Albans. Nicolau viu recusada a sua aceitação no mesmo mosteiro, tendo-lhe sido dito que teria de amadurecer e estudar para descobrir então a sua vocação. Entendeu não ter de esperar e foi para Paris e tornou-se Cônego Agostiniano em São Rufo, perto da cidade de Arles. Foi eleito seu prior e em 1137 foi escolhido por unanimidade para ser abade. Foi um abade zelosamente reformista, o que motivou queixas contra ele, enviadas a Roma. Foi ali chamado para se explicar, ficou bem visto pelo Papa Eugênio III, que o tornou Cardeal-Bispo de Albano. De 1152 a 1154, Nicolau esteve na Escandinávia como delegado Papal, dirigindo os interesses do novo Arcebispo de Trontêmio, e realizando as diligências que permitiram o reconhecimento da Velha Upsália (mais tarde transferido para Upsália) como sede do Metropolita sueco em 1164. Como compensação pela cedência territorial, o Arcebispo dinamarquês de Lund foi designado delegado e Vigário perpétuo e atribuído o título de Primaz da Dinamarca e Suécia. No seu regresso, Nicolau foi recebido com grande honra pelo Papa Anastácio IV, e após a morte deste foi eleito Papa em 4 de Dezembro de 1154. De imediato Adriano diligenciou a reposição da autoridade Papal na cidade de Roma, dominada pelos partidários de Arnaldo de Bréscia e de sua doutrina, que preconizava a mais pura pobreza clerical. Dadas as graves consequências da agitação entre as duas facções, o Papa decidiu excomungar a cidade de Roma, o que induziu o senado a render-se e desterrar o referido Arnaldo de Bréscia. Este foi finalmente entregue por Frederico I da Germânia, o Barbarossa, quando da sua coroação como Imperador, em 1155, e finalmente morto em Roma. Adriano IV mandou o Rei Henrique II da Inglaterra invadir a Irlanda. Adriano IV governou até à sua morte, em 1 de setembro de 1159. Defendeu com todos os meios a primazia do Papado sobre o Império, desafiando o Imperador Frederico Barba Ruiva. Foi este Papa que deu autorização aos templários para se instalarem no lugar de Cera que veio a dar origem ao Castelo de Ceras e mais tarde ao Castelo de Tomar.

 

171º - Alexandre III - 1159 - 1181

               Alexandre III, nascido Rolando Bandinelli (Siena, ca. 1105 - Civita Castellana, 30 de agosto de 1181), foi Papa de 20 de setembro 1159 a 30 de agosto de 1181. Da família Cerretani Bandinelli Paparoni, nasceu em Siena, ensinou direito canônico na universidade de Bolonha, onde escreveu Summa Magistri Rolandi, comentários sobre Decretum Gratiani. Em outubro de 1150 foi ordenado Deão de S. Cosme e Damião; depois Cardeal em S. Marcos. Por esta altura escreveu as suas Sentenças com base na Introdução a Teologia de Pedro Abelardo. Alexandre III foi o primeiro de muitos advogados que se tornaram Papas. Infelizmente, sua eleição provocou um cisma de vinte anos entre os que lhe eram leais e aqueles leais aos três antipapas apoiados pelo imperador alemão, Frederico Barbarossa (ou "Barba Ruiva"). Ele é também o Papa que impôs uma penitência ao rei inglês, Henrique II, pelo assassinato de Tomás Becket em 1172, e convocou, em 1179, o Terceiro Concílio de Latrão, que decretou a necessidade da maioria de dois terços de Cardeais para a eleição Papal. Serviu como Chanceler e núncio apostólico sob o antecessor, Adriano IV, e era Cardeal-Sacerdote quando o elegeram Papa. Um pequeno número de Cardeais pró-imperiais (talvez sete) votou no Cardeal Ottaviano de Monticelli, mas a maioria (é provável que 22) apoiou o Cardeal Bandinelli. Como havia um acordo de que a eleição seria unânime, iniciou-se uma briga violenta. Armados, os partidários do Cardeal Ottaviano irromperam na reunião e arrancaram o manto Papal vermelho dos ombros de Orlando; e o novo Papa teve de procurar refúgio na fortaleza do Vaticano, ao lado da Basílica de São Pedro. Os partidários de Ottaviano conduziram-no em triunfo à Basílica de Latrão. Alexandre III foi consagrado Bispo de Roma três semanas mais tarde, em 20 de setembro, em Ninfa, a sudeste de Velletri, pelo Bispo de Ostia. Ottaviano foi consagrado como Vítor IV na abadia imperial de Farfa, a nordeste de Roma, em 4 de outubro. Em consequência disso, em fevereiro de 1160, o Imperador reuniu, em Pavia, um sínodo de cerca de de cinquenta Bispos alemães e italianos, que aprovou Vítor IV e excomungou Alexandre III. O Papa já havia excomungado Vítor IV e, em 24 de março, condenou o Imperador Frederico. Em outubro, os Bispos e os priores das ordens monásticas da maioria dos países ocidentais reuniram-se em Toulouse na presença do rei Henrique II da Inglaterra e do rei Luís VII da França (que já haviam se manifestado em favor de Alexandre, no Concílio de Beauvais, em julho), ouviram argumentos a favor dos dois pretendentes ao trono Papal, declararam seu apoio a Alexandre III e condenaram Vítor IV. Devido à oposição imperial na Itália, o Papa mudou-se para a França em abril de 1162, acabando por se instalar em Sens (juntamente com sua Cúria), de 1163 a 1165. A convite do povo, voltou a Roma em novembro de 1165, mas não pôde impedir a recoroação de Frederico e a coroação de sua mulher Beatriz I da Borgonha como Imperatriz, em 1167, pelo antipapa Pascoal III (eleito, depois da morte do antipapa Vítor IV em 1164, em cerimônia realizada por dois Cardeais cismáticos, dois Bispos alemães e o prefeito de Roma). Um terceiro antipapa, Calisto III, foi eleito em 1168 e serviu até 1178, quando se submeteu a Alexandre III. Posteriormente, Alexandre III, mudou-se para Benevento. Enquanto permaneceu ali, a posição política do Papa melhorou gradativamente. Quando a liga lombarda das cidades do norte da Itália derrotou Frederico, em Legnano, em 1176, com o apoio do Papa (o que fez com que a liga desse à nova cidade o nome Alexandria, em homenagem a ele), o Imperador dispôs-se a negociar. Em Veneza, ele e o Papa concordaram que seria suspensa a excomunhão de Frederico e este, em troca, reconheceria Alexandre como Papa. Alexandre não só impôs sansões ao rei Henrique II da Inglaterra pelo assassinato de Tomás Becket, mas também confirmou o rei de Portugal em seu trono e pronunciou um interdito contra o rei da Escócia e seu reino por interferências nas nomeações eclesiásticas. De 05 a 19 de março de 1179, Alexandre III presidiu o Terceiro Concílio de Latrão, que encerrou o cisma, de forma definitiva. O concílio também decretou a necessidade da maioria de dois terços de Cardeais para a eleição de um Papa; encorajou universidades e escolas catedrais; e permitiu o castigo dos hereges (em especial dos Cathari, ou albigenses, no sul da França). Logo depois do concílio, entretanto, a comuna popular forçou o Papa a sair de Roma e, em setembro de 1179, um quarto antipapa, Inocêncio III, foi empossado e logo derrotado. Alexandre passou os dois últimos anos em diversas partes dos Estados pontifícios e morreu em 30 de agosto de 1181, em Cività Castellana, cerca de 48 km ao norte de Roma. Seu corpo foi levado de volta a Roma para o sepultamento na Basílica de Latrão, mas os cidadãos o profanaram antes. Antipapas desta época: Vítor IV (1159-1164), Pascoal III (1164-1168), Calisto III (1168-1178), Inocêncio III (1179-1180).

 

172º - Lucio III - 1181 - 1185

               Nascido em Roma, na Itália, no ano 1100, Ubaldo Allucingoli dedicou toda a sua vida à Igreja Católica e comungou do poder e da credibilidade que a instituição religiosa possuía durante a Idade Média. Com o fim do Império Romano, a Igreja Católica ocupou a lacuna de poder deixada pelos romanos e passou a ser a grande influência do mundo ocidental, estabelecendo uma dominação cultural que caracteriza a humanidade até os dias atuais. Ou seja, ser Papa era ter muitos poderes e muitas vidas nas mãos. Com o falecimento do Papa Alexandre III, Ubaldo Allucingoli foi eleito no dia primeiro de setembro de 1181 para ser seu sucessor. Na ocasião, Ubaldo já estava com 81 anos de idade, mas ainda teria fôlego para lidar com seu tumultuado Papado, adotando o nome de Lúcio III. Havia, naquele momento, constantes tumultos em Roma e muitas acusações e manifestações supostamente heréticas. Foi Lúcio III quem criou a Inquisição Episcopal, no ano 1184, para reprimir os ditos hereges. Entretanto, os tumultos em Roma forçaram o Papa a se transferir para Verona, local de onde não voltaria mais. O Papado de Lúcio III passou por um problema diplomático com Frederico Barba-Roxa, famoso Imperador da Alemanha. A situação foi amenizada quando o Papa realizou o matrimônio de Henrique, filho de Frederico, com Constancia da Sicília. A medida unificaria o Reino da Alemanha com o Reino da Sicília. Assim, atendia a interesses e pacificava um pouco o ambiente. Mas, sem dúvida, o maior desafio de seu Papado foi combater as supostas heresias que aumentavam rapidamente. Uma das situações mais emblemáticas do Papado de Lúcio III envolveu Pedro Ubaldo, um ex-banqueiro de Lyon que vivia em oração e pobreza. Ele e seus seguidores acreditavam que a salvação dependia de uma vida em pobreza, o que os levava a doar todos os seus bens. No entanto, esta postura era condenada como herética pela Igreja Católica, que intensificou o combate aos hereges. O Papa Lúcio III promulgou uma constituição para lutar contra heresias que iria abrir caminho para o futuro tribunal da Santa Inquisição. Após quatro anos de Papado, Lúcio III faleceu no dia 25 de novembro de 1185.

 

173º - Urbano III - 1185 - 1187

               O Papa Urbano III, nascido Umberto Crivelli; Cuggiono, 1120 – Ferrara, 20 de outubro de 1187, foi eleito em 25 de Novembro de 1185. Foi elevado Papa com a promessa de pacificar a cidade de Roma. Crivelli nasceu em Cuggiono como filho de Guala Crivelli e tinha quatro irmãos: Pietro, Domenico, Pastore e Guala. Estudou em Bolonha. Em 1173, Crivelli foi feito Cardeal pelo Papa Alexandre III. Seu título original é desconhecido, mas ele optou por ser o Cardeal-Sacerdote de San Lorenzo in Lucina em 1182. Lúcio o nomeou Arcebispo de Milão em 1185. Lúcio III morreu em 25 de novembro de 1185, e neste mesmo dia o Cardeal Crivelli foi eleito. A pressa foi provavelmente devido ao medo da interferência imperial. Urbano III assumiu vigorosamente as brigas de seu antecessor com o Sacro Imperador Romano Frederico I Barbarossa, incluindo a disputa permanente sobre a disposição dos territórios da condessa Matilda da Toscana. Isso foi amargurado pela inimizade pessoal, pois no saque de Milão em 1162 o Imperador fez com que vários parentes do Papa fossem proscritos ou mutilados. Mesmo após sua elevação ao Papado, Urbano III continuou a ocupar o Arcebispado de Milão, e nesta capacidade recusou-se a coroar como rei da Itália o filho de Frederico I, Henrique, que havia se casado com Constança, herdeira do reino da Sicília. Por esse casamento/vínculo, o Papado perdeu aquele apoio normando no qual por tanto tempo contava em suas disputas com o Imperador. Urbano se esforçou para trazer a paz entre a Inglaterra e a França e, em 23 de junho de 1187, seus legados por ameaças de excomunhão impediram uma batalha campal entre os exércitos dos reis rivais perto de Châteauroux e trouxeram uma trégua de dois anos. Enquanto Henrique no sul cooperava com o Senado rebelde de Roma, seu pai Frederico bloqueou as passagens dos Alpes e cortou todas as comunicações entre o Papa, então morando em Verona, e seus adeptos alemães. Urbano III resolveu então excomungar Frederico I, mas os veroneses protestaram contra tal procedimento dentro de seus muros. Ele, portanto, retirou-se para Ferrara, mas morreu antes que pudesse dar efeito às suas intenções. Ele foi sucedido por Gregório VIII. De acordo com os cronistas Ernoul e Benedict de Peterborough, Urbano III morreu de choque e tristeza depois que Joscius, Arcebispo de Tiro trouxe-lhe a notícia da derrota cristã na Batalha de Hatim. Também é comumente afirmado que a morte de Urbano foi causada pela notícia da queda de Jerusalém, mas Guilherme de Newburgh nos assegura que o relatório do desastre de Hattin só chegou à Santa Sé depois da eleição de Gregório VIII, por isso é pouco provável que Urbano III tenha ouvido falar da rendição da Cidade Santa, que ocorreu em 2 de outubro.

 

174º - Gregório VIII - 1187

               Gregório VIII (Benevento, 1108 — Pisa, 17 de dezembro de 1187), Papa da Igreja Católica Romana, eleito em Ferrara a 21 de outubro de 1187. Nascido Alberto di Morra, em Benevento, cerca de 1110, teve um dos mais curtos pontificados da história, governando a Igreja por apenas 56 dias. Faleceu a 17 de dezembro de 1187, na cidade de Pisa, onde se encontrava à participar nos preparativos para a organização da Terceira Cruzada em reação ao desastre de Hatim e à conquista de Jerusalém pelas tropas de Saladino ocorrida a 2 de outubro daquele ano. Era monge beneditino.

 

175º - Clemente III - 1187 - 1191

               Clemente III (Roma, ca. 1130 — Roma, 1191) foi Papa da Igreja Católica Romana, eleito a 19 de dezembro de 1187. Clemente III era Paolo Scolari, Cardeal-Bispo de Palestrina, nascido em Roma cerca de 1130. Organizou a Terceira Cruzada, congregando a maior parte dos príncipes cristãos em torno do projeto de reconquista da Terra Santa. Governou a Igreja até o seu falecimento a 20 de março de 1191. Clemente III foi eleito Papa para suceder Gregório VIII, falecido dois dias antes e apenas dois meses após a eleição, numa sequência de Pontificados curtos que levaram a que entre 1181 e 1198 tivessem passado pelo Trono de Pedro cinco Papas. A escolha de Paolo Scolari para Pontífice, apenas dois dias após a morte em Pisa do seu antecessor, foi bem acolhida pelo povo de Roma. Conhecido pelo seu carácter conciliador e sendo o primeiro nascido em Roma a ocupar o Papado desde a rebelião de Arnoldo de Brescia, a sua eleição foi encarada como uma oportunidade de reconciliação e de pacificação que permitisse o retorno pacífico do Papado à cidade. Após uma breve negociação, foi assinado um tratado formal conciliando a soberania Papal com as liberdades municipais entretanto conquistadas, e em Fevereiro de 1188 o Papa entrou na cidade de Roma com o aplauso do povo, instalando-se sem oposição no Palácio Laterano. Ficou assim sanado mais um episódio da recorrente contestação ao poder temporal do Papa na cidade de Roma. Dando continuação à política dos seus imediatos antecessores, Clemente III empenhou-se na realização da Terceira Cruzada, contra o Islão na Terra Santa, organizando uma impressionante expedição congregando Príncipes, nobres e soldados de toda a cristandade. Através de uma intensa atividade diplomática, conseguiu impor uma trégua generalizada nas lutas entre os estados cristãos, criando as condições para a organização da almejada cruzada, concentrando os esforços bélicos da cristandade em torno do objectivo da reconquista do Santo Sepulcro em Jerusalém. Um feito notável da diplomacia de Clemente III, a Terceira Cruzada conseguiu congregar Filipe Augusto de França, Frederico Barba Ruiva do Sacro Império Romano-Germânico e Ricardo Coração de Leão de Inglaterra. O envolvimento de tão importantes personalidades levou a que fosse denominada a Cruzada dos Reis. Clemente III faleceu pouco antes da conquista de Acre, não assistindo aos sucessivos desastres na Palestina, a derrota da cruzada e ao desmoronar do sonho cristão da reconquista de Jerusalém. A morte de Guilherme II da Sicília sem sucessão clara veio desencadear novo conflito entre o Papado e a casa de Hohenstaufen quando Henrique VI, filho e sucessor de Barba Ruiva, reclamou o trono em nome de sua mulher Constança de Altavila. O Papa, cuja soberania ficava ameaçada com a incorporação do reino das duas Sicílias ao Sacro Império Romano Germânico, opôs-se tenazmente, no que foi apoiado pela nobreza e povo, ciosos da sua independência e temerosos da submissão à um imperador visto como estrangeiro. Com o apoio e investidura Papal, Tancredo de Lecce, filho ilegítimo do falecido rei, foi aclamado. Tal levou à invasão pelas tropas imperiais de Henrique VI. No auge desta disputa, Clemente III faleceu, sendo sucedido por Celestino III. Apesar das lutas que marcaram o seu termo, o Pontificado de Clemente III, apesar de curto, foi caracterizado por uma forte ação diplomática, que se refletiu na organização da Terceira Cruzada, e pelo fortalecimento da influência Papal sobre a cidade de Roma e sobre a igreja europeia. Devem-se a Clemente III a separação da Igreja da Escócia da sé metropolitana de York e as canonizações de Otão de Bamberga e de Estêvão de Thiers.

 

176º - Celestino III - 1191 - 1198

               Papa da Igreja cristã Romana nascido em Roma, eleito Papa em 1191, para suceder Clemente III, e que durante todo o seu Pontificado estabeleceu relações muito tensas com o Imperador germânico Henrique VI, que ele mesmo coroara. Discípulo e defensor de Abelardo no Concílio de Sens (1140), posteriormente foi eleito Cardeal e juntou-se, como legado, à corte do Imperador Frederico I Barba-Ruiva. Quando Henrique VI conquistou a Normandia e alguns territórios pertencentes à Igreja, o Papa foi pressionado pelo clero romano, mas se recusou a excomungá-lo. Essa atitude valeu-lhe a hostilidade de seus colaboradores, pois, ao contrário, teve um comportamento muito severo diante da anulação do divórcio que os Bispos haviam concedido a Filipe Augusto da França, por causa de suas convicções em relação ao casamento. Envolto em problemas internos decorrentes de suas próprias decisões, sentiu-se desconfortável no Trono de São Pedro, mas os Cardeais desaprovaram a sua tentativa de abdicar para, dessa forma, indicar um seu sucessor. Aprovou a Ordem dos Cavaleiros Teutônicos, cujo fim era defender os peregrinos da Terra Santa e defendeu a indissolubilidade do matrimônio. Morreu em 8 de janeiro, em Roma.

               A Ordem dos Cavaleiros Teutônicos de Santa Maria de Jerusalém, conhecida apenas como Ordem Teutónica, foi uma ordem militar cruzada vinculada à Igreja Católica por votos religiosos pelo Papa Clemente III. Foi formada no ano de 1190, em São João de Acre, no Reino de Jerusalém, para auxiliar os germânicos feridos nas Cruzadas. Os seus membros usavam sobrevestes brancas com uma cruz negra e tinham por norte o lema: Ajudar, defender, curar. Tiveram a sua sede em Acre, uma fortaleza construída nos tempos do Reino de Jerusalém (1099-1291), durante as Cruzadas, cujos vestígios se conservam no norte de Israel. A Ordem Teutónica, ao lado da Ordem dos Templários e da Ordem dos Hospitalários, foi uma das mais poderosas e influentes da Europa. A maioria dos seus membros pertencia à nobreza, inclusive a família real prussiana. Os soberanos e a nobreza dos estados antecessores à atual Alemanha, inclusive a família soberana do Império Alemão (1871-1918) e do Reino da Prússia (1525-1947), os Hohenzollern, eram membros da ordem.

 

177º - Inocêncio III - 1198 - 1216

               O Papa Inocêncio III, nascido Lottario dei Conti di Segni, isto é, Lotário dos Condes de Segni ou Lotário Conti (Anagni, 1160/1161 — Perúgia, 16 de julho de 1216), foi Papa da Igreja Católica de 22 de fevereiro de 1198 até a data da sua morte. Lotário nasceu na família nobre dos Condes de Segni, feudo localizado nos Estados Papais, e estudou nas mais importantes universidades de sua época: teologia na Universidade de Paris e direito na Universidade de Bolonha. Aos vinte e um anos tornou-se um Clérigo importante em Roma, e escreveu dois livros notáveis: De Miseria Condicionis Humane (“Sobre a miséria da condição humana”) e De missarum mysteriis (“Sobre o mistério da missa”). Sendo considerado jovem, forte, erudito, inteligente e hábil foi eleito Papa em 1198, com apenas trinta e sete ou trinta e oito anos de idade. O século XIII foi uma fase privilegiada da história da Igreja, marcada por cinco personagens de grande vulto: o Papa Inocêncio III (1198-1216), o rei São Luís da França (1226-70), o teólogo doutor São Tomás de Aquino (1225-1274), e dois frades: São Francisco de Assis (1181-1226) e São Domingos de Gusmão 1170-1234). O pontificado de Inocêncio III, foi o mais bem sucedido da Idade Média. Lotário de Segnei era filho de família nobre da Itália, nascido em 1161 e dotado de muito talento. Estudou em Roma e Bolonha Teologia, Filosofia e Direito. Seu tio Clemente III nomeou-o Cardeal-diácono em 1189. Afastou-se, porém, dos negócios públicos da Igreja para se dedicar à reflexão; donde resultaram diversas obras, principalmente de ascética; sobressai o seu tratado “Sobre o Sagrado Mistério do Altar”. Aos 37 anos de idade foi unanimemente eleito Papa. No dia dos funerais de seu antecessor Celestino III, foi arrancado do seu recolhimento pelos seus admiradores. Era o membro mais jovem do colégio Cardinalício. A eleição unânime e tão rápida era testemunho da confiança que nele depositavam o Clero e os fiéis. Sendo apenas diácono, e ordenado presbítero aos 21/02 e sagrado Bispo de Roma (Papa) aos 22/02. Embora a sua idade juvenil surpreendesse a muitos, Inocêncio revelou o entusiasmo, a energia e a capacidade de trabalho da juventude assim como a prudência, a sabedoria, a ciência teológica e jurídica de experimentado homem da Igreja. As circunstâncias em que assumia o governo da Igreja, eram difíceis; a disciplina interior e a ortodoxia eram abaladas pelos cátaros ou albigenses dualistas; os Imperadores germânicos ameaçavam a liberdade da Igreja e o Patrimônio de São Pedro, pois desejavam cercar Roma pelo Norte e pelo Sul (tinham um ponto de apoio na Sicília); a Terra Santa era ocupada pelos muçulmanos. Inocêncio soube lutar com justiça e dignidade, levando ao auge a obra concebida por Gregório VII em prol da liberdade da Igreja. Estava convencido de que a principal condição para a liberdade da Igreja era emancipá-la do poder imperial. Ora o Imperador Henrique VI morreu em 1198, ano da eleição do Papa; redigia um testamento que fazia grandes concessões ao Papa, a fim de obter para seu filhinho Frederico II Rogério, nascido em 1194, a coroa Imperial e o título de rei da Sicília. Logo após a morte do Imperador, Constança, a Imperatriz viúva, renunciou a muitos direitos sobre a Igreja, que Henrique e seus antecessores tinham reivindicado para si; a Imperatriz e seu filhinho se reconheciam vassalos do Papa. Ao morrer, em novembro de 1198, Constança pediu a Inocêncio que assumisse a tutela e a regência sobre seu filho Frederico até a maioridade deste; Inocêncio então seria o administrador do reino da Sicília (que pertencia aos Imperadores germânicos); por dez anos, o Papa administrou as funções assim confiadas para o bem do Príncipe, com sabedoria e desprendimento; o próprio Frederico, declarado de maioridade por Inocêncio aos 14 anos em 1208, proclamou ser o Papa seu protetor e benfeitor, embora mais tarde este monarca se revelasse pouco fiel ao Papa e às suas diretrizes. Já estes fatos asseguravam a Inocêncio uma posição temporal nunca vista anteriormente.

               Na Alemanha, por exemplo, o partido dos Staufen – com seu pretendente Filipe da Suábia – e o partido dos Guelfos – com seu candidato Oto de Braunschweig disputavam entre si o Trono Real. Solicitado para fazer a arbitragem, o Papa preferiu deixar que os interessados se entendessem entre si. Após três anos, porém, resolveu intervir dando razão a Oto, que se tornou o rei dos germanos; infelizmente, porém, este monarca não cumpriu seus propósitos de respeito à Igreja; pelo que foi excomungado em 1210. Os Príncipes alemães, então, abandonaram Oto e aclamaram Frederico II como rei; Inocêncio deixou partir para a Alemanha o seu antigo pupilo, que também não manteve promessas feitas ao Pontífice a respeito dos direitos da Igreja. Na Inglaterra, de 1199 a 1216 reinou João sem Terra, senhor ambicioso. Em 1207 recusou-se a reconhecer o novo Bispo de Cantuária, Estêvão Langton, eleito por recomendação do Papa. Já que as admoestações ficavam sem resultado, Inocêncio lançou um interdito sobre a Inglaterra (1208); o rei revidou com violência contra igrejas e clérigos; por isto foi excomungado (1209) e deposto do Trono em 1212; João, por prudência, resolveu submeter-se ao Papa; em 1213 prometeu reparar os males cometidos e reconhecer Estêvão Langton. Mais: colocou a Inglaterra e a Irlanda sob a proteção do Papa, na qualidade de feudos. Em consequência, foi absolvido da excomunhão em 1213, ao passo que o interdito só foi levantado em 1214 por causa de dificuldades na restituição dos bens usurpados. Por essa ocasião, Eclesiásticos e leigos da Inglaterra se reuniram para proclamar uma série de reivindicações, que restringiam o poder do rei na administração dos feudos e garantiam maior liberdade aos cidadãos. Tal é a famosa Magna Charta Libertatum, que constava de 63 artigos e se tornou um dos primeiros modelos de Constituições democráticas. Com a França Inocêncio teve que usar de energia, não por motivos políticos, mas para defender a moral cristã. O rei Filipe Augusto (1180-1223) tinha esposado a Princesa Ingeburga, que, depois do casamento, ele repudiou em favor da Condessa Inês de Merano (alemã) já que o rei não se rendia às admoestações Pontifícias; Inocêncio lançou o interdito sobre o reino da França (1200). Em consequência, Filipe em 1203 reassumiu Ingeburga como esposa e rainha, mas só depois que Inês morreu (em 1201) e após muito relutar contra o cumprimento de sua promessa. Com os reis Pedro II da Aragônia (Espanha) e Afonso IX de Leão (Espanha) o Papa também teve divergências por motivos matrimoniais: Pedro II queria separar-se de sua legítima esposa, Maria de Montpellier, e Afonso IX queria casar-se com uma sobrinha sua. Por fim, Pedro II acabou reconhecendo-se vassalo do Papa, como João sem Terra. Ao rei Sancho I de Portugal (1185-1211) Inocêncio infligiu a excomunhão por ter violado a liberdade da Igreja. Ainda mais: com os soberanos da Boêmia, da Bulgária, da Sérbia, da Hungria, da Albânia, da Polônia, da Suécia, da Dinamarca, o Pontífice teve relacionamento mais ou menos intenso, que visava a garantir a liberdade da Igreja, a boa disciplina do Clero e dos fiéis naqueles países; combateu os abusos tanto dos grandes como dos pequenos com igual destemor. Até o Oriente foi objeto dos cuidados de Inocêncio. A quarta cruzada foi essencialmente obra deste Papa; erigiu, com sede em Constantinopla, um Império e um Patriarcado latinos no Oriente em 1204.

               Digno fecho do Pontificado de Inocêncio III foi o Concílio do Latrão IV, reunido em três sessões aos 11, 20 e 30 de novembro de 1215. Foi o maior e mais imponente Concílio da idade Média, frequentado por mais de 1200 prelados (412 Bispos, 800 Abades e Priores grande número de representantes de Bispos e de capítulos catedrais) e por quase todos os Príncipes cristãos (Frederico II, Henrique imperador latino de Constantinopla, os reis da França, da Inglaterra, de Jerusalém, de Aragão, da Hungria). Tinha em vista tríplice finalidade: condenar as heresias (especialmente a cátara), sanar e favorecer a disciplina eclesiástica e promover nova expedição contra os turcos. Inocêncio abriu o Concílio em famosa oração, na qual parafraseava as palavras de Lc 22,15: dizia quanto desejara celebrar essa Páscoa antes de morrer, a fim de realizar um tríplice trânsito (= Páscoa): corporal ou local, do Ocidente para o Oriente (a fim de libertar Jerusalém); espiritual, do estado dos vícios ao das virtudes, ou seja, a reforma da disciplina da Igreja; eterno, da vida temporal para a vida eterna e bem-aventurada. Este Concílio baixou decretos importantes na vida da Igreja: comungar ao menos na Páscoa da Ressurreição (os medievais eram certamente muito devotos, mas, por motivo de respeito ao “tremendo mistério” da Eucaristia, pouco se aproximavam da Comunhão); confessar-se ao menos uma vez por ano; legislação precisa sobre o hábito clerical e a pobreza dos monges, sobre o rito do casamento, tido como algo muito santo. Foi o Concílio do Latrão IV que, pela primeira vez, usou o termo “transubstanciação” na linguagem oficial da Igreja, para designar teologicamente algo que desde o século I estava na crença dos cristãos: a conversão do pão e do vinho no corpo e sangue do Senhor (cf. Jo 6,51-58; lcor 11,23-29; Mt 26,26-29 par.) Pouco depois do Concílio, Inocêncio III, de viagem para a Lombardia, foi colhido por febre maligna, que o vitimou em 16 de julho de 1216.

               O Pontificado de Inocêncio III representa o apogeu do Papado na Idade Média; muitas das suas manifestações não seriam entendidas em nossos dias, nem podem ser reproduzidas, mas hão de ser consideradas no contexto da respectiva época, que tendia a realizar o ideal da Cidade de Deus mediante a estreita colaboração do Papado e do Império sob a hegemonia daquele. Pela primeira vez na história, o Papa, na pessoa de Inocêncio III se denominou “Vigário de Deus” na terra. Até então os Pontífices Romanos se haviam designado “vigários de Pedro”; este último título não se encontra na coleção de Bulas de Inocêncio III. O clero espontaneamente recorria a Inocêncio para resolver problemas administrativos ou pastorais. Assim dava-se uma centralização progressiva do governo da Igreja, que na época podia acarretar inconvenientes, pois havia dificuldades de comunicação e a Cúria Romana estava ainda em fase de organização e, portanto, de trabalho lento. Perante os soberanos deste mundo, o Papa era o “representante de Cristo, ou seja, do Rei dos reis e Senhor dos senhores” (cf. Ap 19,16); mais de vinte vezes ocorre esta fórmula nos documentos do Pontífice. Daí se seguia que o poder do Império devia estar subordinado ao Sacerdócio, ao menos no foro ético ou na medida em que o comportamento do Imperador estava sujeito às normas da moralidade. A Igreja seria o “luzeiro maior”, que ilumina o dia, ao passo que o Estado seria o “luzeiro menor”, que ilumina a noite (cf. Gn 1,16). Por isto Inocêncio chegava a dizer que é o Papa quem confere e tira as coroas dos soberanos. Estas ideias não deixaram de suscitar protestos mesmo na sua época; assim os partidários de Filipe da Suábia (os Staufen) reclamavam contra a intervenção pontifícia na eleição do rei da Alemanha, afirmando a separação nítida do Sacerdócio e do Império. Inocêncio podia ignorar esses protestos, pois o século XIII acariciava, apesar de tudo, o ideal da teocracia (ou do regime de Deus). Em breve, o ambiente estaria mudado, pois, quando Bonifácio VIII (1294-1303) quis repetir as dizeres e as atitudes de Inocêncio III perante Filipe IV o Belo da França, foi desrespeitado e perseguido pelo monarca. Embora exercesse função de grande autoridade, Inocêncio III cultivou as virtudes, entre as quais a simplicidade e a pobreza pessoal: cortou gastos inúteis, dispensou a maioria dos porteiros e servidores que o cercavam, a fim de que três vezes por semana qualquer pessoa o pudesse abordar; substituiu vasos e talheres de metal por outros de vidro e madeira; refreou a avareza e a ambição dos cortesões, que procuravam gorjetas no exercício de suas funções. Foi também o amigo dos frades mendicantes, especialmente de S. Francisco de Assis, que “esposara a Dama Pobreza” e cuja Regra Inocêncio III aprovou oralmente. O vulto deste Pontífice merece a reverência dos pósteros, embora tenha sido fortemente criticado por haver sido aparentemente a antítese do “Poverello de Assis”.

 

177 . 1 - Sâo Domingos de Gusmão

               São Domingos de Gusmão (Caleruega, Reino de Castela, 24 de Junho de 1170 — Bolonha, 6 de Agosto de 1221) foi um frade e Santo católico fundador da Ordem dos Pregadores, cujos membros são conhecidos como Frades Dominicanos. Filho de Joana de Aza e Félix de Gusmão, Domingos nasceu na zona de fronteira do Reino de Castela. Seus pais pertenciam à pequena nobreza guerreira, encarregada de assegurar as praças militares da fronteira com o sul dominado ainda pelos muçulmanos. Domingos, que teve desde cedo inclinação para a vida religiosa, vai em 1189 estudar em Palência, tornando-se membro do cabido da sua diocese natal, Osma, em 1196, após a conclusão dos estudos. Em 1203, o rei de Castela solicita ao Bispo de Osma que negocie e traga uma Princesa da Dinamarca para se tornar esposa do seu filho. Domingos, então, partiu como companheiro de viagem de seu Bispo, Diogo. Durante a viagem, Domingos ficou para sempre impressionado com o desconhecimento da doutrina cristã dos povos da Europa do norte, tornando-se-lhe evidente a necessidade de evangelizar aqueles povos, em especial os Cumanos. Em 1205, Domingos e Diogo, para conclusão do objetivo inicial, realizaram nova missão ao norte da Europa, tendo também efetuado uma peregrinação a Roma e a Cister. No sul da França, junto a Montpellier, encontraram legados do Papa que pregavam contra as heresias dos Albigenses, ou Cátaros. Esse grupo afirmava que dois princípios dividiam o Universo: o princípio bom, espiritual, e o princípio mau, material. O homem era a junção dos dois princípios, um anjo aprisionado num corpo. O dever do homem seria aproximar-se da verdade tendo como fator mediante a razão. De 1119, quando a heresia foi condenada no Concílio de Toulouse, até 1179, Roma contentou-se em enviar pregadores para a região, sem obter muito sucesso. Somente em 1209, após campanha militar de 20 anos, iniciada pela Igreja Católica, foram os cátaros quase que totalmente eliminados. Diogo e Domingos, perante a evidência das dificuldades sentidas na missão dos legados Papais, convencem-nos a adotar uma estratégia de simplicidade ao estilo apostólico e mendicante, pois que os legados, até aí, deslocavam-se com grande pompa, criados e riquezas. Os legados deixam-se convencer, despachando para casa tudo o que fosse supérfluo, na condição de que Diogo e Domingos os acompanhassem e os dirigissem na missão, que esses fizeram. O Papa Inocêncio III, descobrindo virtudes nessa nova forma de pregação, aprova-a e manda Diogo e Domingos para a “Santa pregação”. Diogo, sendo Bispo, por razão das suas responsabilidades e não podendo ficar muito mais tempo naquela região, regressou à sua diocese, falecendo pouco tempo depois. Domingos continuou na região, muitas vezes sozinho.

               Em 1206, um grupo de mulheres convertidas do catarismo por Domingos pede-lhe apoio e ele encontra uma casa para elas morarem em Prouille, dá-lhes uma regra de vida simples, de oração e reclusão, no que veio a ser a primeira comunidade religiosa dominicana de monjas de clausura. Domingos encarava essa comunidade como “ponto de apoio à Santa pregação”, pois que aquelas religiosas, por intermédio da oração, seriam o apoio dos pregadores. Em 1208, encontra-se completamente sozinho na missão de pregar pelas localidades do sul de França. Em 1210, está na região de Toulouse, palco de violentos combates entre senhores feudais e heréticos cátaros. Em 1214, está em Carcassonne onde assiste a duras batalhas entre as duas partes e onde começa a juntar-se um pequeno grupo de companheiros que com ele adotam a vida de pregadores itinerantes. No mesmo ano, torna-se Pároco de Fanjeaux, localidade junto a Prouille e à sua comunidade feminina. Em 1215, em Toulouse, adota uma regra de vida para a sua comunidade de pregadores, obtendo a aprovação do Bispo local. No entanto, seu objetivo era criar uma ordem religiosa que não ficasse restrita a um local, a uma diocese, mas sim que tivesse um mandato geral, por forma a poder atuar em todos os territórios onde fosse necessária a evangelização. Dirige-se nesse mesmo ano a Roma, onde decorria o Concílio de Latrão, por forma a obter o reconhecimento da sua Ordem. No entanto, o concílio, perante tantos e diferentes novos movimentos que surgiram um pouco por todo lado, e por forma a evitar a anarquia, decide proibir que sejam aceites novas ordens religiosas. Aconselhado pelo Papa, e de regresso a Toulouse, Domingos e os seus companheiros estudam as várias Regras de vida religiosa já existentes e optam pela Regra de Santo Agostinho. Entretanto, o Papa Inocêncio III morre e Honório III torna-se Papa, sendo um admirador e amigo de Domingos e dos seus pregadores. Em 1216, Domingos volta a Roma com a sua Regra e a seu pedido, o Papa pede à Universidade de Paris o envio para Toulouse de alguns professores destinados ao ensino e à pregação. Entretanto, o Papa confirma a regra da Ordem dos Pregadores como religiosos “totalmente dedicados ao anúncio da Palavra de Deus”. Logo após o reconhecimento da Ordem, Domingos envia os seus primeiros discípulos, dois a dois, a fundar novas comunidades em Paris, Bolonha, Roma e a Espanha. Domingos acreditava que apenas o estudo profundo da Bíblia poderia dar os meios necessários para uma pregação eficaz. Assim, envia os seus irmãos para as principais cidades universitárias do seu tempo, por forma a não só adquirem os conhecimentos necessários, como para agirem e recrutarem novos membros entre as camadas estudantis e intelectuais do seu tempo.

 

177 . 2 - Aparição de Nossa Senhora em Prouile – França - Nossa Senhora do Rosário

               Nossa Senhora do Rosário ou do Santíssimo Rosário é um título atribuído a Nossa Senhora devido a sua aparição à São Domingos de Gusmão em 1214 na Igreja do Mosteiro de Prouille, no qual a Mãe de Jesus entrega o rosário ao frei dominicano. O Frei Domingos de Gusmão passava por momentos difíceis e em uma de suas orações e momentos de penitência em reparação aos pecados dos homens, na cidade de Toulouse na França, quase sem forças após ter ficados três dias e três noites sem comer, para aplacar a cólera divina, a Virgem Maria lhe parece. Com uma voz materna e delicada diz: Sabes tu, meu querido Domingos, de que arma se serviu a Santíssima Trindade para reformar o mundo? E Domingos lhe responde: Vós o sabeis melhor que eu, porque depois de vosso Filho, Jesus Cristo, fostes o principal instrumento de nossa Salvação. E Nossa Senhora lhe responde: Sabei que a peça principal da bateria foi a saudação angélica, que é o fundamento do Novo Testamento; e, portanto, se queres ganhar para Deus esses corações endurecidos, reza o meu saltério. Após a aparição mariana, São Domingos de Gusmão entrou na Catedral de Toulouse para reunir e falar com os fiéis, de repente os sinos começaram a tocar sem nenhuma intervenção humana. Quando São Domingos começou a pregar houve uma forte ventania, tremor de terra, o sol velou-se e o céu foi cortado por raios. Uma imagem de Nossa Senhora levantou três vezes os braços pedindo justiça à Deus para aqueles que não recorressem a Ele ou não se arrependessem de seus pecados. São Domingos imediatamente começou a rezar o Santo Rosário, e por fim, cessou a tormenta. Após o ocorrido, São Domingos pôde continuar o seu sermão tranquilamente e o fez com tal zelo e ardor nas palavras que os habitantes da cidade abraçaram a devoção ao Rosário da Virgem da Maria. Em pouco tempo, observou-se que a população da cidade se converteu à fé, deixando as práticas de pecado de lado. São Domingos, após a aparição e ter recebido das mãos de Nossa Senhora o Santo Rosário, tornou-se ele próprio o grande propagador dessa devoção por volta do século XIII. A Igreja lhe conferiu o título de “Apóstolo do Santo Rosário”. Isso serviu para combater os hereges que desafiavam a Igreja Católica e que cresciam em toda a França. Em 1218 Domingos está em Roma, a visitar as novas casas, dirigindo-se depois para a Península Ibérica onde um dos seus primeiros companheiros, o português Soeiro Gomes tinha fundado algumas casas. No principio de 1219, Domingos vai a Paris e posteriormente volta a Itália. Em 1220 reune em Bolonha o primeiro Capítulo da Ordem, fazendo-se algumas alteração às respectivas constituições canônicas, estando presentes dezenas de frades vindos de muitos pontos distantes da Europa. É adotado o modelo de governo democrático, pelo qual todos os superiores de casas são eleitos por todos os membros da comunidade. Em 1221 funda em Roma o convento de monjas de São Sisto e realiza o segundo Capítulo da Ordem no qual esta passou a estar organizada em províncias. O modelo democrático estende-se a toda a Ordem, mediante o qual para cada Capítulo Geral participam por direito os Priores Provinciais e delegados eleitos por todas as comunidades, sendo que o Mestre-geral da Ordem dos Pregadores é também eleito. São enviados irmãos pregadores para Inglaterra, Escandinávia, Polônia, Hungria e Alemanha. Completamente desgastado pelo esforço, morre em 6 de Agosto em Bolonha. É canonizado em 1234.

 

177 . 3 - São Francisco de Assis

               São Francisco de Assis nasceu em Assis, Itália, em 1182. Era filho de Pedro Bernardone, um rico comerciante, e Pia, de família nobre da Provença.  Na juventude, Francisco era muito rico e esbanjava dinheiro com ostentações. Porém, os negócios de seu pai não lhe despertaram interesse, muito menos os estudos. O que ele queria mesmo era se divertir. Porém, São Boaventura, seu contemporâneo, escreveu sobre ele: “Mas, com o auxílio divino, jamais se deixou levar pelo ardor das paixões que dominavam os jovens de sua companhia”. Na juventude de Francisco, por volta de seus vinte anos, uma guerra começou entre as cidades italianas chamadas Perugia e Assis. Ele queria combater em Espoleto, entre Assis e Roma, mas caiu enfermo. Durante a doença, Francisco ouviu uma voz sobrenatural: “Francisco, o que é mais importante, servir ao Senhor ou servir ao servo?” Servir ao Senhor, é claro. Respondeu o jovem. “Então, por que te alistas nas fileiras do servo?” Senhor, o que quereis que eu faça? “Volta a Assis e ali te será dito, diz a Voz”.

               Pouco a pouco, com muita oração, Francisco sentiu em seu coração a necessidade de vender seus bens e “comprar a pérola preciosa” sobre a qual ele lera no Evangelho. Certa vez, ao encontrar um leproso, apesar da repulsa natural, venceu sua vontade e beijou o doente. Foi um gesto movido pelo Espírito Santo. A partir desse momento, ele passou a fazer visitas e a servir aos doentes que sem encontravam nos hospitais. Aos pobres, presenteava com suas próprias roupas e também com o dinheiro que tivesse no momento.

               Num dia simples, mas muito especial, num momento em que Francisco rezava sozinho na Igreja de São Damião, em Assis, ele sentiu que o crucifixo falava com ele, repetindo por três vezes a frase que ficou famosa: “Francisco, repara minha casa, pois olhas que está em ruínas”. O Santo vendeu tudo o que tinha e levou o dinheiro ao padre da Igreja de São Damião, e pediu permissão para viver com ele. Francisco tinha vinte e cinco anos. Pedro Bernardone, ao saber o que seu filho tinha feito, foi buscá-lo indignado, levou-o para casa, bateu nele e acorrentou-o pelos pés. A mãe, porém, o libertou na ausência do marido, e o jovem retornou a São Damião. Seu pai foi de novo buscá-lo, mandou que ele voltasse para casa ou que renunciasse à sua herança. Francisco então renunciou a toda a herança e disse: “As roupas que levo pertencem também a meu pai, tenho que devolvê-las”. Em seguida se desnudou e entregou suas roupas a seu pai, dizendo-lhe: “Até agora tu tem sido meu pai na terra, mas agora poderei dizer: ‘Pai nosso, que estais nos céus”. Para reparar a Igreja de São Damião, Francisco pedia esmola em Assis. Terminado esse trabalho, começou reformar a Igreja de São Pedro. Depois, ele retirou-se para morar numa capela com o nome de Porciúncula. Ela fazia parte da abadia de Monte Subasio, cuidada pelos beneditinos. Ali o céu lhe mostrou o que realmente esperava dele. O trecho do Evangelho da Missa daquele dia dizia: “Ide a pregar, dizendo: o Reino de Deus tinha chegado. Dai gratuitamente o que haveis recebido gratuitamente. Não possuas ouro, nem duas túnicas, nem sandálias…” A estas palavras, Francisco tirou suas sandálias, seu cinturão e ficou somente com a túnica.

Milagres de São Francisco de Assis

               Deus lhe concedeu o dom da Profecia e o dos milagres. Quando Francisco pedia esmolas com o fim de restaurar a Igreja de São Damião, ele dizia: “Um dia haverá ali um convento de religiosas, em cujo nome se glorificará o Senhor e a Igreja.” A Profecia se confirmou cinco anos depois com Santa Clara e suas religiosas(Clarissas). Ao curar, com um beijo, o câncer que havia desfigurado o rosto de um homem, São Boaventura comentou com São Francisco de Assis: “Não se há que admirar mais o beijo do que o milagre?”

Fundação da Ordem dos Frades Menores (O.F.M.)

               Francisco começou a anunciar a verdade, no ardor do Espírito de Cristo. Convidou outros a se associarem a ele na busca da perfeita santidade, insistindo para que levassem uma vida de penitência. Alguns começaram a praticar a penitência e em seguida se associaram a ele, partilhando a mesma vida. O humilde São Francisco de Assis decidiu que eles se chamariam Frades Menores. Surgiram assim os primeiros 12 discípulos que, segundo registram alguns documentos, “foram homens de tão grande santidade que, desde os Apóstolos até hoje, não viu o mundo homens tão maravilhosos e Santos”. O próprio Francisco disse em testamento: “Aqueles que vinham abraçar esta vida, distribuíam aos pobres tudo o que tinham. Contentavam-se só com uma túnica, uma corda e um par de calções, e não queriam mais nada”. Os novos apóstolos reuniram-se em torno da pequena igreja da Porciúncula, ou Santa Maria dos Anjos, que passou a ser o berço da Ordem.

A nova ordem religiosa de São Francisco de Assis

               Em 1210, quando o grupo contava com doze membros, São Francisco de Assis redigiu uma regra pequena e informal. Esta regra era, na sua maioria, os conselhos de Jesus para que possamos alcançar a perfeição. Com ela foram a Roma apresentá-la ao Sumo Pontífice. Lá, porém, relutavam em aprovar a nova comunidade. Eles achavam que o ideal de Francisco era muito rígido a respeito da pobreza. Por fim, porém, um Cardeal afirmou: “Não podemos proibir que vivam como Cristo mandou no Evangelho”. Receberam a aprovação e voltaram a Assis, vivendo na pobreza, em oração, em Santa alegria e grande fraternidade, junto a Igreja da Porciúncula. Mais tarde, Inocêncio III mandou chamar São Francisco de Assis e aprovou a regra verbalmente. Logo em seguida o Papa impôs a eles o corte dos cabelos, e lhes enviou em missão de pregarem a penitência. São Francisco de Assis manifestava seu amor a Deus por uma alegria imensa, que se expressava muitas vezes em cânticos ardorosos. A quem lhe perguntava qual a razão de tal alegria, respondia que “ela deriva da pureza do coração e da constância na oração”. A Santidade de São Francisco de Assis lhe angariou muitos discípulos e atraiu também uma jovem, filha do Conde de Sasso Rosso, Clara, de 17 anos. Desde o momento em que o ouviu pregar, compreendeu que a vida que ele indicava era a que Deus queria para ela. Francisco tornou-se seu guia e pai espiritual. Nascia assim a Ordem Segunda dos Franciscanos, a das Clarissas. Depois, Inês, irmã de Clara, a seguia no claustro; mais tarde uma terceira, Beatriz se juntou a elas.

Sabedoria divina

               Certa vez, São Francisco de Assis, sentindo-se fortemente tentado pela impureza, deitou-se sem roupas sobre a neve. Outra vez, num momento de tentação ainda mais violenta, ele rolou sobre espinhos para não pecar e vencer suas inclinações carnais. Sua humildade não consistia simplesmente no desprezo sentimental de si mesmo, mas na convicção de que “ante os olhos de Deus o homem vale pelo que é e não mais”. Considerando-se indigno do Sacerdócio, São Francisco de Assis apenas chegou a receber o diaconato. Detestava de todo coração o exibicionismo. Uma vez contaram-lhe que um dos irmãos amava tanto o silêncio que até quando ia se confessar fazia-o por sinais. São Francisco respondeu desgostoso: “Isso não procede do Espírito de Deus, mas sim do demônio; é uma tentação e não um ato de virtude”. Francisco tinha o dom da Sabedoria. Certa vez, um frade lhe pediu permissão para estudar. Francisco respondeu que, se o frade repetisse com amor e devoção a oração “Glória ao Pai”, se tornaria sábio aos olhos de Deus. Ele mesmo, Francisco, era um grande exemplo da Sabedoria dessa maneira adquirida. A proximidade de Francisco com a natureza sempre foi a faceta mais conhecida deste Santo. Seu amor universalista abrangia toda a Criação, e simbolizava um retorno a um estado de inocência, como Adão e Eva no Jardim do Éden.

Os estigmas de São Francisco de Assis

               Dois anos antes de sua morte, tendo Francisco ido ao Monte Alverne em companhia de alguns de seus frades mais íntimos, pôs-se em oração fervorosa e foi objeto de uma graça insigne. Na figura de um serafim de seis asas apareceu-lhe Nosso Senhor crucificado que, depois de entreter-se com ele em doce colóquio, partiu deixando-lhe impressos no corpo os sagrados estigmas da Paixão. Assim, esse discípulo de Cristo, que tanto desejara assemelhar-se a Ele, obteve mais este traço de similitude com o Divino Salvador.

Devoção a São Francisco de Assis

               No verão de 1225, Francisco esteve tão enfermo, que o Cardeal Ugolino e o irmão Elias o levaram ao médico do Papa, em Rieti. São Francisco de Assis perguntou a verdade e lhe dissessem que lhe restava apenas umas semanas de vida. “Bem vinda, irmã Morte!”, exclamou o Santo. Em seguida pediu para ser levado à Porciúncula. Morreu no dia três de outubro de 1226, com menos de 45 anos, depois de escutar a leitura da Paixão do Senhor. Ele queria ser sepultado no cemitério dos criminosos, mas seus irmãos o levaram em solene procissão à Igreja de São Jorge, em Assis. Ali esteve depositado até dois anos depois da canonização. Em 1230, foi secretamente trasladado à grande Basílica construída pelo irmão Elias. Ele foi canonizado apenas dois anos depois da morte, em 1228, pelo Papa Gregório IX. Sua festa é celebrada em 04 de outubro.

Oração São Francisco de Assis

               Esta oração não foi composta por São Francisco, mas muitas destas frases estão em seus escritos, onde o Espírito Santo, com o tempo, as separou e ordenou desta forma através dos Franciscanos. O autor é portanto o Espírito Santo Paráclito.

Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz. Onde houver ódio, que eu leve o amor; Onde houver ofensa, que eu leve o perdão; Onde houver discórdia, que eu leve a união; Onde houver dúvida, que eu leve a fé; Onde houver erro, que eu leve a verdade; Onde houver desespero, que eu leve a esperança; Onde houver tristeza, que eu leve a alegria; Onde houver trevas, que eu leve a luz.

Ó Mestre, Fazei que eu procure mais consolar, que ser consolado; Compreender, que ser compreendido; Amar, que ser amado.

Pois, é dando que se recebe, É perdoando que se é perdoado, E é morrendo que se vive para a vida eterna.

O encontro com o Sultão maometano

               Escrito por São Boaventura: No sexto ano depois de sua conversão, ardendo de desejo de martírio, resolveu ir à Síria pregar a fé cristã e a penitência aos sarracenos e a outros infiéis. Mas o navio que o conduzia foi arrastado pelos ventos contrários para as costas da Eslavônia. Aí ficou algum tempo sem encontrar navio com destino ao Oriente. Entendeu que lhe era recusado o que desejava. E como alguns marinheiros se preparavam para ir à Ancona, pediu para embarcar por amor de Deus. Mas como não tivessem com que pagar, os marinheiros nem quiseram ouvi-lo e o homem de Deus, entregando-se inteiramente nas mãos de Deus, introduziu-se sub-repticiamente no navio com seu companheiro. Entretanto, um homem certamente enviado por Deus para socorrer o pobre Francisco chegou trazendo víveres, chamou um os marujos, homem temente a Deus, e lhe disse: “Guarda com todo cuidado estas provisões para os pobres Irmãos que estão escondidos no navio; tem a bondade de lhes entregar de minha parte quando tiverem necessidade”. Os ventos sopravam com tal violência que os dias passaram sem que fosse possível abicar em parte alguma; os marujos estavam no fim das provisões; sobravam apenas as esmolas graciosamente oferecidas pelo céu ao pobre Francisco. Eram muito modestas, mas o poder de Deus as multiplicou de tal forma e em tanta quantidade que, apesar do atraso ocasionado pela tempestade que continuava a castigar duramente, elas satisfizeram totalmente às necessidades de todos até Ancona. E os marujos, vendo afastado o perigo de morte de que os livrara o servo de Deus, deram graças ao Altíssimo onipotente, que sempre se mostra admirável e amável nos seus amigos e servos. E com muito acerto, pois haviam enfrentado de perto os tremendos perigos do mar e visto as admiráveis obras de Deus nas águas profundas.

               Afastou-se do mar e começou a peregrinar pela terra espalhando a semente da salvação e colhendo uma messe abundante de bons frutos. Mas o fruto que mais o atraía era o martírio, o mérito de morrer por Cristo; desejava a morte por Cristo mais do que os méritos de uma vida virtuosa, e dirigiu-se a Marrocos para anunciar o Evangelho de Cristo ao Miramolim e seu povo e tentar assim conquistar a suspirada palma do martírio. O desejo que o levava a tais gestos era tão poderoso que, apesar de sua saúde precária, ia sempre à frente de seu companheiro de caminhada, e na pressa de realizar seu plano, parecia voar, inebriado do Espírito Santo. Havia já chegado à Espanha, mas Deus, que o queria para outras missões, dispusera de modo diferente os acontecimentos: uma doença bastante grave o prostrou, impedindo-o de realizar seu desejo. Não obstante a certeza do lucro que a morte representava para ele, o homem de Deus compreendeu ser necessário viver ainda pela família que gerara. Por isso voltou para cuidar das ovelhas entregues à sua guarda. Mas o ardor de sua caridade o impelia ao martírio. Pela terceira vez tentou ele partir aos países infiéis para difundir com o derramamento de seu sangue a fé na Trindade. Aos treze anos de sua conversão, foi às regiões da Síria, enfrentando corajosamente muitos perigos a fim de comparecer diante do Sultão da Babilônia, pessoalmente. Uma guerra implacável castigava cristãos e sarracenos. Os dois exércitos encontravam-se acampados muito próximos, separados apenas por uma estreita faixa de terra, que ninguém podia atravessar sem perigo de morte. O Sultão havia publicado um édito cruel: todos que lhe trouxessem a cabeça de um cristão receberiam uma grande quantia de ouro. Mas o intrépido soldado de Cristo, Francisco, julgando chegada a ocasião de realizar seus anseios, resolveu apresentar-se diante do Sultão, sem temer a morte, mas antes desejoso de enfrentá-la. Confortado pelo Senhor, depois de fervorosa oração, repetia com o profeta: Ainda que eu ande por um vale tenebroso, não temerei males, porque tu estás comigo. Tomou, pois, consigo um companheiro chamado Iluminado, homem de inteligência e coragem. E havendo começado a caminhar, saíram-lhe ao encontro duas mansas ovelhinhas, à vista das quais, cheio de alegria, disse a seu companheiro: “Confiemos no Senhor, Irmão, porque em nós se realizam hoje as palavras do Evangelho: Eis que eu vos mando como ovelha no meio de lobos.” E tendo-se adiantado, encontraram as sentinelas sarracenas que, quais lobos vorazes contra ovelhas, capturaram os servos de Deus e, ameaçando-os de morte, maltrataram-nos com crueldade e desprezo, os cobriram de injúrias e violências e os algemaram. Por fim, depois, de havê-los infligido e atormentado de mil maneiras, a divina Providência fez com que os levassem à presença do Sultão, realizando-se desse modo as fervorosas aspirações de Francisco. Colocados em sua presença, perguntou-lhes aquele bárbaro príncipe quem os havia enviado, a que vinham e como tinham conseguido chegar a seu acampamento. Ao que respondeu o servo de Deus com intrepidez que sua missão não procedia de nenhum homem, mas de Deus altíssimo que o enviava para ensinar a ele e a todo o seu povo os caminhos da salvação e para pregar-lhes as verdades de vida contidas no Evangelho. Com tanta constância e clareza em sua mente, com tanta virtude na expressão e com tão inflamado zelo pregou ao Sultão a existência de um só Deus em três pessoas e a de um Jesus Cristo, Salvador de todos os homens, que claramente se viu realizar-se em Francisco a palavras do Evangelho: Eu vos darei uma linguagem e uma sabedoria, à qual não poderão resistir, nem contradizer todos os vossos inimigos. Admirado o Sultão ao ver o espírito e o fervor do seráfico Pai, não apenas o ouvia com grande satisfação, mas até insistiu com repetidas súplicas que permanecesse algum tempo com ele. Mas o servo de Deus, iluminado pela força do alto, logo lhe respondeu dizendo: “Se me prometeres que tu e os teus vos convertereis a Cristo, permanecerei de muito bom grado entre vós. Mas se duvidas em abandonar a lei impura de Maomé pela fé santíssima de Cristo, ordena imediatamente que se faça uma grande fogueira e teus sacerdotes e eu nos lançaremos ao fogo, a ver se deste modo compreenda a necessidade de abraçar a fé Sagrada que te anuncio.” A esta proposta, replicou sem demora o Sultão: “Não creio que haja entre meus sacerdotes um só que, para defender sua doutrina, se atreva a lançar-se ao fogo nem esteja disposto a sofrer o menor tormento.” E sobrava-lhe razão para dizer isso, pois vira que um de seus falsos sacerdotes, ancião e protervo sequaz de sua lei, desaparecera, mal ouviu as primeiras palavras do Santo. Este acrescentou, dirigindo-se ao Sultão: “Se em teu nome e em nome de teu povo me prometeres abraças a religião de Cristo, com a condição que eu saia ileso da fogueira, estou disposto a entrar eu sozinho nela. Se o fogo me consumir entre suas chamas, atribua-se isso a meus pecados; mas se como espero, a virtude divina me conservar ileso, reconhecereis a Cristo, virtude e sabedoria de Deus e único Salvador de todos os homens.” A essa proposta respondeu o Sultão que não podia aceitar esse contrato aleatório, pois temia uma sublevação popular. Mas ofereceu-lhe numerosos e ricos presentes que o homem de Deus desprezou como lama. Não era das riquezas do mundo que ele estava ávido, mas da salvação das almas. O Sultão ficou ainda mais admirado ao verificar um desprezo tão grande pelos bens deste mundo. Não obstante sua recusa ou talvez seu receio de passar à fé cristã, rogou ao servo de Deus que levasse todos aqueles presentes e os distribuísse aos cristãos pobres e às igrejas. Mas o Santo que tinha horror de carregar dinheiro e não via na alma do Sultão raízes profundas da fé verdadeira, recusou-se terminantemente a aceitar sua oferta.

               Vendo frustradas suas ânsias de martírio e conhecendo que nada adiantava seu empenho na conversão daquele povo, resolveu Francisco, por inspiração divina, voltar aos países cristãos. E assim, por disposição da bondade divina e pelos méritos e virtudes do Santo, sucedeu que o amigo de Cristo procurou com todas as suas energias morrer por ele, mas não conseguiu. Desse modo não perderia o mérito do desejado martírio e ainda gozaria de vida para ser mais adiante assinalado com um selo e um símbolo desse martírio. Aconteceu assim para que aquele fogo primeiro ardesse em seu coração e mais tarde se manifestasse em sua carne.

Profecia sobre o final dos tempos:

               Pouco antes de sua morte, convocou seus amigos e alertou-os sobre os problemas que haviam de vir, dizendo: “Ajam com bravura, meus irmãos; ganhem coragem e confiem no Senhor. Em breve se aproxima o tempo no qual haverão grandes provas e aflições; perplexidades e discórdias, tanto espirituais como temporais, virão em abundância; a caridade de muitos esfriará, enquanto a malícia dos ímpios aumentará. Os diabos terão um poder fora do usual; a imaculada pureza de nossa Ordem, e de outras, será tão obscurecida, que haverá bem poucos Cristãos que obedecerão ao verdadeiro Soberano Pontífice e à Igreja Romana com corações leais e caridade perfeita. Nos tempos dessa tribulação, um homem não canonicamente eleito será elevado ao Pontificado, que, com sua astúcia, empenhar-se-á em levar muitos ao erro e à morte. Então escândalos se multiplicarão, a nossa Ordem será dividida, e muitas outras serão totalmente destruídas, porque consentirão o erro em vez de o combater. Haverá uma tal diversidade de opiniões e cismas entre as pessoas, os religiosos e o clero, que, se aqueles dias não fossem abreviados, segundo as palavras do Evangelho, até os eleitos seriam levados ao erro, se não fossem guiados, no meio de tão grande confusão, pela imensa misericórdia de Deus. Então a nossa Regra e nosso modo de vida serão violentamente combatidos por alguns, e provas terríveis cairão sobre nós. Os que permanecerem fiéis receberão a coroa da vida; mas ai dos que, confiando somente em sua Ordem, caírem em mornidão, pois não serão capazes de suportar as tentações permitidas como teste para os eleitos. Os que perseverarem em seu fervor e mantiverem sua virtude com amor e zelo pela verdade sofrerão injúrias e perseguições como sendo rebeldes e cismáticos. Pois os seus perseguidores, instigados por espíritos malignos, dirão que prestam um grande serviço a Deus, eliminando aqueles homens pestilentos da face da Terra. Mas o Senhor será o refúgio dos aflitos, e salvará todos que nEle confiarem. E a fim de serem como o seu Mestre, estes, os eleitos, agirão com confiança e com sua morte obterão para si próprios a vida eterna. Escolhendo obedecer a Deus e não aos homens, eles não temerão nada e preferirão perecer, do que aprovar a falsidade e a perfídia. Alguns pregadores manterão silêncio sobre a verdade, e outros a calcarão aos pés e a negarão. A santidade de vida será desprezada até pelos que exteriormente a professam, pois naqueles dias Nosso Senhor Jesus Cristo lhes mandará não um verdadeiro pastor, mas um destruidor.”

 

177 . 4 - Santa Clara de Assis

               Santa Clara de Assis, (Chiara D'Offreducci), nasceu no ano de 1194, em Assis, Itália. De família rica, seu pai, Favarone Scifi, era Conde. Sua mãe se chamava Hortolana Fiuni. Clara era neta e filha de fidalgos (pessoas da classe nobre). Sua família vivia em um palácio na cidade, tinha muitas propriedades e até um Castelo. Clara tinha dois irmãos e duas irmãs. Suas irmãs Catarina e Beatriz, mais tarde, iriam entrar para o convento junto com sua mãe, após esta ficar viúva. Quando Clara tinha por volta de doze anos, sua família vai morar em Corozano e depois vão para Perugia, refugiando-se de uma revolução. Clara desde jovem já tinha a fama de muito religiosa e recolhida. Aos 18 anos ela fugiu com uma amiga, Felipa de Guelfuccio, para encontrar São Francisco de Assis, na Porciúncula, (capelinha de Santa Maria dos Anjos, onde nasceu a ordem dos Franciscanos e a ordem de Santa Clara). Lá ela era esperada para fazer os primeiros votos e entrar no convento dos franciscanos.

Santa Clara de Assis, uma discípula de São Francisco de Assis

               O próprio São Francisco cortou os cabelos de Clara, sinal do voto de pobreza e exigência para que ela pudesse ser uma religiosa. Depois da cerimônia ela foi levada para o Mosteiro das Beneditinas. Santa Clara de Assis vendeu tudo, inclusive seu dote para o casamento e distribui aos pobres. Era uma exigência de São Francisco para poder entrar para a vida religiosa. A família de Santa Clara de Assis tentou buscá-la, mas ela se recusou a voltar, mostrando para o seu tio Monaldo os cabelos cortados. Ele, então, desistiu de levá-la. Nisso, sua irmã Catarina, também foge para o convento aos 15 anos de idade. A família envia novamente o Tio Monaldo para busca-la à força. Monaldo amarra a moça e prepara-se para arrastá-la de volta para casa. Clara não suporta ver o sofrimento da irmã e pede ao Pai Celeste que intervenha. Então a menina amarrada ficou tão pesada que ninguém conseguia movê-la. Monaldo, então, desistiu. Catarina entrou para o convento e recebeu o nome de Inês. Depois de ter passado pelo convento de Santo Ângelo de Panço, São Francisco leva Clara e suas seguidoras para o Santuário de São Damião, onde foram morar em definitivo.

               Milagre de Santa Clara de Assis: Por causa da invasão muçulmana, a região de Assis passou necessidades. Tanto que, certa vez, as irmãs, que já eram mais de 50, não tinham o que comer. Então a irmã cozinheira chega desesperada e diz a Santa Clara de Assis que havia somente um pão na cozinha. Santa Clara diz a ela: confie em Deus e divida o pão em 50 pedaços. A irmã cozinheira, mesmo sem entender, obedece. Então, de repente, dezenas de pães aparecem na cozinha e as irmãs conseguem se sustentar por vários dias.

               Pela intercessão de Santa Clara muitos milagres se realizaram quando ela ainda era viva e também depois de seu falecimento. Um dos mais expressivos foi quando os sarracenos (muçulmanos) invadiram Assis e tentaram entrar no convento das Clarissas. Santa Clara pegou o ostensório com o Santíssimo Sacramento e disse aos invasores que Cristo era mais forte que todos eles. Então, inexplicavelmente, todos, tomados de grande medo, fugiram sem saquear o convento. Por isso, Santa Clara é representada com suas vestes marrons segurando o ostensório.

               Um ano antes de Santa Clara de Assis falecer, em 11 de agosto de 1253, ela queria muito ir a uma missa na Igreja de São Francisco (já falecido). Não tendo condições de ir por estar doente, ela entrou em oração e conseguiu assistir toda a celebração de sua cama em seu quarto no convento. Segundo seus relatos, a Missa aparecia para ela como que projetada na parede de seu humilde quarto.  Santa Clara conseguiu ver e ouvir toda a celebração sem sair de sua cama. O fato foi confirmado quando Santa clara de Assis contou fatos acontecidos na missa, detalhando palavras do sermão do celebrante. Mais tarde, várias pessoas que estiveram na missa confirmaram o que Santa Clara narrou, de fato aconteceram. Assim, pelo fato de Santa clara ter assistido a uma celebração à distância, em 14 de fevereiro de 1958, o Papa Pio XII proclamou oficialmente Santa Clara de Assis como a padroeira da televisão.

O legado de Santa Clara de Assis: Santa Clara de Assis é a fundadora das Clarissas, (antes chamadas de senhoras pobres), com conventos espalhados por vários lugares da Europa e uma espiritualidade voltada para a pobreza, a oração e a ajuda aos mais necessitados. Ela escreveu a Regra para as mulheres religiosas, (forma de vida), a regra de viver o mistério de Jesus Cristo de acordo com as propostas de São Francisco de Assis. Regra depois aprovada pela Papa. Ela foi o lado feminino dos franciscanos e as irmãs Clarissas permanecem até hoje. Santa Clara de Assis morreu em Assis no dia 11 de agosto de 1253, aos 60 anos de idade. Um dia antes de sua morte ela recebeu a visita do Papa Inocencio lV, que lhe entregou a Regra escrita por ela aprovada e aplicada a todas as monjas. Na hora de sua morte ela disse: Vá segura, minha alma, porque você tem uma boa escolha para o caminho. Vá, porque Aquele que a criou também a Santificou. E, guardando-a sempre como uma mãe guarda o filho, amou-a com eterno amor. E Bendito sejais Vós, Senhor que me criastes. O Papa mandou enterrá-la na Igreja de São Jorge, onde São Francisco estava enterrado. Em 1260 depois de construída a Basílica de Santa Clara, ao lado da Igreja de São Jorge seu corpo foi transladado com todas as honras para lá. Sua canonização foi oficializada pelo Papa Alexandre lV, no ano de 1255, dois anos após sua morte. Santa Clara de Assis é representada com uma roupa marrom e touca branca, com uma custódia com o Santíssimo Sacramento.

 

178º - Honório III - 1216 - 1227

               Papa da Igreja cristã Romana nascido em Roma, eleito em 24 de julho de 1216 como sucessor de Inocêncio III, em cujo Pontificado cuidou especialmente do aspecto disciplinar e jurídico da eleição do Papa e dos Bispos, fixando as regras e a cerimônia, e aprovou definitivamente as regras dos Franciscanos, dos Dominicanos e confirmou a ordem dos Carmelitas. De origem nobre, exerceu funções de caráter administrativo na cúria Pontifícia e tornou-se Cardeal diácono de Santa Luzia na época do Pontificado de Celestino III. Eleito Papa já com idade avançada, mostrou-se com um temperamento muitas vezes oposto ao de seu predecessor. Homem sereno e bastante religioso, mas de pouca energia e autoridade e desprovido de grandes capacidades políticas. Definiu o Liber Censorium, sobre os direitos dos Pontífices e organizou o cerimonial para a eleição Papal. Politicamente não impediu as ambições monárquicas de Frederico da Suábia em troca da promessa de aplicar em seus domínios as severas Constituições eclesiásticas contra os hereges e o compromisso de apoiar a quinta cruzada, uma nova expedição militar à Terra Santa. Organizou, então, a quinta cruzada, com André II da Hungria, que não alcançou os objetivos. A primeira ofensiva da quinta Cruzada (1217-1221) tinha como objetivo capturar o porto egípcio de Damieta, o que foi conseguido em 1219. Porém a estratégia posterior que era assegurar o controle da península do Sinai não obteve sucesso, principalmente porque os reforços prometidos por Frederico II, então poderoso rei da Sicília e neto de Frederico Barba-Roxa, não chegaram, razão pela qual ele foi excomungado pelo Papa Gregório IX. Posteriormente, Frederico II organizou uma Cruzada por sua própria conta, marchou até a Terra Santa e, sem o apoio do Papado, conseguiu que os egípcios devolvessem Jerusalém aos cruzados. Em termos políticos teve mais sucesso no restante da Europa ocidental, onde apoiou o rei da Inglaterra João Sem-Terra e obteve o apoio dos soberanos da França e de Aragão contra os albigenses. Durante seu Pontificado favoreceu bastante as ordens mendicantes e seus frades pregadores, permitindo-lhes o acesso às universidades francesas, e aprovou a regra dos frades menores (1223), aos quais designou como protetor o Cardeal Ugolino de Óstia. Aprovou em 1226 as regras dos carmelitas, formulada em 1208-1209, por Alberto de Vercelli, Patriarca latino de Jerusalém, e ainda hoje professadas pela Ordem. O Papa morreu em Roma.

 

179º - Gregório IX - 1227 - 1241

               Gregório IX (Anagni, 1145 – Roma, 22 de agosto de 1241), nascido Ugolino di Anagni. Filho do conde de Segni e sobrinho do Papa Inocêncio III, estudou direito em Paris e Bolonha. Feito Cardeal em 1198, tornou-se Cardeal-Bispo de Óstia em 1206. Foi um importante incentivador dos dominicanos e dos franciscanos, tendo sido amigo pessoal do próprio São Francisco de Assis. Organizou a Inquisição Pontifícia com o objectivo de reprimir as heresias, com a promulgação da bula Licet ad capiendos em 20 de abril de 1233, dirigida aos dominicanos, que passaram a liderar o trabalho de investigação, julgamento, condenação ou absolvição dos hereges. Canonizou S. Francisco de Assis dois anos após sua morte, também S. Domingos de Gusmão e Santo António de Lisboa. Internamente encarregou Raimundo de Penaforte da elaboração de uma coletânea geral de leis em 1230, que vigorou como peça principal do direito canônico até 1918. Está sepultado na Basílica de São Pedro, na Cidade do Vaticano. Papa fundador da Santa Inquisição, através de sua bula papal Escommunicamus, editada após o sínodo de Toulouse (1229), a qual decretava que todos os hereges e instigadores deveriam ser entregues aos nobres e magistrados para o devido castigo. Formado nas universidades de Paris e Bologna, após a ascensão de Inocêncio III ao trono papal, de quem era sobrinho, foi sucessivamente nomeado capelão Papal, Arcebispo de São Pedro, Cardeal diácono em Santo Eustáquio (1198) e Bispo Cardeal de Óstia e Velletri (1206). Com o Cardeal Brancaleone foi enviado a Germânia para mediar a disputa entre Philip de Suábia e Otto de Brunswick, que disputavam o trono germânico após a morte de Henry VI. Por ordem do Papa os delegados livraram Philip da pena imposta pelo Papa Celestino III por ele ter invadido os Estados Pontifícios. Embora os delegados fossem incapazes para convencer Brunswick a deixar as reivindicações dele ao trono, eles tiveram sucesso efetuando uma trégua entre os dois pretendentes e voltou a Roma (1208). Após o assassinado de Philip, voltou à Alemanha (1209) para convencer os Príncipes a reconhecerem Otto de Brunswick como rei. Depois da morte do Papa Inocêncio III (1216), organizou a eleição do Papa Honório III juntamente com o Cardeal Guido de Preneste. Hábil diplomata foi nomeado por Honório III para, além de participar da organização das cruzadas, ser o mediador principal nos conflitos regionais entre a Lombardia e Tuscia (1217), Pisa e Gênova (1217), Milão e Cremona (1218) e entre a Bolonha e Pistóia (1219). A pedido especial de São Francisco, Honório III o designou o protetor da ordem em 1220. Depois da morte de Honório III (1227), o Cardeal Conrad de Urach foi eleito a princípio, mas declinou da tiara e, então, os Cardeais o elegeram por unanimidade no dia 19 março (1227), e ele relutantemente aceitou a honraria, até mesmo por se considerar avançado na idade, e adotou o nome de Gregorio IX. Os constantes conflitos com as táticas desonestas do Imperador Frederico II, especialmente com relação ao papel deste nas Cruzadas, o levaram a publicar a excomunhão do imperador (1228). A primeira ofensiva da quinta Cruzada (1217-1221), organizada por Honório III, Papa em Roma (1216-1227), tinha como objetivo capturar o porto egípcio de Damieta, o que foi conseguido dois anos depois (1219). A estratégia posterior requeria assegurar o controle da península do Sinai. Porém esses objetivos não foram alcançados, pois os reforços prometidos por Frederico II não chegaram, razão pela qual ele foi excomungado pelo Papa. Para provar para o mundo Cristão que o Papa tinha sido precipitado em lhe impor tão grave punição, o Imperador resolveu ir para a Terra Santa (1228), previamente pedindo a bênção Papal para o seu empreendimento. Porém, o Papa não só negou-lhe a bênção, como justificou que um Imperador excomungado não tinha direito para empreender uma guerra Santa, como também liberou os cruzados do juramento de submissão. Frederico II organizou uma Cruzada por sua própria conta, marchou até a Terra Santa e, sem o apoio do Papado, conseguiu que os egípcios devolvessem Jerusalém aos cruzados. Ao mesmo tempo, o Papa proclamou outra Cruzada, desta vez contra Frederico, e seguiu atacando as possessões italianas do Imperador. Ameaçado por uma turba de Ghibelline, o Papa fugiu primeiro a Viterbo e depois para Perugia. Sem saída, o Imperador reconheceu a justiça de sua excomunhão e começou a dar passos para uma reconciliação com o Papa. Depois de muitas refregas o Papa voltou à Roma de seu refúgio em Perúgia (1228-1930), e estabeleceu um tratado com o Imperador, por meio do qual aquela parte dos Estados Pontifícios que estavam ocupadas através de tropas imperiais seriam restabelecidas às posses Papais e a paz foi estabelecida entre o Papa e o Imperador. Durante um tempo o imperador ajudou o Papa contra algumas revoltas secundárias nos Estados Pontifícios, como foi estipulado dentro das condições de paz. Porém, logo ele começou a perturbar a paz novamente impedindo a liberdade da Igreja na Sicília e prejudicando a liberdade das cidades da Lombardia, um bastião forte e necessário para o segurança dos Estados Pontificais. Com a declaração (1237) do Imperador da intenção de unir ao império não só a Lombardia e a Tuscania, mas também o Patrimônio de São Pedro e praticamente toda a Itália, fez o Papa novamente excomungar o imperador (1239), reiniciando o período de desentendimentos entre ambos, que continuou até a morte repentina do Pontífice, em Roma, com a idade de quase cem anos, quando o exército do Imperador tomou posição e acampou próximo à cidade. Apesar desta contínua beligerância com Frederico II, o titular de São Pedro não descuidou das atividades cristãs da Igreja, em especial o apoio às ordens religiosas e missionários. Entre suas muitas ações para entidades religiosas protegeu a Ordem dos Dominicanos, aprovou os privilégios do Camaldolese (1227), deu estatutos novos aos Carmelitas (1229), aprovou a Ordem de Nossa Senhora de Clemência para a redenção de cativos, entre outras, e ajudou financeiramente as ações de ordens religiosas de conversão na Ásia e África e leste europeu e nas campanhas do Oriente Médio. No seu Papado canonizações e o calendário de Santos foi enriquecido com alguns dos mais populares nomes do catolicismo como São Francisco de Assis, Santo Antônio de Pádua, Santa Isabel de Turíngia etc.

Inquisição foi na verdade Providência Divina

Quantos e quantos historiadores e falsos teólogos, criticam a Igreja Católica pelas perseguições das Cruzadas e da Inquisição contra os hereges daquela época, dizendo que foi um crime contra a humanidade, uma injustiça. Mas se esquecem que Deus tudo sabe, e não poderia deixar seitas altamente perniciosas para a alma prevalecer. Acreditam que Deus foi duro demais? Mas, quem é, por mais poderoso que seja, capaz de limitar os desígnios de Deus sobre a humanidade? Quem pode ousar enfrentar Deus, dizendo-lhe: “Isto não pode”, e com que autoridade? A vontade de Deus está acima de todas as outras vontades, e devemos amar esta Santa Vontade. A Bíblia nos conta em suas escrituras que diversas vezes Deus agiu em prol de seu povo, não permitindo que fosse vencido ou extinto. Desde o mais numeroso reino, ou uma simples vila ou cidade, mesmo que seja um simples homem, a providência divina agiu contra estas potências ideológicas idolátricas, para preservar a fé verdadeira. Deus puniu os Filisteus, Amorreus, Heteus, Perizeus, Cananeus, Heveus, Jebuseus, Egípcios, Amonitas, Edonitas, Amalequitas, extinguiu quase toda a humanidade no dilúvio, salvando apenas a família de Noé. Todos estes povos investiram contra os princípios morais estabelecidos pelo Criador, e receberam um justo castigo.

               A Igreja Católica é a geradora de filhos legítimos do Senhor. Todos aqueles que acreditarem na doutrina contida nesta Igreja, obterá a salvação de sua alma no último dia. Os inimigos desta Igreja foram e são muitos. O que dizer dos Judeus que negam a divindade de Jesus, do Império Romano que perseguiu e matou cristãos por séculos, do Islamismo que trabalha para expulsar e matar quem à esta seita não se converter, dos filósofos e falsos doutores racionalistas induzindo as pessoas a apostasia, dos institutos satânicos que promovem o aborto, dos Protestantes e suas milhares de seitas e divisões se dizendo cada uma delas “os verdadeiros cristãos”, infundindo confusão espiritual, pelejando contra à Católica, difamando Nossa Senhora. Do Comunismo espalhando ideias anticristãs a nível mundial, da Maçonaria, uma seita ocultista que adentrou nos Governos e na Igreja de Cristo afim de destruí-la por dentro.

               Acreditam mesmo que não foi necessário a intervenção divina na humanidade durante os séculos e séculos?  Acham que nossa fé conseguiria sobreviver a esta enxurrada de ataques? É claro que não. Foi necessário a expiação e a eliminação de pessoas incorrigíveis, que prejudicaram grandemente a expansão do cristianismo. Muitos dizem que Deus é vingador quando age assim, mas na verdade é amor! Sim, é amor! O Amor que usa a perfeita Justiça para se chegar a verdade e a paz. Por acaso não foi Deus quem tudo criou e nos criou? Não é Ele o dono de toda vida existente? Ele pode, se assim desejar, de um momento para outro, apagar de seu pensamento todo o gênero humano e imediatamente deixaríamos de existir. Tem todo o direito de assim proceder, se assim desejar. Os excessos cometidos por alguns durante a Santa Inquisição, não vieram de Deus, mas da maldade humana instigada por satanás. Os direitos humanos servem como bandeira apenas para este mundo, não se encaixam nos preceitos divinos do decálogo, porque um é material e o outro sobrenatural. Humanismo não é cristianismo! A Justiça divina agiu e continuará agindo, enquanto houver homens sobre a terra.

 

180º - Celestino IV - 1241

               Papa da Igreja Cristã Romana nascido em Milão, e eleito sucessor de Gregório IX, foi Papa por apenas 17 dias; depois dos acontecimentos ocorridos em sua eleição originou-se a palavra conclave. De uma família de tradição eclesiástica, era cisterciense, ou seja, membro da Ordem Cisterciense, organizada por São Bernardo (1090-1153), e filho de uma irmã de Urbano III. Foi eleito em 25 de outubro de 1241, em uma eleição realizada num período de muitos problemas de relacionamento entre os Cardeais, o que dificultou um acordo. Somente dez membros participavam do colégio eleitoral presente, pois a maioria dos Cardeais continuava prisioneira do Imperador alemão Frederico II. O Senado Romano trancou-os a chave no antigo Monasterio del Septizionio. Deste episódio deriva a palavra conclave, do latim cum clave, ou seja, com chave. Portanto ele foi o primeiro Papa da história a ser escolhido através do conclave. No meio do conclave, as condições precárias do lugar onde estavam levou um dos Cardeais a morte, então às pressas elegeram o Cardeal milanês para ocupar o trono de Pedro. O Papa devido a sua idade avançada, morreu em Roma após um curtíssimo pontificado de pouca mais de duas semanas e foi substituído por Inocêncio IV, 21 meses depois, devido as condições completamente adversas da normalidade.

 

181º - Inocêncio IV - 1243 – 1254

               Papa Inocêncio IV (1195 – 7 de dezembro 1254), nascido Sinibaldo Fieschi, foi eleito em 25 de Junho de 1243, depois de dois anos de Sede vacante. Natural de Gênova, escolhido em 28 de junho de 1243 como sucessor de Celestino IV, teve que lutar duramente contra o Imperador Frederico II e, por este motivo teve que abandonar temporariamente Roma. Filho do Conde de Lavagna, foi encaminhado para a carreira eclesiástica, tornando-se Bispo de Albenga e ocupando altos cargos na administração Pontifícia. Foi nomeado cardeal (1227) e eleito Papa, com fama de canonista; seu primeiro ato político teve o objetivo de esclarecer as relações da Santa Sé com o Imperador Frederico II. O monarca ofereceu a restituição das terras eclesiásticas, que ocupara anteriormente, em troca de uma investidura feudal dessas terras por parte do Papa, porém como o Pontífice desejava obter a separação entre o Reino da Sicília e o da Alemanha preferiu abandonar as negociações de paz. Em conflito aberto com o Imperador e diante das novas ofensivas das forças imperiais, fugiu disfarçado de Roma em 1244, e refugiou-se primeiro em Gênova, depois na França, onde presidiu o XIII Concílio Ecumênico, convocado em Lião (1245) para depor o Imperador, e proclamou uma cruzada, a sétima, com Luís IX, rei da França, contra Frederico II, declarado-o perjuro e sacrílego e excomungando-o pela terceira vez, mas o movimento fracassou. Costurou um grande movimento antiimperial e uma rede de alianças familiares, especialmente na Alemanha, junto com um grupo de eclesiásticos fiéis a Roma (1246-1247), conseguindo sublevar algumas cidades contra a Imperador e fortalecendo a Liga Lombarda. Três anos depois da morte de Frederico (1250) voltou a Roma (1253), mas teve que empreender uma luta armada contra Manfredo que, após a morte do irmão Conrado IV (1254), tencionava apoderar-se do reino siciliano. Inocêncio morreu subitamente em Nápoles, durante esse conflito, e foi sucedido por Alexandre IV (1254-1261). Antes de ser um homem da Igreja, foi um político que atuou assiduamente para impor a supremacia do Papado na Itália e em toda a Europa, utilizando-se de todos os meios possíveis, temporais e espirituais. A 15 de Maio de 1252, promulgou a bula Ad extirpanda autorizando a tortura contra os hereges. Durante seu Pontificado, houve a Sétima Cruzada, terminando com derrota para os cristãos.

 

181 . 1 - Santa Matilde de Hackeborn

Nossa Senhora ensina à Matilde a Oração da Ave Maria

               Santa Matilde de Hackeborn (Helfta, 1240/1241 - 19 de novembro de 1298), foi uma monja cisterciense, mística, nobre e Santa católica, também conhecida por Matilde de Helfta. Sua festa é celebrada em 19 de novembro. Matilde nasceu no Castelo de Helft, Saxônia, membro da nobre e poderosa família Hackeborn que era possuidora de terras na Turíngia. Nasceu tão frágil pelo que se chegou a acreditar estar morta, mas quando o padre foi batizá-la, este profetizou que ela chegaria a ser Santa e que Deus obraria grandes coisas através dela.

               Em 1248, com sete anos de idade, visitou com sua mãe a sua irmã Gertrudes de Hackeborn (não confundir com Gertrudes de Helfta, também chamada Gertrudes, a Grande), monja no mosteiro de Rodardsdorf. Atraída pelo ambiente monástico, permaneceu no mosteiro, se ingressando como educanda. Três anos depois, em 1251, Gertrudes se torna abadessa com a idade de dezenove anos regendo a comunidade até 1291. Em 1258, devido a escassez de água, as monjas se mudaram para Helfta. Este novo monastério chegaria a prosperar tanto economicamente como culturalmente e espiritualmente. Gertrudes formou a sua irmã com vistas ao cargo que lhe ia confiar: maestra da escola para meninas, e formadora das noviças e das jovens professoras. Em 1261, exercendo o cargo de maestra, recebe a seus cuidados a uma menina chamada Gertrudes, de então cinco anos de idade, que mais chegaria a ser conhecida como Santa Gertrudes, a Grande. Por seus dotes naturais para o canto, Matilde seria também chamada maestra de coral. A tradição acabou chamando-a “Ruiseñor de Cristo”. Matilde desempenhou seu trabalho silenciosamente até os cinquenta anos. Desde jovem tinha experiências místicas, porém nunca escreveu nada. Em 1291 morre sua irmã Gertrudes de Hackeborn. Por este acontecimento começou a adoecer constantemente e a passar períodos de cama. A nova abadessa, Sofía de Querfurt, vendo a progressiva decadência física de Matilde, mandou que as monjas recorressem a todos os dados e notas que ela tinha tomado durante o seu magistério, para ser base de sua história. A encarregada especial para este trabalho foi Gertrudes de Helfta. Isso foi feito às escondidas da doente, mas depois, quando informada, confirmou o conteúdo do livro. O resultado foi O Livro de graça especial (El Libro de la Gracia Especial).

O Livro de Graça Especial

               O livro é constituído por sete partes. As primeiras se recolhe as experiências místicas de Matilde em torno das festas litúrgicas. A terceira e quarta reúnem os ensinamentos referentes a salvação do homem e as suas virtudes. A quinta parte está dedicada às almas dos defuntos. A sexta é uma breve biografia de Gertrudes de Hackeborn, irmã de Matilde. A sétima parte descreve os últimos dias de Matilde e sua morte.

               Doutrinalmente, o livro se centra na vida espiritual monástica: Liturgia das Horas, Lectio Divina, Eucaristia. No centro de tudo está o Coração de Jesus, símbolo do amor divino, encontrando-se neste livro uma das referências mais antigas desta devoção. Ocupa um papel importante o tema mariológico. Apoia três dogmas marianos: A Imaculada Concepção de Maria, sua Maternidade Divina, e a Concepção Virginal de Jesus. Além disso inaugurou a devoção mariana de rezar diariamente três Avemarias pedindo a especial proteção de Maria.

               Uma promessa e um pedido de Maria: "Eu te assistirei na hora da tua morte, mas quero que, por tua parte, me rezes diariamente três Ave-Marias. A primeira Ave-Maria, pedindo que, assim como Deus Pai me elevou a um trono de glória sem igual, fazendo de mim a mais poderosa no céu e na terra, assim também eu te assista na terra para fortificar-te e afastar de ti toda potestade inimiga.

A segunda Ave-Maria, pedindo que, assim como o Filho de Deus me concedeu a sabedoria em tal extremo que tenho mais conhecimento da Santíssima Trindade que todos os santos, assim eu te assista na passagem da morte para encher a tua alma das luzes da fé e da verdadeira sabedoria, para que não a obscureçam as trevas do erro e da ignorância.

A terceira Ave-Maria, pedindo que, assim como o Espírito Santo me concedeu as doçuras do seu amor e me fez tão amável que depois de Deus sou a mais doce e misericordiosa, assim eu te assista na morte, enchendo a tua alma de tal suavidade de amor divino que toda pena e amargura da morte seja transformada para ti em delícias”.

               Em 19 de novembro de 1299 morreu Matilde com a idade de 59 anos. A fama e importância que se atribui a sua discípula, a Santa Gertrudes de Helfta (que acabou chamando-se por ela, a Grande) consequentemente fez sombra a Matilde, que passou à segundo plano a partir do século XVI.

 

181 . 2 - Aparição de Nossa Senhora em Cambraidge – Inglaterra - Nossa Senhora do Carmo

               Na Inglaterra, vivia um homem penitente, como o Profeta Elias, austero como João Batista. Chamava-se Simeão. Mas, diante de sua vida solitária na convexidade de uma árvore no seio da floresta, deram-lhe o apelido de Stock. Simão nasceu no ano de 1165 no Castelo de Harford, no condado de Kent, Inglaterra, em atenção às preces de seus piedosos pais, que uniam a mais alta nobreza à virtude. Alguns escritores julgam mesmo que tinham parentesco com a família real. Sua mãe consagrou-o à Santíssima Virgem desde antes de nascer. Em reconhecimento a Ela pelo feliz parto, e para pedir sua especial proteção para o filhinho, a jovem mãe, antes de o amamentar, oferecia-o à Virgem, rezando de joelhos uma Ave-Maria. Bela atitude de uma senhora altamente nobre! O menino aprendeu a ler com pouquíssima idade. A exemplo de seus pais, começou a rezar o Pequeno Ofício da Santíssima Virgem, e logo também o Saltério. Esse verdadeiro pequeno gênio, aos sete anos de idade iniciou o estudo das Belas Artes no Colégio de Oxford, com tanto sucesso que surpreendeu os professores. Foi também nessa época admitido à Mesa Eucarística, e consagrou sua virgindade à Santíssima Virgem. Perseguido pela inveja do irmão mais velho, e atendendo a uma voz interior que lhe inspirava o desejo de abandonar o mundo, deixou o lar paterno aos 12 anos, encontrando refúgio numa floresta onde viveu inteiramente isolado durante 20 anos, em oração e penitência. Nossa Senhora revelou-lhe então seu desejo de que ele se juntasse a certos monges que viriam do Monte Carmelo, na Palestina, à Inglaterra, “sobretudo porque aqueles religiosos estavam consagrados de um modo especial à Mãe de Deus”. Simão saiu de sua solidão e, obedecendo também a uma ordem do Céu, estudou teologia, recebendo as sagradas ordens. Dedicou-se à pregação, até que finalmente chegaram dois frades carmelitas no ano de 1213. Ele pôde então receber o hábito da Ordem, em Aylesford. Em 1215, tendo chegado aos ouvidos de São Brocardo, Geral latino do Carmo, a fama das virtudes de Simão, quis tê-lo como coadjutor na direção da Ordem; em 1226, nomeou-o Vigário-Geral de todas as províncias Europeias. São Simão teve que enfrentar uma verdadeira tormenta contra os carmelitas na Europa, suscitada pelo demônio através de homens ditos zelosos pelas leis da Igreja, os quais queriam a todo custo suprimir a Ordem sob vários pretextos. Mas o Sumo Pontífice, mediante uma bula, declarou legítima e conforme aos decretos de Latrão a existência legal da Ordem dos Carmelitas, e a autorizou a continuar suas fundações na Europa. São Simão participou do Capítulo Geral da Ordem na Terra Santa, em 1237. Em um novo Capítulo, em 1245, foi eleito 6° Prior-Geral dos Carmelitas. Após a algum tempo de calmaria, as perseguições reiniciaram com mais intensidade. Na falta de auxílio humano, São Simão recorria à Virgem Santíssima com toda a tristeza de seu coração, pedindo-Lhe que fosse solícita à sua Ordem, tão provada, e que desse um sinal de sua aliança com ela. Na manhã do dia 16 de julho de 1251, suplicava com maior empenho à Mãe do Carmelo sua proteção, recitando a bela oração por ele composta: "Flor do Carmelo, Vinha florífera, Esplendor do céu, Virgem fecunda, singular. Ó Mãe benigna, sem conhecer varão, aos Carmelitas dá privilégio, Estrela do Mar!". Terminada esta prece, levanta os olhos marejados de lágrimas, vê a cela encher-se, subitamente, de luz. Rodeada de anjos, em grande cortejo, apareceu-lhe a Virgem Santíssima, revestida de esplendor, trazendo nas mãos o Escapulário dizendo a São Simão Stock, com inexprimível ternura maternal: “‘Recebe, diletíssimo filho, este Escapulário de tua Ordem como sinal distintivo e a marca do privilégio que eu obtive para ti e para todos os filhos do Carmelo; é um sinal de salvação, uma salvaguarda nos perigos, aliança de paz e de uma proteção sempiterna. Quem morrer revestido com ele será preservado do fogo eterno’’. Essa graça especialíssima foi imediatamente difundida nos lugares onde os carmelitas estavam estabelecidos, e autenticada por muitos milagres que, ocorrendo por toda parte, fizeram calar os adversários dos Irmãos da Santíssima Virgem do Monte Carmelo. São Simão Stock atingiu extrema idade e altíssima Santidade, operando inúmeros milagres, tendo também obtido o dom das línguas; foi chamado a Pátria Celeste por Deus em 16 de maio de 1265.

 

182º - Alexandre IV - 1254 – 1261

              Alexandre IV foi Papa de 12 de dezembro de 1254 até a data da sua morte em 25 de maio de 1261. Chamava-se Reginaldo (ou Reinaldo, Rinaldo) Conti. Foi elevado a Cardeal pelo seu tio, o Papa Gregório IX, em 1227. Prosseguiu a guerra contra os descendentes do Imperador Frederico II. Opôs-se à sucessão no trono Imperial alemão de Conradino. Viveu quase sempre fora de Roma, por causa do conflito entre guibelinos e guelfos. Ocupou-se do governo da Igreja, procurando a união com as igrejas gregas. Promoveu a influência dos franciscanos, intervindo na universidade de Paris em favor desta ordem mendicante, e também dos dominicanos. Após submeter a uma comissão de Cardeais, concluiu que a obra de Guillaume Saintamour era reprovável em todos os seus aspectos. Após a bula Ad Extirpanda, de Inocêncio IV, autorizando a tortura, mas não pelas mãos dos próprios clérigos, o Papa Alexandre IV na bula Ut Negotium de 1256, permitiu que os inquisidores se absolvessem mutuamente se tivessem incorrido em quaisquer "irregularidades canónicas no seu importante trabalho". Bispo de Óstia, nomeado Cardeal (1227) pelo tio, o Papa Gregório IX, após eleito renovou em 1255, a investidura do Reino de Nápoles para Edmundo, filho de Henrique III, da Inglaterra. Entrou em conflito com Manfredo da Suábia, filho do Imperador Frederico II, e o excomungou quando este autocoroou-se rei da Sicília e das Puglie, em Palermo (1258). Também decretou a excomunhão (1260) aos senenses e aos gibelinos florentinos por estes se aliarem a Manfredo, para derrotar Florença, em Montaperti. Deu novo impulso à repressão da heresia prescrevendo o procedimento sumário para a heresia e condenou os flagelantes (1257). Empenhou-se pela união das Igrejas, canonizou Santa Clara e confirmou a realidade dos estigmas de São Francisco. Os conflitos insuperáveis com a administração romana liderada pelo capitão do povo Brancaleone degli Andalò, foi obrigado a deixar a cidade e fugir para Viterbo. Morreu em 25 de maio, em Viterbo e foi sucedido por Urbano IV. Os agostinianos eremitas de Santo Agostinho, a Ordo eremitarum Sancti Augustini, originada da congregações de eremitas da Itália central e setentrional nos séculos XII e XIII, foram reunidas em uma ordem religiosa mendicante por este Papa em 1256. A Ordem difundiu-se por toda a Europa e desenvolveu uma importante escola teológica ocupando cátedras nas principais universidades de Paris, Oxford, Praga, Viena, Pádua, Pisa, Wittenberg. São Nicolau de Tolentino e Martinho Lutero foram agostinianos eremitas.

 

183º - Urbano IV - 1261 - 1264

               Papa Urbano IV, nascido Jacques Pantaléon, foi o chefe da Igreja Católica e governante dos Estados Papais de 29 de agosto de 1261 até sua morte. Foi eleito Papa sem ser Cardeal; ele foi o primeiro a ser eleito de tal forma, e isso ocorreria apenas para mais 3 Papas depois (Gregório X, Urbano V e Urbano VI). Pantaléon era filho de um sapateiro de Troyes, França. Ele estudou teologia e direito consuetudinário em Paris e foi nomeado Cônego de Laon e mais tarde Arquidiácono de Liège. No Primeiro Concílio de Lyon (1245), atraiu a atenção do Papa Inocêncio IV, que o enviou duas vezes em missões à Alemanha. Numa dessas missões, ele negociou o Tratado de Christburg entre os prussianos pagãos e os Cavaleiros Teutônicos. Tornou-se Bispo de Verdun em 1253. Em 1255. O Papa Alexandre IV fez dele Patriarca Latino de Jerusalém. Pantaléon voltou de Jerusalém, que estava em apuros, e voltou para Viterbo em busca de ajuda para os cristãos oprimidos no Oriente quando Alexandre IV morreu. Após uma vacância de três meses, os oito Cardeais do Sagrado Colégio o escolheram para suceder Alexandre IV nas eleições Papais em 29 de agosto de 1261. Ele escolheu como nome de reinado Urbano IV. Um mês antes da eleição de Urbano, o Império Latino de Constantinopla, fundado durante a malfadada Quarta Cruzada contra os bizantinos, caiu nas mãos dos bizantinos liderados pelo imperador Miguel VIII Paleólogo. Urbano IV tentou, sem sucesso, iniciar uma cruzada para restaurar o Império Latino. Urbano iniciou a construção da Basílica de St. Urbain, Troye, em 1262. Ele instituiu a festa de Corpus Christi em 11 de agosto de 1264, com a publicação da bula Papal Transiturus. Urbano pediu a Tomás de Aquino, o teólogo dominicano, que escrevesse os textos para a missa e o ofício da festa. Isso incluía hinos famosos como Pange lingua, Tantum ergo e Panis angelicus. Urbano envolveu-se nos assuntos da Dinamarca. Jakob Erlandsen, Arcebispo de Lund, queria tornar a Igreja dinamarquesa independente do poder real - o que o colocou em confronto direto com a Rainha viúva Margarida Sambiria, atuando como regente de seu filho, o rei Érico V da Dinamarca. A Rainha prendeu o Arcebispo, que respondeu emitindo uma interdição. Ambos os lados procuraram o apoio do Papa. O Papa concordou com vários pedidos da Rainha. Ele emitiu uma dispensa para alterar os termos da sucessão dinamarquesa para permitir que as mulheres herdassem o trono dinamarquês. No entanto, as principais razões do conflito permaneceram sem solução com a morte de Urbano, com o caso continuando na corte Papal em Roma. O exilado Arcebispo Erlandsen veio pessoalmente à Itália em busca de uma solução. No entanto, os complicados assuntos da Dinamarca eram uma preocupação menor para o Papa. Sua atenção estava voltada para os assuntos italianos. Durante o pontificado anterior, o longo confronto entre o Papa e o falecido imperador alemão de Hohenstaufen, Frederico II, alimentou confrontos entre cidades dominadas por gibelinos pró-Imperiais e aquelas dominadas por facções guelfas pró-Papais. O herdeiro de Frederico II, Manfred, ficou absorvido nesses confrontos. O capitão militar de Urbano era o condottiere Azzo d' Este, que liderava uma liga de cidades, incluindo Mântua e Ferrara. Os Hohenstaufen na Sicília tinham reivindicações sobre as cidades da Lombardia. Para contrariar a influência de Manfredo, Urbano apoiou Carlos I, Conde de Anjou na tomada do Reino da Sicília, porque era receptivo ao controle Papal. Carlos era Conde da Provença devido ao casamento e era muito poderoso. Urbano negociou com Manfredo durante dois anos para buscar seu apoio para reconquistar Constantinopla em troca do reconhecimento Papal de seu Reino. Ao mesmo tempo, o Papa prometeu navios e homens a Carlos através de um dízimo da cruzada. Em troca, Carlos prometeu não reivindicar terras imperiais no norte da Itália, nem nos Estados Papais. Carlos também prometeu restaurar o censo anual ou o tributo feudal devido ao Papa como suserano, sendo acordadas cerca de 10.000 onças de ouro, enquanto o Papa trabalharia para bloquear a eleição de Conradinp para Rei dos Alemães. Urbano IV morreu em Perugia em 2 de outubro de 1264, antes da chegada de Carlos à Itália. Seu sucessor, o Papa Clemente IV, deu continuidade aos seus acordos.

 

184º - Clemente IV - 1265 - 1268 

               Clemente IV, nascido Guy Foulques, foi Papa de fevereiro de 1265 a 29 de novembro de 1268. Soldado e advogado, nesta última qualidade foi secretário de Luís IX na França, a cuja influência deve provavelmente a sua eleição. Está sepultado em Viterbo. Era militar e secretário do Rei Luís IX. Eleito, excomungou Corradino da Suécia, mas isto não impediu a ocupação de Roma e Nápoles. Manfredo (1232-1266), filho do Imperador Frederico II e neto de Henrique VI e sua esposa Constância, assumiu o reino da Apulia e da Sicília após a morte do seu pai em 1250. Foi afastado do poder por seu meio-irmão Conrado IV, mas na morte deste, retomou o poder e foi coroado em Palermo (1258). Manfredo tinha grande popularidade entre seus súditos mas a Igreja, não o reconhecia seu direito ao trono. Considerado um guibelino e um herege, foi excomungado pelo Papa que indicou para ocupar o seu lugar Carlos de Anjou. Carlos invadiu a Itália (1265) com o exército do Papa e depôs e matou Manfredo na batalha de Benevento (1266). O Papa mandou o Bispo de Cosenza desenterrar o corpo de Manfredo e transferi-lo para fora das terras da Igreja. Ordenou em 1264, que fossem queimados todos os manuscritos talmúdicos que fossem encontrados e nomeou uma comissão que haveria de encarregar-se de expurgar do Talmud as passagens que considerassem ofensivas à Igreja. Papa de número 184, morreu em 29 de novembro de 1268, morreu em Viterbo e sepultado na Igreja de São Francisco de Viterbo.

 

185º - Gregório X - 1271 - 1276  

               Gregório X, nascido Tedaldo Visconti, OCist (Placência, 1210 — Arezzo, 10 de Janeiro de 1276). O conclave que o elegeu foi o mais longo da história da Igreja, durando quase três anos. Teobald Visconti foi monge da Ordem Cisterniense. Italiano de nascimento, gastou a maioria de sua carreira Eclesiástica nos Países Baixos. Era um homem severo e de grande dignidade. Foi amigo de São Tomás de Aquino e conselheiro dos Reis da Inglaterra e da França. Sucedeu ao Papa Clemente IV após três anos de Sé Vacante, devido às divisões entre os Cardeais. Os Cardeais franceses e italianos igualmente rachados quiseram um Papa de seu país devido à situação política com Carlos de Anjou. O "beco sem saída" foi quebrado finalmente quando os cidadãos de Viterbo, onde os Cardeais estavam reunidos, removeram o telhado do edifício onde os Cardeais estavam reunidos e lá entraram, somente permitindo-lhes comer pão e água. Três dias mais tarde, o Papa Gregório X foi eleito. (Desde então, os Cardeais escolheram sempre o Papa sob o fechamento e a chave). Gregório X foi considerado uma escolha forte porque embora fosse italiano, tinha passado parte da sua vida no norte dos Alpes e assim não estava envolvido em controvérsias políticas italianas recentes. Sua eleição veio como uma surpresa completa a ele, pois quando eleito estava envolvido na Nona Cruzada a São João de Acre com Eduardo I de Inglaterra na Palestina. Ajudou os irmãos Nicollo e Mateo Polo, tio e pai de Marco Polo, quando eles voltavam da China - governada por Kublai Khan - à sua pátria, a cidade de Veneza. Promulgou a Bula De Regno Portugaliae em 1276, que excomungava o Reino de Portugal, e o rei português D. Afonso III, o Bolonhês, devido a desentendimentos entre o reino e a Igreja. À chegada à Roma o seu primeiro ato foi reunir um concílio que teve lugar em Lyon em 1274 que debateu a condição da Terra Santa, os abusos na Igreja Católica, e o Grande Cisma que separou a Igreja Católica da Ortodoxia Oriental. Foi no regresso de uma das sessões do concílio que faleceu, em Arezzo. A Gregório X se deve a bula Ubi periculum, subsequentemente incorporada no Código de Direito Canónico, que continua a regular os conclaves para a eleição Papal. O Papa Gregório X foi beatificado em 1713.

 

186º - Inocêncio V - 1276

               O Papa Inocêncio V (c. 1225 - 22 de junho de 1276), nascido Pierre de Tarentaise, foi Papa de 21 de janeiro a 22 de junho de 1276. Membro da Ordem dos Pregadores, ele adquiriu uma reputação de pregador eficaz. Ele ocupou uma das duas "Cadeiras Dominicanas" da Universidade de Paris e foi fundamental para ajudar a elaborar o "programa de estudos" da Ordem. Em 1269, Pedro(Pierre) de Tarentaise foi provincial da província francesa dos dominicanos. Ele foi um colaborador próximo do Papa Gregório X, que o nomeou Bispo de Ostia e o elevou a Cardeal em 1273. Com a morte de Gregório, em 1276, Pedro foi eleito Papa, tomando o nome de Inocêncio V. Ele morreu cerca de cinco meses depois, mas durante seu breve mandato facilitou a paz entre Gênova e o rei Carlos I da Sicília. Pedro de Tarentaise foi beatificado em 1898 pelo Papa Leão XIII. Ele nasceu por volta de 1225, perto de Moûtiers, na região de Tarentaise do Condado de Saboia. Uma hipótese popular alternativa, no entanto, sugere que ele nasceu em La Salle, no vale de Aosta, na Itália. Ambos os lugares faziam parte do Reino de Arles no Sacro Império Romano-Germânico, mas agora o primeiro é no sudeste da França e o segundo no noroeste da Itália. No início da vida, por volta de 1240, ele ingressou na Ordem Dominicana em seu convento em Lyon. No verão de 1255, ele foi transferido para o studium generale do convento de S. Jacques em Paris. Essa mudança foi essencial para alguém que provavelmente estudaria na Universidade de Paris. Ele obteve o grau de Mestre em Teologia, e rapidamente adquiriu grande fama como pregador. Entre 1259 e 1264, ele ocupou a "Cadeira dos franceses", uma das duas cadeiras (cátedras) atribuídas aos dominicanos. Em 1259, Pedro participou, talvez por causa de seu status como um mestre em Paris, talvez como uma eleito Definidor (delegado) para a Província da França, no Capítulo Geral da Ordem Dominicana em Valenciennes, sob a liderança do Mestre Geral, Humberto de Romans. Pedro participou junto com Alberto Magno, Tomás de Aquino, Bonushomo Britto, e Florentius. Este Capítulo Geral estabeleceu um ratio studiorum, ou programa de estudos, o que era para ser implementada para toda a Ordem Dominicana, que apresentava o estudo da filosofia como um preparativo para aqueles que não eram suficientemente treinados para estudar teologia. Essa inovação iniciou a tradição da filosofia escolástica dominicana, que deveria ser posta em prática em todos os conventos dominicanos, se possível, por exemplo, em 1265, no studium provinciale da Ordem, no convento de Santa Sabina, em Roma. Esperava-se que cada convento tivesse alguém eleito para supervisionar os estudos preparatórios e um mestre eleito para estudos teológicos. No ano seguinte, ele recebeu o título de pregador geral.

               Em 1264, um novo Mestre-geral da Ordem dos Pregadores foi eleito, João de Vercelli. Foi uma oportunidade para se envolver em algumas políticas acadêmicas, já que Humberto de Romans, o patrono de Pedro, estava morto. Cento e oito das declarações de Pedro em seu Comentário sobre as frases de Peter Lombard foram denunciadas como heréticas. Mas, embora Pedro tenha se retirado de seu cargo de professor, João de Vercelli nomeou Tomás de Aquino para escrever uma defesa das 108 proposições. A reputação de Pedro era tal que ele foi imediatamente eleito provincial da província francesa por um período de três anos (1264-1267). Ele foi libertado do cargo no Capítulo Geral, realizado em Bolonha em maio de 1267. No final de seu mandato, e após a divulgação da réplica de Tomás de Aquino aos seus críticos, Peter retornou à sua cátedra na Universidade de Paris (1267). Em 1269, ele foi reeleito para o cargo de provincial da província francesa e ocupou o cargo até ser nomeado Arcebispo de Lyon. Em 6 de junho de 1272, o próprio Papa Gregório X nomeou Pedro de Tarantaise como Arcebispo de Lyon, cargo que ocupou até ser nomeado Bispo de Óstia. Dizem, no entanto, que Pedro nunca foi consagrado. No entanto, prestou juramento de lealdade no início de dezembro de 1272 ao rei Filipe III da França. O próprio Papa Gregório chegou a Lyon em meados de novembro de 1273, com a intenção de levar o máximo de prelados possível ao seu planejado concílio ecumênico. Ele se encontrou imediatamente com o rei Filipe III da França. Suas conversas eram obviamente harmoniosas, já que Filipe cedeu à Igreja o Condado Venaissino, que ele herdou de seu tio Alphonse, conde de Toulouse. O Segundo Concílio de Lyon foi aberto em 1 de maio de 1274. A primeira sessão foi realizada na segunda-feira, 7 de maio. Os principais itens da agenda foram a Cruzada e a reunião das Igrejas Orientais e Ocidentais.

               Pedro de Tarantaise foi elevado a Cardeal em 3 de junho de 1273, em um Consistório realizado em Orvieto pelo Papa Gregório X, e nomeado Bispo do subúrbio Sé de Óstia. Ele participou do Segundo Concílio de Lyon. Durante o Concílio, ele cantou a Missa Funeral e proferiu o sermão no funeral do Cardeal Boaventura, Bispo de Albano, morto em 15 de julho de 1274, e foi enterrado no mesmo dia na Igreja dos Franciscanos de Lyon. O Papa Gregório, os Padres do Concílio e a Cúria Romana participaram. Após a conclusão do Concílio, o Papa Gregório passou o outono e o inverno em Lyon. Ele e sua suíte partiram de Lyon em maio de 1275; deixou Vienne pouco depois de 30 de setembro de 1275 e chegou a Lausana em 6 de outubro. Lá ele se encontrou com o Imperador eleito Rudolph, rei dos romanos, e em 20 de outubro recebeu seu juramento de lealdade. Havia sete Cardeais com o Papa na época, e seus nomes são mencionados no registro do juramento: Petrus Ostiensis, Ancherus Pantaleone de S. Prassede, Guglelmus de Bray de S. Marco, Ottobono Fieschi de S. Adriano, Giacomo Savelli de S. Maria em Cosmedin, Gottifridus de Alatri de S. Giorgio em Velabro e Mattheus Rosso Orsini de S. Maria em Porticu. A festa chegou a Milão na terça-feira, 12 de novembro de 1275, e Florença, no dia 18 de dezembro. O partido Papal chegou a Arezzo a tempo do Natal, mas o Papa estava fraco e doente. A estadia em Arezzo foi prolongada até a morte de Gregório X, em 10 de janeiro de 1276. Apenas três Cardeais estavam em seu leito de morte: Pedro de Tarantaise, Pedro Juliani de Tusculum e Bertrand de Saint-Martin de Sabina, todos os Cardeais-Bispos. Segundo a Constituição Ubi periculum, aprovada pelo Concílio de Lyon, o Conclave para eleger seu sucessor deve começar dez dias após a morte do Papa. Após os dez dias exigidos, os Cardeais se reuniram na Vigília de Santa Inês (20 de janeiro) para ouvir a habitual Missa do Espírito Santo. Na manhã seguinte, 21 de janeiro, o Cardeal Petrus foi a escolha unânime dos eleitores, na primeira votação (escrutínio). Pedro de Tarantaise foi o primeiro dominicano a se tornar Papa. Ele escolheu o nome Pontifício de "Inocêncio". Sua decisão seria coroada em Roma, que não via Papa desde a partida de Gregório X na terceira semana de junho de 1272. Em 7 de fevereiro, a Cúria Papal havia chegado a Viterbo. O rei Carlos de Nápoles foi até Viterbo para encontrar o novo Papa e acompanhá-lo até Roma. Em 22 de fevereiro de 1276, festa da Cadeira de São Pedro, ele foi coroado na Basílica do Vaticano pelo Cardeal Giovanni Gaetano Orsini. Em 2 de março de 1276, o Papa Inocêncio concedeu ao rei Carlos I da Sicília o privilégio de manter a Senatoria de Roma, o governo da cidade e a Reitoria de Tuscia. Em uma carta de 4 de março, o Papa testemunha que o rei Carlos havia jurado lealdade pelo Reino de Nápoles e da Sicília. Em 9 de março, ele escreveu a Rudolf, rei dos romanos, implorando que ele não viesse à Itália e, se ele já havia começado sua jornada, interrompê-la, até que um acordo entre ele e o Papado pudesse ser finalizado. Isso significava que a coroação de Rudolf, que fora aprovada por Gregório X, não ocorreria imediatamente. No dia 17, ele escreveu novamente ao rei dos romanos, aconselhando-o a encontrar-se com os núncios Papais, e que, em suas negociações, ele não deveria, de maneira alguma, introduzir o tópico do Exarcado de Ravena, Pentápolis e Romandiola. Parecia extorsão. O favoritismo dos inocentes franceses em relação ao rei Carlos, irmão de Luís IX e tio de Filipe III, e sua dureza em relação a Rudolf começaram a mudar novamente o equilíbrio de poder na Itália e apontaram na direção da guerra. Papa Gregório no dia 26, ordenou aos Bispos de Parma e Comacchio que providenciassem a instalação de Boniface de Lavania (Lavagna) como Arcebispo de Ravena, como o Papa Gregório X havia decidido. Inocêncio foi capaz de organizar um tratado de paz entre Gênova e o rei Carlos I, assinado em 18 de junho de 1276. Em 18 de maio de 1276, o Papa Inocêncio V notificou o rei Filipe III de França que havia indicado seu amigo pe. Guy de Sully, OP, provincial dominicano de Paris (cargo que o próprio Inocêncio ocupou até 1272, quando foi nomeado Arcebispo de Lyon), junto à Sé de Bourges. Uma característica notável de seu breve pontificado foi a forma prática assumida por seu desejo de se reunir com a Igreja Oriental. Ele escreveu a Miguel VIII Paleólogo, informando-o da morte de Gregório X e desculpando-se pelo fato de que os representantes do imperador, George, o Arquidiácono de Constantinopla, e Theodore, o dispensador da Cúria Imperial, ainda não haviam sido libertados para retornar a Constantinopla. Ele estava enviando legados a Miguel VIII Paleólogo, o Imperador bizantino, em conexão com as recentes decisões do Segundo Concílio de Lyon, na esperança de intermediar uma paz entre Constantinopla e o rei Carlos I da Sicília. O rei Carlos, no entanto, estava interessado na conquista, não na concordância. Inocente estava interessado em enviar pessoas para negociar a reunião. Ele nomeou pe. Bartolommeo, O. Min., de Bolonha, um sábio das Sagradas Escrituras, para viajar para o Oriente, mas ele ordenou que ele viesse primeiro a Roma, para que um conjunto adequado pudesse ser escolhido para ele. A morte interveio. O Papa Inocêncio V morreu em Roma em 22 de junho de 1276, após um reinado de cinco meses e um (ou dois) dias. Ele foi enterrado na Arquibasílica de São João de Latrão, em uma magnífica tumba construída pelo rei Carlos. Infelizmente, a tumba foi destruída pelos dois incêndios do século XIV na Basílica, em 1307 e 1361. Inocêncio V não havia criado novos Cardeais e, portanto, o elenco de personagens no Conclave de julho de 1276 era o mesmo de janeiro. O rei Carlos, no entanto, esteve em Roma o tempo todo e ocupou o cargo de senador de Roma, como governador do Conclave. Seus desejos não podiam ser ignorados. Papa Inocêncio V foi o autor de várias obras de filosofia, teologia e direito canônico, incluindo comentários sobre as epístolas paulinas, e nas Sentenças de Peter Lombard. Ele às vezes é chamado de médico famoso. O Papa Leão XIII beatificou Pedro de Tarantaise (Inocêncio V) em 9 de março de 1898.

 

187º - Adriano V - 1276

               Papa da Igreja Cristã Romana nascido em Gênova, que tentou abolir o severo regulamento de Gregório X para o conclave. Foi nomeado Cardeal pelo tio Inocêncio IV, posteriormente tornou-se legado de Clemente IV na Inglaterra (1265-1267). Com a morte de Inocêncio V (1276), Carlos de Anjou, que, como senador da cidade, era responsável pela vigilância, pôs os Cardeais a pão e água para apressar as decisões de um conclave que já durava oito dias. Foi eleito em 11 de julho e logo pôs ordem nas regras eclesiásticas e procurou modificar e abolir as normas do conclave implantadas por seu antecessor Gregório X, mas não teve tempo e elas voltaram a vigorar para a indicação de seu sucessor. O Papa de número 187, morreu em 18 de agosto, em Viterbo, pouco depois de um mês de um curtíssimo pontificado, inclusive antes de ser consagrado, e foi sucedido por João XXI, que também quis abolir essas leis, e igualmente foi surpreendido pela morte. Basicamente a norma principal era que para a eleição eram necessários dois terços dos votos. Ninguém podia votar em si mesmo. Cada Cardeal colocava o seu nome num lado da cédula, e o nome do eleito do outro lado.

 

188º - João XXI - 1276 - 1277

               João XXI, nascido Pedro Julião Rebolo e mais conhecido como Pedro Hispano, (Lisboa, 1215 – Viterbo, 20 de maio de 1277) foi Papa desde 20 de setembro de 1276 até a data da sua morte, tendo sido também um famoso médico, filósofo, teólogo, professor e matemático português do século XIII. Adoptou sucessivamente os nomes de Pedro Julião como nome de batismo, Pedro Hispano como acadêmico e João XXI como Pontífice. João XXI irá marcar o seu breve pontificado (de pouco mais de 8 meses) pela fidelidade ao XIV Concílio Ecumênico de Lyon. Apressa-se a mandar castigar, em tribunal criado para o efeito, os que haviam molestado os Cardeais presentes no conclave que o elegera. Embora sem grande sucesso, leva por diante a missão encetada por Gregório X de reunir a Igreja Grega à Igreja do Ocidente. Esforça-se por libertar a Terra Santa em poder dos turcos. Tenta reconciliar grandes nações europeias, como França, Germânia e Castela, dentro do espírito da unidade cristã. Neste sentido, envia legados a Rodolfo de Habsburgo e a Carlos de Anjou, sem sucesso. Pontífice dotado de rara simplicidade, recebe em audiência tanto os ricos como os pobres. Dante Alighieri, poeta italiano (1265-1321), na sua famosa Divina Comédia, coloca a alma de João XXI no Paraíso, entre as almas que rodeiam a alma de São Boaventura, apelidando-o de "aquele que brilha em doze livros", menção clara a doze tratados escritos pelo erudito Pontífice português. O rei Afonso X de Leão e Castela, o Sábio, avô de Dom Dinis de Portugal, elogia-o em forma de canção no "Paraíso", canto XII. Mecenas de artistas e estudantes, é tido na sua época por 'egrégio varão de letras', 'grande filósofo', 'clérigo universal' e 'completo cientista físico e naturalista'. Mais dado ao estudo que às tarefas Pontifícias, João XXI delega no Cardeal Orsini, o futuro Papa Nicolau III, os assuntos correntes da Sé Apostólica. Ao sentir-se doente, retira-se para a cidade de Viterbo, onde morre a 20 de maio de 1277, vitimado pelo desmoronamento das paredes do seu aposento, estando o Palácio Apostólico em obras. É sepultado junto do altar-mor da Catedral de São Lourenço, naquela cidade. No século XVI, durante os trabalhos de reconstrução do templo, os seus restos mortais são trasladados para um modesto e ignorado túmulo, mas nem aqui encontraram repouso definitivo. Através do contributo da Câmara Municipal de Lisboa, por João Soares então seu presidente, o mausoléu é colocado a título definitivo, do lado do Evangelho na Catedral de Viterbo, a 28 de março de 2000.

 

189º - Nicolau III - 1277 - 1280

               Nicolau III nascido Giovanni Gaetano Orsini, O.S.B. (1216 — 22 de Agosto de 1280) foi Papa entre 25 de novembro de 1277 até a data da sua morte.  Nobre romano, que serviu sob as ordens de oito Papas, foi feito Cardeal-diácono pelo Papa Inocêncio IV (1243-54), protetor dos Franciscanos pelo Papa Alexandre IV (1254-61) e inquisidor-geral pelo Papa Urbano IV (1261-64). Após a morte do seu antecessor, o Vaticano ficou cerca de seis meses sem Papa. Foi eleito em 25 de novembro de 1277. O seu breve pontificado foi marcado por vários acontecimentos importantes. Político nato, fortaleceu consideravelmente a posição Papal na Itália. Concluiu uma concordata com Rodolfo I de Habsburgo (1273-91) em maio de 1278, na qual as regiões da Romanha e de Ravena foram garantidas ao Papa. Nicolau III compôs a bula Exiit em 14 de Agosto de 1279 para resolver o conflito interno da Ordem Franciscana, entre os partidários da observância estrita e liberal. Com enormes custos, reparou o Palácio de Latrão e o Vaticano, e construiu uma bela casa de campo em Soriano, na Itália, nos arredores de Viterbo. Nicolau III, apesar de ser descrito como um homem culto e com uma forte personalidade, terá sido vítima de censuras devido aos seus esforços para fundar principados para os seus sobrinhos e outras personalidades. Ele mesmo parente do Papa Celestino III, ainda teve um parente Papa, Bento XIII, descendente de um dos seus irmãos. Morreu de Apoplexia, em 22 de agosto de 1280.

 

190º - Martinho IV - 1281 - 1285

               Papa Martinho IV nascido Simon de Brion (ca. 1220 — 28 de Março de 1285), foi Papa de 22 de Fevereiro de 1281 até o dia da sua morte. Simon de Brion nasceu na França, em Château Montpensier, província de Touraine, cerca do ano de 1210. Foi padre em Rouen durante algum tempo, e depois serviu como Cânone e tesoureiro na igreja de S. Martinho em Tours. Em 1260, o rei Luís IX de França nomeou-o chanceler da França. Em Dezembro de 1262, foi feito padre-Cardeal (com o titulus da igreja de Santa Cecília) pelo Papa Urbano IV. Voltou a França como legado papal de Urbano IV e depois do seu sucessor, Papa Clemente IV, nas negociações para o apoio Papal de Carlos de Anjou, com quem estabeleceu uma forte ligação política, à Coroa da Sicília. Posteriormente, o Papa Gregório X enviou-o novamente à França como legado para conter os abusos da Igreja Católica no país; lá, presidiu a vários sínodos sobre reformas, sendo o mais importante destes o de Bourges em Setembro de 1276. Seis meses depois da morte do Papa Nicolau III em 1280, Carlos de Anjou interveio no conclave Papal de Viterbo, aprisionando dois Cardeais italianos influentes, com o argumento de que estes estavam a interferir na eleição. Sem esta oposição, Simon de Brie foi eleito com unanimidade, tomando o nome Martinho IV. Viterbo foi colocada sob interdito (penalidade Eclesiástica que suspende todas as celebrações e retira os sacramentos da igreja de um território ou país) pelo aprisionamento dos Cardeais. Roma não desejava aceitar um odiado francês como Papa, por isso Martinho IV foi coroado em Orvieto, em 23 de Março de 1281. Apesar de ser apenas o segundo Papa a escolher o nome de Martinho, no século XIII os tribunais Papais confundiram os nomes dos dois papas Marinho como Martinho. Assim, é conhecido como Martinho IV, e os Papas Marinho I (882-884) e Marinho II (942-946) com o nome de Martinho. Dependente de Carlos de Anjou em quase tudo, o novo Papa nomeou-o rapidamente para o cargo de Senador Romano. Sob a insistência deste, Martinho IV excomungou o Imperador de Bizâncio, Miguel VIII Paleólogo (1261-82), que obstava aos planos de Carlos para restaurar o Império Latino do Oriente, estabelecido depois da Quarta Cruzada. Quebrou assim a tênue união alcançada entre as igrejas grega e latina no Segundo Concílio de Lyon em 1274, e não foram possíveis mais negociações. Em 1282, Carlos foi deposto no violento massacre conhecido como as Vésperas Sicilianas. Os Sicilianos elegeram Pedro III de Aragão (1276-85) como rei e pretenderam, em vão, a confirmação Papal, apesar de estarem dispostos a reconfirmar a Sicília como estado vassalo do Papado; Martinho IV usou todos os recursos espirituais e materiais ao seu dispor contra o Aragonês, tentando preservar a Sicília para a Casa de Anjou. Excomungou Pedro III, declarou o seu reino de Aragão inválido e ordenou uma cruzada contra o mesmo, mas foi tudo em vão. Com a morte do seu protetor Carlos de Anjou, Martinho teve que abandonar Roma e foi para Perúgia, onde faleceu, a 28 de Março de 1285. Entre os sete Cardeais criados por Martinho IV estava Benedetto Gaetano, que posteriormente ascendeu ao Trono Papal como o famoso Papa Bonifácio VIII (1294-1303).

 

191º - Honório IV - 1285 - 1287

               Papa Honório IV, nascido Giacomo Savelli; (Roma, 1210 — Roma, 3 de abril de 1287), foi Papa de 2 de abril de 1285 até a data da sua morte. Pertencia a uma rica e influente família romana de onde já tinham saído quatro Papas: Bento II, Gregório II, Papa Eugênio II e Honório III. Embora dotado de boa capacidade política, teve poucos meses para mostrar a força da Igreja em seu Pontificado e não conseguiu elevar o prestígio da instituição Papal. Romano, da nobre família dos Savelli e sobrinho de Honório III, eleito Papa, sua primeira preocupação foi a de pôr ordem no estado Pontifício. Procurou estabelecer a ordem em Roma e, no Sul da Itália, apoiou a Casa de Anjou contra os aragoneses pela posse da Sicília. Procurou limitar os abusos do governo francês e garantir maiores liberdades individuais aos súditos. Promoveu uma nova expedição dos Anjou em águas sicilianas (1287), para pôr fim à revolta da Sicília, que começara com o tumulto das Vésperas (1282), porém teve um fim desastroso. Também procurou eliminar os conflitos que desde o Pontificado de Martinho IV, haviam separado o Papado de várias cidades e senhores. Em termos culturais, introduziu o estudo dos idiomas orientais na Universidade de Paris, à qual inicialmente ordenou que iniciasse os estudos do árabe, a fim de explicar a fé errônea dos muçulmanos em sua própria língua. Tentou se aproximar da Igreja grega e projetou um acordo com os muçulmanos. Reconheceu a ordem dos Carmelitas, foi amigo e Patrono dos franciscanos, dominicanos e aprovou a ordem dos agostinianos.

 

192º - Nicolau IV - 1288 - 1292

               O Papa Nicolau IV (30 de setembro de 1227 — 4 de abril de 1292), nasceu Girolamo Masci, Papa desde 22 de fevereiro de 1288 até sua morte. Ele foi o primeiro franciscano a ser eleito Papa. Após a morte do Papa Honório IV em 3 de abril de 1287, o Conclave foi realizado em Roma, no Palácio Papal ao lado de Santa Sabina, no Monte Aventino, onde o Papa Honório havia morrido. Isso estava de acordo com a Constituição Ubi periculum assim os sobreviventes elegeram por unanimidade Girolamo Masci, para o Papado no primeiro escrutínio. Dizem que os Cardeais ficaram impressionados com sua firmeza em permanecer no Palácio Papal, mas não há documentação real sobre seus motivos. Como ele admitiu em seu manifesto eleitoral, o Cardeal Masci estava extremamente relutante em aceitar, e, de fato, ele persistiu em sua recusa por uma semana inteira. Finalmente, em 22 de fevereiro, ele cedeu e concordou. Ele se tornou o primeiro Papa franciscano e escolheu o nome Nicolau IV em memória de Papa Nicolau III, que o tornara Cardeal. Dadas as consideráveis perdas para os números do Colégio Sagrado em 1286 e 1287, não surpreende que Nicolau IV tenha rapidamente preenchido as vagas. O que é surpreendente é que ele nem sequer alcançou o número de Cardeais que estavam vivos sob Honório IV, muito menos o excedeu. Em 16 de maio de 1288, nomeou seis novos Cardeais: Bernardus Calliensis, bispo de Osimo (morto em 1291), Hugues Aiscelin (Seguin) de Billon, OP, da diocese de Clermont, na Auvergne; Mateus de Aquasparta, na Toscana, Ministro Geral dos Franciscanos desde 1287; Pietro Peregrosso de Milão, vice-chanceler da Santa Igreja Romana; Napoleone Orsini; e Pietro Colonna. Nicolau IV emitiu uma importante constituição em 18 de julho de 1289, que concedeu aos Cardeais metade de toda a receita proveniente da Santa Sé e uma parte na gestão financeira, abrindo caminho para a independência do Colégio de Cardeais que, no século seguinte, seria prejudicial ao Papado. Quanto à questão da sucessão siciliana, como soberano feudal do reino, Nicolau anulou o tratado, concluído em 1288 por meio da mediação de Eduardo I de Inglaterra, que confirmou Jaime II de Aragão na posse da ilha da Sicília. Este tratado não atendeu adequadamente aos interesses Papais. Em maio de 1289, ele coroou o rei Carlos II de Nápoles e Sicília depois que este reconheceu expressamente a soberania Papal, e em fevereiro de 1291 concluiu um tratado com os reis Afonso III de Aragão e Filipe IV de França, olhando para a expulsão de Tiago da Sicília. Em 1288, Nicolau se encontrou com o cristão nestoriano Rabban Bar Sauma da China. Em agosto de 1290, ele concedeu à universidade o status de Studium Generale que o rei Dinis I de Portugal acaba de fundar alguns meses antes, na cidade de Lisboa. A perda do Acre em 1291 levou Nicolau IV a renovar o entusiasmo por uma cruzada. Ele enviou missionários, entre eles o franciscano João de Montecorvino, para trabalhar entre búlgaros, etíopes, mongóis, tártaros e chineses. Nicolau IV morreu em Roma, em 4 de abril de 1292, no Palácio que ele havia construído ao lado da Basílica da Libéria (S. Maria Maggiore), onde foi enterrado. Seu epitáfio diz: "Aqui está Nicolas IV, filho de São Francisco".

 

193º - São Celestino V - 1294

               Papa São Celestino proveniente da ordem beneditina, Papa de 29 de agosto a 13 de dezembro de 1294. Nascido Pietro del Murrone, na região de Abruzzi, na Itália, décimo primeiro filho de pais camponeses, era simples eremita sob a regra de S. Bento, na ocasião em que o elegeram Papa, aos 85 anos de idade, na Perugia, depois de uma vacância de 27 meses. Após a morte de Nicolau IV em 4 de abril de 1292, os doze Cardeais-eleitores, divididos, por lealdade de família, entre os Orsini e os Collona, não conseguiram reunir os dois terços de votos necessários para a eleição. Duas vezes diversos deles saíram de Roma para fugir ao calor abrasador, enquanto os Cardeais da poderosa família Collona ficaram para trás e tentaram realizar uma eleição sozinhos. Em outubro de 1293, o conclave tornou a se reunir em Perugia e aumentou a pressão sobre os Cardeais para que elegessem alguém, com pressão de Carlos II, rei da Sicília e de Nápoles, e de distúrbios em Roma e na região de Orvieto. Em 5 de julho de 1294, o decano do Colégio de Cardeais citou uma profecia do renomado eremita Pietro del Murrone segundo a qual os Cardeais sofreriam o castigo divino, se não escolhessem logo um Papa. O Cardeal-decano também anunciou que votaria em Pietro. Gradativamente, a margem de Pietro alcançou dois terços e depois a unanimidade. Ele foi saudado como o "Papa angélico", com base em um sonho do século XIII, de um Papa que anunciaria a era do Espírito Santo.

          Carlos II e seu filho escoltaram-no, montado em um burrico, até L'Aquila (cidade nos domínios de Carlos), onde Pietro foi consagrado Bispo de Roma em sua igreja de Santa Maria di Collemaggio, em 29 de agosto. Adotou o nome Celestino V. Carlos providenciou para que o novo Papa fosse residir em Nápoles, no Castel Nuovo, não em Roma, como a Cúria exigia. De Nápoles, Celestino fazia tudo que Carlos lhe ordenava: colocou homens da confiança dele em cargos importantes na Cúria e nos Estados Pontifícios, nomeou doze Cardeais que Carlos propôs, inclusive sete franceses, e nomeou o filho de Carlos, Luís de Toulouse, Arcebispo de Lyon. Também reintroduziu as regras de conclave instituídas por Gregório X, que faziam do Rei o guardião da eleição Papal seguinte. Inculto (não falava latim) e, em geral, desnorteado, (às vezes nomeava duas pessoas para o mesmo beneficio), mostrou-se administrador inepto. Perto do Advento, propôs que três Cardeais assumissem a responsabilidade pelo governo da Igreja enquanto ele jejuava e rezava. Quando o plano foi rejeitado, Celestino consultou o Cardeal Benedetto Caetani (que lhe sucederia como Bonifácio VIII), famoso advogado canônico, sobre a possibilidade de renunciar. Caetani incentivou-o a fazê-lo e preparou todos os papéis e procedimentos necessários. Em 13 de dezembro, em consistório pleno, Celestino V leu a fórmula de abdicação que Caetani lhe preparara. Despojou-se da insígnia Papal e, em um último apelo, exortou os Cardeais a proceder imediatamente à eleição do seu sucessor. A renúncia provocou uma guerra de tratados pró e contra sua validade. Quando o próprio Caetani foi eleito, providenciou para que Pietro não voltasse a seu eremitério no monte Murrone, como desejava. O novo Papa temia que Pietro fizesse um ponto de reunião para um cisma. Pôs o ex-Papa sob vigilância (da qual ele fugiu durante alguns meses) e acabou prendendo-o na torre de Caste Fumone, a leste de Ferentino, onde parece que Pietro não foi maltratado. Morreu de infecção causada por um abcesso, em 19 de maio de 1296. Em princípio, seu corpo foi sepultado em Ferentino, mas em 1317 foi transferido para Santa Maria di Collemaggio, em L'Aquila, onde foi coroado Papa. Posteriormente, em 5 de maio de 1313, sob pressão do rei Filipe IV da França, inimigo ferrenho de Bonifácio VIII, o Papa Clemente V canonizou Pietro, como confessor (isto é, alguém que sofreu pela fé, com exceção da morte), em vez de mártir, como Filipe queria. Foi canonizado em Avinhão pelo Papa Clemente V em 3 de Maio de 1313, sendo conhecido como São Pedro Celestino.

 

194º - Bonifácio VIII - 1294 - 1303

               Papa Bonifácio VIII (c. 1235 – 11 de outubro de 1303) foi Papa de 1294 até à data da sua morte. Nasceu com o nome Benedetto Gaetani. Atualmente, Bonifácio VIII é provavelmente lembrado por seus conflitos com Dante Alighieri, que o retratou no inferno em sua Divina Comédia, e a publicação da bula Unam Sanctam na disputa contra o rei Filipe IV da França. Benedetto nasceu em 1235 em Anagni, a cerca de 50 km a sudeste de Roma, filho mais novo de uma pequena mas importante família nobre da Lombardia, os Caetani (ou Gaetani) que já antes tinha dado um Papa (Gelásio II). Depois, na sua adolescência, tornou-se Cônego da Catedral de Anagni. Em 1252, quando seu tio Pedro Gaetani se tornou Bispo de Todi, na Umbria, começou em Todi os seus estudos jurídicos. Benedetto nunca esqueceu suas experiências lá, tanto que, mais tarde, descreveu a cidade como "a morada de sua juventude," a cidade que o "alimentou ainda em tenra idade", e como um lugar onde ele "realizou duradouras memórias". Ainda aí, em 1260, Benedetto adquiriu o Sacerdócio, bem como o pequeno Castelo nas proximidades em Sismano. Mais tarde na vida ele repetidamente expressou sua gratidão a Anagni, Todi, e sua família. Em 1264, Benedetto se tornou parte da Cúria Romana, onde atuou como secretário do Cardeal Simão de Brie em uma missão na França. Da mesma forma, ele acompanhou o Cardeal Ottobono Fieschi à Inglaterra (1265–1268), a fim de fazer um acordo entre um grupo de Barões rebeldes contra Henrique III, rei da Inglaterra. Após oito anos, período do qual nada se sabe sobre o que ocorreu em sua vida, Benedetto retornou da Inglaterra, e foi enviado à França para fiscalizar a cobrança de dízimos em 1276 e depois se tornou um notário Papal no final de 1270. Durante este tempo, Benedetto acumulou cargos, sendo promovido, em primeiro lugar a Cardeal-diácono em 1281 e, em seguida, dez anos mais tarde Cardeal-presbítero. Como Cardeal, ele sempre serviu como legado Papal em negociações diplomáticas com a França, Nápoles, Sicília e Aragão. Bonifácio VIII no jubileu de 1300 concedendo uma indulgência extraordinária. Foi eleito Papa em 24 de dezembro de 1294, após a abdicação do Papa Celestino V em 13 de dezembro, dez dias depois os Cardeais iniciaram um conclave no Castel Nuovo em Nápoles e em 24 de dezembro de 1294, por uma maioria de votos Benedetto Gaetani é eleito Papa, escolhendo o nome de Bonifácio VIII. A cerimônia de sua consagração e coroação foi realizada em Roma, em 23 de janeiro de 1295. Em 1300 Bonifácio VIII institui o primeiro jubileu cristão por meio da bula Antiquorum fide relatio, que concedeu uma indulgência extraordinária e plenária aos fiéis que fizessem uma peregrinação a Roma, ao túmulo de São Pedro. Devido ao jubileu, Bonifácio restaurou as igrejas de Roma, particularmente as Basílicas de São Pedro, a Basílica de São João de Latrão, e a Basílica de Santa Maria Maior. A partir de então os jubileus e a anunciação de uma indulgência extraordinária foram comemorados com uma periodicidade de 50 anos. Bonifácio VIII defendeu algumas das mais fortes afirmações da supremacia espiritual dos Papas sobre o temporal dos Reis e dos Senhores Feudais, vinculando-se em grande parte aos ideais da Reforma gregoriana que tinha sido delineada 250 anos antes, demonstrando-a na sua política externa. O conflito entre Bonifácio VIII e os reis europeus ocorreu em um momento de expansão dos Estados-nação e o desejo de consolidação do poder pelos monarcas. A intervenção de Bonifácio nos assuntos temporais levou a muitas disputas com o Imperador Alberto I da Germânia (1291–1298), com a poderosa família dos Colonna, com Filipe IV de França (1285–1314) e estranhamente com Dante Alighieri (que escreveu De Monarchia para argumentar contra ele). Na França, durante seu reinado, Filipe IV centralizou em si todo o poder, que era possível a um Rei, e cercando-se dos melhores advogados civis, descredenciou o Clero de toda a participação na administração da lei. Fez mais, pois decretou impostos ao mesmo clero, a fim de financiar as suas guerras contra outros países. Nessa altura o Papa Bonifácio tomou uma posição dura contra ele porque, entre outras coisas, viu a tributação como um abuso aos tradicionais direitos da Igreja e publicou a bula Clericis laicos, em 24 de Fevereiro de 1296, na qual a proíbe sem prévio acordo com a Santa Sé. Foi aí que as hostilidades entre ambos começaram. Filipe retaliou contra a bula, negando a exportação de dinheiro da França para Roma, que tratava-se dos fundos necessários para o funcionamento da Igreja. Bonifácio então encerra a questão com a bula Etsi de statu, de 31 de Julho de 1297, permitindo que a tributação seja feita somente "durante uma emergência". Depois de complicações que envolvem a captura, por Filipe, do Bispo Bernardo Saisset, defensor do Papa, o conflito reacendeu-se. Em dezembro de 1301, Bonifácio enviou a Filipe a bula Ausculta fili ("Ouça, Meu Filho"), defendendo a supremacia Papal. Muitos historiadores sugerem que, em 1301, nessa altura, Bonifácio acrescenta uma segunda coroa para si, na tiara Papal, para simbolizar a superioridade da autoridade espiritual em relação à autoridade civil. A rivalidade entre os dois atingiu o seu auge logo depois, quando Filipe começou a lançar uma forte campanha difamatória contra Bonifácio. Em 18 de Novembro de 1302, Bonifácio emitiu uma das bulas mais importantes da história do Papado: Unam Sanctam, onde ele declara a superioridade do poder espiritual sobre o temporal, no entanto, o documento possuiu pouca repercussão e não foi aceito pelo corpo de fé. Em resposta, Guillaume de Nogaret, ministro-chefe de Filipe, acusou Bonifácio de ser um "criminoso herético" para o Clero francês. Em 1303, Filipe e Nogaret foram excomungados. No entanto, em 7 de setembro de 1303, um exército liderado por Nogaret e Sciarra Colonna da família Colonna, surpreenderam Bonifácio em seu retiro em Anagni. O Rei e os Colonna exigiram que ele renunciasse, Bonifácio porém, respondeu que preferiria morrer. Reza a lenda que, em resposta, nessa altura um membro da família Colonna deu uma sapatada (tapa) em Bonifácio, que ainda é lembrado no folclore local de Anagni. Bonifácio foi espancado e quase executado, mas foi libertado da prisão após três dias por intervenção dos habitantes locais. Seu legado é significativo no campo do Direito Canônico, onde Bonifácio VIII continua a ter grande influência. Publicou 88 cânones jurídicos conhecido como o "Regulae iuris", em 1298. Esta obra é bem conhecida e compreendida pelos canonistas até à atualidade, a fim de interpretar e analisar os Cânones e outras formas de leis Eclesiásticas corretamente. O "Regulae Iuris" aparece no final da chamada Liber Sextus, promulgada por Bonifácio VIII e publicado como um dos cinco Decretais no Corpus Iuris Canonici. Outros sistemas de direito também têm os seus próprios "Regulae Iuris", com o mesmo nome ou algo que possui uma função semelhante. Bonifácio VIII também fundou a Universidade La Sapienza de Roma em 1303. Após a sua morte e a sede do Papado seria removida para Avinhão, na França, o Papa Clemente V consentiu um julgamento post mortem movida, em 1309, contra o seu antecessor. Foi um processo de investigação judicial, contra a memória de Bonifácio, em que o rei Filipe forjou as acusações retratadas por falsas testemunhas que alegaram opiniões heréticas do ex-Papa. Nelas incluía o crime de simonia que, aliás, como aconteceu no processo contra os Templários, era o padrão de difamação de Filipe contra seus inimigos. Antes do julgamento real poder ser realizado, Clemente convenceu Filipe a deixar a questão da culpa de Bonifácio para o Concílio de Vienne, que se reuniu em 1311. Quando o concílio se reuniu, três Cardeais compareceram perante ele e testemunharam a ortodoxia e moralidade do Papa morto e o concílio decretou que o assunto estava encerrado.

 

195º - Bento XI - 1303 – 1304

               Nascido Nicola Boccasini (Niccolò de Treviso), foi Papa de 22 de outubro de 1303 a sua morte. Ele também era membro da Ordem dos Pregadores. Foi beatificado com seu culto confirmado pelo Papa Clemente XII em 1736. Ele é um Patrono de Treviso. O conclave para eleger o sucessor de Bonifácio VIII foi realizado na Arquibasílica de São João de Latrão e o Colégio de Cardeais desejou um candidato adequado que não fosse hostil ao rei Filipe IV da França. Após uma votação em um conclave que durou um dia, Boccasini foi eleito Papa. Ele foi rápido em libertar o rei Filipe IV da excomunhão que Bonifácio VIII lhe impusera. No entanto, em 7 de junho de 1304, Bento XI excomungou o implacável ministro de Filipe IV, Guilherme de Nogaret, e todos os italianos que haviam participado da apreensão de seu antecessor em Anagni. Bento XI também organizou um armistício entre Filipe IV da França e Eduardo I da Inglaterra. Após um breve Pontificado que durou apenas oito meses, Bento XI morreu repentinamente em Perugia. Como relatos originais, a suspeita recaiu sobre Nogaret com a suspeita de que sua morte súbita foi causada por envenenamento. Entretanto, não há evidências diretas para apoiar ou refutar a alegação de que Nogaret envenenou o Papa. O sucessor de Bento XI, Papa Clemente V, estava na França quando eleito e nunca viajou para Roma. Seus sucessores residiram principalmente em Avignon, inaugurando o período às vezes conhecido como o Cativeiro Babilônico. Ele e os Papas franceses que o sucederam estavam completamente sob a influência dos Reis da França. Bento XI também celebrou dois Consistórios com o objetivo de criar novos Cardeais. O primeiro, em 18 de dezembro de 1303, elevou o pe. Niccolò Albertini, OP, o Bispo de Spoleto; e pe. William Macclesfield (Marlesfeld), OP, de Canterbury, prior da província inglesa dos dominicanos. Em 19 de fevereiro de 1304, ele elevou Walter Winterburn, OP, de Salisbury, o confessor do rei Eduardo I da Inglaterra, que não queria se separar dele, e o manteve na Inglaterra por algum tempo. Quando chegou a Perugia, em 28 de novembro de 1304, o Papa Bento estava morto. O cardeal Winterburn morreu em Gênova, em 24 de setembro de 1305. Não se pode deixar de notar que os três novos Cardeais eram membros da Ordem Dominicana. Bento XI ganhou uma reputação de Santidade e os fiéis vieram para venerá-lo. Sua tumba ganhou reputação pela quantidade de milagres que surgiram no local. O Papa Clemente XII aprovou seu culto em 24 de abril de 1736, que atuou como sua beatificação formal. O Papa Bento XIV estendeu sua veneração à República de Veneza em 1748, após um pedido dos venezianos. Uma observação sobre a numeração: o Papa Bento X (1058-1059) é agora considerado um antipapa pela Igreja Católica. Na época da eleição de Bento XI, no entanto, ainda era considerado um Papa legítimo, e, portanto, o homem que a Igreja Católica considera oficialmente o décimo verdadeiro Papa Bento. Niccolo Boccasini, recebeu o número oficial XI em vez de X, e consequentemente os Papas chamados Bentos posteriores, que deveriam ter um dígito a menos.

 

SEDE DA IGREJA MUDA PARA A FRANÇA.

 

196º - Clemente V - 1305 - 1314

               O Papa Clemente V, nascido Bertrand de Gouth (perto de Villandraut, 1264 – Roquemaure, 20 de abril de 1314), Pontificou entre junho de 1305 até a sua morte. Foi Bispo de Saint-Bertrand-de-Comminges, antes de se tornar Papa. Foi eleito após um longo conclave realizado em Perugia, onde se defrontaram os interesses dos Cardeais italianos e franceses. Isso acontece após um pacto selado com o então rei da França, Filipe, o Belo, no qual o monarca, com seu poder e influência o ajudou a alcançar esse lugar principalmente para que retirasse a excomunhão da família real francesa, colocada pelo Papa Bonifácio VIII. O seu Pontificado ficou marcado por duas coisas: pela mudança da Santa Sé de Roma para Avinhão, em 1309, justificada pelos tumultos que ocorriam na Itália, e pela destruição trágica da Ordem dos Cavaleiros Templários — ordem criada pela própria Igreja Católica com o propósito original de proteger os cristãos em peregrinação à Terra Santa. Clemente V foi então forçado, por Filipe, a promover uma investigação post mortem do Papa Bonifácio VIII, contra quem Filipe forjara acusações. Porém, durante o Concílio de Vienne, reunido em 1311, a ortodoxia e a moralidade do Papa morto acabou por ser confirmada. Seu túmulo está na igreja colegiada (que ele havia construído) em Uzeste, província de Gironde. O rei Filipe IV da França conseguiu persuadir o Papa Clemente a deslocar a Sede Papal de Roma para Avinhão, às margens do rio Ródano, no Palácio dos Papas de Avinhão.

 

197º - João XXII - 1316 - 1334

               O Papa João XXII, nascido Jacques d'Euse (Cahors, 1249 — Avinhão, 4 de dezembro de 1334), foi Papa da Igreja Católica de 1316 até sua morte. Inaugurou o período dos Papas de Avinhão. Rebento de uma família de burgueses banqueiros em Cahors, estudou medicina em Montpellier e direito em Paris. O período de dois anos de sede vacante entre a morte de Clemente V em 1314 e a eleição de João XXII em 1316 deveu-se às desavenças extremas entre os Cardeais, os quais estavam divididos em duas facções. Depois de dois anos, Filipe V da França finalmente articulou a realização de um conclave com vinte e três Cardeais em Lyon e, através de um engodo, prendeu os Cardeais em uma igreja até que a eleição estivesse concluída. Os Cardeais então elegeram-no como Papa, sendo coroado em Lyon. Este Papa decidiu que a residência papal seria em Avinhão e não em Roma. João XXII envolveu-se em movimentos políticos e religiosos de muitos países europeus, com o objetivo de promover os interesses da Igreja, tornando-se um Papa muito controverso em seu tempo. Antes da eleição de João XXII, decorreu uma disputa pela Coroa Imperial entre Luís IV da Baviera e seu oponente Frederico I da Áustria. João XXII foi neutro a princípio, mas em 1323, quando Luís IV venceu a disputa e tornou-se o Santo Imperador Romano, os partidos Guelfo (Papal) e Gibelino (Imperial) iniciaram uma disputa muito séria. Esta foi parcialmente causada pelas aclamações extremas da autoridade de João XXII sobre o Império e parcialmente pelo apoio por Luís IV aos Fraticelli, Franciscanos espirituais, os quais João XXII havia condenado por sua visão distorcida da chamada pobreza evangélica na Bula Papal Sancta Romana. Luís IV tinha assistência de Marsilius de Pádua, e mais tarde do monge britânico William de Ockham. Luís IV invadiu a Itália, entrou em Roma e designou Pietro Rainalducci como o antipapa Nicolau V, em 1328. O projeto foi um fiasco, e a superioridade dos Gelfos em Roma foi mais tarde restaurada. Ainda assim, Luís IV tinha silenciado as aclamações de autoridade do Papa, e este permaneceu o restante de sua vida em Avinhão. Como administrador conseguiu estabilizar a situação da igreja na época.

 

198º - Bento XII - 1334 - 1342

               O Papa Bento XII (1285 - 25 de abril de 1342), nascido Jacques Fournier, foi o Papa de 30 de dezembro de 1334 até sua morte. Ele foi o terceiro Papa de Avignon. Bento foi um Papa cuidadoso que reformou as ordens monásticas e se opôs ao nepotismo. Incapaz de remover sua capital para Roma ou Bolonha, ele iniciou o grande Palácio em Avignon. Ele decidiu contra uma noção do Papa João XXII, dizendo que as almas podem atingir a "plenitude da visão beatífica " antes do Juízo Final. Apesar de ser um reformador sólido, ele tentou, sem sucesso, reunir a Igreja Ortodoxa e a Igreja Católica, quase três séculos após o Grande Cisma; ele também não chegou a um acordo com Luís IV do Sacro Império Romano-Germânico. Bento XII foi um Papa em reforma que não seguiu as políticas de seu antecessor. Ele escolheu fazer as pazes com o Luís IV do Sacro Império Romano-Germânico e, na medida do possível, chegou a um acordo com os franciscanos, que então estavam em desacordo com a Sé Romana. Ele tentou conter os luxos das ordens monásticas, embora sem muito sucesso, também ordenou a construção do Palácio dos Papas de Avinhão. Bento passou a maior parte do tempo trabalhando em questões de teologia. Ele rejeitou muitas das ideias desenvolvidas por João XXII. A esse respeito, ele promulgou uma constituição apostólica, Benedictus Deus, em 1336. Esse dogma definia a crença da Igreja de que as almas dos que partem recebem sua recompensa eterna imediatamente após a morte, em vez de permanecer em um estado de existência inconsciente até o Juízo Final. Embora alguns afirmem que ele fez campanha contra a Imaculada Conceição, isso está longe de ser claro. Ele se envolveu em longos debates teológicos com outras figuras notáveis ​​da época, como Guilherme de Ockham e Mestre Eckhart. Embora nascido francês, Bento não sentiu patriotismo em relação à França nem a seu rei, Filipe VI da França. Desde o início de seu Papado, as relações entre ele e Filipe foram frígidas. Depois de ser informado do plano de Filipe de invadir a Escócia, Bento sugeriu que Eduardo III de Inglaterra, provavelmente venceria, independentemente.

 

199º - Clemente VI - 1342 - 1352

               O Papa Clemente VI nascido Pierre Roger, O.S.B., (Rosiers-d'Égletons, cerca de 1291 — 6 de dezembro de 1352) foi o quarto Papa do Papado de Avinhão. O seu Pontificado decorreu de 7 de maio de 1342 até a data da sua morte. Era Monge Beneditino. Tal como os seus antecessores, era dedicado às causas francesas. Em 1347 canonizou Santo Ivo (1253 - 1293), Patrono dos advogados, procuradores, juízes, juristas, notários, órfãos e abandonados. A 20 de outubro de 1349 proibiu os flagelantes, uma seita da zona do Reno que emergiu na altura da Peste Negra. Sobreviveu a esta epidemia, primeiro seguindo os conselhos dos seus médicos de se rodear de piras, e depois retirando-se para o campo, perto de Avinhão. Mas a coragem e a caridade do religioso afloraram quando surgiu a pandemia. Ele obrigava os médicos a visitar os pobres e chegou a comprar um terreno para servir de cemitério para as vítimas da peste negra. Escreveu a bula 'Unigenitus' (27 de janeiro de 1343), para justificar o poder Papal e a concessão de indulgências. Este documento foi usado na defesa das indulgências muitos anos depois, quando Martinho Lutero afixou as suas 95 teses em Wittenberg, em 1517.

 

199 . 1 - Santa Catarina de Siena

               Nascida em Siena, na Itália, por volta de 1347, Catarina ouvira o chamamento de Deus desde a mais tenra infância, numa idade em que, normalmente, só se pensa em brincar. Passava sua infância aproveitando o silêncio e a solidão de sua casa para rezar e, em segredo, flagelar seus ombros com uma corda, por amor a Deus. Visitada em sonho por São Domingos de Gusmão, Catarina tomou a firme resolução de tornar-se "mantelata" – como eram chamadas as leigas da ordem dominicana.  Ao lado de uma sólida vida interior, Santa Catarina de Siena desempenhou um papel fundamental na história da Igreja, ao pedir ao Papa Gregório XI o fim do terrível "grande cisma do Ocidente". Ela exortou o Sumo Pontífice a sair do exílio em Avinhão e voltar para Roma, a fim de devolver a unidade ao povo católico. Ao fim de sua vida, a Santa de Siena configurou-se inteiramente a Nosso Senhor, sendo coroada com os Santos Estigmas. Ela, que era capaz de não tomar, durante cinquenta e cinco dias, outro alimento senão uma hóstia, converteu-se em um milagre vivo de Deus. Por isso, ainda em 1461, menos de um século depois de seu nascimento para o Céu, foi canonizada pelo Papa Pio II.

Jesus revela a Santa como é o Inferno

               Diz-lhe Jesus: "Filha, a tua linguagem é incapaz de descrever os sofrimentos desses infelizes. No Inferno, os pecadores padecem quatro tormentos principais: Primeiro tormento: é a ausência da minha visão. Um sofrimento tão grande, que os condenados, se fosse possível, prefeririam sofrer o fogo, vendo-me, do que ficarem fora dele sem me verem. Segundo tormento, como consequência, é o remorso que corrói interiormente o pecador, privado de mim, longe da conversação dos Anjos, a conviver com os demônios. Aliás, a visão do Diabo constitui o terceiro tormento. Ao vê-lo, duplica-se o sofrer... Os infelizes danados veem crescer os seus padecimentos ao verem os demônios. Nestes, eles conhecem-se melhor, entendendo que pela própria culpa mereceram o castigo. Assim, o remorso martiriza-os e jamais cessará o ardor da consciência. Muito grande é este tormento, porque o Diabo é visto no seu próprio ser; tão horrível é a sua fealdade, que a mente humana não consegue imaginar. Segundo a Justiça Divina, ele é visto mais ou menos horrível pelos condenados, conforme a gravidade das suas culpas. O quarto tormento é o fogo. Um fogo que arde sem consumir, sem destruir o ser humano. É algo imaterial, que não destrói a alma incorpórea. Na minha Justiça, permito que tal fogo queime, faça padecer, aflija; mas não destrua. É ardente e fere de modo crudelíssimo e de muitas maneiras. A uns mais, a outros menos, segundo a gravidade dos seus pecados." (O Diálogo, 14.3.2)

A carta a seguir foi escrita de próprio punho por Santa Catarina em outubro de 1377. Fala de uma impressionante experiência mística, tida pela Santa no dia de São Francisco de Assis. É como um resumo de sua obra prima “O Diálogo”.

Para frei Raimundo de Cápua

Saudação e objetivo

               Em nome de Jesus Cristo crucificado e da bondosa Maria, caríssimo e bondoso pai em Jesus Cristo, eu Catarina, serva e escrava dos servos de jesus, vos escrevo no seu precioso sangue, desejosa de vos ver seguidor e amante da verdade, qual verdadeiro filho do crucificado. Ele é a verdade e a flor perfumada na ordem e na hierarquia da Santa Igreja, e vós também deveis sê-lo. Ocorre não desanimar e não retroceder por causa das numerosas perseguições. Seria muito louco aquele que desprezasse uma rosa por medo dos espinhos! Quero vos ver como homem forte, sem medo de ninguém. Estou certa de que, pela infinita bondade divina, se realizará este meu desejo.

Necessidade de reavivamento espiritual

               Caríssimo pai, revesti-vos de fortaleza na doce esposa de Cristo. Quanto mais ela sofre dificuldades e amarguras, tanto mais a verdade divina promete enchê-la de felicidade e conforto. Sua felicidade será esta: a reforma mediante pastores santos e bons, autênticas flores a dar perfume e glória a Deus pelas virtudes. Essa é a reforma necessária, ou seja, a dos sacerdotes e pastores. A essência dessa esposa não carece de reforma, pois não decresce nem é prejudicada pelos delitos dos ministros. Alegrai-vos, portanto, na amargura! Deus prometeu dar-nos a paz depois da angústia.

Três pedidos a Deus

               Tal foi a consolação que recebi ao chegar-me a carta do bondoso papai e a vossa. Sofre muito pelo dano causado à Santa Igreja e por causa de vossa tristeza, segundo quanto experimentei dentro de mim no dia de São Francisco. Fiquei feliz, porque me tirastes a preocupação. Tendo lido as cartas e compreendido tudo, pedi a uma serva de Deus (a própria Catarina) que oferecesse lágrimas e suores em favor da Santa Igreja e pela doença do Papa. Por graça divina, imediatamente cresceram, fora de medida, o desejo santo e a alegria. Aquela serva ficou esperando que amanhecesse para ir à missa, pois era o dia de Maria. Chegada a hora da missa, colocou-se no seu lugar, meditando sobre a própria imperfeição e envergonhado-se diante de Deus. Elevada por inflamado anseio, fixou o olhar da fé na verdade eterna e apresentou-lhe quatro pedidos, enquanto se conservava a si mesma e seu diretor espiritual diante da Igreja, esposa de Cristo. Em primeiro lugar, implorou a reforma da santa Igreja. Então Deus Pai, deixando-se obrigar pelas suas lágrimas e amarrar-se pelo seu desejo, disse: “Minha filha querida, vê como está suja a face da Igreja devido à impureza, egoísmo, orgulho e ganância dos seus ministros. Derrama lágrimas e suor, hauridos na fonte da minha caridade, e lava-lhe o rosto. Afirmo-te que sua beleza não virá da espada, da violência e da guerra, mas da paz, das orações humildes e contínuas, do suor e das lágrimas, do amor inflamado dos meus servidores. Realizarei teu desejo em grandes sofrimentos, mas nunca vos faltará minha providência”. Embora tal resposta contivesse a salvação do mundo todo, assim mesmo a oração desceu ao particular e a serva rogou por todo o universo. Então Deus Pai fez-lhe ver o amor com que criara o homem e disse: “Vê como todos me ofendem! Considera, filha, os diversos e numerosos pecados com que me atingem. Sobretudo o infeliz e abominável egoísmo, fonte de todos os males, com o qual envenenaram o mundo todo. Por isso vós, meus servidores, ponde-vos diante de mim, com muita oração. Assim diminuireis a severidade do meu julgamento. Saibas que ninguém pode escapar das minas mãos. Com o pensamento, olha para minhas mãos”. Em pensamento aquela serva viu o mundo inteiro nas mãos de Deus, que disse: “Deves saber que ninguém escapa de minhas mãos. Por justiça ou por misericórdia, todos estão nelas. Todos os homens me pertencem, todos saíram de mim; amo-os inefavelmente. Usarei de misericórdia graças aos meus servidores”. Então aquela serva sentia-se feliz e ansiosa por causa da chama de amor que aumentava. Mostrava-se grata a Deus. Compreendia que Deus lhe manifestava os pecados dos homens, a fim de que ela se aplicasse com maior empenho e maior amor. De fato, tanto se avolumou a chama sagrada do amor, que nenhum valor atribuía ao suor de água que transpirava, e desejava que seu corpo suasse sangue. Disse ela: “Ó minha alma, perdeste todo o tempo de tua vida! Eis o motivo por que sobrevieram tantos males e danos à Santa Igreja e ao mundo, seja em geral como em particular. Por essa razão, quero que remedies agora com suor de sangue”. A serva, sob o impulso do desejo santo, elevou-se ainda mais e na fé meditava sobre a caridade divina. Ela percebeu e experimentou quanta obrigação temos de procurar a glória e o louvor de Deus mediante a salvação dos homens. Aliás, justamente a isso a verdade eterna vos convida e conclamava em resposta ao terceiro pedido, relativo à vossa salvação. Dizia Deus: “Filha, eu quero que ele procure com todo empenho a própria salvação. Mas isso seria impossível, tanto para ele como para qualquer outra pessoa, sem passar por muitos sofrimentos, conforme eu os permitir. Já que desejas ver-me honrado na Santa Igreja, então aceita o sofrimento com amor e paciência. Será essa a prova de que ele e os demais servidores realmente procuram a minha glória.”

Jesus, a ponte para todos

               Somente assim ele será um filho caríssimo e repousará sobre o peito de meu Filho unigênito, ponte construída por mim a fim de que todos possais alcançar, experimentar e obter o prêmio pelas fadigas suportadas. Filho, sabeis que a estrada (para o céu) foi interrompida pelo pecado e desobediência de Adão. Ninguém mais conseguia atingir a meta; já não se realizava meu plano, segundo o qual criara o homem a minha imagem e semelhança desejoso de que ele alcançasse a vida eterna e participasse e experimentasse minha suma e eterna bondade. Esse pecado deu origem a males e sofrimentos, bem como a um rio cujas as ondas continuamente esbravejam. Para não vos afogardes construí uma ponte em meu Filho, pela qual poderíeis passar. Usai vossa fé e vede como do céu a ponte chega à terra. De fato, se tal ponte fosse algo de terreno não possuiria a grandiosidade necessária para transpor o rio e dar-vos a vida. Tal ponte une o céu com a terra. É desse vosso interesse portanto caminhar por ela procurando a glória do meu nome mediante a salvação dos homens, suportando numerosas dificuldades na dor, seguindo as pegadas do amoroso e doce Verbo encarnado. Sois meus operários postos a trabalhar na vinha da Santa Igreja, pois desejo ser misericordioso para com o mundo. Cuidai, porém, de não irdes pelo caminho de baixo; não é essa a estrada verdadeira.

Os que vão pelo Rio do pecado

               Sabes quais são os que vão por baixo desta ponte? São os iníquos pecadores. Em favor deles eu quero que me implores lágrimas e suor pois jazem nas trevas do pecado mortal. Eles vão pelo rio e se não aceitarem o meu jugo irão para a eterna condenação. Numerosos pecadores por medo do castigo dirigem-se para a margem e abandonam o pecado mortal. Ao sentirem seus males, deixam o rio. Se não forem negligentes, senão adormecerem no egoísmo atingirão a ponte e a ela subirão pelas práticas da virtude. Mas se continuarem no egoísmo e na negligência tudo lhes parecerá difícil. Sem perseverança qualquer evento contrário os fará retornar ao pecado.

Os que sobem pela ponte

               Aquela serva vira as diversas maneiras como os homens se afogavam no rio do pecado; por isso Deus Pai lhe disse: Olha agora os que vão pela ponte de Cristo crucificado. Ela os viu correr rapidamente pois estavam livres do peso da vontade própria. Eram os verdadeiros filhos. Após desprezar a si mesmos, caminhavam inflamados de desejos santo, unicamente a procura da glória divina e da salvação dos homens. Sobe seus pés corria água do rio do pecado, pois caminhavam pela ponte de Cristo crucificado. Caminhavam sobre espinhos, mas estes não lhes causavam dor. Graças a sua caridade, não se preocupavam com os espinhos das perseguições. Pacientemente abandonavam as riquezas, que também são espinhos cruéis e mortais para aqueles que as conservam em desordenado amor; abandonavam-nas como se fossem um veneno. Sua única preocupação era alegrar-se na cruz de Cristo, único valor de suas vidas. Outros caminhavam (pela ponte) por quê? Porque não procuravam o Cristo crucificado na fé, mas consolações espirituais, atitude esta que torna imperfeito o amor frequentemente paravam, à semelhança de Pedro antes da paixão, no tempo em que somente se preocupava em gozar da companhia de Cristo. De fato quando lhe foi retirada a consolação Pedro fracassou mas ao fortificar-se no desprezo de si, nada mais quis a não ser o conhecimento e procura de Cristo crucificado. Também os imperfeitos são fracos e não progridem no desejo santo quando lhe são tiradas as consolações do espírito. Nos sofrimentos, tentações do demônio, atrativos humanos, dificuldades pessoais, sentem-se privados do objeto que amavam e desanimam, abandonam a sequela de Cristo. Por meio de Cristo eles tencionavam seguir Deus Pais no prazer das consolações, visto que no Pai não acontecem dores; mas somente em Jesus. Aquela serva compreendia que a fraqueza dos imperfeitos só pode ser corrigida se eles seguirem o fim, dizia lhe Deus Pai: “Ninguém pode vir a mim a não ser por meio do meu Filho unigênito. Foi ele que reconstruiu a estrada que deveis percorrer. Ele é o caminho, a verdade, a vida. As pessoas que vão por tal estrada conhecem experimentalmente a verdade, saboreiam o amor inefável por ele vivido nos sofrimentos. Sabes muito bem que, se eu não vos tivesse amado, não teria dado este Redentor. Amei-vos desde a eternidade preparei meu filho Unigênito e o entreguei a uma horrível morte na cruz. Por sua obediência e morte destruiu a desobediência de Adão e a morte da humanidade. É nele que os homens conhecem a verdade a seguem e atingem a vida eterna. Percorrendo os caminhos de Crito, chegam ao portal da verdade, atravessam-no e chegam ao oceano da paz entre os bem aventurados. Como vês, minha filha, os imperfeitos não dispõem de outro meio para se fortalecerem. Somente por este caminho o homem se une a verdade e alcança a perfeição a qual o chamei. Todo outro meio é penoso e insuficiente o que faz o homem sofrer é o egoísmo espiritual ou sensível. Quem é altruísta, não sofre senão ao me ver ofendido por tal forma sob a direção da caridade, a pessoa torna-se prudente e jamais se afasta de minha doce vontade”.

               Outros homens começavam a subir para a ponte Cristo, mas reconheciam o próprio pecado unicamente por medo dos castigos deles decorrentes. Pelo medo, em si imperfeito, deixavam a vida de pecado. Destes, muitos passavam rapidamente do temor servil ao temor santo e caminhavam esforçadamente para o segundo e terceiro estado; muitos outros porém, sentavam-se negligentemente a entrada da ponte no temor servil haviam começado a caminhar, mas aos poucos e na tibieza, sem nenhum amor pelo conhecimento da própria miséria e da bondade divina presente neles. Por esta razão, continuavam na tibieza. A respeito destes últimos disse Deus Pai: “Vê, filha querida, como é impossível a estes últimos não voltar atrás pois não praticam as virtudes. O motivo é este: o homem não vive sem amor, e seus esforços no conhecer e amar concentram-se no objeto amado. Se não procuram conhecer-se como encontrarão um modo de entender a grandeza de minha caridade? Ignorando, não amam; não amando, deixam de me servir. Todavia se não me amam procurarão amar outras coisas; e retornam ao egoísmo! Essas pessoas procedem como o cachorro que come vomita olha para o que rejeitou abocanha-o e engole novamente. São homens negligentes tibios. Haviam se livrado de seus pecados na confissão por medo dos castigos e com pouco esforço tinham começado a trilhar o caminho de Cristo. Sem progredir, retrocedem. Ao se lembrarem dos pecados, não se recordam dos castigos e voltam ao prazer sensível. Perdem o medo, retornam ao pecado, alimentam-se de egoismo e de impureza. Merecem maior repreensão que os demais pecadores. Sou assim maldosamente ofendido pelas minhas criaturas. Por essa razão, filhos caríssimos, peço que não deixeis diminuir o vosso desejo. Que ele cresça e se alimente. Ergam-se meus servidores, aprendam com Cristo a por nos ombros as ovelhas desgarradas e as carreguem com muitos sofrimentos, vigílias e preces. Assim, passarão pelo Cristo ponte e serão esposos. Filhos da verdade. Infundirei em vós a sabedoria e a luz da fé; conhecereis perfeitamente a verdade, atingireis a perfeição”.

Bons e maus pastores

               Pai bondoso! A bondade e misericórdia divina dignou-se revelar-me seus segredos, coisas que a língua humana não pode exprimir. E que ofuscam a inteligência. Minha capacidade de entender fica empobrecida e meu coração angustiado. A uma só voz clamam as minhas faculdades, desejosas de sair deste mundo imperfeito e ir para a meta final, na degustação da suma e eterna Trindade com os cidadãos do céu! Lá, rendem-se glórias e louvores a Deus, resurjem as virtudes, bem como o ardor e a caridade dos autênticos pastores e santos religiosos, que foram neste mundo lâmpadas autênticas no candelabro da santa Igreja, e iluminaram o mundo inteiro. Ó Pai, que diferença entre eles e os pastores de nosso dia! sobre estes últimos lamentou-se Deus Pai, dizendo: “Os pastores de hoje assemelham-se a mosquitos, afeitos os animais que despreocupados, pousam em alimentos doces, cheirosos, e logo depois saem e vão por-se em cima de objetos apodrecidos e asquerosos. Os ministros de hoje, postos a saborear a suavidade do Sangue de Cristo, não lhe dão valor. Ao deixar o altar, guardam o Corpo de Jesus e os demais sacramentos preciosos cheios de suavidade insubistituíveis fontes de vida para quem os recebe dignamente, mas logo despreocupados, caem na impureza do corpo e do espirito. É uma maldade vergonhosa, não somente para mim mas até os demônios sentem nojo de tão miserável pecado”.

Quarto Pedido

               Caríssimo Pai! Após ter respondido as três petições, Deus atendeu a quarta, na qual a serva implora socorro e providência para um caso particular. Dele não posso falar por escrito; contarei de viva voz, se Deus não me der a graça de sair deste corpo antes de encontrar-vos. Nosso corpo possui uma lei, uma lei perversa que continuamente luta contra o espirito. Sabeis que digo a verdade! Seria uma graça se Deus me tirasse do corpo, como dizia, Deus se dignou responder a quarta petição e ao inflamado desejo daquela serva e disse: “Minha filha, a providência jamais faltará para quem a deseja, isto é, para quem espera em mim com perfeição. Refiro-me as pessoas que realmente me imploram no amor e na luz da fé, e não apenas com palavras. Quem me súplica só com palavras: “Senhor, Senhor”, jamais experimentara minha divindade, minha providência. Não os reconheço. Quem me invoca sem virtudes só o reconheço pela justiça e não pela misericórdia, afirmo-te pois que minha providência não falha em favor dos que esperam em mim. Quero porém, que te dirijas a mim na paciência. Eu desejo ajudar estas pessoas e todos os que criei a minha imagem e semelhança num grande ato de amor”.

A ilusão dos pecadores

               Obedecendo à ordem divina, a serva olhou com fé para o abismo da caridade divina e compreendeu que Deus é bondade. Bondade suma e eterna, que unicamente por amor criou os homens e os remiu no sangue de Cristo, o qual por amor tudo nos dá. Tanto o sofrimento como o prazer, tudo provém do amor divino como providência em prol da salvação dos homens. Disse Deus Pai: “Tudo isso é comprovado pelo sangue derramado por vós. Todavia os pecadores cegos de egoísmo, impacientam-se contra mim. Para próprio prejuízo e dano, interpretam mal e no ódio tudo o que realizo por amor deles, no intuito de livra-los das penas eternas e dar-lhes o céu. Por que se lamentam de mim? Por que odeiam o que deveriam respeitar? Por que emitem juízos sobre os meus ocultos designios, todos eles retissimos? Assemelham-se aos cegos que pelo tato, gosto e audição, pretende julgar sobre o bem e o mal, baseando-se no seu conhecimento débil e escasso, recusando-se a opinião de quem enxerga. Parecem ainda com um cego louco que pelo tato falaz, não distingue as cores; ou pelo paladar ignora que sobre o alimento andou um animal imundo; ou pelo ouvido não sabe que o cantor pode dar-lhe a morte. Age deste modo quem não tem fé. Ao sentir o prazer oferecido pelo mundo, julga-o coisa ótima; sem perceber que tal prazer constitui apenas uma venda espinhosa e suja para os olhos da fé. O coração de tais pessoas torna-se imsuportavel para si mesmas. Esse amor desordenado, este prazer, parecem agradáveis e bons. Dentro deles porém esta o animal imundo do pecado mortal, que sua a alma. Se o homem em tais casos não se purifica mediante a luz da fé, terá morte eterna. O som do egoísmo é melodioso e faz o homem correr atrás da própria sensualidade. Qual cego, o pecador engana-se com o som e, manietado sera levado para o abismo cegos de egoísmo, cheios de presunção os pecadores não me seguem, apesar de ser eu o caminho, o guia, a vida e a luz. Quem anda em mim, não vai ao escuro, nunca erra. Mesmo que não confie em mim desejo a salvação dos pecadores, tudo lhes envio ou permito por amor. Continuamente se revoltam contra mim e eu pacientemente os suporto; amo-os sem ser por eles amados. Impacientes, perseguem-me com ódios murmurações e infidelidades. Seguindo suas cegas opiniões investigam meus ocultos desígnios, que são justos e amorosos. Não tem alto conhecimento, por isso julgam erradamente. Quem não se conhece também não pode conhecer-me ou ter noção de minha justiça. Filha queres, que te mostre quanto se engana o mundo a respeito dos meus mistérios? Usa tua fé e olha para mim”.

A providência Divina e o caso particular

               A serva olhou para Deus cheia de desejos e lhe mostrou a morte daquele homem, pelo qual ela havia implorado, e disse: “É bom que tu saibas, para livrar aquele homem da morte eterna, permiti o que aconteceu. Seu sangue derramado obteve-lhe a vida eterna no sangue de Cristo. Eu me lembrei do respeito e amor que ele tinha pela mãe de Jesus, A dulcíssima Maria. Foi por misericórdia que permiti o fato, uma crueldade, segundo o falso julgamento humano. Pensam assim, porque o egoísmo lhes apagou a luz da fé; não veem a verdade. Se afastassem esta nuvem, a conheceriam e amariam; respeitando o que aconteceu, teriam o prêmio no dia da colheita final. Apesar disso e de outras coisas, meus filhos realizarei vossos desejos com muitos sofrimentos minha providência agira sobre os pecadores com maior ou menor eficacia, de acordo com sua maior ou menor confiança em mim. Dar-lhe-eis auxílio até em quantidade maior do que merecem, graças aos desejos santos dos meus servidores que me imploram. Acolho as súplicas daqueles que humildemente oram por si e pelos outros. Convido-te pois a implorar meu perdão pelos pecadores e pelo mundo todo. Ó filhos concebei e gerarei o homem novo mediante a luta contra o pecado e através de um grande amor”.

Consolações de Catarina

               Caríssimo e bondoso Pai! Ao ver e ouvir tanta coisa da verdade eterna parecia que meu coração se partisse em dois. Morro e não consigo morrer. Tende pena desta pobre filha que vive tão contrariada por causa das ofensas cometidas contra Deus e não tem com que se desafogar. Ainda bem que o Espírito Santo achou uma solução no meu íntimo com sua clemência e no exterior mediante a possibilidade de escrever. Confortemo-nos em Cristo Jesus. Sejam os sofrimentos a nossa consolação. Aceitemos entusiasmados, sem negligências o convite divino. Doce pai, alegrai-vos. Sois convidado com tanto amor! Suportai as dores alegremente, com paciência, sem angústia, caso desejeis ser esposo da verdade consolar minha alma. Não há outro modo de receberdes a graça. Eis porque dizia que desejava vos ver “seguidor e amante da verdade”. Nada mais vos digo. Permanecei no santo e doce amor de Deus.

Como Catarina aprende a escrever

               Abençoai fr. Mateus em Cristo Jesus. Esta carta e uma outra que vos mandei foram escritas de próprio punho em ilha da Rocca com muitos suspiros e abundância de lágrimas. Meu olho nem mais enxergava. Eu mesma fiquei cheia de admiração, meditando sobre a bondade e a misericórdia de Deus para comigo e para com todos na sua providência. Quanto a mim deu me paz, pois encontrava-me sem nenhuma consolação, como não tivesse aprendido a escrever por ignorância minha, Deus providenciou dando me a capacidade de aprender. Assim descendo das alturas poderia desafogar um pouco o coração, evitando que explodisse. Por uma forma adimirável a maneira do mestre que ensina a criança com o exemplo, Deus imprimiu (a capacidade de escrever) em meu espirito. Logo que partistes, adormecendo, comecei a escrever com o glorioso evangelista João e com Tomás de Aquino. Perdoai-me se escrevi demais. É que a mão e a língua concordam com o coração. Jesus doce Jesus amor.

A explicação de Deus sobre as lágrimas

CATARINA PEDE EXPLICAÇÕES SOBRE AS LÁGRIMAS

               Desejosa de conhecer mais sobre os estados da alma, sobre os quais Deus lhe falara, elevou seu pensamento à verdade suprema. Notara que aqueles estados são percorridos em lágrimas; queria saber quais são as espécies de lágrimas, qual sua natureza, sua origem, suas características. Num ardor imenso, como nunca lhe acontecera antes, sobre-elevou-se toda inflamada de amor. Com fé olhou para Deus e nele entendeu o que desejava. A verdade divina manifestou-se a ela e atendeu a seus anseios e pedidos.

As lágrimas nascem do coração

               Então Deus disse àquela serva: - Filha querida, queres que eu te fale sobre as lágrimas e seus frutos. Não vou desprezar o teu pedido. Presta bem atenção, que passo a explicar em analogia com os estados da alma descritos acima. Há lágrimas imperfeitas, que se fundamentam no temor servil. Em primeiro lugar, as lágrimas de condenação, próprias dos pecadores; em seguida, as lágrimas de medo, encontradas naqueles que deixam o pecado mortal por medo de castigo e choram; em terceiro lugar, as lágrimas de auto-consolação, derramadas pelas almas livres do pecado mortal que começam a servir-me. Estas últimas também são imperfeitas, pois imperfeito ainda é o amor de onde procedem. Lágrimas perfeitas são as que procedem do homem que atingiu a perfeição do amor pelo próximo e que me ama desinteressadamente. Unidas a estas últimas estão as lágrimas de prazer, espirituais, versadas em grande suavidade, como direi mais longamente depois. Há, enfim, as lágrimas de fogo, espirituais, concedidas àqueles que desejam chorar e não conseguem. Todas essas lágrimas podem ocorrer numa única pessoa em sua caminhada do temor servil ao amor imperfeito e, depois, do amor perfeito à união. É nessa ordem que passo a falar-te agora. Deves saber que toda lágrima nasce do coração. Nenhum membro corporal é tão sensível aos impulsos do coração como os olhos; se o coração sofre, logo eles o revelam. Também quando o sofrimento do coração é causado pelos pecados, os olhos derramam lágrimas, que são de morte. São lágrimas de quem vive longe de mim, no amor dissoluto. Como o coração me ofende, sua dor produz morte, gera lágrimas mortais. A gravidade da culpa será maior ou menor, conforme a desordem no amor. Assim, os pecadores choram lágrimas mortais. Delas falarei ainda

As lágrimas de vida

               Começo falando das lágrimas que produzem a vida. Ao reconhecer os próprios pecados, o homem chora por medo de castigo; são lágrimas fundamentadas no apetite sensível e procedem da dor íntima causada pelo temor da pena. Sofrendo assim o coração, os olhos choram. Com a prática das virtudes, a pessoa vai perdendo esse medo. Vê que o medo, em si, não lhe concede a vida eterna - como já ficou dito ao se tratar do segundo estado da alma. Esforça-se, pois, em conhecer-se e conhecer-me. Aos poucos vai aumentando sua esperança na minha misericórdia. Arrependimento e esperança alternam-se. Então os olhos choram, com lágrimas a brotar da fonte do coração. Tais lágrimas freqüentemente ainda são de ordem sensível, pois o amor continua imperfeito. Se me perguntares por que razão, respondo: porque sua raiz é o egoísmo. Não é mais um amor puramente sensível, já superado; é espiritual, mas apegado às consolações espirituais, de cuja imperfeição te falei longamente, ou apegado a alguma criatura. As consolações podem desaparecer por motivos internos ou externos; internos, quando cessa algum conforto concedido por mim; externos, quando, por exemplo, morre uma pessoa amiga. Desaparecem igualmente pela presença de tentações e dificuldades. Em todos esses casos, a pessoa sofre e o coração, ressentido, chora. Será um choro de autocompaixão, causado pelo egoísmo. A vontade própria ainda não morreu; são lágrimas sensíveis de autocompaixão espiritual.

               Prosseguindo na prática das virtudes e em maior autoconhecimento, a pessoa começa a desprezar-se, a tomar consciência amorosamente dos meus favores, a unir-se a mim, a conformar-se à minha vontade. Sente, então, alegria e compaixão: alegria interior produzida pela caridade e compaixão pelos outros. Já me ocupei do assunto ao tratar: do terceiro estado. O coração acompanha e os olhos derramam lágrimas por Mim e pelo próximo. Sente tristeza a pessoa ante as ofensas cometidas contra mim e o prejuízo dos ofensores; já não pensa em si mesma; preocupa-se em louvar-me, deseja sofrer à semelhança do Cordeiro humilde, paciente e imaculado, do qual fiz uma ponte na maneira explicada.

Ao percorrer a ponte-mensagem do meu Filho, a alma passa pela porta que é Cristo.

               Repleta da verdadeira paciência, dispõe-se a tolerar todas as dificuldades que eu Lhe enviar. Aceita-as com virilidade, sem preferências, do modo que vierem. Mais ainda! Como já afirmei, não apenas sofre com paciência, mas com alegria. Considera uma honra padecer por minha causa; deseja mesmo sofrer. Por tais caminhos, alcança uma satisfação e paz de espírito tais, que as palavras não conseguem exprimir. Vivendo a mensagem do meu Filho, o homem fixa o pensamento em mim, conhece-me, ama-me; nas pegadas do pensamento que contempla a natureza divina unida à humana em Cristo, a vontade saboreia minha divindade, repousa em mim, oceano de paz. No amor, permanece unida a mim. Mas de tudo isso já tratei ao ocupar-me do quarto estado da alma. Pois bem, ao experimentar minha divindade, os olhos derramam lágrimas de suavidade, verdadeiro alimento que nutre a alma na paciência. Qual perfume, estas lágrimas exalam odor de grande suavidade. Como é feliz, filha querida, o homem que ultrapassou o mar proceloso do pecado e chegou ao oceano da paz, o homem que encheu seu coração com a minha divindade. Qual aqueduto, os olhos satisfarão o coração derramando lágrimas. Este é o último estado, no qual o homem é ao mesmo tempo feliz e sofredor. Feliz por achar-se unido a mim, gozando do amor divino; sofredor ao ver que me ofendem. Age de tal forma por causa do autoconhecimento; foi conhecendo-se e conhecendo-me, que chegou a tal estado. Este estado de união, fonte das lágrimas de suavidade, não é prejudicado pelo conhecimento de si, proveniente do amor ao próximo, donde recebeu a lágrima do perdão amoroso de Deus e a tristeza pelos pecados alheios; quando chorou com os que choram e sorriu com os que sorriem. Estes últimos são as pessoas que vivem no amor; o perfeitíssimo alegra-se ao vê-los dar-me glória e louvor. Estas segundas lágrimas do terceiro estado perfeito, são as "lágrimas de união" do quarto estado. Estes dois estados (terceiro e quarto) se completam mutuamente. Se o último pranto, causador da união com Deus, não incluísse o terceiro estado - de amor pelos homens - nem seria perfeito. Necessariamente um estado inclui o outro. Em caso contrário, cair-se-ia na presunção pela sutil preocupação da própria fama; das alturas, o homem cairia para a antiga situação de pecado.

               Diante desse perigo, ocorre amar o próximo sempre com autêntico autoconhecimento; esse esforço aumentará a consciência do meu amor por si mesmo. A caridade para com o próximo deriva desse amor. Com o mesmo amor que se sente amado, o perfeitíssimo ama o outro; percebendo qual é o objetivo do meu amor, ama-o também. Num segundo instante a alma compreende sua incapacidade de ser-me útil, retribuindo-me o puro amor ("Puro amor", para Catarina, é amar sem ser amado antes, coisa impossível de realizar-se para com Deus, que desde sempre nos amou.) que de mim recebe. Reage, amando-me naquele "meio" que vos dei, o próximo; nele todas as virtudes são praticadas. Todas as qualidades que vos dei, destinam-se ao benefício dos outros, em geral e em particular. É vossa obrigação amar com o mesmo puro amor que eu Vos amo. Não sois capazes de praticá-lo para comigo, já que Vos amei antes de ser por vós amado. Meu amor não tem justificação; amo antes. Foi tal dileção que levou a criar-vos a minha imagem e semelhança. Sim, amor igual não podeis manifestar relativamente a mim; praticai-o para com os homens. Amando-os sem serdes amados, amando-os sem interesses espirituais e materiais; amando-os unicamente para o louvor do meu nome; amando-os porque são amados por mim. É desse modo que cumprireis o mandamento de "amar-me sobre todas as coisas e ao próximo como a vos mesmos". A tais alturas não se chega sem atingir o estado de união, que segue o terceiro. Mas seria impossível conservar tal união Comigo, se se abandona aquele amor das lágrimas do terceiro estado, da mesma forma que não é possível cumprir o mandamento de amar-me sem cumprir o mandamento de amar o próximo. Eles, (os dois amores) são os dois pés que levam a vivência dos mandamentos e dos conselhos dados por meu Filho crucificado. Estes dois estados (terceiro e quarto) reduzem-se a um e nutrem o homem na prática das virtudes e na união Comigo. Realmente, não se trata de um novo estado; é o terceiro que se aperfeiçoa em novas, numerosas e admiráveis elevações do espírito, conforme expliquei. Dá-se uma compreensão da verdade que, embora realizada na terra, parece celeste. Em tal união, a sensualidade é dominada e a vontade própria morre. Como é agradável essa união para quem a desfruta; ao experimentá-la, o homem conhece meus segredos e chega mesmo a profetizar acontecimentos futuros. São coisas que dependem de mim, e a pessoa interessada não deve dar-lhes grande valor. Explico-me: valorize, sim, o que realizo; mas evite comprazer-se por apego pessoal. Que a pessoa se julgue indigna de qualquer sossego e tranqüilidade espirituais. A fim de nutrir sua alma, não se julgue um perfeitíssimo, mas desça ao vale do autoconhecimento. Esta volta ao conhecimento de si é uma graça, destinada a iluminar a alma e fazê-la progredir. Durante esta vida, ninguém é tão perfeito que não possa aperfeiçoar-se no amor. Somente meu Filho, que é vossa cabeça, não podia progredir na perfeição, pois Eu e Ele somos um. Por causa da união com a natureza divina, Sua alma era compreensora. (No sentido de que gozava a visão beatífica) Vós, ainda peregrinos, sempre podeis crescer. Não que atinjais um estado ulterior, pois o estado de união é o último. Por minha graça podeis aperfeiçoá-lo segundo vosso desejo.

As lágrimas e as fases da vida espiritual

               Conforme teu pedido, expliquei-te as espécies de lágrimas com suas características. As primeiras são próprias das pessoas que vivem em pecado mortal. As lágrimas brotam do coração; como aqui a fonte está corrompida, o pranto é pecaminoso e mau, bem como todas as demais atividades. As segundas lágrimas pertencem àqueles que começam a ter consciência dos próprios males e temem os castigos consequentes. Constitui o comum início de conversão, misericordiosamente concedido por mim aos homens fracos e desorientados que vão se afogando pelo rio do pecado e desprezando a mensagem do meu Filho. Infelizmente são numerosíssimos os pecadores que conscientes, sem nenhum temor, continuam no pecado. Alguns repentinamente sentem grande descontentamento de si mesmos e passam a considerarem-se dignos de castigos; outros, arrependem-se por terem me ofendido e com bonomia se põem a servir-me. De todos eles, certamente têm maior possibilidade de atingir a perfeição aqueles que se convertem com grande ardor; mas esforçando-se todos o conseguirão. Os primeiros terão de preocupar-se em não ficar no temor servil; os segundos, em não cair na tibieza. Trata-se de um acordar geral à santidade. As terceiras lágrimas estão nas pessoas que superaram o temor servil e atingiram o amor e a esperança. Percebem que lhes perdoei, sentem favores e consolações. Para concordar com o coração, choram. Como são imperfeitas, conforme expliquei, trata-se de um pranto ao mesmo tempo sensível e espiritual. As quartas lágrimas acontecem com a prática das virtudes. Crescendo o desejo da alma, a pessoa se une e se conforma à minha vontade; quer o que Eu quero, ama profundamente o próximo. É um pranto de amor por mim e de dor pelos pecados e prejuízos sofridos pelo próximo. As quintas lágrimas, próprias da última perfeição, completam as anteriores. Em união com a verdade eterna, estes progridem muito no desejo santo. Por esse motivo, o demônio os teme e não consegue prejudicar-lhes a alma, seja com ofensas, pois são pacientes na caridade, seja com atrativos espirituais e materiais, por eles humildemente desprezados. Na verdade, o demônio não dorme jamais. Nisto ele até vos dá lições, vós que sois negligentes e dormis no tempo da messe. Mas sua vigilância não consegue prejudicar as pessoas que se acham no estado de união, pois ele não tolera o ardor da caridade e a união da alma Comigo. Quem vive em mim, não pode ser enganado. O diabo evita os perfeitíssimos como o mosquito se afasta da panela que ferve, por medo do calor. Quando a panela se acha fria, o mosquito se engana e cai dentro, encontrando às vezes mais calor do que percebia. O mesmo acontece com os homens. Antes que eles cheguem à perfeição, o demônio os julga frios e atormenta com muitas tentações. Mas se neles houver um pouquinho de entendimento, de fervor e de desprezo pelo pecado, a vontade não consentirá. Alegrem-se aqueles que sofrem; esse é o caminho para se ir até o estado de união. Já afirmei que o meio de se conquistar a perfeição está no conhecer-se e no conhecer-me. Ora, se eu estiver na alma, não há ocasião mais oportuna para conhecer-se do que no tempo das contradições. Em que sentido? Vou explicar. Nas dificuldades, o homem tem mais consciência das próprias forças; compreende que somente conseguirá resistir e libertar-se das tentações se sua vontade for reta; vê que de si mesmo nada é, pois em caso contrário afastaria as tentações indesejáveis. O autoconhecimento, portanto, conduz à humildade e faz recorrer a mim, Deus eterno, mediante a fé. A pessoa compreende que somente Eu dou a vontade reta, que não consente nas tentações e evita as insinuações más. Estais certos quando procurais vos fortalecer mediante a mensagem do meu Filho, o amoroso Verbo encarnado, durante as provações, sofrimentos, adversidades e tentações. Tal atitude aumenta vossa virtude e vos ajuda a chegar à perfeição.

As lágrimas de fogo

               Falei sobre as lágrimas imperfeitas e perfeitas, dizendo que brotam do coração. Qualquer que seja o motivo pelo qual se chore, é do coração que todas as lágrimas nascem. Neste sentido, indistintamente podem ser chamadas "lágrimas cordiais". A diferença entre elas encontra-se na qualidade do amor, bom ou mau, perfeito ou imperfeito. Falta-me responder sobre o caso daqueles que, desejosos de possuir a perfeição das lágrimas, não conseguem chorar. Existe alguma lágrima que não saia dos olhos? Sim, existe um pranto de fogo, procedente do desejo santo e que faz consumar-se no amor por mim. Há pessoas que gostariam de chorar na renúncia de si mesmas e no desejo de salvar os outros, mas não conseguem. Relativamente a tais pessoas, afirmo que já possuem a lágrima de fogo, com que chora o Espírito Santo. Sem lágrimas exteriores, elas me oferecem as aspirações da vontade que deseja chorar. Aliás, se prestares atenção, verás que o Espírito Santo chora em cada servidor meu que possui o desejo santo e faz orações contínuas e humildes na minha presença. Ao que parece, foi quanto pretendia afirmar o glorioso apóstolo Paulo, ao dizer que o Espírito Santo chora em mim "com gemidos inenarráveis", a vosso favor. O fruto da lágrima de fogo não é menor que o das demais. Muitas vezes, até maior, dependendo da intensidade do amor. Ninguém deve perturbar-se, pois, e julgar-se distante de mim, só porque não derrama as lágrimas que deseja. Ao desejar lágrimas, ocorre conformar-se à minha vontade, humilhar-se diante do "sim" e do "não" por mim pronunciados. Às vezes, deixo uma pessoa sem lágrimas, a fim de que permaneça numa atitude humilde, em oração contínua, desejosa de chegar a mim. Almas existem que, se conseguissem o que almejam, nem tirariam proveito; sentir-se-iam satisfeitas com a obtenção das lágrimas desejadas e cairiam no egoísmo. É para vosso crescimento que não dou lágrimas exteriores, mas unicamente as do espírito, as do coração, inflamadas na chama da divina caridade. Em todo estado de vida e ocasião, tais pessoas podem agradar-me. A menos que seu espírito se afaste de mim por falta de fé e amor. Sou o médico, vós sois os doentes; dou a todos o que é necessário para a salvação e o crescimento de vossas almas.

As lágrimas são infinitas

               Conforme acabo de explicar, filha querida, essa é a doutrina sobre as cinco lágrimas. Afoga-te, pois, no sangue de Cristo crucificado, o Cordeiro humilde, sofredor e puro. Esforça-te por crescer nas virtudes, aumenta em ti a chama da minha caridade. Os cinco tipos de lágrimas são como que canais: quatro deles derramam infinitas espécies de lágrimas, as quais produzem a vida se forem usadas de acordo com a virtude. Infinitas, repito, não no sentido de que tenhais de chorar sem fim nesta vida, mas relativamente ao desejo da alma. Já afirmei que a lágrima brota do coração. É ele que a recolhe no desejo santo e oferece aos olhos. Como a madeira verde atirada ao fogo; por causa do calor, sua umidade ferve, geme. Com a madeira seca não acontece assim. Igualmente sucede com o coração, quando a graça divina o renova, destruindo a sequidão do egoísmo que enrijece a alma. Amor e lágrimas unem-se no desejo santo. Mas este último, durante esta vida, não tem limites. Quanto mais o homem ama menos acredita estar amando. Dessa forma: o desejo ulterior de amar provoca o pranto. Quando a alma se separa do corpo e chega até mim, seu fim último, não deixa o desejo santo; continua a querer-me e a amar o próximo. A caridade penetrou em si como rainha, levando consigo o merecimento de todas as virtudes. Como já disse, cessa todo sofrimento; ao desejar-me, a alma me possui, sem temor de vir a perder o que tanto sonhara. Todavia suas aspirações crescem: ao desejar, é atendida; e ao ser atendida deseja mais, sem ameaça de qualquer fastio. Nem sofre ao desejar ainda. A perfeição é total. É desse modo que vosso desejo é infinito. Nem poderia ser diferentemente. Se me servísseis apenas com atitudes finitas, nenhuma virtude vossa alcançaria a vida. Sou o Deus infinito e quero serviço infinito de vossa parte. Mas de infinito só tendes o desejo da alma. Por isso dizia antes que as lágrimas são infinitas; infinitas, por estarem associadas ao desejo santo, infinito. Depois da morte, a lágrima sensível não acompanha o homem. Mas ele leva consigo os merecimentos do pranto terreno e os consome. Sucede tal como a água que se atira numa fornalha; ela não fica de lado, mas é pelo fogo absorvida e vaporizada. Sim, é quanto acontece com o homem que chega ao céu, para experimentar o fogo da caridade divina, cheio de amor na união Comigo e o próximo, causa de suas lágrimas. Ele não pára de me oferecer suas aspirações, felizes e lacrimosas; só que não serão mais lágrimas dos olhos, mas lágrimas de fogo do Espírito Santo.

Frutos das cinco lágrimas

               Compreendeste agora como as lágrimas são infinitas. Mesmo durante esta vida há tantas maneiras de chorar no estado da união, que tua língua é insuficiente para declará-las. Depois de explicar-te como são as lágrimas nos quatro estados da vida espiritual, falta-me discorrer sobre os frutos que elas e o desejo santo produzem.

Efeitos das lágrimas de condenação

               Começo por aquela lágrima, a que me referi no começo, a lágrima dos homens que vivem pecaminosamente no mundo, que consideram seu deus as pessoas, as coisas, a própria sensualidade. Essa atitude é para eles a fonte de todos os males na alma e no corpo. Disse acima que as lágrimas nascem do coração. De fato, o coração chora de acordo com seu amor. O pecador, por exemplo, chora quando o coração sofre com a perda de um objeto amado. Suas lágrimas são numerosíssimas, conforme a variedade do amor. Achando-se corrompida a raiz interior, que é o egoísmo, tudo nasce corrompido. É como uma árvore, cujos frutos fossem venenosos, as flores pobres, as folhas manchadas e os ramos voltados para o chão, vergastados pelos ventos. Tal é a árvore interior dos pecadores. Vós, porém, deveis ser árvores de amor. Por amor vos criei, sem amor não podeis viver. O homem virtuoso planta sua árvore no vale da humildade; o orgulhoso, na montanha da soberba. Mal plantada, a árvore deste último só produz frutos mortais.

As más ações

               Frutos desta árvore são as más ações, carregadas de veneno por muitos e diferentes pecados. Mesmo quando o pecador pratica uma boa ação, não merece para a vida eterna, uma vez que a raiz do egoísmo prejudica tudo. Sua alma, em pecado mortal, não possui a graça. Mesmo assim, o homem pecador não deve deixar de praticar o bem, pois toda boa obra terá sua recompensa. A boa ação praticada em pecado mortal não merece o céu, mas é paga por minha justiça. Às vezes, darei bens materiais; outras vezes, como já disse antes ao tratar deste assunto, dou uma vida mais longa para que possa o pecador emendar-se; outras ainda, concedo a vida da graça pelos merecimentos de algum meu servidor. Foi o que fiz no glorioso apóstolo Paulo, que abandonou a infidelidade e as perseguições ao cristianismo devido às preces de santo Estêvão. Como vês, qualquer que seja seu estado de vida, ninguém deve deixar de fazer o bem.

Os sentimentos maus

               Dizia que as folhas desta árvore de morte são podres. Referia-me aos maus sentimentos do coração. Tais sentimentos internos ofendem-me e levam a pessoa ao ódio e desprezo pelos outros. Qual ladrão, o pecador rouba-me a honra, para atribuí-la a si mesmo. São flores apodrecidas, causadoras de náusea pelas duas espécies de julgamento que causam. Primeiro, a meu respeito. O homem pecador pronuncia-se iniquamente sobre Meus ocultos juízos e mistérios; despreza tudo quanto realizei por amor; nega quanto revelei em meu Filho; destrói os meios por mim oferecidos para se alcançar a vida. Tais pessoas tudo julgam e condenam em sintonia com seu parecer enfermiço. O egoísmo cegou-lhes a inteligência, vendou o olhar da fé, impediu-lhes de reconhecer a verdade. Segundo, relativamente ao próximo. Uma fonte de numerosos males. Sem autoconhecimento, o infeliz pecador pretende pronunciar-se sobre o segredo íntimo dos outros. Baseado em comportamentos exteriores, julga os sentimentos do coração. Meus servidores julgam sempre retamente, pois fundamentam-se na minha bondade; os pecadores, sempre mal, alicerçados que estão na maldade. De seus juízos nascem muitas vezes o ódio, homicídios, desprezo pelos demais, distanciamento de meus servidores devido ao seu amor pela virtude.

As más palavras

               Aos poucos vão aparecendo as folhas, que são as palavras: os pronunciamentos ofensivos a mim, ao sangue de meu Filho, prejudiciais aos outros homens. A preocupação dos pecadores é falar mal, blasfemar contra minhas obras, murmurar contra todo mundo. Consideram como realidade tudo o que seu julgamento sugere. Pobre infelizes, não sabem que a língua foi feita unicamente para me louvar, para a confissão dos pecados, para a promoção da virtude na salvação dos homens. Folhas manchadas pela culpa! Tudo isso, porque está sujo o coração donde nascem; cheio de duplicidade e mal. Além de prejudicar o homem com a perda da graça, as palavras suscitam desavenças na vida social. Já ouviste falar que, devido às palavras, aconteceram revoltas nos estados, ruína de cidades, homicídios e muitos outros males. A palavra pronunciada penetra fundo no coração do homem a quem é dirigida, atinge regiões que nenhum punhal alcança.

Os vícios capitais

               A árvore de morte possui sete galhos, inclinados para a terra, que produzem flores e folhas. São os sete vícios capitais, responsáveis por numerosos e diferentes pecados, todos eles enraizados no egoísmo e no orgulho. Os frutos são as más ações. Esses galhos - os vícios capitais - inclinam-se para a terra, enquanto tendem unicamente para a frágil e desordenada realidade deste mundo. Inclinam-se para nutrirem-se, incansavelmente, da terra. Os pecadores são insaciáveis e insuportáveis a si mesmos, sempre inquietos a procurar justamente o que não os pode saciar. O motivo por que são insaciáveis é o seguinte: Como pecadores, desejam só as realidades finitas, ao passo que eles, no que se refere ao ser, são infinitos, isto é, jamais deixarão de existir. No máximo perderão a vida da graça por causa do pecado mortal. O homem é maior que as realidades criadas, não vice-versa. Somente estará satisfeito, quando atingir um bem superior a si. Como somente Eu sou maior que o homem, disto decorre que somente Eu, Deus eterno, consigo saciá-lo. Separado de Mim pelo pecado, o homem vive perenemente atormentado e sofredor.

Os vendavais da vida

               Ao sofrimento segue o pranto; sobrevêm então os vendavais que açoitam esta árvore de quem ama a sensualidade como razão da própria vida. Os vendavais são quatro: da prosperidade, da adversidade, do temor servil e do remorso. A prosperidade material alimenta o orgulho, a presunção; leva o pecador a valorizar-se excessivamente e a desprezar os outros. Se for patrão, oprimirá o súdito com muitas injustiças. A prosperidade é ainda causa de vaidade pessoal, de impureza do corpo e do espírito, de desejo de fama, e de muitos outros defeitos. Tua linguagem nem seria capaz de enumerá-los. Seria, então, má em si mesma a riqueza? Não, assim como as outras três realidades de que falo. O que está apodrecido é a raiz da árvore, ruína de todo o resto. Eu, autor de todos os acontecimentos, sou imensamente bom! À prosperidade material pode sobrevir o choro, quando o coração, insaciável, não realiza seus desejos; ante essa impotência, o pecador sofre e chora porque as lágrimas, como disse, nascem do coração. Segue-se o vendaval do temor servil. Quando um homem tem medo de perder quanto ama, até sua sombra causa-lhe temor. Por exemplo, o medo de morrer, de perder um dos filhos ou qualquer outra pessoa, o medo de ser humilhado, de decair na posição social, de perder a boa fama, a riqueza. Semelhantes temores não permitem ao homem nem conservar em tranqüilidade os bens que possui desordenadamente. Escravo de suas posses, o pecador vive temendo; e como o pecado é privação, a pessoa termina no nada. Além do medo, os pecadores costumam sofrer adversidades, quais sejam perdas de bens em geral e em particular. Em geral, por ocasião da morte; em particular, pela privação de uma coisa ou outra: saúde, filhos, riquezas, posição social, honras. Tais perdas acontecem quando eu, médico bondoso, julgo proveitoso permiti-ias, da mesma forma como concedera aqueles bens antes. Por terem o coração corrompido, muitos pecadores impacientam-se, sem procurar compreender. Surgem os protestos, a murmuração, o ódio, o desprezo por mim e pelos outros. Consideram mal aquilo que Eu dera como bem; apenas lhes conta a dor pelo objeto amado. Diante disso, o pecador costuma cair num pranto angustiado e impaciente, que lhe arruína e mata a alma, privando-a a vida da graça; um choro que cega a pessoa, corporal e espiritualmente: que lhe retira toda alegria, toda esperança. Chora o pecador, porque privado daquilo que constituía seu prazer e o objeto de sua afeição, de sua esperança, de sua fé. Além da lágrima, há outras causas desses grandes inconvenientes; são a afeição desordenada e a angústia do coração, donde a lágrima procede. De fato, não é a lágrima exterior que causa a morte espiritual e o sofrimento, mas sim a raiz donde ela nasce, isto é, o egoísmo do coração desregrado. Quando o coração é bom e possui a graça, o pranto também é santo e alcança de mim a misericórdia. Dei o nome de "lágrima de condenação" a este pranto, porque manifesta que o coração está morto. Disse acima que existe também o vendaval do remorso! Como Sou bondoso, sirvo-me da prosperidade material para atrair amorosamente os homens; do temor servil, a fim de que orientem o coração para a prática das virtudes; da adversidade, para que o homem tome consciência da fragilidade e incerteza das realidades deste mundo. Acontece, porém, que para alguns todos esses meios não produzem efeito; dado que os amo demais, envio então o remorso da consciência. Quero que confessem seus pecados no sacramento da penitência! Quando se obstinam no mal e recusam tal graça, os pecadores acabam na reprovação. Iludem as reprovações da própria consciência, distraem-se com prazeres ilícitos, ofendem a mim e ao próximo. Com a raiz da árvore apodrecida, tudo secou e a pessoa recai na tristeza íntima, entre lágrimas e angústias. Não havendo conversão enquanto para isso dispõem da liberdade, tais pessoas passarão do pranto da terra para o choro do inferno. Então o finito se mudará em infinito, pois a causa deste último pranto é o ódio infinito pelo bem, em que se fundamentara o pecador. Os réprobos do inferno, se quisessem, teriam escapado da perdição durante esta vida, através do meu perdão. Eram livres, mesmo tendo-se dito que seu ódio pelo bem era infinito. A infinitude não se refere à intensidade do amor ou do ódio, mas à duração no tempo. Enquanto estais neste mundo, sois livres de amar ou odiar como quereis; quem encerra esta vida no amor, terá um bem infinito e quem a terminar no ódio, encontrar-se-á num mal interminável, na condenação eterna. Desta já me ocupei ao tratar daqueles que vão afogando-se pelo rio do pecado. Longe da minha misericórdia e do amor dos homens, já não poderão querer o bem. Os bem-aventurados, ao contrário, gozam da minha misericórdia, amam-se mutuamente e têm o vosso amor de caminhantes desta vida. Aliás, foi para que também vós venhas a mim que vos coloquei no mundo. Para os condenados de nada servem vossas esmolas e boas obras. São membros separados do corpo que eu constituí na caridade. Recusaram obedecer aos santos preceitos da hierarquia, de quem recebeis nesta vida o sangue do Cordeiro imaculado. Condenaram-se, assim, eternamente em choro e ranger de dentes, quais mártires do demônio. Ali recebem do demônio os frutos que para si recolheram. Desse modo, as lágrimas de condenação fazem sofrer nesta vida e dão a companhia interminável dos demônios na outra.

Efeitos das lágrimas de temor

               Passo a falar dos frutos colhidos por aqueles que, por medo dos castigos, abandonam o pecado para viver em estado de graça. São numerosos os que, pelo temor da pena, param de pecar. É o acordar geral, de que falei. Quais são os efeitos em tais pessoas? O medo de ser castigado age sobre o livre arbítrio e este procede à limpeza da casa da alma. Tendo-se purificado (na confissão) o homem sente paz em sua consciência, põe ordem nas suas afeições, abre a inteligência para o autoconhecimento. Antes de tal purificação, a inteligência apenas pensava nos pecados; surgem agora as primeiras consolações espirituais. Livre dos remorsos, a alma espera o alimento das virtudes. Acontece-lhe como para o doente após a cura: volta-lhe o apetite. Tocará à vontade preparar-lhe o alimento espiritual.

Efeitos das lágrimas de autocompaixão

               Livre do medo dos castigos, a alma colhe as segundas lágrimas de vida, com as quais busca o amor e a prática das virtudes. Embora ainda seja imperfeita, a pessoa já não teme; como verdade suma, Eu lhe dou consolações e amor. Por causa de tal consolação e amor, ama-me docemente a mim e as demais pessoas. A vivência desse amor na alma purificada pelo temor servil infunde numerosas e variadas consolações. Se perseverar, chegará a sentar-se à mesa do Crucificado, passando do medo ao amor.

Efeitos das lágrimas de amor

               Ao chegar às terceiras lágrimas de vida, o homem se põe à mesa da santa cruz, nela saboreando o amoroso Verbo encarnado. Meu Filho deseja minha honra e vossa salvação; por isso, Seu coração foi aberto e se fez vosso alimento. Nesta "mesa" o homem começa a alimentar-se do desejo da minha glória e da salvação dos homens, bem como a renunciar a si mesmo e ao pecado. Que frutos recolhe o homem destas lágrimas do terceiro estado? São os seguintes: grandes forças em dominar a sensualidade, verdadeira humildade, muita paciência. Esta paciência vence toda oposição e liberta o homem dos sofrimentos. Quem faz sofrer é a vontade própria, que é destruída pela renúncia a si mesmo. A paciência domina a sensualidade, que se revolta diante das ofensas, perseguições, ausência de consolações espirituais e sensíveis, tornando o homem sofrido. Com a morte da vontade própria, a pessoa experimenta os frutos da paciência em desejo amoroso e lacrimejante. Um fruto suavíssimo, como és agradável a quem te possui! Como tu me agradas! Quem te possui é feliz mesmo na amargura. Nas injúrias, vive em paz. Ao navegar por mares procelosos, quando perigosas ventanias erguem terríveis ondas contra a barquinha da alma, tu vais tranquila e serena sem danos. Minha vontade eterna te protege, pois te revestiu com a couraça da caridade e impede que a água do pecado penetre em ti! Filha querida, a paciência é uma rainha encastelada numa fortaleza de rocha; vence e jamais é vencida. Nunca está sozinha, pois a constância lhe faz companhia! Ela é o cerne da caridade, é o sinal de que alguém possui a veste nupcial do amor. De fato, logo que tal "veste" é rasgada, o homem se torna impaciente. Todas as virtudes podem ser falsificadas, parecendo verdadeiras sem o ser diante de mim. A paciência, aliás, mostra quando uma virtude é viva e verdadeira, enquanto o homem impaciente manifesta a imperfeição dos seus atos, revelando que ainda não se assentou à mesa de cruz. E junto à cruz que se adquire a paciência; quem se conhece e me conhece, conseguirá praticá-la depois com desejo santo e humildade. O homem paciente nunca deixa de me honrar e de trabalhar pela salvação dos outros, dedicando a isso o próprio tempo. Ó filha querida, a paciência encontrava-se nos mártires, que mediante os sofrimentos salvaram outros; suas mortes foram fonte de vida, ressuscitando mortos e expulsando as trevas do pecado mortal. Na força desta virtude rainha, eles venceram o mundo com seus atrativos; com seus recursos, os poderosos não conseguiram derrotá-los. A paciência é uma lâmpada sobre o candelabro. Tal é o fruto produzido pela "lágrima de amor", na pessoa que conseguiu sentar-se à mesa do Crucificado, cheio de desejo santo e com intolerável dor pelas ofensas cometidas contra mim, seu Criador. Mas não é uma dor angustiante. A angústia já cessara, quando o amor paciente destruiu o temor servil e o egoísmo, únicos fatores que fazem sofrer. A dor sentida é uma dor que conforta, pois nasce da caridade e é causada pelo conhecimento de pecados contra mim e de danos sofridos pelos pecadores. E um sentimento que brota do amor e enriquece o homem; algo que alegra, algo que revela Minha presença na graça.

Efeitos das lágrimas de união

               Tendo-me ocupado sobre os frutos das terceiras lágrimas de vida, resta-me o quarto e último estado, o da união. Este, como já disse, não existe como que separado do anterior. Ambos coexistem, como acontece com o amor pelo próximo e o amor por mim; um reforça o outro. Neste quarto estado, aumenta tanto a caridade, que o homem não somente suporta as dificuldades pacientemente, mas deseja-as com alegria, como ficou explicado acima. Desejoso de configurar-se a Cristo crucificado, renuncia a toda satisfação pessoal, de qualquer tipo que seja. Fruto desta lágrima de união é a quietude do espírito, uma comunhão contínua Comigo em grande prazer. Qual criança no colo da mãe, com a boca colada ao seio sugando o leite, assim a alma, neste estado, descansa no seio do meu amor e, pelo desejo santo, alimenta-se do Crucificado pelos Seus exemplos e mensagens. Durante o terceiro estado a alma aprendera que não devia fixar-se unicamente em mim, Pai eterno, porque em mim não há sofrimento; que devia imitar meu Filho, o doce e amoroso Verbo encarnado. Vós não deveis viver sem a dor; é tolerando muita dificuldade que atingis o aprimoramento da virtude. Esse aprimoramento é alcançado no Coração de Cristo, sede do amor. É ali que as almas buscam a força da graça, experimentando a divindade. Antes disso, as virtudes não possuem suavidade; ela chega com a união no meu amor, ou seja, quando o homem deixa de preocupar-se com os próprios interesses, visando apenas minha glória e salvação alheia. Filha querida, como é agradável e grandioso este estado da alma! Nele o homem se une muito estreitamente ao amor divino. Como está a boca da criança para o seio materno, e o seio materno para o leite que sustenta, assim está a alma para com Cristo crucificado e para Comigo, onde acha o alimento da divindade. Oxalá se entendesse como aqui as faculdades se enriquecem. A memória lembra-se de mim permanentemente, atenta aos meus benefícios; mas ela se fixa menos sobre os benefícios, do que no amor com que os dei. De maneira particular a memória considera o dom da criação, pelo qual o homem surgiu do nada à minha imagem e semelhança. Quando estava no primeiro estado, a consciência de tal favor levara a alma a reconhecer a ingratidão em que vivia e a abandonar o pecado por graça do sangue de Cristo. Em tal sangue Eu vos recriei, Eu vos lavei da lepra do mal. Ao passar para o segundo estado a alma recebera grande consolação no amor, bem como o desgosto pela culpa com que me ofendera, pois foi por esse motivo que fiz sofrer meu Filho. Continuando, a memória se lembra da efusão do Espírito Santo, que a iluminara - e ilumina ainda - na verdade. Quando isso aconteceu? Após ter reconhecido os dons divinos concedidos durante o primeiro e segundo estados. É no terceiro que se dá a iluminação completa, mediante a qual vê que por amor criei o homem no intuito de dar-lhe a vida eterna. Revelei-vos tal verdade no sangue de Cristo. Consciente disso tudo, o homem ama-me, gostando do que Eu gosto, desprezando o que desprezo. Descobre assim no próximo o "meio" para amar. É no coração de Cristo que a memória supera toda imperfeição e enche-se da recordação dos meus favores. Com a perfeita iluminação, a inteligência perscruta tudo o que a memória retém, conhecendo a verdade. Uma vez superada a cegueira do egoísmo, ela contempla o sol que é Cristo crucificado e O reconhece como Deus e Homem. Por ocasião da união Comigo, recebera uma ulterior iluminação infusa, dom gratuito meu, que não desprezo os ardentes desejos e esforços da alma. A vontade segue a inteligência, une-se à sabedoria infusa com um amor perfeitíssimo, muito ardente. Se me perguntassem o que aconteceu numa pessoa assim, eu responderia: tornou-se um outro eu na caridade! Que língua seria capaz de narrar a excelência deste último estado - a união - e descrever os efeitos produzidos nas três faculdades humanas, inteiramente realizadas? Aqui acontece aquela "unificação" das faculdades por mim mencionadas ao falar dos três graus (gerais), comentando uma expressão bíblica. Não, a linguagem humana não é capaz de a descrever! Dela falaram os santos doutores, quando a iluminação infusa os fez explicar a Sagrada Escritura. São Tomás de Aquino, por exemplo, adquiriu sua sabedoria mais na oração, no êxtase e na iluminação da mente do que no estudo humano. Foi uma lâmpada por mim colocada na hierarquia da santa Igreja a dissipar as trevas do erro. São João evangelista, quanta luz recebeu ao reclinar-se sobre o peito de Cristo. Com essa luz desde então, e durante muitos anos, pregou o evangelho. E se considerares um por um os santos doutores, todos eles revelaram tal luz, cada um a seu modo. Mas ser-te-ia impossível descrever o sentimento profundo, a suavidade inefável, a perfeita comunhão! É a isto que Paulo se referia quando afirmava: "Os olhos não podem ver, nem os ouvidos escutar, nem a mente pensar quão grande prazer e que perfeição estão preparados, no final, para aquele que realmente me serve". Como é agradável, acima de todo outro prazer, a permanência do homem em mim pelo amor! A vontade própria já não põe empecilhos, pois se tornou uma coisa Comigo. Essa pessoa espalha seu perfume pelo mundo inteiro, qual efeito de suas orações contínuas e humildes. É o perfume do amor, a clamar pelos irmãos diante de minha divina majestade na voz do próprio silêncio! São esses os frutos da união nesta vida, entre lágrimas e suores, no último estado da vida espiritual. Se a pessoa perseverar, passará, um dia, dessa união imperfeita como união, mas perfeita quanto à graça, à perfeita união celeste. Enquanto se encontra no corpo, o homem não atinge tudo o que deseja; estará preso a uma "lei perversa", cuja força as virtudes adormecem, mas não destroem. Essa lei poderá até acordar, caso seja retirado o controle que a mantém dormindo. Eis a razão por que disse que a união presente é "imperfeita". Mas é ela que conduz a pessoa à vida eterna, à vida impossível de se perder, como já disse ao falar dos bem-aventurados, junto aos quais o homem gozará da comunhão Comigo na vida sem fim. As almas que forem para o céu, terão a vida eterna; os demais terão a condenação como punição de seu pranto pecaminoso.

               Os primeiros, dos sofrimentos desta vida passarão à alegria; a vida eterna será a recompensa de suas lágrimas de amor. No céu, como já afirmei, continuarão a oferecer-me lágrimas de fogo em vosso favor. Concluo assim minhas palavras sobre as lágrimas, suas qualidades e seus efeitos. Umas conduzem os perfeitos ao céu, outras levam os maus à perdição!

 

199 . 2 - Santa Brígida da Suécia

               Brígida, conhecida também como Brigite, nasceu em 1303, Princesa do Castelo de Finstad, filha do rei da Suécia. Sua família real era tão piedosa, que forneceu vários Santos à Igreja. Além disso, sua família real também construiu mosteiros, hospitais e igrejas usando a própria fortuna. Seguindo o exemplo de sua família, Brígida ajudava em obras de caridade desde a infância. Além disso, ela tinha um dom de revelações. Essas revelações foram todas escritas por ela na língua sueca. Mais tarde elas foram traduzidas para o Latim, formando grandes volumes. Tais obras ainda hoje são consultadas por teólogos, historiadores e fiéis como fonte histórica. Durante sua juventude, Brígida foi dama de companhia de uma Rainha chamada Bianca, da região de Namur, na atual Bélgica. Por causa dessa função, ela estava sempre presente nas Cortes cheias de luxo e riqueza. Contudo, ela não se deixou corromper nestes ambientes de cheios de frivolidades. Pelo contrário, manteve-se fiel à sua consciência cristã e preservou sua fé, nunca se afastando da caridade e da dignidade.  Com dezoito anos de idade, Brígida se casou com um nobre de nome Ulf Gudmarsson. Seu marido era também um cristão fervoroso. Brígida e Ulf tiveram oito filhos. Dentre eles destaca-se uma filha que também foi canonizada: Santa Catarina da Suécia. O casal, e especialmente Brígida, cuidava da educação moral, formal e religiosa dos filhos com toda a dedicação. O casal Brígida e Ulf viveu um duro golpe: a morte de um de seus filhos. Depois disso, eles decidiram ir em peregrinação até o Santuário de Santiago de Compostela, na Espanha. Quando voltavam, Ulf ficou gravemente doente. Quando isso aconteceu, Santa Brígida teve uma revelação, em sonho, por intermédio de São Dionísio. No sonho, ela ficou sabendo que seu marido não morreria. E, realmente, ele ficou curado. Logo depois, porém, decidiu ingressar no Mosteiro de Alvastra. Lá, um de seus filhos já vivia como monge. Em 1344 Ulf faleceu, deixando Santa Brígida viúva. Uma vez viúva, Santa Brígida retirou-se de uma vez por todas para a vida religiosa. Ela guardava em seu coração um antigo projeto, que era o de fundar um mosteiro duplo, tendo uma área para homens e outra para mulheres. Deste projeto nasceu a Ordem do Santo Salvador. Os religiosos seguiam as Regras de vida de São Agostinho. A própria Santa Brígida passou a viver neste mosteiro até que a Ordem fundada por ela foi aprovada oficialmente pela Igreja. Depois dessa aprovação, ela mudou-se para Roma. Santa Brígida viveu em Roma durante vinte e quatro anos. Lá, trabalhou pela moralização dos costumes. Também lutou para que o Papa que, na época, por divisões dentro da Igreja, estava em Avignon, na França, voltasse para Roma. Contando com total apoio do rei da Suécia, ela construiu nada menos que setenta e oito mosteiros espalhados pela Europa. Santa Brígida faleceu em 23 de julho de 1373, quando estava numa peregrinação à Terra Santa.  A partir de sua morte, a Ordem do Santo Salvador passou a ser dirigida por Santa Catarina da Suécia, sua filha. A Ordem tornou-se muito famosa alguns anos depois. Santa Brígida foi canonizada logo, apenas dezoito anos depois de sua morte. O culto a ela espalhou-se rapidamente por toda a Europa. O local onde ela morou na cidade de Roma foi transformado numa bela igreja dedicada a ela, situada na praça Farnese.

As 15 Orações dadas a Santa Brígida

               Como já há muito tempo Santa Brígida desejasse saber o número de golpes que Jesus levara durante a Paixão, certo dia, enquanto rezava na Igreja de São Paulo, em Roma, Ele lhe apareceu dizendo: "Recebi em todo o meu Corpo 5.480 golpes. Se desejais honras as chagas que eles me produziram, mediante uma veneração particular, deveis recitar 15 Pai-Nossos e 15 Ave-Marias, acrescentando as seguintes orações, durante um ano inteiro; quando o ano terminar, tereis prestado homenagem a cada uma das minhas chagas.

               Quem recitar estas oração durante um ano inteiro conseguirá livrar do Purgatório 15 almas de sua família, 15 justos também de sua linhagem serão conservados em graça e 15 pecadores de sua família serão convertidos. A pessoa que as recitar será elevada ao mais eminente grau de perfeição e 15 dias antes da sua morte Eu lhe darei meu Precioso Corpo, para que ela seja livre da fome eterna. Eu lhe darei também de beber o meu Precioso Sangue, afim de que não padeça sede eternamente e 15 dias antes da morte ela experimentará uma profunda contrição de todos os seus pecados e um perfeito conhecimento deles. Diante dela colocarei o sinal da minha Cruz vitoriosa como socorro e defesa contra os embustes dos seus inimigos. Antes da sua morte, Eu virei em companhia de minha muito cara e bem amada Mãe, para receber a sua alma e conduzi-la às alegrias eternas. E tendo-a levado até lá, Eu lhe darei a beber um trago singular da fonte da minha Divindade, o que não farei, absolutamente, a outros que não tenham recitado as minhas Orações. Aquele que disser estas Orações pode estar seguro de ser associado ao supremo coro dos Anjos e todo aquele que as ensinar a alguém, terá assegurado para sempre sua felicidade e seus méritos. Sim, eles serão estáveis e durarão perpetuamente. No lugar onde se encontrarem e onde forem recitadas essas Orações, Deus estará também presente com as Suas Graças."

Quinze Orações de Santa Brígida

Sinal da Cruz.

Pelo sinal da Santa Cruz, livrai-nos Deus, Nosso Senhor, dos nossos inimigos.

Em Nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Amém.

Oração ao Espírito Santo: Vinde, Espírito Santo, enchei os corações dos vossos fiéis e acendei neles o fogo do Vosso amor. Enviai o Vosso Espírito e tudo será criado, e renovareis a face da Terra! Ó Deus que instruístes os corações dos Vossos fiéis, com a luz do Espírito Santo, fazei que apreciemos retamente todas as coisas, segundo o mesmo Espírito, e gozemos sempre de Sua consolação, por Cristo, Senhor Nosso. Amém!”

1ª Oração: Pelos Sacerdotes, freiras e religiosos militantes.

Reze agora um Pai-Nosso... E depois uma Ave-Maria...

Ó Jesus Cristo, doçura eterna para aqueles que Vos amam, alegria que ultrapassa toda a alegria e todo o desejo, esperança de salvação dos pecadores, que declarastes não terdes maior contentamento do que estar entre os homens, até o ponto de assumir a nossa natureza, na plenitude dos tempos, por amor deles. Lembrai-Vos dos sofrimentos, desde o primeiro instante da Vossa Conceição e sobretudo durante a Vossa Santa Paixão, assim como havia sido decretado e estabelecido desde toda a eternidade na mente divina. Lembrai-Vos, Senhor, que, celebrando a Ceia com os Vossos discípulos, depois de lhes haverdes lavado os pés, deste-lhes o Vosso Sagrado Corpo e precioso Sangue e, consolando-os docemente lhes predissestes a Vossa Paixão iminente. Lembrai-Vos da tristeza e da amargura que experimentastes em Vossa Alma como o testemunhastes Vós mesmo por estas palavras: "A minha Alma está triste até a morte". Lembrai-Vos, Senhor, dos temores, angústias e dores que suportastes em Vosso Corpo delicado, antes do suplício da Cruz, quando, depois de ter rezado por três vezes, derramado um suor de Sangue, fostes traído por Judas Vosso discípulo, preso pela nação que escolhestes, acusado por testemunhas falsas, injustamente julgado por três juízes, na flor da Vossa juventude e no tempo solene da Páscoa. Lembrai-Vos que fostes despojado de Vossas vestes e revestido com as vestes da irrisão, que Vos velaram os olhos e a face, que Vos deram bofetadas, que Vos coroaram de espinhos, que Vos puseram uma cana na mão e que, atado a uma coluna, fostes despedaçado por golpes e acabrunhado de afrontas e ultrajes. Em memória destas penas e dores que suportastes antes da Vossa Paixão sobre a Cruz, concedei-me, antes da morte, uma verdadeira contrição, a oportunidade de me confessar com pureza de intenção e sinceridade absoluta, uma adequada satisfação e a remissão de todos os meus pecados. Assim seja!

2ª Oração: Pelos trabalhadores em geral.

Pai-Nosso... Ave-Maria...

Ó Jesus Cristo, verdadeira liberdade dos Anjos, paraíso de delícias, lembrai-Vos do peso acabrunhador de tristezas que suportastes, quando Vossos inimigos, quais leões furiosos, Vos cercaram e, por meio de mil injúrias, escarros, bofetadas, arranhões e outros inauditos suplícios Vos atormentaram à porfia. Em consideração destes insultos e destes tormentos, eu Vos suplico, ó meu Salvador, que Vos digneis libertar-me dos meus inimigos, visíveis e invisíveis e fazer-me chegar, com o Vosso auxílio a perfeição da salvação eterna. Assim seja!

3ª Oração: Pelos presos.

Pai-Nosso... Ave-Maria...

Ó Jesus, Criador do Céu e da terra, a quem coisa alguma pode conter ou limitar, Vós que tudo abarcais e tendes tudo sob o Vosso poder, lembrai-Vos da dor, repleta de amargura, que experimentastes quando os soldados, pregando na Cruz Vossas Sagradas mãos e Vossos pés tão delicados, transpassaram-nos com grandes e rombudos cravos e não Vos encontrando no estado em que teriam desejado, para dar largas à sua cólera, dilataram as Vossas Chagas, exacerbando assim as Vossas dores. Depois, por uma crueldade inaudita, Vos estenderam sobre a Cruz e Vos viraram de todos os lados, deslocando, assim, os Vossos membros. Eu vos suplico, pela lembrança desta dor que suportastes na Cruz, com tanta santidade e mansidão, que Vos digneis conceder-me o Vosso Temor e o Vosso Amor. Assim seja!

4ª Oração: Pelos doentes.

Pai Nosso... Ave-Maria...

Ó Jesus, médico celeste, que fostes elevado na Cruz afim de curar as nossas chagas por meio das Vossas, lembrai-Vos do abatimento em que Vos encontrastes e das contusões que Vos infligiram em Vossos Sagrados membros, dos quais nenhum permaneceu em seu lugar, de tal modo que dor alguma poderia ser comparada a Vossa. Da planta dos pés até o alto da cabeça, nenhuma parte do Vosso Corpo esteve isenta de tormentos e, entretanto, esquecido dos Vossos sofrimentos, não Vos cansastes de suplicar a Vosso Pai, pelos inimigos que Vos cercavam, dizendo-Lhe: "Pai, perdoai-lhes porque não sabem o que fazem".

Por esta grande misericórdia e em memória desta dor, fazei com que a lembrança da Vossa Paixão, tão impregnada de amargura, opere em mim uma perfeita contrição e a remissão de todos os meus pecados. Assim seja!

5ª Oração: Pelos funcionários dos hospitais.

Pai-Nosso... Ave-Maria...

Ó Jesus, espelho do esplendor eterno. Lembrai-Vos da tristeza que sentistes, quando, contemplando a luz da Vossa Divindade a predestinação daqueles que deveriam ser salvos pelos méritos da Vossa santa paixão, contemplastes, ao mesmo tempo, a multidão dos réprobos, que deveriam ser condenados por causa de seus pecados e lastimastes, amargamente, a sorte destes infelizes pecadores, perdidos e desesperados. Por este abismo de compaixão e de piedade e, principalmente, pela bondade que manifestastes ao bom ladrão dizendo-lhe: "Hoje mesmo estarás Comigo no Paraíso", eu Vos suplico ó Doce Jesus, que na hora da minha morte useis de misericórdia para comigo. Assim seja!

6ª Oração: Pelas famílias.

Pai-Nosso... Ave-Maria...

Ó Jesus, Rei amável e de todo desejável, lembrai-vos da dor que experimentastes quando, nu e como um miserável, pregado e levantado na Cruz, fostes abandonado por todos os vossos parentes e amigos, com exceção de Vossa mãe bem amada, que permaneceu, em companhia de São João, muito fielmente junto de Vós na agonia, lembrai-Vos que os entregastes um ao outro dizendo: "Mulher eis aí o teu filho!". E a João: "Eis aí a tua Mãe!". Eu vos suplico, ó meu Salvador, pela espada de dor que então transpassou a alma de, Vossa Santa Mãe, que tenhais compaixão de mim, em todas as minhas angústias e tribulações, tanto corporais como espirituais e que Vos digneis assistir-me nas provações que me sobrevierem, sobretudo na hora da minha morte. Assim seja!

7ª Oração: Contra a luxúria.

Pai-Nosso... Ave-Maria...

Ó Jesus, fonte inexaurível de piedade, que por uma profunda ternura de amor, dissestes sobre a Cruz: "Tenho sede!", mas sede de salvação do gênero humano. Eu Vos suplico, ó meu Salvador, que Vos digneis estimular o desejo que meu coração experimenta de tender a perfeição em todas as minhas obras e extinguir, por completo, em mim, a concupiscência carnal e o ardor dos desejos mundanos. Assim seja!

8ª Oração: Pelas crianças e jovens.

Pai-Nosso... Ave-Maria...

Ó Jesus, doçura dos corações, suavidade dos espíritos, pelo amargo sabor do fel e do vinagre que provastes sobre a Cruz por amor de todos nós, concedei-me a graça de receber dignamente o Vosso Corpo e Vosso Preciosíssimo Sangue, durante toda a minha vida e, na hora da minha morte afim de que sirvam de remédio e de consolo para minha alma. Assim seja!

9ª Oração: Pelos agonizantes espirituais.

Pai-Nosso... Ave-Maria...

Ó Jesus, virtude real, alegria do espírito, lembrai-Vos da dor que suportastes, quando, mergulhado na amargura, ao sentir aproximar-se a morte, insultado e ultrajado pelos homens, julgastes haver sido abandonado por Vosso Pai dizendo: "Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?". Por esta angústia eu Vos suplico ó meu Salvador, que não me abandoneis nas aflições e nas dores da morte. Assim seja!

10ª Oração: Pelos sofredores em geral.

Pai-Nosso... Ave-Maria...

Ó Jesus, que sois em todas as coisas começo e fim, vida e virtude, lembrai-Vos de que por nós fostes mergulhado num abismo de dores, da planta dos pés até o alto da cabeça. Em consideração da extensão das Vossas chagas, ensinai-me a guardar os Vossos Mandamentos, mediante uma sincera caridade, mandamentos estes que são caminhos espaçosos e agradáveis para aqueles que Vos amam. Assim seja!

11ª Oração: Pelos pecadores de todo o mundo.

Pai-Nosso... Ave-Maria...

Ó Jesus, profundíssimo abismo de misericórdia, suplico-Vos, em memória de Vossas Chagas, que penetraram até a medula dos vossos ossos e atingiram até as vossas entranhas, que vos digneis afastar esse(a) pobre pecador(a) do lodaçal de ofensas em que está submerso(a) conduzindo-o(a) para longe do pecado. Suplico-Vos também, esconder-me de Vossa face irritada, ocultando-me dentro de Vossas chagas, até que a Vossa cólera e a Vossa justa indignação tenham passado. Assim seja!

12ª Oração: Por todas as Igrejas.

Pai-Nosso... Ave-Maria...

Ó Jesus, espelho de verdade, sinal de unidade, laço de caridade, lembrai-Vos dos inumeráveis ferimentos que recebestes, desde a cabeça até os pés, ao ponto de ficardes dilacerado e coberto pela púrpura do Vosso Sangue adorável. Ó quão grande e universal foi a dor que sofrestes em Vossa Carne virginal por nosso amor! Ó Dulcíssimo Jesus, que poderíeis fazer por nós que não o houvésseis feito?

Eu vos suplico, ó meu Salvador, que vos digneis imprimir, com o Vosso Precioso Sangue, todas as Vossas chagas em meu coração, afim de que eu relembre, sem cessar, as Vossas Dores e o Vosso Amor. Que pela fiel lembrança da Vossa Paixão, o fruto dos Vossos Sofrimentos seja renovado em mim, cada dia mais, até que eu me encontre, finalmente, Convosco, que sois o tesouro de todos os bens e a fonte de todas as alegrias. Ó Dulcíssimo Jesus, concedei-me poder gozar de semelhante ventura na vida eterna. Assim seja!

13ª Oração: Pelos profetas atuais.

Pai-Nosso... Ave-Maria...

Ó Jesus, fortíssimo Leão, Rei imortal e invencível, lembrai-Vos da dor que vos acabrunhou quando sentistes esgotadas todas as Vossas forças, tanto do Coração como do Corpo e inclinastes a cabeça dizendo: "Tudo está consumado!". Por esta angústia e por esta dor, eu Vos suplico, Senhor Jesus, que tenhais piedade de mim, quando soar a minha última hora e minha alma estiver amargurada e o meu espírito cheio de aflição. Assim seja!

14ª Oração: Pelos políticos e pelos governantes.

Pai-Nosso... Ave-Maria...

Ó Jesus, Filho Único do Pai, esplendor e imagem da Sua substância, lembrai-Vos da humilde recomendação que Lhe dirigistes dizendo: "Meu Pai, em Vossas mãos entrego o meu Espírito!" Depois expirastes, estando vosso Corpo despedaçado, vosso Coração transpassado e as entranhas da vossa Misericórdia abertas para nos resgatar.

Por esta preciosa morte eu Vos suplico, ó Rei dos Santos, que me deis força e me socorrais, para resistir ao demônio, a carne a ao sangue, afim de que, estando morto(a) para o mundo, eu possa viver somente para Vós. Na hora da morte, recebei, eu Vos peço, minha alma peregrina e exilada que retorna para Vós. Assim seja!

15ª Oração: Pelo Santo Padre, o Papa.

Pai-Nosso... Ave-Maria...

Ó Jesus, vide verdadeira e fecunda, lembrai-Vos da abundante efusão de Sangue, que tão generosamente derramastes de Vosso Sagrado Corpo, assim como a uva é triturada no lagar. Do Vosso lado aberto pela lança de um dos soldados, jorraram Sangue e Água, de tal modo que não retivestes uma gota sequer. E, enfim, como um ramalhete de mirra elevado na Cruz, Vossa Carne delicada se aniquilou, feneceu o humor de Vossas entranhas e secou a medula dos Vossos ossos. Por esta tão amarga Paixão e pela efusão de Vosso precioso Sangue, eu vos suplico, ó Bom Jesus, que recebais minha alma quando eu estiver na agonia. Assim seja!

Oração final:

Ó doce Jesus, vulnerai o meu coração, afim de que lágrimas de arrependimento, de compunção e de amor, noite e dia me sirvam de alimento. Convertei-me inteiramente a Vós. Que o meu coração Vos sirva de perpétua habitação. Que a minha conduta vos seja agradável e que o fim da minha vida seja de tal modo edificante que eu possa ser admitido no Vosso Paraíso, onde, com os Vossos Santos, hei de vos louvar para sempre. Assim seja!

Consagração diária a Nossa Senhora

Ó Santa Mãe Dolorosa de Deus, ó Virgem Dulcíssima, eu Vos ofereço o meu coração afim de que o conserveis intacto como o Vosso Coração Imaculado. Eu vos ofereço a minha inteligência, para que ela conceba apenas pensamentos de paz e de bondade, de pureza e verdade. Eu vos ofereço a minha vontade, para que ela se mantenha viva e generosa ao serviço de Deus. Eu vos ofereço meu trabalho, minhas dores, meus sofrimentos, minhas angústias, minhas tribulações e minhas lágrimas, no meu presente e meu futuro, para serem apresentadas por vós ao vosso Divino Filho, para purificação da minha vida. Mãe Compassiva, eu me refugio em vosso Coração Imaculado, para acalmar as dolorosas palpitações de minhas tentações, de minha aridez, de minha indiferença e das minha negligências. Escutai-me ó Mãe, guiai-me, sustentai-me e defendei-me, contra todos os perigos da alma e do corpo, agora e por toda a eternidade.

Assim seja.

A oração dos 7 pai nossos e 7 Ave Marias

O divino Salvador revelou a Santa Brígida a seguinte promessa:

"Sabei que darei 5 graças àqueles que, durante 12 anos, rezarem sete Pai Nossos e sete Ave Marias em honra do meu precioso Sangue:

1º) Não terão que passar pelo purgatório.

2º) Aceitá-los-ei no Coro dos Mártires como se tivessem derramado seu sangue pela fé.

3º) Conservarei 3 almas de seus parentes na graça santificante conforme sua escolha.

4º) As almas dos seus parentes até o 4o. grau escaparão do inferno.

5º) Um mês antes de sua morte ser-lhes-á dado conhecimento dela.

Se por acaso morrerem antes dos 12 anos completos, irei julgar como se fossem as condições cumpridas."

               Papa Inocêncio X confirmou esta revelação e acrescentou que as almas cumpridoras das condições libertarão cada sexta-feira Santa uma alma do purgatório. A esta devoção, facilmente, se unirá a veneração e o oferecimento das santas chagas do nosso Salvador, pois das suas chagas brotou o precioso Sangue. O Redentor recomendou este exercício à irmã Maria Marta Chambon e lhe deu grandes promessas a respeito deste.

Recomenda-se acrescentar aos 7 Pai Nossos e 7 Ave Marias as orações seguintes:

AS ORAÇÕES:

Sinal da Cruz.

Oração ao Espírito Santo: Vinde, Espírito Santo, enchei os corações dos vossos fiéis e acendei neles o fogo do Vosso amor. Enviai o Vosso Espírito e tudo será criado, e renovareis a face da Terra! Ó Deus que instruístes os corações dos Vossos fiéis, com a luz do Espírito Santo, fazei que apreciemos retamente todas as coisas, segundo o mesmo Espírito, e gozemos sempre de Sua consolação, por Cristo, Senhor Nosso. Amém!”

1ª Mistério: Circuncisão de Jesus

Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, pelas mãos imaculadas de Maria, eu vos ofereço as primeiras chagas, as primeiras dores, e a primeira evasão do preciosíssimo Sangue derramado por Jesus, para expiar os pecados da humanidade, especialmente da juventude, os meus, e para a renúncia aos primeiros pecados, especialmente os mortais, sobretudo da minha família.

Amém.

1 Pai nosso ...  1 Ave Maria...

2ª Mistério: O Suor de Sangue

PAI de Nosso Senhor Jesus Cristo, pelas mãos imaculadas de Maria, eu vos ofereço as dores atrozes do Coração de Jesus no jardim das Oliveiras, e cada gota de Sangue, para expiar todos os pecados do coração de cada pessoa, os meus, para a renúncia a tais pecados e para que aumente o amor a Deus e ao próximo.

Amém.

1 Pai nosso ...  1 Ave Maria...

3ª Mistério: Flagelação de Jesus

PAI de Nosso Senhor Jesus Cristo, pelas mãos imaculadas de Maria, eu vos ofereço todas as chagas, as dores cruéis, e o Preciosíssimo Sangue de Jesus na flagelação, por todos os pecados da carne, da humanidade, pelos meus, para a renúncia a tais pecados e para a aquisição e conservação da pureza, em especial da minha família.

Amém.

1 Pai nosso ...  1 Ave Maria...

4ª Mistério: Coroação de Espinhos

PAI de Nosso Senhor Jesus Cristo, pelas mãos imaculadas de Maria, eu vos ofereço as chagas, as dores, e o Preciosíssimo Sangue da Sagrada Cabeça de Jesus na coroação de espinhos, para expiar todos os pecados dos pensamentos, da humanidade, os meus, para a renúncia a todos os pecados, e para a extensão do Reino de Cristo sobre a terra.

Amém.

1 Pai nosso ...  1 Ave Maria...

5ª Mistério: Caminho da Cruz

PAI de Nosso Senhor Jesus Cristo, pelas mãos imaculadas de Maria, eu vos ofereço as dores de Jesus no caminho do calvário, sobretudo na sua santa chaga do ombro, ofereço também o seu preciosíssimo Sangue, para aliviar o peso da Cruz, para reparar os meus murmúrios, para a renúncia a todos os pecados cometidos, e para que haja um verdadeiro amor á Santa Cruz.

Amém.

1 Pai nosso ...  1 Ave Maria...

6ª Mistério: Crucificação de Jesus

Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, pelas mãos imaculadas de Maria, eu vos ofereço o vosso Unigênito Filho cravado na Cruz, as chagas das mãos e dos pés, e os fios de seu Preciosíssimo Sangue derramado por nós, seu extremo aniquilamento, a sua perfeita obediência, e todas as aflições mortais de seu Corpo e Alma. Ofereço-vos a sua preciosa Morte na Cruz que se renova constantemente em cada Santa Missa no Mundo inteiro, para expiar os atentados aos votos e às santas instituições, em reparação dos meus pecados e dos pecados do Mundo inteiro, pelos doentes e moribundos, para obter Santos Sacerdotes e leigos, pelas intenções do Papa, pela restauração da família cristã, para fortificar e encorajar a Fé, pela nossa Pátria, pela unidade de todos os povos em Cristo e na vossa Igreja, assim como por todos os Países onde os cristãos estão em minoria.

Amém.

1 Pai nosso ...  1 Ave Maria...

7ª Mistério: Abertura do Santo Lado

PAI de Nosso Senhor Jesus Cristo, pelas mãos imaculadas de Maria, aceitai os preciosíssimo dons da Água e do Sangue, que jorraram da chaga do Divino Coração de Jesus, pelas necessidades da Igreja e em expiação dos pecados da humanidade. Sangue propulsado pelo Sacratíssimo Coração de Jesus, lavai-me e purificai-me de todos os meus pecados. Água do Lado de Cristo, lavai-me e purificai-me de meus primeiros pecados, e salvai-me como a todas as almas das chamas do Purgatório.

Amém.

1 Pai nosso ...  1 Ave Maria...

ORAÇÃO FINAL:

Ó doce Jesus, vulnerai o meu coração, afim de que lágrimas de arrependimento, de compunção e de amor, noite e dia me sirvam de alimento. Convertei-me inteiramente a Vós. Que o meu coração Vos sirva de perpétua habitação; Que a minha conduta vos seja agradável e que o fim da minha vida seja de tal modo edificante que eu possa ser admitido no Vosso Paraíso, onde, com os vossos Santos, hei de vos louvar para sempre.

Assim seja!

Amém.

Consagração a Nossa Senhora

Ó Santa Mãe Dolorosa de Deus, ó Virgem Dulcíssima, eu Vos ofereço o meu coração afim de que o conserveis intacto como o Vosso Coração Imaculado. Eu Vos ofereço a minha inteligência, para que ela conceba apenas pensamentos de paz e de bondade, de pureza e verdade. Eu Vos ofereço a minha vontade, para que ela se mantenha viva e generosa ao serviço de Deus. Eu vos ofereço meu trabalho, minhas dores, meus sofrimentos, minhas angustias, minhas tribulações e minhas lágrimas, no meu presente e meu futuro, para serem apresentadas por Vós ao Vosso Divino Filho, para purificação da minha vida. Mãe Compassiva, eu me refugio em Vosso Coração Imaculado, para acalmar as dolorosas palpitações de minhas tentações, de minha aridez, de minha indiferença e das minha negligencias. Escutai-me ó Mãe, guiai-me, sustentai-me e defendei-me, contra todos os perigos da alma e do corpo, agora e por toda a eternidade.

Assim seja!

Amém.

As Profecias e Revelações de Santa Brígida da Suécia

               Palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo à sua esposa escolhida e muito amada, Santa Brígida; sobre a proclamação de sua Santíssima encarnação; a rejeição, profanação e abandono de nossa fé e batismo; e como Ele convida sua amada esposa e todo o povo cristão a amá-lo.

               Eu sou o Criador do Céu e da Terra, uno na divindade com o Pai e o Espírito Santo. Eu sou aquele que falou aos aos patriarcas e profetas e aquele a quem esperavam. Para cumprir seus anseios e de acordo com minha promessa, assumi a carne sem pecado e sem concupiscência, entrando no ventre da Virgem, como o sol que brilha através de claríssima joia. Assim como o sol não danifica o vidro ao entrar nele, assim também a virgindade da Virgem não foi perdida quando eu assumi a natureza humana. Eu assumi a carne de tal forma que não abandonei minha divindade, e Eu não fui menos Deus – governando e sustentando todas as coisas com o Pai e o Espírito Santo - embora estivesse no ventre da Virgem em minha natureza humana. Assim como a luminosidade jamais é separada do fogo, assim também, minha divindade nunca foi separada de minha humanidade, nem mesmo na morte. Desde então, permiti que meu corpo puro e sem pecado fosse ferido, dos pés à cabeça, e fosse crucificado por todos os pecados do gênero humano. Esse mesmo corpo é agora oferecido a cada dia no altar para que o gênero humano possa amar-me e se lembrar de meus grandes feitos mais frequentemente. Eu, deveras, quis que meu reino estivesse dentro do homem, e por direito, Eu deveria ser Rei e Senhor para ele, porque Eu o fiz e o redimi. Entretanto, agora ele quebrou e profanou a fé que me prometeu em seu batismo, e quebrou e desprezou minhas leis e meus mandamentos, que Eu prescrevi e revelei a ele. Ele ama sua própria vontade e se recusa a ouvir-me. Alem disso, ele exalta acima de mim o pior ladrão, o demônio, e deu à ele sua fé. O demônio realmente é um ladrão, já que, me rouba, por meio das tentações diabólicas, maus conselhos e falsas promessas, a alma humana que Eu redimi com meu sangue. Mas ele não faz isso por que, seja mais poderoso do que eu, porque eu sou tão poderoso que Eu posso fazer todas as coisas com uma palavra, e tão justo, que mesmo que todos os santos me pedissem, Eu não faria a menor coisa contra a justiça. Entretanto, como o homem, a quem foi dado livre arbítrio, voluntariamente rejeita meus mandamentos e obedece o demônio, é justo que ele também experimente sua tirania e malícia. Esse demônio foi por mim criado bom, mas decaiu por sua vontade má, e se tornou, por assim dizer, meu servo para aplicar retribuição aos trabalhadores do mal. Ainda, embora eu seja agora tão desprezado, sou ainda tão misericordioso que, qualquer um que reze pela minha misericórdia e se humilhe por correção, terão seus pecados perdoados, e eu o salvarei do ladrão diabólico: o demônio. Mas para aqueles que continuam me desprezando, Eu levarei minha justiça sobre eles, de forma que ouvindo isso, tremerão, e os que experimentam isso dirão: ‘Ai de nós os nascidos ou concebidos! Ai de nós os que provocamos o Senhor da majestade até a ira!’ Mas tu, filha que eu escolhi para mim e com quem eu agora falo em espírito: ama-me com todo teu coração, não como tu amas teu filho, filha ou pais, mas mais do que qualquer coisa no mundo, já que Eu que te criei e não poupei nenhum de meus membros no sofrimento por ti. Ainda Eu amo a tua alma tão amorosamente que, ao invés de te perder, eu me deixaria ser crucificado novamente, se isso fosse possível. Imita minha humildade, porque Eu, que o rei da glória e dos anjos, fui vestido com horríveis miseráveis trapos, e fiquei nu em um pilar e ouvi todo tipo de insultos e zombarias com meus próprios ouvidos. Sempre prefira minha vontade à tua, porque minha Mãe, tua Senhora, do começo ao fim, nunca quis nada a não ser o que eu quis. Se tu fazes isso, então teu coração estará com o meu coração, e será incendiado por meu amor, da mesma forma que qualquer coisa seca é facilmente incendiada pelo fogo. Tua alma será tão inflamada e preenchida por mim, e eu estarei em ti, que todas as coisas mundanas se tornarão amargas para ti e todo desejo carnal como veneno. Descansarás nos braços da minha divindade, onde nenhum desejo carnal existe, mas somente deleite espiritual e alegria, que enche a alma deleitada com felicidade - interior e exteriormente – de forma que ela não pensa em nada e nada deseja a não ser ser o gozo que possui. Portanto, somente ama-me, e terás tudo que desejares e terás em abundância. Não está escrito que o óleo da viúva não diminuiu até o dia que a chuva foi enviada à terra, por Deus, de acordo com as palavras do profeta? Eu sou o verdadeiro profeta! Se acreditas em minhas palavras, segue e as cumpre, óleo - gozo e júbilo - não diminuirão para ti, por toda a eternidade.

               Palavras de Jesus Cristo à sua filha - que tomou por sua esposa - sobre os artigos da verdadeira fé, e sobre que tipos de adornos, sinais e desejos a esposa precisa ter para agradar o Esposo.

               Eu sou o Criador dos céus, da terra, do mar e de tudo que está neles. Eu sou um com o Pai e o Espírito Santo, não como os deuses de pedra ou de ouro, como os utilizados pelo povo antigo, e não vários deuses, como o povo pensava, mas um só Deus: Pai, Filho e Espírito Santo, três pessoas, mas um em natureza divina, o Criador de tudo, mas por ninguém criado, imutável, todo-poderoso e eterno - sem princípio ou fim. Eu sou o que nasceu da Virgem, sem perder minha divindade, mas unindo-a à minha humanidade, de forma que, em uma pessoa, possa ser o verdadeiro Filho de Deus e Filho da Virgem. Eu sou o que pregado na cruz, morreu e foi sepultado, mas minha divindade permaneceu intacta. Embora eu tenha morrido na humanidade e na carne, que Eu, o Filho único, assumi, eu ainda continuei a existir na minha natureza divina, sendo um só Deus com o Pai e o Espírito Santo. Eu sou o mesmo que ressuscitou dos mortos e subiu ao Céu, e que agora falo contigo em meu Espírito. Eu te escolhi e tomei por esposa para mostrar-te os caminhos do mundo e meus segredos divinos, porque isso me agrada. Tu és minha por direito, porque quando teu marido morreu, colocaste toda a tua vontade em minhas mãos, e após sua morte, pensaste e rezaste sobre como poderias te tornar pobre e abandonar tudo por mim. Então, és minha por direito, por causa deste teu imenso amor, e por isso cuidarei de ti. Então, Eu te tomo como minha esposa, e para meu próprio prazer, como é próprio Deus ser com uma alma casta. É obrigação da noiva estar preparada quando o noivo quer celebrar o casamento, de forma que ela esteja adequadamente vestida e pura. Tu já estarás limpa se teus pensamentos estiverem sempre atentos a teus pecados, em como no batismo Eu te purifiquei do pecado de Adão, e quantas vezes eu fui paciente e te sustentei quando caíste em pecado. A noiva deve também trazer a insignia de seu noivo em seu peito, que significa que deves observar e reconhecer os favores e benefícios que eu te fiz, assim como quão nobremente eu te criei, dando-te um corpo e alma; quão nobremente eu te enriqueci, dando-te saúde e bens temporais; quão amorosamente e docemente eu te redimi quando morri por ti e restaurei a tua herança celestial - se quiseres tê-la. A esposa deve também fazer a vontade do seu esposo. Mas qual é minha vontade, se não que deves querer me amar acima de todas as coisas e não desejar nada a não ser Eu? Criei todas as coisas pelo bem da humanidade e coloquei todas as coisas sob a autoridade dela, mas ela ama todas as coisas exceto a mim, e não odeia nada mas a mim. Eu recuperei sua herança, que tinham perdido por causa do pecado, mas eles ela é tão tola e sem razão, que prefere a glória passageira - que é como a espuma do mar que se levanta por um momento como uma montanha, e depois rapidamente cai em nada - ao invés da glória eterna na qual há bem que nunca acaba. Mas se não desejas, minha esposa, nada a não ser Eu, se desprezas todas as coisas pelo meu bem – não somente seus filhos e parentes, mas também honras e riquezas - eu te darei a mais preciosa e amorosa recompensa! Eu não te darei nem ouro nem prata, mas a mim mesmo, para ser seu noivo - e em recompensa, Eu, que sou o Rei da Glória. Mas se tu estás com vergonha de ser pobre e desprezada, então considera como Eu, seu Deus, fiquei antes de ti, quando meus servos e amigos me abandonaram no mundo. Eu não estava procurando amigos do mundo, mas amigos do céu. E se agora estiveres preocupada e com medo do peso e dificuldade do trabalho, bem como da doença, considere quão difícil e penoso é queimar no inferno! O que não merecerias se tivesses ofendido um senhor terrestre, como me fizeste? Assim, embora eu te ame com todo o meu coração, não fica sem justiça o menor ponto. Então, como pecaste em todos os teus membros, tens também que prestar satisfação e penitência em cada membro. Mas, por causa de tua boa vontade e tua propósito de reparar seus pecados, vou mudar tua sentença com misericórdia, trocando a dolorosa punição por uma pequena penitência. Então, abrace e tome sobre ti um pequeno sofrimento, para que possas ser limpa do pecado e alcances o grande premio em pouco tempo! A esposa deve ficar cansada trabalhando ao lado do seu esposo de modo que possa ainda mais confiantemente ter seu descanso com ele.

               Palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo à sua esposa sobre como ela deve amar e honrá-Lo, o Esposo; sobre como o mal ama o mundo e odeia a Deus.

            Eu sou teu Deus e Senhor a quem adoras e honras. Sou o que sustenta o céu e a terra com meu poder. Eles não são sustentados por nenhum pilar ou qualquer outra coisa. Eu sou o que, a cada dia, é tomado e oferecido no altar, sob a aparência de pão; verdadeiro Deus e homem. Sou o mesmo que te escolheu. Honra o meu Pai! Ama-me! Obedece ao meu Espírito! Honre minha Mãe como tua Senhora! Honre todos os meus santos! Mantém a verdadeira fé que deves aprender por ele que experimentou dentro de si a batalha dos dois espíritos - o espirito da falsidade e o espirito da verdade - e com minha ajuda venceu. Mantenha a verdadeira humildade. O que é a verdadeira humildade senão comportar-se como é realmente, e louvar a Deus pelas boas coisas que ele nos tem dado? Mas agora, há muitos que me odeiam e a meus feitos, e que consideram minhas palavras como desgraça e vaidade, e ao contrário, com afeição e amor, abraçam o adulterador: o demônio. Tudo o que eles fazem para mim é feito com reclamação e amargor. Eles nem mesmo confessam meu nome ou me servem, se não tem medo da opinião de outros homens. Eles amam o mundo com tal fervor que nunca se cansam de trabalhar por ele, noite e dia, sempre queimando de amor por ele. Seu serviço é tão agradável para mim como o de alguem que dá dinheiro a seus inimigos para matar seu próprio filho! Isto é o que eles fazem para mim. Dão-me algumas esmolas e me honram com seus lábios para conseguir sucesso no mundo e permanecer em seu privilégio e em seus pecados. O bom espírito está, portanto, bloqueado neles e eles estão impedidos ter qualquer progresso em fazer o bem. O entanto, se quiseres amar-me de todo seu coração e não desejar nada a não ser a mim, Eu te atrairei a mim através do amor, como um imã atrai o ferro a si. Tomar-te-ei em meu braço, que é tão forte que ninguém o pode estender, e tão firme que ninguém, uma vez estendido, pode dobrar, e é tão doce que ultrapassa todos os aromas e está além da comparação com qualquer coisa doce ou prazer do mundo.

               Palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo à sua esposa nas quais lhe diz que não se preocupe nem pense que o que se revela a ela proceda de um espírito maligno, e sobre como distinguir um Espírito bom de um mau.

            Eu sou teu Criador e Redentor. Porque tens temido minhas palavras? Porque te tens perguntado se procedem de um espírito bom ou de um mau? Diga-me, tens encontrado algo em minhas palavras que não te tenha ditado tua própria consciência? Ordenei-te algo contrario a razão?

               A isto a esposa respondeu: Não, ao contrario, tuas palavras são verdadeiras e eu estava errada.

               O Espírito, seu Esposo, acrescentou: Eu te ordenei três coisas. Nelas poderias reconhecer o bom espírito. Ordenei-te que honrasses o teu Deus que te criou e te tem dado tudo o que tens. Ordenei-te que te mantivesses na verdadeira fé, ou seja, que cresses que nada se criou nem se pode criar sem Deus. Também te ordenei que mantivesses uma razoável temperança em todas as coisas, pois o mundo foi feito para uso do homem, afim de que as pessoas o aproveitem para suas necessidades. Da mesma forma, também podes reconhecer o espírito imundo por três coisas contrarias a estas: Ele tenta para que te elogies a ti mesma e te orgulhes do que te foi dado; Ele tenta para que atraiçoes tua própria fé; também te tenta a impureza em todo o corpo e em todas as coisas, e faz com que teu coração arda por isso. Às vezes também engana as pessoas sob a forma de bem. Por isso te tenho ordenado que sempre examines tua consciência e que a exponhas a prudentes diretores espirituais. Por isso não duvides de que o bom espírito de Deus esteja contigo quando não desejas outra coisa a não ser a Deus e Dele te inflames toda. Só Eu posso criar esse fervor e assim, é impossível ao demônio aproximar-se de ti. Também não é possível para ele aproximar-se das pessoas, a menos que Eu o permita, seja pelos pecados humanos ou por algum de meus desígnios ocultos, porque ele é minha criatura como todas as demais, e foi criado bom por mim, embora tenha se pervertido por sua própria maldade. Portanto, Eu sou Senhor sobre ele. Por esta razão me acusam falsamente aqueles que dizem que as pessoas que me rendem grande devoção estão loucas ou possuídas. Fazem-me parecer como um homem que exponha a sua casta e fiel mulher a um adúltero. Isso é o que Eu seria se deixasse que alguém que me amasse plena e retamente fosse possuído por um demônio. Mas como Eu sou fiel, nenhum demônio poderá nunca controlar a alma de nenhum dos meus devotos servidores. Embora meus amigos, às vezes pareçam estar quase fora de sua razão, não é porque sofram devido ao demônio, nem porque me sirvam com fervorosa devoção. Mas se deve a algum defeito do cérebro ou a alguma outra causa oculta que serve para humilhá-los. Às vezes, também pode ocorrer que o demônio receba de mim um poder sobre os corpos das pessoas boas, para um maior beneficio delas, ou que obscureça suas consciências. Entretanto, nunca poderá conseguir o controle das almas que têm fé e se deleitam em mim.

               Amorosas palavras de Cristo à sua esposa com a preciosa imagem de uma nobre fortaleza que simboliza a Igreja Militante, e sobre como a Igreja de Deus será agora reconstruída pelas orações da gloriosa Virgem e dos Santos.

           Eu sou o Criador de todas as coisas. Sou o Rei da gloria e o Senhor dos anjos. Construí para mim uma nobre fortaleza e tenho colocado nela os meus eleitos. Meus inimigos têm corrompido seus fundamentos e tem dominado meus amigos - tanto que fazem sair a medula dos ossos de seus pés amarrados a colunas. Suas bocas são apedrejadas e são torturados pela fome e a sede. Assim, os inimigos perseguem o seu Senhor. Meus amigos estão agora gemendo e suplicando ajuda; a justiça pede vingança, mas a misericórdia invoca o perdão.

               Então, Deus disse à Corte Celestial ali presente: O que pensais dessas pessoas que têm assaltado minha fortaleza?”. Eles, a uma voz responderam: “Senhor, toda a justiça está em Ti e em Ti vemos todas as coisas. A Ti foi dado todo juízo, Filho de Deus, que existes sem princípio nem fim, Tu és seu Juiz.

               E Ele disse: Como todos sabeis e vedes em Mim, pelo bem da Minha Esposa, decidam qual é a sentença justa.

               Eles disseram: Isto é justiça: Que aqueles que derrubaram os muros sejam castigados como ladrões; que aqueles que persistem no mal, sejam castigados como invasores, que os cativos sejam libertados e os famintos saciados.

               Então Maria, a Mãe de Deus que a princípio havia permanecido em silencio, disse: Meu Senhor e Filho querido, tu estiveste em meu ventre como verdadeiro Deus e homem. Tu te dignaste a santificar-me a mim que era um vaso de argila. Eu te suplico, tem misericórdia deles uma vez mais!

               O Senhor respondeu a sua Mãe: Bendita seja a palavra de tua boca! Como um suave perfume sobe até Deus. Tu és a glória e a Rainha dos anjos e de todos os santos, porque Deus foi consolado por ti e a todos os santos deleitas. E porque tua vontade tem sido a minha desde o começo de tua juventude, uma vez mais cumprirei o teu desejo.

               Então Ele disse à Corte Celestial: Porque haveis lutado valentemente, pelo bem da vossa caridade, terei piedade por ora". Vede, re-edificarei meu muro pelos vossos rogos. Salvarei e curarei os oprimidos pela força e os honrarei cem vezes pelo abuso que sofreram. Se os que fazem violência pedem misericórdia, terão paz e misericórdia. Aqueles que a desprezam, sentirão minha justiça.

               Então Ele disse à sua esposa: Esposa minha, te escolhi e te revesti com meu Espírito. Tu escutas minhas palavras e as dos meus santos. Embora os santos vejam da mesma forma todas as coisas em mim, já que são espíritos, Eu agora vou também mostrar-te o que todas essas coisas significam. Afinal, tu que ainda estás no corpo, não me podes ver da mesma forma que eles, que são meus espíritos. Agora te mostrarei o que significam estas coisas.

            A fortaleza da qual tenho te falado é a Santa Igreja, que construí com meu próprio sangue e o dos santos. Eu mesmo a cimentei com minha caridade e depois coloquei nela meus eleitos e amigos. Seu fundamento é a fé, ou seja, a crença em que Sou um Juiz justo e misericordioso. Este fundamento tem sido agora deturpado porque todos creem e pregam que sou misericordioso, mas quase ninguém crê que Eu seja um Juiz justo. Consideram-me um juiz iníquo. De fato, um juiz seria iníquo, se, à margem da misericórdia, deixasse os maus sem castigo de forma que pudessem continuar oprimindo os justos. Eu, porém sou um Juiz justo e misericordioso e não deixarei que o mínimo pecado fique sem castigo nem que o menor bem fique sem recompensa. Pelos buracos perfurados no muro, entram na Santa Igreja pessoas que pecam sem medo, que negam que Eu seja justo e atormentam meus amigos como se os cravassem em estacas. A estes meus amigos não se dá alegria nem consolo. Pelo contrário, são castigados e injuriados como se fossem demônios. Quando dizem a verdade sobre mim, são silenciados e acusados de mentir. Eles anseiam com paixão ouvir ou falar a verdade, mas não há ninguém que os escute nem quem lhes diga a verdade. Além disso, Eu, Deus Criador, estou sendo blasfemado. As pessoas dizem: Não sabemos se Deus existe. E, se existe, não nos importa. Jogam no chão minha bandeira e a pisoteiam dizendo: “Porque sofreu? Em que nos beneficia? Se cumpre nossos desejos estaremos satisfeitos, que mantenha Ele seu reino em seu Céu! “Quando quero entrar neles, dizem: Antes morrermos que submeter nossa vontade! Dá-te conta, esposa minha, que tipo de gente é! Eu os criei e posso destruí-los com uma palavra! Que soberbos são para comigo! Graças aos rogos de minha Mãe e de todos os santos, permaneço misericordioso e tão paciente que estou desejando enviar-lhes palavras da minha boca e oferecer-lhes misericórdia. Se a quiserem aceitar, terei compaixão. Do contrário, conhecerão minha justiça e, como ladrões, serão publicamente envergonhados diante dos anjos e dos homens e condenados por cada um deles. Como os criminosos são colocados nas forcas e devorados pelos corvos, assim eles serão devorados pelos demônios, mas não serão consumidos. Como as pessoas amarradas em cepos não podem descansar, eles padecerão dor e amargura em todas as partes. Um rio de fogo entrará por suas bocas, mas seus estômagos não serão saciados e sua sede e suplício se reavivarão a cada dia. Porém, meus amigos estarão a salvo, e serão consolados pelas palavras que saem de minha boca. Eles verão minha justiça junto de minha misericórdia. Revesti-los-ei com as armas do meu amor, que os tornarão tão fortes que os adversários da fé escorrerão diante deles como o barro; quando virem minha justiça, cairão em vergonha perpétua por haverem abusado de minha paciência.

               Palavras de Cristo à sua esposa sobre como seu Espírito não pode morar nos malvados; sobre a separação dos bons e perversos e o envio dos bons, armados com armas espirituais, à guerra contra o mundo.

            Meus inimigos são como os mais selvagens animais, que nunca podem estar satisfeitos nem permanecer em calma. Seu coração está tão vazio de meu amor que o pensamento da minha paixão nunca os penetra. Nem sequer uma vez, desde o mais íntimo de seu coração, tem saído uma palavra como esta: Senhor, tu nos redimistes, louvado sejas por tua amarga paixão!” Como pode viver o meu Espírito em pessoas que não sentem o divino amor por mim, pessoas que estão desejando trair a outros para conseguir seu próprio benefício? Seu coração está cheio de vermes vis, ou seja, cheio de paixões mundanas. O demônio deixou seus excrementos em suas bocas e por isso não têm gosto pelas minhas palavras. Por isso, com meu serrote os cortarei para apartá-los de meus amigos. Não há forma pior de morrer do que sob a serra. Igualmente não haverá castigo que eles não compartilhem: serão serrados em dois pelo demônio e separados de mim. Vejo-os tão odiosos que todos os que aderirem a eles, se separarão de mim. Por esta razão, estou enviando meus amigos para que eles separem os demônios de meus membros, já que os demônios são meus verdadeiros inimigos. Eu os envio como nobres soldados à batalha. Todo aquele que mortifique sua carne e se abstenha do ilícito é meu verdadeiro soldado. Como lança levarão as palavras de minha boca e em suas mãos brandirão a espada da fé; em seu peito estará a couraça do amor para que, aconteça o que acontecer não deixem de me amar. Devem ter o escudo da paciência em suas costas, de forma que suportem tudo com paciência. Tenho-os entesourados como ouro num estojo: agora devem sair e andar em meus caminhos. Segundo os desígnios da justiça, Eu não poderia entrar na glória de minha majestade sem suportar tribulação na minha natureza humana. Portanto, como entrarão eles? Se seu Senhor sofreu, não é de estranhar que eles também tenham de sofrer. Se seu Senhor suportou chicotadas, não será para eles grande coisa o suportar palavras. Não hão de temer porque nunca os abandonarei. Da mesma forma que é impossível para o demônio entrar no coração de Deus e dividi-lo, igualmente será impossível separá-los de mim. E como, diante de meus olhos são ouro puríssimo, pois foram testados com um pouco de fogo, não os abandonarei: é para sua maior recompensa.

               Palavras da gloriosa Virgem à sua filha, sobre a forma de vestir e o tipo de roupas e enfeites com os quais a filha deve adornar-se e vesti-se.

            Eu sou Maria, que deu à luz o Filho de Deus, verdadeiro Deus e verdadeiro homem. Sou a Rainha dos anjos. Meu Filho te ama com todo o coração. Ama-O! Deves adornar-te com roupas muito honestas e eu te mostrarei como e que tipo de roupas devem ser. Como antes, tinhas uma anágua, uma túnica, sapatos, uma capa e um broche sobre seu peito, agora hás de cobrir-te com roupas espirituais. A anágua é a contrição. Como a anágua se veste junto ao corpo, assim a contrição e a conversão são o primeiro passo de volta a Deus. Através delas, a mente, que em um momento encontrou gozo no pecado, se purifica e a carne impura se mantém sob controle. Os dois sapatos são duas disposições, na verdade a intenção de retificar as transgressões passadas e a intenção de fazer o bem e manter-se longe do mal. Tua túnica é a esperança em Deus. Como a túnica tem duas mangas, há de haver justiça e misericórdia em tua esperança. Desta forma esperarás na misericórdia de Deus porque não esquecerás sua justiça. Pensa em sua justiça e em seu juízo, de forma que não esqueças sua misericórdia, porque Ele não usa a justiça sem misericórdia nem a misericórdia sem justiça. A capa é a fé. Do mesmo modo que a capa cobre tudo e tudo está contido nela, a natureza humana pode igualmente abarcar tudo e conseguir tudo mediante a fé. Esta capa deve ser enfeitada com as insígnias do amor de teu Esposo, ou seja, da forma como te criou, da forma que te alimentou, te atraiu para seu Espírito e abriu teus olhos espirituais. O broche é a consideração de sua paixão. Fixa firmemente em teu peito o pensamento de como Ele foi fraudado e mortificado, como se manteve vivo na cruz, ensanguentado e perfurado em todas as suas fibras, como em sua morte seu corpo inteiro se convulsionou pela dor aguda da paixão, como entregou seu Espírito nas mãos do Pai. Que este broche permaneça sempre em teu peito! Sobre tua cabeça, coloque-se uma coroa, ou seja, a castidade em teus afetos, que prefiras resistir aos açoites antes de tornar a manchar-te. Sê modesta e digna. Não penses nem desejes nada mais que o teu Criador. Quando tens a Ele, tens tudo. Adornada desta forma, deves esperar o teu Esposo.

               Palavras da Rainha do Céu à sua querida filha, ensinando-lhe que deve amar e louvar seu Filho junto de sua Mãe.

            Eu sou a Rainha dos Céus. Estás preocupada sobre como tens que louvar-me. Tenha a certeza de que todo o louvor a meu Filho é louvor a mim. E aqueles que o desonram, desonram a mim, pois meu amor para com Ele e o dele para comigo é tão ardente como se nós dois fossemos um só coração. Tanto me honrou a mim, que era um vaso de argila, que me elevou acima de todos os anjos. Por isso tu me hás de louvar assim: Bendito sejas, Senhor Deus, Criador de todas as coisas, que te dignaste descer ao ventre da Virgem Maria. Bendito sejas Senhor Deus que quiseste habitar nas entranhas da Virgem Maria, sem ser um fardo para Ela e te dignaste receber sua carne imaculada sem pecado. Bendito sejas, Senhor Deus, que vieste à Virgem, dando-lhe gozo a sua alma e a todos os seus membros e que, com o gozo de todos os membros de seu corpo sem pecado, Dela nasceste. Bendito sejas, Senhor Deus, que depois de tua ascensão alegraste a Virgem Maria com frequentes consolações e com tua consolação a visitaste. Bendito sejas, Senhor Deus, que elevaste o corpo e a alma da Virgem Maria, tua Mãe, aos Céus e a honraste situando-a junto de tua divindade, sobre todos os anjos. Tem misericórdia de mim, Senhor, por seus rogos e intercessão.

               Palavras da Rainha dos Céus à sua querida filha sobre o formoso amor que o Filho professava à sua Mãe Virgem; sobre como a Mãe de Cristo foi concebida em um matrimonio casto e santificada no ventre de sua mãe; sobre como subiu ao Céu em corpo e alma; sobre o poder de seu nome e sobre os anjos designados aos homens para o bem e para o mal.

            Sou a Rainha do Céu. Ama meu Filho, porque ele é o honestíssimo e quando tens a Ele, tens tudo o que é honesto. Ele é o mais desejável e quando tens a Ele tens tudo o que é desejável. Ama-o também porque Ele é virtuosíssimo e quando o tens, tens todas as virtudes. Vou te contar como foi maravilhoso seu amor pelo meu corpo e minha alma e quanta honra deu ao meu nome. Ele, meu filho, me amou antes que eu o amasse, pois é meu Criador. Ele uniu meu pai e a minha mãe em um matrimonio tão casto que não se pode encontrar nenhum casal mais casto. Nunca desejaram unir-se exceto de acordo com a Lei, só para terem descendência. Quando o anjo lhes anunciou que teriam uma Virgem pela qual chegaria a salvação do mundo, antes desejariam morrer do que unir-se em um amor carnal, pois a luxuria estava extinta neles. Asseguro-te que, pela caridade divina e devido à mensagem do anjo, eles se uniram na carne, não por concupiscência, mas contra sua vontade e por amor a Deus. Dessa forma, minha carne foi gerada de suas sementes e através do amor divino. Quando meu corpo se formou, Deus enviou nele a alma criada a partir da sua divindade. A alma foi imediatamente santificada junto com o corpo e os anjos a vigiavam e custodiavam dia e noite. É impossível expressar-te que grandíssimo gozo sentiu minha mãe quando minha alma santificada se uniu ao meu corpo. Depois, quando o curso da minha vida se cumpriu, meu Filho primeiro elevou minha alma, por ter sido a dona do corpo, a um lugar mais eminente que os demais, perto da glória de sua divindade, e depois meu corpo, da forma que nenhum outro corpo de criatura esteja tão perto de Deus como o meu. Veja quanto meu Filho amou a minha alma e meu corpo! Existem pessoas, entretanto, que maliciosamente negam que eu tenha sido assunta em corpo e alma, e existem outras que simplesmente não tem maior conhecimento. Mas a verdade disso é certa: Fui elevada até a Gloria de Deus em corpo e alma! Escuta agora o muito que meu Filho honrou meu nome! Meu nome é Maria, como diz o evangelho. Quando os anjos olham esse nome, se regozijam em sua consciência e dão graças a Deus pela grandíssima graça que operou em mim e comigo, porque eles veem a humanidade de meu Filho glorificada em sua divindade. As almas do purgatório se regozijam de maneira especial, como quando um homem enfermo que está na cama escuta alentadoras palavras de outros e isto agrada seu coração fazendo-o sentir-se contente. Ao ouvir meu nome, os anjos se aproximam imediatamente das almas dos justos, a quem foram dados como guardiões, e se regozijam em seus progressos. Os anjos bons foram designados a todos como proteção e os anjos maus como provação. Não é que os anjos estejam separados de Deus, mas assistem a alma sem deixar Deus, e permanecem constantemente em sua presença, enquanto seguem inflamando e incitando a alma a fazer o bem. Os demônios todos se espantam e temem meu nome. Ao som do nome de Maria, soltam imediatamente a presa que tenham em suas garras. Da mesma forma que uma ave de rapina com a presa em suas garras, a deixa quando escuta um ruído e volta depois quando vê que não era nada, igualmente os demônios deixam a alma, assustados, ao ouvir meu nome, mas voltam de novo rápidos como uma flecha a menos que vejam que depois se produziu uma emenda. Ninguém está tão frio no amor de Deus – a menos que esteja condenado- que o demônio não se distancie dele se invoca meu nome com a intenção de não retornar mais aos seus maus hábitos, e o demônio se mantém longe dele a menos que volte a consentir em pecar mortalmente.

               Palavras da Virgem Maria à sua filha, oferecendo-lhe um proveitoso ensino sobre como deve viver, e descrevendo maravilhosos detalhes da paixão de Cristo.

            Sou a Rainha do Céu, a Mãe de Deus. Eu te disse que devias levar um broche sobre teu peito. Agora te mostrarei com mais detalhes como, desde o principio, quando eu primeiro ouvi e entendi que Deus existia, sempre e com temor estive zelosa sobre minha salvação na observância de seus mandamentos. Quando aprendi mais plenamente que o mesmo Deus era meu Criador e o Juiz de todas minhas ações, cheguei a amá-Lo profundamente e estive constantemente alerta e atenta para não ofendê-Lo por palavra ou por obra. Quando soube que Ele havia dado sua Lei e mandamentos a seu povo e fez milagres através deles, fiz a firme resolução em minha alma de não amar nada mais a não ser Ele, e as coisas mundanas se tornaram muito amargas para mim. Então, sabendo que o mesmo Deus redimiria o mundo e nasceria de uma Virgem, eu estava tão movida de amor por Ele que não pensava em nada mais a não ser em Deus, nem queria nada fora Dele. Separei-me, no possível, da conversação e presença de parentes e amigos, e dei aos necessitados tudo o que havia chegado a ter, ficando somente com um moderado vestuário e alimentação. Nada me agradava a não ser Deus. Sempre esperei em meu coração viver até o momento de seu nascimento, e talvez, aspirar a ser uma indigna servidora da Mãe de Deus. Também fiz em meu coração o voto de preservar minha virgindade, se isso fosse aceitável a Ele, e de não possuir nada no mundo. Mas se Deus quisesse outra coisa, meu desejo era que se cumprisse em mim seu desejo e não o meu, porque acreditei que Ele era capaz de tudo e que Ele só queria o melhor para mim. Por Ele, submeti-lhe toda a minha vontade. Quando chegou o tempo estabelecido para a apresentação das virgens no templo do Senhor, estive presente com elas graças à religiosa obediência de meus pais. Pensei comigo, que nada era impossível para Deus e que, como Ele sabia que eu não desejava nem queria mais que a Ele, Ele poderia preservar minha virgindade, se isto lhe agradasse, e se não, que se fizesse sua vontade. Depois de ter escutado todos os mandamentos no templo, voltei a casa ainda ardendo mais que nunca por Deus, sendo inflamada com novos fogos e desejos de amor a cada dia. Por isso, me separei ainda mais de tudo e estive só noite e dia, com grande temor de que minha boca falasse e meus ouvidos ouvissem algo contra Deus, ou de que meus olhos olhassem algo em que me deleitasse; em meu silencio senti também temor e ansiedade por estar calando sobre algo que deveria falar. Com essas perturbações em meu coração, e a sós comigo mesma, encomendei todas as minhas esperanças a Deus. Naquele momento veio ao meu pensamento considerar o grande poder de Deus; como os anjos e todas as criaturas o servem; e como sua glória é indescritível e eterna. Enquanto me perguntava tudo isso, tive três visões maravilhosas: Vi uma estrela, mas não como as que brilham no Céu. Vi uma luz, mas não como a que ilumina o mundo. Percebi um aroma, mas não de ervas nem de nada disso, mas indescritivelmente suave, que me plenificou tanto que senti como se saltasse de gozo. Nesse momento, ouvi uma voz, mas não de fala humana. Tive muito medo quando a ouvi e me perguntei se seria uma ilusão. Então, apareceu diante de mim um anjo de Deus de uma belíssima forma humana, mas não revestida de carne, e me disse: Ave, cheia de graça... Ao ouvi-lo perguntei-me o que significava aquilo ou porque me tinha saudado dessa forma, pois sabia e cria que eu era indigna de algo semelhante, ou de algo tão bom, mas também sabia que para Deus não era impossível fazer tudo o que quisesse. Então, o anjo acrescentou: O filho que nascerá de ti é santo e se chamará Filho de Deus. Se fará como a Deus apraz. Ainda não me acreditei digna nem lhe perguntei: Por quê? ou Quando se fará? Mas lhe perguntei: Como é que eu, tão indigna, hei de ser mãe de Deus, se nem sequer conheço varão? O anjo me respondeu, como disse, que nada é impossível para Deus, mas “Tudo o que ele queira se fará”. Quando ouvi as palavras do anjo, senti o mais fervente desejo de converter-me na mãe de Deus, e minha alma disse com amor: Aqui estou, faça-se em mim tua vontade! Ao dizer aquilo, nesse momento e lugar, foi concebido meu Filho em meu ventre com uma inefável exultação da minha alma e dos membros do meu corpo. Quando Ele estava em meu ventre, o gerei sem dor alguma, sem torpor nem cansaço em meu corpo. Humilhei-me em tudo, sabendo que levava em mim o Todo-poderoso. Quando o dei à luz, o fiz sem dor nem pecado, igual a quando o concebi, com tal exultação de alma e corpo que senti como se caminhasse sobre o ar, gozando de tudo. Ele entrou em meus membros, com gozo de toda minha alma, e dessa forma, com gozo de todos meus membros, saiu de mim, deixando minha alma exultante e minha virgindade intacta. Quando olhei e contemplei sua beleza, a alegria transbordou de minha alma, sabendo-me indigna de um Filho assim. Quando observei os lugares nos quais, como sabia através dos profetas, suas mãos e pés seriam perfurados na crucifixão, meus olhos se encheram de lagrimas e meu coração se partiu de tristeza. Meu Filho olhou meus olhos lacrimosos e se entristeceu quase até morrer. Mas ao contemplar seu divino poder, me consolei de novo, dando-me conta de que isto era o que ele queria, e por ele, como era o correto, conformei toda a minha vontade à sua. Assim, minha alegria sempre se misturava com a dor. Quando chegou o momento da paixão de meu Filho, seus inimigos o arrastaram. Golpearam-no na face e no pescoço e lhe cuspiram zombando dele. Quando foi levado à coluna, ele mesmo se desnudou e colocou suas mãos sobre o pilar, e seus inimigos as ataram sem misericórdia. Atado à coluna, sem nenhum tipo de roupa, como quando veio ao mundo, se manteve ali sofrendo a vergonha de sua nudez. Seus inimigos o cercaram e, tendo fugido todos os seus amigos, flagelaram seu puríssimo corpo, limpo de toda mancha e pecado. Na primeira chicotada eu, que estava por perto, caí quase morta, e ao voltar a mim, vi em meu espírito seu corpo chicoteado e chagado até as costelas. O mais horrível foi que quando lhe retiraram as amarras, as correias grossas haviam sulcado sua carne. Estando aí meu Filho, tão ensanguentado e lacerado que não lhe restou nenhuma área sã sem ser chicoteada, alguém ali presente perguntou: “Vão matá-lo sem estar sentenciado?” e imediatamente lhe cortou as amarras. Então, meu Filho vestiu suas roupas e vi como ficou cheio de sangue o lugar onde havia estado. E, por suas pegadas, pude ver por onde andava, pois o solo ficava empapado de sangue por onde Ele ia. Não tiveram paciência quando se vestia, empurram-no e o arrastaram com pressa. Sendo tratado como um ladrão, meu Filho secou o sangue de seus olhos. Quando ele foi sentenciado à morte, lhe impuseram a cruz para que a carregasse. Levou-a um pouco, mas depois veio um que a pegou e o ajudou a carregá-la. Enquanto meu Filho ia até o lugar de sua paixão, alguns o golpearam no pescoço e outros lhe esbofetearam a face. Batiam com tanta força que embora não visse quem lhe batia, ouvia claramente o som da bofetada. Quando cheguei com Ele ao lugar da paixão, vi todos os instrumentos de sua morte ali preparados. Ao chegar ali Ele só se desnudou enquanto os carrascos diziam entre si: Estas roupas são nossas e ele não as recuperará porque está condenado à morte. Meu Filho estava ali, nu como quando nasceu e nisto alguém veio correndo e lhe ofereceu um pano com o qual Ele contente pode cobrir sua intimidade. Depois seus cruéis executores o agarraram e o estenderam na cruz, pregando primeiro sua mão direita na ponta da cruz onde tinha feito o buraco para o cravo. Perfuraram sua mão no ponto em que o osso era mais sólido. Com uma corda lhe estenderam a outra mão e a pregaram no outro extremo da cruz, do mesmo modo. Continuando, cruzaram seu pé direito com o esquerdo por cima usando dois cravos de forma que seus nervos e veias se estenderam e se romperam. Depois lhe puseram a coroa de espinhos e a apertaram tanto que o sangue que saia de sua venerável cabeça lhe tapava os olhos, lhe obstruía os ouvidos e lhe empapava a barba ao cair. Estando assim na cruz, ferido e sangrando, sentiu compaixão de mim, que estava ali soluçando e, olhando com seus olhos ensanguentados em direção a João, meu sobrinho, me encomendou a ele. Nesse momento pude ouvir alguns dizendo que meu Filho era um ladrão, outros que era um mentiroso, e ainda outros dizendo que ninguém merecia a morte mais do que Ele. Ao ouvir tudo isto se renovava minha dor. Como disse antes, quando lhe fincaram o primeiro cravo, esse primeiro sangue me impressionou tanto que cai como morta, meus olhos cegos na escuridão, minhas mãos tremendo, meus pés instáveis. No impacto de tanta dor não pude olhá-Lo até que terminaram de crucificá-Lo. Quando pude levantar-me, vi meu Filho arfando ali miseravelmente e, consternada de dor, eu sua Mãe tão triste, apenas podia manter-me em pé. Vendo-me a mim e seus amigos chorando desconsoladamente, meu Filho gritou em voz alta e pesarosa dizendo: Pai porque me abandonaste? Era como dizer: Ninguém se compadece de mim senão tu, Pai. Então seus olhos pareciam meio mortos suas faces estavam afundadas, seu rosto lúgubre, sua boca aberta, e sua língua ensanguentada. Seu ventre estava pressionado na direção das costas, porque todos os líquidos tinham sido perdidos. Era como se não tivesse órgãos. Todo o seu corpo estava pálido e lânguido devido à perda de sangue. Suas mãos e pés estavam muito rígidos e estirados ao terem sido forçados para adaptá-los a cruz. Sua barba e seu cabelo estavam completamente empapados de sangue. Estando assim, lacerado e lívido, sua mente e seu coração se mantinham vigorosos, pois tinha uma boa e forte constituição. De minha carne, Ele recebeu um corpo puríssimo e bem proporcionado. Sua pele era tão fina e macia que ao menor arranhão imediatamente lhe saia sangue, que sobressaia sobre sua pele tão pura. Precisamente por sua boa constituição, a vida lutou contra a morte em seu corpo chagado. Em certos momentos, a dor nas extremidades e fibras de seu corpo lacerado lhe subia até o coração, ainda vigoroso e integro e isto trazia um incrível sofrimento. Em outros momentos, a dor baixava de seu coração para seus membros feridos e, ao suceder isto, se prolongava a amargura de sua morte. Submerso na agonia, meu Filho olhou ao redor e viu seus amigos que choravam e que teriam preferido suportar eles mesmos a dor com seu auxilio e ter ardido para sempre no inferno em lugar de vê-Lo tão torturado. Sua dor pela dor dos seus amigos excedia toda a amargura e tribulações que havia suportado em seu corpo e em seu coração pelo amor que lhes tinha. Então, na excessiva angustia corporal de sua natureza humana, clamou a seu Pai: Pai, em tuas mãos entrego meu espírito. Quando eu, sua triste Mãe, ouvi essas palavras, todo o meu corpo se comoveu com a dor amarga de meu coração, e todas as vezes que as recordo choro desde então, pois elas permaneceram presentes e recentes em meus ouvidos. Quando se lhe aproximava a morte e seu coração se rompeu com a violência das dores, todo seu corpo se convulsionou e sua cabeça se levantou um pouco para depois cair outra vez. Sua boca ficou aberta e sua língua podia ser vista sangrando. Suas mãos se retraíram um pouco do lugar da perfuração e seus pés suportaram mais com o peso de seu corpo. Seus dedos e braços pareceram estender-se e seus ombros ficaram rígidos contra a cruz. Então, alguns me diziam: Maria, teu Filho está morto. Outros diziam: Está morto, mas ressuscitará. À medida que tudo seguia veio um homem e lhe cravou uma lança no lado com tanta força que quase saiu pelo outro lado. Quando tiraram a lança, sua ponta estava tingida de sangue vermelho e me pareceu como se me tivessem perfurado o meu próprio coração, quando vi meu querido Filho transpassado. Depois o retiraram da cruz e eu tomei seu corpo sobre meu regaço. Parecia um leproso, completamente lívido. Seus olhos estavam mortos e cheios de sangue, sua boca tão fria como gelo, sua barba eriçada e sua face contraída. Suas mãos estavam tão desconjuntadas que não se sustentavam sequer sobre seu ventre. Recebi-o sobre meus joelhos como havia estado na cruz, como um homem contraído em todos os seus membros. Depois disso, o estenderam sobre um tecido limpo de linho e com meu próprio lenço lhe sequei as feridas e seus membros e fechei seus olhos e sua boca que havia ficado aberta quando morreu. Assim o colocaram no sepulcro. De boa vontade me teria colocado ali viva com meu Filho se essa tivesse sido sua vontade! Terminado tudo isto veio o bondoso João e me levou à sua casa. Vê, Filha minha, quanto suportou meu Filho por ti!

               Palavras de Cristo à sua esposa sobre como Ele mesmo se entregou, por sua própria e livre vontade, para ser crucificado por seus inimigos, e sobre como controlar o corpo de atos ilícitos frente à consideração de sua paixão.

               O Filho de Deus se dirigiu a sua esposa, dizendo: Sou o Criador do Céu e da terra, e o que se consagra no altar é meu verdadeiro corpo". Ama-me com todo teu coração, porque eu te amei e me entreguei a meus amigos por minha própria e livre vontade, enquanto meus amigos e minha Mãe caiam em amarga dor e pranto. Quando vi a lança, os cravos, as correias e todos os demais instrumentos de minha paixão ali preparados, ainda assim fiquei a sofrer com alegria. Quando minha cabeça sangrava por todas as partes a partir da coroa de espinhos, mesmo que meus inimigos se apoderassem de meu coração, desejaria que o ferissem e o desprezassem, ao invés de perder-te. Portanto serias muito ingrata se, em correspondência a tanta caridade, não me amasses. Se minha cabeça foi perfurada e se inclinou na cruz por ti, também tua cabeça deveria inclinar-se até a humildade. Já que meus olhos estavam ensanguentados e cheios de lagrimas, teus olhos deveriam abster-se de visões agradáveis a teus olhos. Se meus ouvidos se cobriram de sangue e ouvi palavras de zombaria contra mim, teus ouvidos teriam que abster-se das conversas frívolas e inoportunas. Ao se ter dado bebida amarga à minha boca e negado uma doce, preserve a tua boca do mal e deixa que se abra para o bem. Posto que minhas mãos foram estendidas e cravadas, que as obras simbolizadas por tuas mãos se estendam aos pobres e aos meus mandamentos. Que teus pés, ou sejam, teus atos, com os quais deves caminhar até mim, sejam crucificados aos deleites de maneira que, da mesma forma que sofri em todos meus membros, também todos os teus membros estejam dispostos a obedecer-me. Peço mais serviços para ti do que para outros porque te dei uma maior graça.

               Sobre como um anjo reza por sua esposa e como Cristo pergunta ao anjo o que é que pede para sua esposa e o que é bom para ela.

               Um anjo bom, o guardião da esposa, apareceu rogando a Cristo por ela. O Senhor lhe respondeu e disse: Uma pessoa que reza por outra deve rogar pela salvação dela. Tu és como um fogo que nunca se extingue, incessantemente ardendo com meu amor. Tu vês e conheces tudo quando me vês e não queres nada mais do que o que eu quero. Portanto, diz-me o que é que convém a esta minha esposa?

            Ele respondeu: Senhor, tu sabes tudo.

               O Senhor lhe disse: Tudo o que se criou ou se criará existe eternamente em mim. Mas, para que minha esposa possa reconhecer minha vontade, diz-me o que é bom para ela, agora que está escutando”.

               E o anjo disse: Ela tem um coração orgulhoso e arrogante. Portanto, necessita uma vara com que possa ser domada.

               Então, o Senhor disse: Que pedes para ela meu amigo?

               O anjo disse: Senhor, peço-te que lhe garanta a misericórdia com a vara.

               E o Senhor acrescentou: Pelo seu bem o farei, pois nunca emprego a justiça sem misericórdia. Então, a esposa deve amar-me com todo seu coração e com boa vontade.

               Sobre como um inimigo de Deus tinha três demônios dentro dele e sobre a sentença que Cristo lhe aplicou.

            Meu inimigo tem três demônios em seu interior. O primeiro reside em seus genitais, o segundo em seu coração, o terceiro em sua boca. O primeiro é como um barqueiro que deixa que a água lhe chegue aos joelhos, e a água, ao aumentar gradativamente, termina enchendo o barco. Então se produz uma inundação e o barco se afunda. Esse barco representa seu corpo, que é assaltado pelas tentações de demônios, e por suas próprias concupiscências, como se fossem tempestades. Primeiro, a luxuria entrou em seu corpo até os joelhos, ou seja, através do desejo demoníaco com o qual se deleitou com pensamentos impuros. E como ele não resistiu pelo arrependimento e penitencia, e não reparou o barco do seu corpo, mediante os apertos da abstinência, a água da luxuria cresceu diariamente enquanto ele deu seu consentimento ao mal. Então, o barco repleto, ou seja, cheio pela concupiscência do ventre, se inundou e afundou na luxuria, de forma que não pôde chegar ao porto da salvação. O segundo demônio, que residia em seu coração, é como um verme dentro de uma maçã, que primeiro come o pé da maçã e depois deixa seus excrementos, se espalha pelo interior da maçã até que todo o fruto se decompõe. Isto é o que faz o demônio. Primeiro destrói a vontade da pessoa e seus bons desejos, que são como a polpa, onde se encontra toda a força da alma e reside toda bondade, e quando o coração se esvazia desses bens, põem em seu lugar, dentro do coração, os pensamentos mundanos e os desejos que os dominam mais. Assim, impele o corpo ao seu próprio prazer, e por essa razão, o valor e entendimento do homem diminuem e ele odeia a sua vida. Esse homem é sem duvida uma maçã sem polpa, ou seja, é um homem sem coração, que entra em minha igreja pois já não tem o amor de Deus. O terceiro demônio é como um arqueiro que olha pela janela e dispara nos descuidados. Como não vai estar o demônio dentro de um homem que sempre o inclui em sua conversação? Aquele a quem amamos mais é quem mais mencionamos. As palavras amargas com que ele fere a outros são como flechas disparadas por tantas janelas quantas vezes o demônio é mencionado e pessoas inocentes sejam ofendidas por suas palavras. Eu, que Sou a verdade, juro pela minha verdade que os condenarei como uma prostituta, ao fogo e enxofre; como a um traidor insidioso, à mutilação de seus membros; como a um zombador do Senhor, à vergonha eterna. Entretanto, enquanto sua alma e seu corpo permaneçam unidos, minha misericórdia está ainda aberta para ele. O que exijo dele é que participe com maior frequência dos divinos ofícios e orações, que não tenha medo de nenhuma humilhação nem deseje qualquer honra e que o inferno ou más palavras não sejam mencionados pela sua boca.

               Explicação: Este homem, um abade da ordem cisterciense, enterrou uma pessoa que havia estado excomungada. Quando ele rezou a oração de encomenda de corpo sobre ele, Santa Brígida ouviu em êxtase espiritual as seguintes palavras do Senhor: Ele utilizou seu poder e o enterrou. Podes estar segura de que o próximo enterro depois deste será o seu, pois pecou contra o Pai, que nos disse que não mostremos parcialidade nem honremos injustamente aos ricos. Para benefício próprio, este homem honrou uma pessoa indigna e a colocou entre os dignos, coisa que não devia fazer. Pecou contra mim também, o Filho, porque Eu disse: “Aquele que me rejeita será rejeitado. Este homem honrou e exaltou alguém que minha Igreja e meu vigário haviam rejeitado. O abade se arrependeu quando ouviu essas palavras e morreu ao quarto dia.

               Palavras de Cristo à sua esposa sobre a maneira e respeito com que deve conduzir a oração, e sobre três classes de pessoas que servem a Deus no mundo.

            Sou teu Deus, o que foi pregado na cruz, verdadeiro Deus e homem em uma pessoa, e que está presente todos os dias nas mãos do sacerdote. Quando me ofereces uma oração, termine-a sempre com o desejo de que se faça minha vontade e não a tua. Quando rezas por alguém que já está condenado não te escuto. Algumas vezes não te ouço se desejas algo que possa ir contra tua salvação. É por isso, necessário que submetas tua vontade à minha, porque como Eu sei todas as coisas, não te permito nada mais do que te seja benéfico. Há muitos que não rezam com a intenção correta e é por isso que não merecem ser atendidos. Há três tipos de pessoas que me servem neste mundo. Os primeiros são os que creem que sou Deus e o provedor de todas as coisas, que tem poder sobre tudo. Estes me servem com a intenção de conseguir bens e honras temporais, mas as coisas do Céu não lhes importam e estão até dispostos a perdê-las para obter bens presentes. O êxito mundano se ajusta completamente à sua medida, segundo seus desejos. Já que perderam os bens eternos, Eu lhes compenso com consolos temporais por qualquer bom serviço que me façam, pagando-lhes até o ultimo centavo e até o ultimo ponto. Os segundos são os que creem que sou Deus onipotente e Juiz severo, mas que me servem por medo do castigo e não por amor à gloria celestial. Se não me temessem não me serviriam. Os terceiros são os que creem que sou o Criador de todas as coisas e Deus verdadeiro e que creem que sou justo e misericordioso. Estes não me servem por medo do castigo, mas por amor divino e caridade. Prefeririam suportar qualquer castigo, por duro que fosse, a não me ofender. Estes merecem verdadeiramente ser escutados quando rezam, pois sua vontade coincide com minha vontade. O primeiro tipo de servos nunca sairá do castigo nem chegará a ver meu rosto. O segundo não será tão castigado, mas também não chegará a ver meu rosto, a não ser que corrija seu temor mediante a penitencia.

               Palavras de Cristo à esposa revelando-se como um grande Rei; sobre os tesouros que simbolizam o amor de Deus e o amor do mundo, e uma lição sobre como melhorar nesta vida.

            Sou como um grande Rei majestoso e potente. Quatro coisas correspondem a um rei. Primeiro, tem que ser rico; segundo, generoso; terceiro, sábio; quarto, caritativo. Eu tenho essas quatro qualidades que mencionei. Em primeiro lugar, Sou o mais rico de todos, pois abasteço as necessidades de todos e não tenho menos depois de ter dado. Segundo, sou o mais generoso, pois estou preparado para dar a quem me pede. Terceiro, sou o mais sábio, pois conheço as dividas e necessidades de cada pessoa. Quarto, sou caritativo, pois estou mais disposto a dar do que alguém para pedir. Tenho, digamos, dois tesouros. No primeiro tesouro guardo materiais pesados como o chumbo e os compartimentos onde se encontram estão cobertos por afiadíssimos pregos. Mas estas coisas pesadas chegam a parecer tão leves como plumas para a pessoa que começa a alterá-las e revolvê-las e que, depois, aprende a carregá-las. O que antes parecia tão pesado se converte em luz e as coisas que antes se viam afiadas e cortantes se tornam suaves. No segundo tesouro, se vê ouro resplandecente, pedras preciosas, e aromáticas e deliciosas bebidas. Mas o ouro é realmente barro e as bebidas são veneno. Há dois caminhos até o interior desses tesouros, apesar de que antes só havia um. No cruzamento, ou seja, na entrada dos dois caminhos, há um homem que, gritando a três homens que tomam o segundo caminho, lhes diz: “Ouçam, ouçam o que tenho para dizer! Se não querem escutar, ao menos ponham vossos olhos para ver que o que digo é certo. Se não querem usar seus ouvidos nem seus olhos, ao menos usem suas mãos para tocar e dar conta de que não falo em falso.” Então, o primeiro deles diz: “Vamos atender e ver se o que diz é verdade”. O segundo homem diz: “Tudo o que diz não é verdade". O terceiro diz: “Sei que tudo o que diz é verdade, mas não me importa”. O que são esses tesouros se não o amor por mim e amor pelo mundo? Há duas trilhas até esses tesouros. O rebaixar-se e a completa autonegação conduz ao meu amor, enquanto o desejo carnal conduz ao amor ao mundo. Para algumas pessoas, a carga que suportam por meu amor parece feita de chumbo, porque quando têm que jejuar ou vigiar, ou praticar a restrição, pensam que estão carregando uma carga de chumbo. Se têm que ouvir zombarias e insultos porque gastam tempo em oração e na pratica da religião, é como se sentassem sobre pregos, sempre é uma tortura para eles. A pessoa que desejar estar em meu amor, primeiro tem que reverter o chumbo, ou seja, fazer um esforço para fazer o bem desejando-o com um ardor constante. Então, perseverando na tarefa que assumiu, começará a carregar tudo o que antes lhe parecia chumbo, com uma disposição tão alegre que todos os trabalhos ou jejuns e vigílias, ou qualquer outro trabalho, será para ele tão leve como uma pluma. Meus amigos descansam em um lugar que, para os malvados e negligentes, parece estar coberto de espinhos e pregos, mas a meus amigos lhes oferece o melhor repouso, suave como as rosas. O caminho direto até este tesouro é desprezar tua própria vontade. Isto acontece quando um homem, pensando em minha paixão e morte, não se preocupa com sua vontade, mas resiste e luta constantemente para melhorar. Apesar de que esse caminho é algo difícil no principio, ainda há muito prazer neste processo, tanto que tudo o que no principio parecia impossível de carregar se torna muito leve, de forma que pode dizer com toda razão a si mesmo: “Leve é o jugo de Deus”. O segundo tesouro é o mundo. Aí há ouro, pedras preciosas e bebidas que parecem deliciosas, mas são amargas como o veneno quando se experimenta. O que ocorre a todos que levam o ouro é que, quando seu corpo se debilita e seus membros falham, quando sua medula se desgasta e seu corpo cai por terra devido à morte, então deixam o ouro e as joias e não merecem mais do que o barro. As bebidas do mundo, ou seja, seus prazeres parecem deliciosos, mas quando chegam ao estomago debilitam a cabeça e pesam no coração, arruínam o corpo e a pessoa, e desaparecem como palha. À medida que se aproxima a dor da morte, todas essas delicias se tornam tão amargas como o veneno. A própria vontade conduz a este desejo, quando uma pessoa não se preocupa em resistir aos seus apetites e não medita sobre o que Eu tenho ordenado e sobre o que tenho dito, mas a todo o momento faz o que lhe apetece, seja lícito ou não. Três homens caminham por esta trilha. Refiro-me a todos os réprobos, todos os que amam o mundo e a seu próprio desejo. Eu lhes grito desde a encruzilhada dos caminhos, até a entrada dos dois, porque ao ter vindo em carne humana mostrei dois caminhos à humanidade em concreto, um para ser seguido e outro para ser evitado, ou seja, um caminho que leva à vida e outro que conduz à morte. Antes da minha vinda em carne somente havia um caminho. Nele, todas as pessoas, bons e maus, iam ao inferno. Eu sou o que clamei e meu clamor foi este: “Povos, escutem minhas palavras, que conduzem ao caminho da vida, ponham seus sentidos em compreender que o que digo é verdade. Se não as escutam ou não podem escutá-las, então ao menos olhem – ou seja, usem a fé e a razão – e vejam que minhas palavras são certas. Da mesma forma que uma coisa visível pode ser percebida pelos olhos do corpo, assim também o invisível se pode perceber e crer mediante os olhos da fé. Há muitas almas simples na Igreja que fazem poucos trabalhos, mas que se salvam graças a sua fé, por crerem que sou o Criador e redentor do universo. Não existe ninguém que não possa compreender ou chegar à crença de que Eu sou Deus, se considera como a terra dá frutos e os Céus produzem chuva; como se tornam verdes as árvores; como subsistem os animais, cada um em sua espécie; como os astros são úteis ao ser humano, e como ocorrem coisas contrárias à vontade do homem. Partindo de tudo isso, uma pessoa pode ver que é mortal e que é Deus quem dispõe todas as coisas. Se Deus não existisse tudo estaria em desordem. Por conseguinte, tudo foi criado e disposto por Deus, tudo se ordenou racionalmente para a própria instrução do ser humano. Nem sequer a mínima coisa existe nem subsiste no mundo sem razão. Assim, se uma pessoa não pode entender ou compreender meus poderes devido a sua debilidade, ao menos pode ver e crer por meio da fé. Mas se ainda – oh homens! – não queres empregar teu intelecto para considerar meu poder, podes usar tuas mãos para tocar as obras que Eu e meus santos temos realizado. São tão patentes que ninguém pode duvidar de que se trata de obras de Deus. Quem, senão Deus pode ressuscitar os mortos ou devolver a vista a um cego? Quem senão Deus expulsa os demônios? O que ensinou que não sirva para a salvação da alma e do corpo, e seja fácil de levar? Entretanto, o primeiro homem ou, melhor, algumas pessoas dizem: “Escutemos e comprovemos se isto é correto!” Estas pessoas estão há algum tempo a meu serviço, mas não por amor, mas como experimentação e imitação de outros, sem renunciar a sua própria vontade, mas tratando de conjugar sua própria vontade junto com a minha. Estes se encontram em uma perigosa posição porque querem servir a dois mestres, ainda que não possam servir bem a nenhum dos dois. Quando forem chamados, serão recompensados pelo mestre que mais amaram. O segundo homem, ou seja, algumas pessoas dizem: O que disse é falso e a Escritura é falsa. Eu sou Deus, o Criador de todas as coisas, nada foi criado sem mim. Eu estabeleci o novo e o antigo testamento; ambos saíram de minha boca e neles não há falsidade porque Eu sou a verdade. Por isso aqueles que dizem que Eu sou falso e que as Sagradas Escrituras são falsas, nunca verão meu rosto porque sua consciência lhes diz que Eu sou Deus, pois tudo ocorre segundo meu desejo e disposição. O Céu lhes dá luz, pois eles não podem iluminar a si mesmos; a terra dá frutos, o ar permite que se fecunde a terra, todos os animais têm certas disposições, os demônios me confessam, os justos sofrem de maneira incrível pelo seu amor a mim. Eles olham tudo isso e ainda não me veem Poderiam ver-me em minha justiça, se considerassem como a terra devora os ímpios e como o fogo consome os malvados. Igualmente, também podiam ver-me em minha misericórdia quando a água fluiu da rocha para os retos ou as águas se abriram para que eles passassem; quando o fogo não os queimou, ou os Céus lhes deram alimento como a terra. Assim, vendo tudo isso, ainda dizem que minto, então, nunca verão meu rosto. O terceiro homem, ou seja, certas pessoas, dizem: Sabemos muito bem que Ele é Deus em verdade, mas não nos importa. Essas pessoas serão atormentadas eternamente, porque me desprezam a mim que sou seu Senhor e seu Deus. Não é um grandíssimo desprezo de sua parte usar meus dons e recusar a servir-me? Se ao menos tivessem adquirido tudo isso por sua conta e não inteiramente por mim, seu desdém não seria tão grande. Mas Eu darei minha graça àqueles que comecem voluntariamente a carregar meu fardo e a lutar com um desejo ardente de fazer o que possam. Eu trabalharei junto com esses que levam meu fardo, ou seja, os que progridem a cada dia por amor a mim. Serei sua força e os inflamarei tanto que estarão desejosos de fazer mais. Os que perseveram no ponto que parece mortificá-los – mas que em verdade lhes é benéfico – são os que labutam dia e noite sem descanso, fazendo-se inclusive mais ardentes, pensando que o que fazem é pouco. Estes são meus amigos mais queridos e são muito poucos, pois os demais acham mais prazerosas as bebidas do segundo tesouro.

               Como a esposa viu um santo falando com Deus sobre uma mulher que havia sido terrivelmente afligida pelo demônio e que depois se converteu graças às orações da gloriosa Virgem. A esposa viu que um dos Santos dizia a Deus: Porque o demônio está afligindo a alma desta mulher que tu redimiste com teu sangue?

               O demônio contestou de imediato dizendo: Porque é minha por direito.

               E o Senhor disse: Com que direito é tua?

               O demônio lhe respondeu: Há dois caminhos. Um que conduz ao Céu e outro ao inferno. Quando ela se viu frente a esses dois caminhos, sua consciência e razão lhe disseram que escolhesse meu caminho. Como tinha livre vontade para escolher o caminho de seu agrado, pensou que seria mais vantajoso dirigir sua vontade para o pecado, e assim, começou a caminhar por minha trilha. Depois, a enganei com três vícios: a gula, a cobiça pelo dinheiro e a luxúria. Agora habito em seu ventre e em sua natureza. Tenho-a presa por cinco mãos. Com uma mão lhe fecho os olhos para que não veja coisas espirituais. Com a segunda, sujeito suas mãos de forma que não possa fazer nenhuma boa obra. Com a terceira lhe sustenho os pés, de maneira que não caminhe para a bondade. "Com a quarta, sujeito seu intelecto para que não se envergonhe de pecar e, com a quinta lhe prendo o coração para que não sinta contrição.

               A bendita Virgem Maria disse então a seu Filho: Filho meu, faça com que ele diga a verdade sobre o que eu quero lhe perguntar.

               O Filho respondeu: Tu és minha Mãe, és a Rainha do Céu, és a Mãe da misericórdia, o consolo das almas do purgatório, a alegria dos que peregrinam pelo mundo. És a Soberana dos anjos, a criatura mais excelente diante de Deus. Também és Soberana sobre o demônio. Ordena tu mesma a este demônio, Mãe, e ele te dirá o que quiseres.

               A bendita Virgem perguntou então ao demônio: Diga-me, Satanás, que intenção tinha aquela mulher antes de entrar na Igreja?

               Satanás lhe respondeu: Tomou a resolução de não voltar a pecar.

               E a Virgem Maria lhe disse: Embora sua intenção anterior a conduzisse ao inferno, diga-me, em que direção aponta sua atual intenção de afastar-se do pecado?

               O demônio lhe respondeu com raiva: A intenção de abster-se de pecar a conduz para o Céu.

               A Virgem Maria disse: Como tu entendeste que era teu direito afastá-la do caminho da Santa Igreja devido a sua intenção anterior, agora é questão de justiça que deve ser conduzida de volta a Igreja, dada sua presente intenção. Agora demônio, vou te fazer outra pergunta: Diga-me, que intenção tem em seu atual estado de consciência?

               O demônio lhe respondeu: Em sua mente está terrivelmente contrita e arrependida, chora por tudo o que fez. Decidiu nunca mais cometer pecados semelhantes e emendar-se em tudo o que possa.

               A Virgem, então, perguntou ao demônio: Poderia dizer-me se os três pecados de luxúria, gula e cobiça podem existir em um coração junto às suas três boas resoluções de contrição, arrependimento e propósito de emenda?

               O demônio respondeu: Não.

               E a bendita Virgem disse: Me dirás então, quais têm que retroceder e sair de seu coração, as três virtudes ou os três vícios, que, segundo tu, não podem ocupar o mesmo lugar ao mesmo tempo?

               O demônio replicou: Digo que os pecados.

               E a Virgem falou: O caminho do inferno está então fechado para ela e o caminho do Céu está aberto.

               De novo, a bendita Virgem Maria inquiriu ao demônio: Diga-me, se um ladrão arrombar as portas da esposa e quiser violá-la, que teria que fazer o Esposo?

               Satanás respondeu: Se o Esposo é bom e valente, deve defendê-la arriscando sua vida por ela.

               Então, a Virgem disse: Tu és o ladrão malvado. Esta alma é a esposa de meu Filho, que a redimiu com seu próprio sangue. Tu a corrompeste e a atacaste à força. Portanto, e posto que meu Filho é o Esposo de sua alma e Senhor sobre ti, retira-te de sua presença.

               Explicação: Esta mulher era uma prostituta, que depois de arrepender-se quis voltar ao mundo porque o demônio a molestava dia e noite, tanto que visivelmente pressionava seus olhos e, diante de muitos, a arrastava fora de sua cama. Então, na presença de testemunhas fiéis, a santa dona Brígida disse abertamente: Saia, demônio, tens já vexado bastante a esta criatura de Deus. Depois de dizer isso, a mulher se aquietou por meia hora, com os olhos fixos no solo e, depois se levantou e disse: Na verdade eu vi o demônio em uma forma abominável saindo pela janela e ouvi sua voz que me dizia: Mulher, verdadeiramente estás livre. Desde esse momento, esta mulher, venceu toda impaciência, cessaram seus sórdidos pensamentos e veio a descansar em uma boa morte.

               Palavras de Cristo à sua esposa comparando um pecador com três coisas: uma águia, um caçador e um lutador.

            Eu sou Jesus Cristo, que está falando contigo. Sou o que esteve no ventre da Virgem, verdadeiro Deus e homem. Apesar ter estado na Virgem ainda regia tudo com o Pai. O homem, que é um perverso inimigo meu, se parece com três coisas. Primeiro, é como uma águia que voa pelos ares enquanto outras aves voam por baixo; segundo, é como um caçador que entoa doces melodias com uma flauta recoberta de cola, cujos sons deleitam as aves de modo que voam até a flauta e ficam presas na cola. Terceiro, é como um lutador que ganha todos os combates. É como uma águia porque, em seu orgulho, não pode tolerar que haja ninguém acima dele e fere a qualquer que esteja a seu alcance com as unhas de sua malicia. Cortarei as asas de seu poder e de seu orgulho e eliminarei sua maldade da terra. Colocá-lo-ei em uma inextinguível panela fervente, que é o sofrimento do inferno, onde será eternamente atormentado, se não emendar seu caminho. É também como um caçador que atrai todos para si com a doçura de suas palavras e promessas, mas quem se aproxima dele, fica preso na perdição sem poder escapar. Por esta razão, as aves do inferno lhe picarão os olhos para que nunca possam ver minhas glorias, senão somente a escuridão perpetua do inferno. Cortar-lhe-ão as orelhas para que não ouça as palavras de minha boca. Em troca de suas doces palavras lhe darão amargos tormentos desde a planta de seus pés até o alto de sua cabeça e sofrerá tantas torturas quantos foram os homens que conduziu à perdição. É também como um lutador briguento, quem gosta de ser o primeiro em maldade, não querendo ceder diante de ninguém, e sempre determinado a derrotar a qualquer um. Como lutador, então, terá o primeiro lugar em cada castigo; seus tormentos se renovarão constantemente e nunca terminarão. Ainda assim, enquanto sua alma esteja unida a seu corpo, minha misericórdia permanece quieta esperando-o.

               Explicação: Este foi um poderosíssimo cavaleiro que odiava muito o clero e costumava lançar-lhe insultos. A precedente revelação é sobre ele, igual a que segue: O Filho de Deus disse: “Oh mundano cavaleiro, pergunta a sabedoria que ocorreu ao soberbo Aman que desprezava minha gente! Não foi a sua uma morte ignominiosa e uma grande degradação? Da mesma forma este homem zomba de mim e de meus amigos. Por isto, o mesmo que Israel não chorou pela morte de Aman, aos meus amigos não doerá a morte deste homem. Terá uma morte muito amarga se não emenda seu caminho”. E isso foi o que se passou.

               As palavras de Cristo à sua esposa sobre como deveria haver humildade na casa de Deus, e como essa casa significa pureza de vida e como casas e esmolas devem ser doadas apenas de bem ganhos honestamente, e sobre como restaurar bens adquiridos indevidamente.

            Na minha casa todos devem ter a humildade que agora é totalmente rejeitada. Deve haver uma forte parede divisória entre os homens e as mulheres, porque mesmo que eu seja capaz de defender todos e mantê-los todos sem uma parede, ainda, por razões de precaução e por causa da astúcia do diabo, eu quero uma parede que deve separar as duas residências. Deve ser forte e não muito elevada, mas moderada. As janelas devem ser muito simples e transparentes, o telhado moderadamente elevado, pelo que nada pode ser visto lá que não pertença à humildade. Porque aqueles que agora constroem casas para mim são como mestres construtores que, quando o senhor ou o mestre da casa entram nelas, agarram-lhe pelos cabelos e pisam-lhe com os pés; eles elevam o que é sujo para o alto e pisam o ouro com os pés. Isto é o que muitos fazem para mim agora. Eles constroem sujeira, ou seja, criam para o céu coisas perecíveis e mundanas, mas descuidam das almas que são mais preciosas do que todo ouro. Se eu quero ir até eles através das minhas pregações ou através de bons pensamentos, eles agarram-me pelos cabelos e pisam-me com seus pés, o que significa que eles me insultam e consideram minhas palavras e minhas ações desprezíveis como sujeira. Eles se consideram muito mais sensatos. Mas se eles quiserem construir coisas para mim e para minha honra, deveriam primeiro elevar as almas para o reino dos Céus. Os que querem construir minha casa devem, com a máxima precisão, tomar cuidado em não deixar ser destinado à construção nenhum centavo que não tenha sido honesta e justamente adquirido. Há muitas pessoas que sabem que possuem bens conseguidos ilicitamente e não se aborrecem por isso, nem tem intenção de restituir e devolver seus roubos e pilhagens, apesar de que poderiam fazê-lo se quisessem. Entretanto, como sabem que não podem manter estas coisas para sempre, dão uma parte de seus bens mal adquiridos às Igrejas, como se me pudessem aplacar por suas doações. As possessões legítimas reservam aos seus descendentes. E isto não me agrada nada. Uma pessoa que deseja agradar-me com suas doações têm que ter antes de tudo, o desejo de emendar seu caminho e depois fazer todo o bem que possa. Deve lamentar-se e chorar pelo mal que tenha feito e repará-lo se puder. Se não puder deve ter a intenção de fazer a restituição de seus bens fraudulentamente adquiridos. Então, tem que cuidar de não voltar a cometer os ditos pecados. Se a pessoa a quem tem que restituir seus bens mal adquiridos já não está viva, então pode fazer a mim a doação que a todos posso devolver o pago. Se não pode restituí-los, sempre se humilhe diante de mim, com propósito de emenda e um coração contrito, tenho os meios de fazer a restituição e agora ou no futuro, restaurar a propriedade de todos os que tiverem sido fraudados. Explicar-te-ei o significado da casa que quero construir. A casa é a vida religiosa. Eu sou o Criador de todas as coisas, através de quem tudo se fez e existe; Sou seu fundamento. Há quatro paredes nessa casa. A primeira é a justiça pela qual julgo os que são hostis a esta casa. A segunda parede é a sabedoria, pela qual ilumino seus habitantes com meu conhecimento e compreensão. A terceira é o poder mediante o qual os fortaleço contra as maquinações do demônio. A quarta parede é minha misericórdia, que acolhe qualquer um que a peça. Nesta parede está a porta da graça, através da qual todos os que a procuram são bem vindos. O telhado da casa é a caridade, mediante a qual cubro os pecados daqueles que me amam, de forma que não sejam sentenciados por suas faltas. A claraboia do teto por onde entra o sol é representação da minha graça. Através dela se introduz nos habitantes a transparência da minha divindade. Que a parede seja grande e forte significa que nada pode debilitar minhas palavras nem destruí-las. Que deveria ser moderadamente alta significa que minha sabedoria pode ser entendida e compreendida em parte, mas nunca completamente. As janelas simples e transparentes referem que minhas palavras são simples e ainda assim chega ao mundo, através delas, a luz do conhecimento divino. O telhado moderadamente alto significa que minhas palavras não devem manifestar-se de maneira incompreensível e inalcançável, mas em forma compreensível e inteligível.

               Palavras do Criador à esposa sobre o esplendor de seu poder, sabedoria, virtude e sobre como aqueles que agora se dizem sábios são os que mais pecam contra Ele.

            Eu sou o criador do Céu e da Terra. Tenho três qualidades. Sou o mais poderoso, o mais sábio e o mais virtuoso. Sou tão poderoso que os Anjos me honram no Céu e, no inferno, os demônios não se atrevem a olhar-me. Todos os elementos respondem às minhas ordens e chamadas. Sou tão sábio que ninguém consegue alcançar meu conhecimento. Minha sabedoria é tal que sei tudo o que tem sido e o que ainda será. Sou tão racional que nem sequer a mínima coisa, nem um verme nem nenhum outro animal, por informe que pareça, foi feito sem um motivo. Também sou tão virtuoso que todo o bem emana de mim como de um manancial abundante e toda a doçura vem de mim como de uma boa vinha. Sem mim, ninguém pode ser poderoso, ninguém pode ser sábio, ninguém pode ser virtuoso. Por isso, os homens poderosos do mundo pecam contra mim em excesso. Dei-lhes força e poder para que possam honrar-me, mas atribuem a si mesmos a honra como se a tivessem obtido por si mesmos. Os desgraçados não consideram sua imbecilidade. Se lhes enviasse a menor enfermidade, seriam imediatamente derrubados e tudo para eles perderia seu valor. Como, pois, serão capazes de suportar meu poder e os castigos da eternidade? Mas aqueles que agora se dizem sábios, pecam ainda mais contra mim. Dei-lhes sentido, entendimento e sabedoria para que me amassem, mas a única coisa que entendem é seu próprio proveito temporal. Tem olhos em sua face, mas somente olham para seus próprios prazeres. Estão cegos, até para dar graças a mim que lhes tenho dado tudo, pois ninguém, nem bom nem mau, pode perceber ou compreender nada sem mim, mesmo quando permito aos malvados inclinar sua vontade para fazer o que desejam. Tampouco, ninguém pode ser virtuoso sem mim. Agora, poderia usar um provérbio comum: “Todos desprezam o homem paciente”. Devido a minha paciência, todos creem que sou um pobre tolo e é por isso que me olham com desprezo. Mas pobres deles quando, depois de tanta paciência, lhes for dada sua sentença! Diante de mim serão como lama que desliza para as profundidades e não param até chegar à parte mais baixa do inferno.

               Diálogo de agradecimento entre a Virgem Mãe e o Filho e, entre eles, com a esposa e sobre como a esposa deverá se preparar para o casamento.

               A Mãe apareceu dizendo ao Filho: És o Rei da Glória, Filho meu, és o Senhor de todos os senhores, criaste o Céu e a Terra e tudo o que existe neles. Sejam cumpridos todos os teus desejos, faça-se toda tua vontade!

               O Filho respondeu: Há um antigo provérbio que diz: “O que se aprende na juventude se preserva até a velhice”. Mãe, desde tua juventude aprendeste a seguir minha vontade e a submeter todos os seus desejos a mim. Disseste corretamente: ‘Faça-se tua vontade! És como ouro precioso que se estende e esmaga sobre a dura bigorna, porque foste golpeada por todo tipo de tribulação e sofreste em minha Paixão mais que todos os demais. Quando, pela intensidade de minha dor na cruz meu coração se partiu, isto feriu teu coração como afiadíssimo espinho. Terias desejado ser cortada em duas se fosse essa minha vontade. Mesmo se tivesses tido a capacidade de opor-se a minha paixão e suplicado que me fosse permitido viver, não terias querido obter isto, de nenhuma maneira, se não fosse de acordo com minha vontade. Por essa razão, fizeste bem ao dizer: ‘Faça-se tua vontade!” Então, Maria disse à esposa: “Esposa de meu Filho, ame-o porque Ele te ama. Honra seus Santos que estão em sua presença, são como estrelas incontáveis, cuja luz e esplendor não se pode comparar com nenhuma luz temporal. Assim como a luz do mundo é diferente da escuridão, igualmente – mas muito mais – ocorre com a luz dos santos, que difere da luz deste mundo. Eu te digo, certamente, que se os Santos fossem vistos claramente como são, nenhum olho humano poderia suportar sem ver-se privado de sua vista corporal”. Então, o Filho da Virgem falou com sua esposa dizendo: “Esposa minha, deves ter quatro qualidades. Primeiro, tens que estar preparada para a boda de minha divindade, onde não há desejo carnal senão somente o mais suave prazer espiritual, do tipo que é próprio que Deus tenha com uma alma casta. Desta forma, nem o amor por teus filhos, nem os bens temporais, nem o afeto de teus parentes te deve separar do meu amor. Não permitas que te aconteça como foi com aquelas virgens tolas que não estavam preparadas quando o Senhor quis convidá-las para a boda e ficaram de fora. Segundo, deves ter fé em minhas palavras. Como sou a Verdade, nada, senão a verdade sai de meus lábios e ninguém pode encontrar em minhas palavras outra coisa que a verdade. Às vezes, o que digo tem um sentido espiritual e outras vezes se harmoniza com a letra da palavra em cujo caso minhas palavras têm que ser entendidas segundo seu sentido literal. Portanto, ninguém pode acusar-me de mentir. Em terceiro lugar, hás ser obediente para que não haja nenhum só membro de teu corpo pelo qual faças o mal e para que não se submeta a correspondente penitência e reparação. Porém, sou misericordioso, mas não deixo de lado a justiça. Por isso, obedece humildemente e com prazer àqueles aos quais estás sujeita a obedecer, de forma que não faças nada que te pareceria útil e razoável, se isto for contra a obediência. É melhor renunciar a tua própria vontade pela obediência, mesmo se seu objetivo for bom, e ajustar-se à obediência de teu diretor sempre e quando não for contra a salvação de tua alma nem seja irracional. Em quarto lugar, deves ser humilde porque estás unida em um matrimônio espiritual. Por isso, deves ser humilde e modesta quando chegar teu marido. Que teu criado seja moderado e contido, ou seja, que teu corpo pratique a abstinência e seja bem disciplinado, porque vais portar a semente de um fruto espiritual para o bem de muitos. Da mesma forma que, ao inserir um broto em um talo seco e o talo começar a florescer, tu deve portar frutos e florescer por minha graça. E minha graça te embriagará e toda a Corte Celestial se regozijará pelo doce vinho que te hei de dar. Não desconfies de minha bondade. Eu te asseguro que, assim como Zacarias e Isabel se regozijaram em seus corações com um gozo indescritível pela promessa de um futuro filho, tu também te regozijarás pela graça que te quero dar e, por sua vez, outros se alegrarão através de ti. Foi um Anjo que falou com os dois, Zacarias e Isabel, mas sou Eu, Deus Criador dos Anjos e de ti, quem te fala agora. Pelo meu bem, eles deram a vida ao meu mais querido amigo, João. Através de ti, quero que me nasçam muitos filhos, não de carne, mas do espírito. Em verdade, João foi uma cana cheia de doçura e mel, pois nada impuro jamais entrou em sua boca nem jamais transpassou os limites da necessidade para obter o que necessitava para viver. Nunca saiu sêmen de seu corpo, por esta razão, podemos chamá-lo de anjo e virgem.

               Palavras do Esposo à sua esposa recorrendo a uma alegoria sobre um feiticeiro para ilustrar e explicar o que é o demônio.

               O Esposo, Jesus, falou a sua esposa em alegorias, empregando o exemplo de um sapo. Disse: Certo feiticeiro tinha um ouro finíssimo e reluzente. Um homem simples e de modestas maneiras veio a ele e quis comprar seu ouro. O feiticeiro lhe disse: ‘Não conseguirás este ouro a não ser que me dês um ouro melhor e em maior quantidade’. O homem disse: ‘Desejo tanto teu ouro que te darei o que queres antes que eu fique sem ele’. Depois de dar ao feiticeiro um ouro melhor e em maior quantidade, levou o ouro reluzente que este tinha e o guardou em uma maleta, planejando fazer um anel. Passado algum tempo, o feiticeiro foi ver o homem e lhe disse: ‘O ouro que compraste e guardaste em tua maleta não é ouro como crês, e sim um sapo feio que se alimentou em meus peitos e comeu do meu alimento. E para comprovar a verdade da questão, abre a maleta e verás como o sapo saltará ao meu peito onde se alimentava. Quando o homem tomou a maleta para averiguar, pôde sentir o sapo dentro dela forçando as quatro travas já a ponto de rompê-las. Ao abrir a fechadura da maleta, o sapo viu o feiticeiro e saltou em seu peito. Os criados e amigos do homem viram isso e lhe disseram: ‘Mestre, seu ouro está dentro do sapo e, se o deseja, facilmente pode conseguir o ouro. ‘Como’? – perguntou – ‘Como poderei’? Eles disseram: ‘Se alguém usar um bisturi afiado e aquecido e o inserir no lombo do sapo, o ouro sairá dessa parte do lombo em que há um buraco. Se não puder encontrar o buraco, então, terá que fazer todo o possível para inserir o bisturi firmemente nessa parte e, é assim que conseguirás recuperar o que compraste’. Quem é o feiticeiro senão o demônio persuadindo as pessoas e lhes trazendo prazeres e glórias fugazes? Ele assegura que o que é falso é verdade e faz com que o verdadeiro pareça falso. Ele possui esse ouro precioso, ou seja, a alma que, mediante meu divino poder, fiz mais preciosa que todas as estrelas e planetas. Eu a fiz imortal e estável e mais deliciosa para mim do que todo o resto da criação. Preparei para ela um eterno lugar de descanso e morada junto a mim. Arrebatei-a do poder do demônio com um ouro melhor e mais caro ao dar-lhe minha própria carne imune a todo pecado, resistindo a uma Paixão tão amarga que nenhum membro de meu corpo ficou ileso. Pus a alma redimida em uma maleta até o momento em que lhe daria um lugar na corte de minha divina presença. Agora, entretanto, a alma humana redimida se transformou em um sapo torpe e feio brincando em sua soberba e vivendo no lodo de sua luxúria. O ouro, ou seja, minha propriedade por direito, me foi arrebatado. Por isso, o demônio ainda pode me dizer: ‘O ouro que compraste não é ouro e sim um sapo alimentado nos peitos dos meus prazeres. Separa o corpo da alma e verás como este voará direto ao peito de meu deleite onde se alimentou’. Minha resposta a ele é esta: ‘Visto que o sapo é horrível para ser olhado, horrível para ser ouvido, venenoso para ser tocado e em nada me agrada, mas a ti sim, em cujos peitos se alimentou, então podes ficar com ele, pois tens direito a ele. Assim, quando se abre a fechadura, ou seja, quando a alma se separa do corpo, essa voará diretamente a ti para ficar contigo eternamente’. Tal é a alma da pessoa que te estou descrevendo. É como um sapo maligno, cheio de imundície e luxúria alimentado nos peitos do demônio. Agora, falarei da maleta, ou seja, do corpo dessa alma, da morte que lhe sobrevém. A maleta é fechada por quatro travas que estão a ponto de romper-se, no sentido de que seu corpo se mantém por quatro coisas que são: força, beleza, sabedoria e visão, as quais, agora, estão começando a falhar. Quando a alma se separa do corpo, voará direta ao demônio de cujo leite se alimentou, ou seja, sua luxuria, porque se esqueceu de meu amor pelo qual tomei sobre mim os sofrimentos e penas que ela mereceu. Ela não retribui meu amor com amor, mas, em seu lugar, arrebata a propriedade que me corresponde. Deve mais a mim do que a qualquer outra pessoa, mas encontra maior prazer no demônio. O som de sua oração é, para mim, como a voz de um sapo, seu aspecto me resulta detestável. Seus ouvidos não escutam meu gozo, seu corrompido sentido de tato nunca sentirá minha divindade. Todavia, como sou misericordioso, se alguém quiser tocar sua alma, mesmo que seja impura, e examiná-la para ver se há alguma contrição ou algum bem em sua vontade, se alguém quiser introduzir em sua mente um bisturi afiado e aquecido, ou seja, o temor do meu severo juízo, ainda poderia esta alma obter minha graça sempre e quando ela consentir. Se não houvesse contrição nem caridade nela, ainda poderia haver alguma esperança no caso de que alguém a perfurasse com uma aguda correção e a castigasse fortemente, porque, enquanto a alma vive no corpo, minha misericórdia está aberta a todos. Dá-te conta de que Eu morri por amor e ninguém me responde com amor e sim se apoderam do que, por justiça, é meu. Seria justo que a pessoa melhorasse sua vida em proporção ao esforço que custou redimi-la. Entretanto, agora, as pessoas querem viver o pior, em proporção à dor que sofri redimindo-as. Quanto mais lhes mostro a abominação de seu pecado, mais ousadamente se lançam a pecar. Olha, pois, e considera que, não sem motivo, fico irado, porque eles mudaram minha misericórdia em ira. Redimi todos do pecado e eles se enredam cada vez mais no pecado. Por isso, esposa minha, dá-me o que estás obrigada a dar-me, ou seja, mantém tua alma limpa para mim porque eu morri por ela, para que tu pudesses manter-te pura para mim.

               A amável pergunta da Mãe à Esposa, a humilde resposta da esposa à Mãe, a útil réplica da Mãe à Esposa e sobre o progresso das pessoas boas entre os malvados.

               A Mãe falou a à esposa de seu Filho dizendo-lhe: Tu és a esposa de meu Filho. Diga-me, no que estás pensando e o que desejas?

               A esposa respondeu: Senhora minha, tu o sabes, porque sabes tudo.

               A Virgem Bendita acrescentou: Mesmo que eu saiba tudo, gostaria que me dissesses na presença dessas pessoas que te escutam.

               A esposa disse: Senhora minha, temo duas coisas. Primeiro – disse – temo não lamentar-me nem emendar-me por meus pecados tanto quanto desejaria. Segundo, estou triste porque teu Filho tem muitos inimigos.

               A Virgem Maria respondeu: Dar-te-ei três remédios para a primeira preocupação. Em primeiro lugar, pensa em como todos os seres que têm alma, como as rãs ou qualquer outro animal, de vez em quando têm problemas, mesmo que suas almas não sejam eternas, e que morrem com seus corpos. Entretanto, teu espírito e toda a alma humana vive para sempre. Segundo, pense na misericórdia de Deus, porque não há ninguém que, por mais pecados que tenha, não seja perdoado se tão somente rezar com contrição e com a intenção de melhorar. Terceiro, pensa quanta glória consegue a alma quando vive com Deus e em Deus eternamente. Vou dar-te também três remédios para sua segunda preocupação, sobre os muitos inimigos de Deus. Primeiro, considera que teu Deus e Criador, e o deles, é Juiz sobre eles, e que eles nunca mais irão criticá-lo novamente, mesmo porque tolerou pacientemente sua maldade durante um tempo. Segundo, recorda que eles são os filhos da infâmia, e pensa no duro e insuportável que será para eles arder eternamente. São servos tão péssimos que ficarão sem herança, enquanto os bons filhos a receberão. Mas talvez te perguntes: ‘Ninguém, então, há de pregar para eles?’ Claro que sim! Recorda que muito frequentemente as boas pessoas se misturam com os perversos e que os filhos adotivos, às vezes, se afastam dos bons como o filho pródigo que procurou uma terra distante e levou uma vida de perdição. Mas, às vezes, a pregação reverte sua consciência e eles voltam ao Pai e eu os aceito como antes de pecar. É assim que se deve pregar especialmente para eles porque, ainda que um pregador possa encontrar somente gente perversa ao seu redor, deve pensar em seu interior: ‘Talvez haja alguns entre eles que se tornarão filhos de meu Senhor. Por isso, pregarei para eles. Esse pregador será muito premiado’. Em terceiro lugar, considera que aos malvados se lhes permite continuar vivendo como prova para os maus para que eles, exasperados pelos hábitos dos perversos, possam conseguir sua remuneração como fruto de sua paciência. Isto poderás entender melhor por meio de um exemplo. Uma rosa desprende um agradável aroma, é bela de se ver e suave para o tato, mas cresce entre espinhos que espetam se os tocar, são feios de se ver e não desprendem nenhum bom odor. Igualmente, as pessoas boas e retas, mesmo que possam ser agradáveis por sua paciência, belas por seu caráter e suaves por seu bom exemplo, no entanto não podem progredir, nem ser postas à prova a menos que estejam entre os malvados. O espinho é, às vezes, a proteção da rosa, de forma que ninguém a arranque em plena floração. Assim também, os malvados oferecem aos bons a ocasião de não segui-los no pecado quando, devido à maldade dos outros, os justos se controlam ante a ruína a que os poderia levar uma imoderada alegria ou qualquer outro pecado. O vinho não mantém sua qualidade exceto entre excrementos e tampouco as pessoas boas e justas podem manter-se firmes e avançar para a virtude sem ser postas à prova mediante tribulações e sendo perseguidas pelos injustos. Por isso, suporta com alegria os inimigos de meu Filho. Recorda que Ele é o Juiz e, se a justiça exigir que Ele os destrua por completo, acabaria com eles em um instante. Tolera-os, pois, tanto como Ele os tolera!

               Palavras de Cristo à sua esposa descrevendo um homem que não é sincero, mas sim inimigo de Deus e especialmente sobre sua hipocrisia e suas características.

            As pessoas o veem como um homem bem vestido, forte e digno, ativo na batalha do Senhor. Entretanto, quando tira a casca, é repugnante de se olhar e inútil para qualquer trabalho. Seu cérebro aparece nu, tem as orelhas na frente e os olhos na parte traseira de sua cabeça. Seu nariz está cortado. Suas bochechas estão fundas como as de um homem morto. Em seu lado direito, sua “maçã do rosto” e a metade de seus lábios caíram por completo, ou seja, não há nada na direita exceto sua garganta descoberta. Seu peito está infestado de vermes; seus braços são como um par de serpentes. Um maligno escorpião senta-se em seu coração; suas costas parecem carvão queimado. Seus intestinos fedem podre como carne cheia de pus, seus pés estão mortos e são inúteis para caminhar. Agora te direi o que tudo isso significa. Por fora, é um tipo de homem que parece ornado de bons hábitos e de sabedoria, ativo no meu serviço, mas não é assim realmente. Porque se tiramos a casca de sua cabeça, ou seja, se a gente o visse como é, seria o homem mais feio de todos. Seu cérebro está tão nu, que a vaidade e a frivolidade de suas maneiras são sinais suficientemente evidentes para os homens bons, de que é indigno de tanta honra. Se conhecesse minha sabedoria, perceberia que quanto mais se eleva em sua honra sobre os demais, ele deveria, muito mais que os outros, cobrir-se de austeras maneiras. Suas orelhas estão em sua frente porque, em lugar da humildade, que deveria ter por sua alta categoria e que deveria deixar brilhar para outros, ele somente quer receber bajulação e glória. Em seu lugar, ele põe orgulho e é por isso que quer que todos o chamem de grande e bom. Tem olhos na nuca porque todo seu pensamento está no presente e não na eternidade. Ele pensa em como agradar os homens e sobre o que se requer para as necessidades do corpo, mas não em como agradar-me nem no que é bom para as almas. Seu nariz está cortado, tanto que perdeu a discrição mediante a qual poderia distinguir entre pecado e virtude, entre a glória temporal e eterna, entre as riquezas mundanas e eternas, entre os prazeres breves e os eternos. Suas bochechas estão afundadas, ou seja, todo seu sentido de vergonha em minha presença, junto com a beleza das virtudes pelas quais poderia agradar-me, estão mortos por completo ao menos no que me diz respeito. Tem medo de pecar por medo da vergonha humana, mas não por medo de mim. Parte de sua “maçã do rosto” e lábios sumiram, ficando sem nada a não ser a garganta, porque a imitação de meus trabalhos e a pregação de minhas palavras, junto com a oração sentida desde o coração, desapareceram nele, por isso nada ficou, salvo sua garganta glutona. Mas ele encontra, na imitação do depravado e no envolver-se em assuntos mundanos, algo, a uma só vez, saudável e atrativo. Seu peito está cheio de vermes porque nele, onde deveria estar a recordação de minha Paixão e a memória de minhas obras e mandamentos, somente há preocupação pelos assuntos temporais e desejos mundanos. Os vermes corroeram sua consciência de forma que já não pensa em coisas espirituais. Em seu coração, onde eu gostaria de morar e onde deveria residir meu amor, reside um maligno escorpião de cauda venenosa e feição insinuante. Por isso que de sua boca saem palavras sedutoras e aparentemente sensíveis, mas seu coração está cheio de injustiça e falsidade, porque não lhe importa se a Igreja que representa se destrói enquanto ele pode seguir adiante com sua vontade egoísta. Seus braços são como serpentes porque, em sua perversidade, alcançam os simples e os atraem para si com simplicidade, mas quando se acomodam a seus propósitos, os dispensa como a pobres desgraçados. Como uma serpente, se enrosca sobre si escondendo sua malícia e iniquidade, de tal forma que dificilmente se pode detectar seu artifício. A meus olhos, ele é como uma vil serpente, porque como a serpente é mais odiosa que qualquer outro animal, ele é também para mim o mais infame de todos na medida em que reduz a nada minha justiça e me considera como alguém relutante em infligir castigos. Suas costas são como o carvão negro, ainda que devesse ser como o marfim, pois suas obras deveriam ser mais corajosas e puras que as dos outros, para apoiar os fracos com sua paciência e exemplo de vida reta. Entretanto, é como carvão porque, ele também é fraco para pronunciar uma só palavra que me glorifique, a menos que o beneficie. Ainda assim, se crê valente com respeito ao mundo. Em consequência, ainda que ele creia que se mantém reto, cairá na mesma medida de sua deformidade como o carvão privado de vida, diante de mim e dos meus santos. Seus intestinos estão fétidos porque, diante de mim, seus pensamentos e afetos fedem à carne podre, cujo fedor ninguém pode suportar. Nenhum dos santos o pode suportar. Ao contrário, todos afastam seu rosto dele e exigem que se lhe apliquem uma sentença. Seus pés estão mortos porque seus dois pés são suas duas disposições em relação a mim, ou seja, o desejo de emenda por seus pecados e o desejo de fazer o bem. Entretanto, esses pés estão mortos nele porque a essência do amor se consumiu nele e não lhe fica nada mais do que os ossos endurecidos. É nesta condição que está diante de mim. Entretanto, enquanto sua alma permanecer em seu corpo poderá obter minha misericórdia.

               Explicação: São Lourenço apareceu dizendo: Quando estive no mundo, tinha três coisas: continência comigo mesmo, misericórdia com meu próximo e caridade com Deus. Por isso, preguei a palavra de Deus zelosamente, distribuí os bens da Igreja com prudência, e suportei açoites, fogo e morte com alegria. Mas este Bispo resiste e camufla a incontinência do clero, gasta livremente os bens da Igreja com os ricos e mostra caridade para consigo e para o que é seu. Portanto, declaro para ele que uma nuvem luminosa subiu ao Céu, sombreada por chamas escuras, de tal forma que muitos não a podem ver. Esta nuvem é a intercessão da Mãe de Deus para a Igreja. As chamas da avareza e da falta de piedade e de justiça a escurecem de tal maneira que a amável misericórdia da Mãe de Deus não pode entrar nos corações dos oprimidos. Por isso, que o arcebispo volte rapidamente à caridade divina corrigindo-se, aconselhando seus subordinados por palavras e por obra, e animando-os a melhorar. Se não o fizer, sentirá a mão do Juiz, e sua Igreja diocesana será purgada a fogo e espada e afligida pela rapina e a tribulação, e passará muito tempo sem que ninguém a possa consolar.

               Palavras de Deus Pai à Corte Celeste, e a resposta do Filho, e, a Mãe ao Pai, solicitando graças para sua Filha, a Igreja.

               Falou o Pai enquanto atendia toda a Corte Celeste e disse: Ante vós exponho minha queixa porque desposei minha Filha com um homem que a atormenta terrivelmente, atou seus pés a uma estaca de madeira e toda a sua essência se esvai.

O Filho lhe respondeu: Pai, eu a redimi com meu sangue e a aceitei por Esposa, mas agora ela me foi arrebatada à força.

               Então, a Mãe falou: És meu Deus e Senhor. Meu corpo carregou os membros de teu bendito Filho, que é verdadeiro Filho teu e é verdadeiro Filho meu. Não lhe neguei nada na terra. Por minhas súplicas, tenha misericórdia de tua Filha!

               Depois disso, falaram os Anjos dizendo: Tu és nosso Senhor. Em ti possuímos todo o bem e não necessitamos nada mais que tu. Quando tua esposa saiu de ti, todos nos alegramos, mas agora temos razões para estarmos tristes, porque foi jogada nas mãos do pior dos homens, que a ofende com todo o tipo de insultos e abusos. Por isso, tende piedade dela por tua grande misericórdia, pois se encontra em uma extrema miséria, e não há ninguém que possa consolá-la nem libertá-la exceto tu, Senhor, Deus todo poderoso.

               Então, o Pai respondeu ao Filho dizendo: Filho, tua angústia é a minha, tua palavra é a minha e tuas obras são as minhas. Tu estás em mim e eu estou em ti, inseparavelmente. Faça-se tua vontade!” Depois, disse à Mãe do Filho: “Por não haver-me negado nada na terra, também não te negarei nada no Céu. Teu desejo deve ser satisfeito.

               Aos anjos disse: Sois meus amigos e a chama de vosso amor arde em meu coração. Por vossas orações, terei misericórdia de minha filha.

               Palavras do Criador à esposa sobre como sua justiça mantém os malvados na existência por uma tríplice razão.

            Eu sou o Criador do Céu e da Terra. Perguntavas-te, esposa minha, porque sou tão paciente com os malvados. Isso se deve ao fato de que sou misericordioso. Minha justiça os aguenta e minha misericórdia os mantêm por uma tríplice razão.

            Em primeiro lugar, minha justiça os aguenta de forma que seu tempo se complete até o final. Poderias perguntar a um rei justo porque tem alguns prisioneiros aos quais não condena à morte e sua resposta seria: ‘Porque ainda não chegou o tempo da assembleia geral da corte na qual possam ser ouvidos e onde, aqueles que os ouvem, podem tomar maior consciência’. De forma parecida, eu tolero os malvados até que chegue seu tempo, de maneira que sua maldade possa ser conhecida por outros também. Já não previ a condenação de Saul muito antes que se desse a conhecer aos homens? O tolerei durante longo tempo para que sua maldade pudesse ser mostrada a outros.

            A segunda razão é que os malvados fazem alguns bons trabalhos pelos quais hão de ser compensados até o último centavo. Desta forma, nem o mínimo bem que tenham feito por mim ficará sem recompensa e, consequentemente, receberão seu salário na terra.

            Em terceiro lugar, os aguento para que se manifeste assim a glória e a paciência de Deus. É por isso que tolerei Pilatos, Herodes e Judas, apesar de que iam ser condenados. E se alguém perguntar por que tolero a tal ou qual pessoa que se lembrem de Judas e Pilatos. Minha misericórdia mantém os malvados também por uma tríplice razão.

            Primeiro, porque meu amor é enorme e o castigo é eterno e muito grande. Por isso, devido ao meu grande amor, os tolero até o último momento para retardar seu castigo o mais possível na extensa prolongação do tempo.

            Em segundo lugar, é para permitir que sua natureza seja consumida pelos vícios, pois experimentariam uma morte temporal mais amarga se tivessem uma constituição jovem. A juventude padece uma maior e mais amarga agonia na hora da morte.

            Em terceiro lugar, pela melhora das boas pessoas e a conversão de alguns dos maus. Quando as pessoas boas e retas são atormentadas pelos perversos, isso beneficia os bons e justos, pois lhes permite resistir ao pecado ou conseguir um maior mérito. Igualmente, os maus, às vezes, tem um efeito positivo nas outras pessoas perversas. Quando esses últimos refletem sobre a queda e maldade dos primeiros, dizem a si mesmos: ‘De que nos serve seguir seus passos?’ E: ‘Se o Senhor é tão paciente, será melhor que nos arrependamos’. Desta forma, às vezes voltam a mim porque temem fazer o que fazem os outros e, além disso, sua consciência lhes diz que não devem fazer esse tipo de coisas. Dizem que, se uma pessoa foi picada por um escorpião, pode-se curá-la quando se a unte com azeite no qual haja outro escorpião morto. De forma parecida, às vezes uma pessoa malvada que vê a outra cair pode ver-se atingida pelo remorso e curada, ao refletir sobre a maldade e vaidade do outro.

               Palavras de louvor a Deus pela Corte Celeste; sobre como teriam nascido as crianças se nossos primeiros pais não tivessem pecado; sobre como Deus mostrou seus milagres através de Moisés e, depois, por si mesmo a nós com sua própria vinda; sobre a perversão do matrimônio corporal nestes tempos e sobre as condições do matrimônio espiritual.

               A Corte Celeste foi vista diante de Deus, e toda a Corte disse: Louvado e honrado sejas, Senhor Deus, que és e foste sem fim! Somos teus servidores e te louvamos e honramos por uma tríplice razão. Primeiro, porque nos criaste para nos regozijarmos contigo e nos deste uma luz indescritível na qual nos regozijemos eternamente. Segundo, porque todas as coisas são criadas e mantidas por tua bondade e constância, e todas as coisas permanecem de acordo com tua vontade e se submetem à tua palavra. Terceiro, porque criaste a humanidade e assumiste a natureza humana para o bem dela; esse assumir a natureza humana é a razão da nossa grande alegria, e também por vossa castíssima Mãe que foi digna de vos dar à luz e a quem os Céus não podem conter nem limitar". Então, vossa honra e benção estão acima de todas as coisas por causa da dignidade dos anjos que exaltaste grandemente em honra. Que vossa inesgotável eternidade e constância estejam sobre todas as coisas que são e podem ser constantes! Possa vosso amor estar sobre toda a humanidade que criastes! Oh Senhor Deus, somente Vós sejais temido por vosso grande poder, só Vós sejais desejado por vosso grande amor, só Vós sejais amado por vossa constância! Toda honra e gloria sejam dadas a Vós para sempre. Amém!

               Então nosso Senhor respondeu: Vocês me honram merecidamente por toda criação. Mas, digam-me, por que me louvam pela raça humana que me provocou até à ira, mais do que qualquer outra criatura? Eu a fiz superior e mais dignificada do que todas as criaturas abaixo do Céu, e por nenhuma outra sofri tanta indignidade como pelos humanos e nenhuma foi redimida por tão alto custo. Que criatura não se guia por sua ordem natural, a não ser o homem? Ele me aflige com mais desgosto que qualquer outra criatura. Da mesma forma que eu os criei, para que me louvassem e glorificassem, fiz o homem para que me honrasse. Dei a ele um corpo como templo espiritual e eu fiz e coloquei nele a alma como um belo Anjo, para que a alma humana tenha poder e força como um anjo. Neste templo, Eu, Deus e Criador da raça humana, desejei ser como o terceiro (companheiro) para que ele se alegrasse e se deleitasse em mim. Então Eu lhe fiz, de sua costela, um outro templo semelhante a ele.

            Agora, esposa minha, para quem todas as coisas foram ditas e mostradas, tu podes perguntar como nasceriam filhos deles se não tivessem pecado? Eu respondo-te: ‘Em verdade, pelo amor de Deus e mutua devoção e união da carne dentro da qual ambos seriam internamente inflamados, o sangue do amor teria semeado sua semente no corpo da mulher sem nenhuma luxúria vergonhosa, e assim a mulher ficaria grávida. Uma vez concebida a criança sem pecado e desejo luxurioso, Eu mandaria, de minha divindade, uma alma à criança, e a mulher geraria assim a criança e a daria à luz sem dor. Quando a criança nascesse, ela teria sido perfeita como Adão quando ele foi criado. Mas essa honra foi desprezada pelo homem quando ele obedeceu ao demônio e cobiçou uma maior glória do que eu havia dado a ele. Depois que a desobediência foi realizada, meu Anjo veio a eles e eles se envergonharam de sua nudez, e imediatamente experimentaram a concupiscência e desejo da carne, sofreram fome e sede. Então, também me perderam, porque quando eles me tinham, não sentiam nenhuma fome, ou desejo carnal pecaminoso ou vergonha, mas somente Eu era todo seu bem e prazer e perfeito deleite. Mas quando o demônio se alegrou por sua perdição e queda, me movi de compaixão por eles e não os abandonei mas lhes mostrei uma tríplice misericórdia. Assim os vesti quando ficaram nus e lhes dei pão a partir da terra. E por causa da luxuria que o demônio excitou neles após a desobediência, Eu dei e criei almas por suas sementes através da minha divindade. E todo o mal com que o demônio os tentou, transformei inteiramente em bem para eles. Desde então, Eu lhes mostrei como viver e me honrar. E Eu lhes dei permissão para terem relações, porque antes da minha permissão e a manifestação da minha vontade eles ficaram chocados de medo e temerosos de unir-se e ter relações. Eu fui também movido de compaixão e os confortei quando Abel foi morto e estiveram de luto por um longo tempo mantendo abstinência. E quando eles entenderam minha vontade, começaram de novo a ter relações e a ter filhos, de cuja família Eu, seu Criador, prometi que nascessem. Quando a maldade dos filhos de Adão cresceu, Eu mostrei minha justiça ao pecador e a misericórdia a meu eleito; desses Eu me agradei tanto que os preservei da destruição e os criei, porque eles mantiveram meus mandamentos e acreditaram nas minhas promessas. Quando chegou o tempo da misericórdia, Eu mostrei meus poderosos milagres e obras através de Moisés e salvei meu povo, de acordo com minha promessa. Alimentei-os com o maná e caminhei à frente deles em uma coluna de nuvem e fogo. Eu lhes dei minha Lei e lhes revelei meus segredos e o futuro através de meus profetas. Desde então, Eu, o Criador de todas as coisas, escolhi para mim uma virgem nascida de um pai e uma mãe, e dela, assumi a natureza humana e aceitei nascer dela sem pecado. Do mesmo modo que a primeira criança teria nascido no paraíso através do divino amor e no amor mútuo de seu pai e de sua mãe, e com afeto, sem nenhuma luxúria vergonhosa, minha divindade tomou a natureza humana de uma virgem, sem nenhuma vergonhosa luxuria e sem dano a sua virgindade. Eu vim na carne como verdadeiro Deus e homem, e cumpri a Lei e todas as escrituras, tal como antes havia sido profetizado sobre mim, e Eu iniciei a Nova Lei, porque a Antiga Lei era estreita e difícil de cumprir e não foi mais que uma figura das coisas futuras que viriam. Na antiga Lei havia sido permitido a um homem ter várias mulheres, de forma que o povo não fosse deixado sem descendência ou tivessem que se casar com os gentios. Mas na minha Nova Lei, é permitido a um homem ter uma mulher, e é proibido a ele, durante seu tempo de vida ter varias mulheres. Aqueles que se unem com amor e temor divinos, para o bem da procriação e para criar filhos para a honra de Deus, são meu templo espiritual onde eu desejo morar como o terceiro com eles.

            Mas as pessoas nestes tempos se unem em matrimônio por sete razões. Primeiro, pela beleza facial; segundo, pela riqueza; terceiro, pelo prazer grosseiro e gozo indecente que conseguem no desejo sexual impuro; quarto, pelas festas com amigos e glutonaria descontrolada; quinto, por causa da vaidade no vestir,e comer, na brincadeira, entretenimento e jogos e em outras futilidades; sexto, pelo bem procriar filhos mas não criá-los para a honra de Deus ou boas obras, mas para bens materiais e honra; sétimo, se unem pela luxúria e eles são como bestas grosseiras em seus desejos luxuriosos. Eles vêm às portas da minha Igreja em comum acordo e, consentimento, mas seus desejos e pensamentos são completamente contra mim. Eles preferem sua própria vontade, que visa agradar o mundo, ao invés da minha vontade. Se todos os seus pensamentos e vontades fossem dirigidos a mim, e eles colocassem sua vontade em minhas mãos e se casassem em meu temor, então eu lhes daria o meu consentimento e seria como o terceiro com eles. Mas, agora meu consentimento, que seria a coisa mais preciosa para eles, não lhes foi dado, porque têm mais luxúria em seu coração do que amor por mim. Desde então, eles sobem ao meu altar onde ouvem que devem ser um só coração e alma, mas meu coração se aparta deles porque não possuem o calor de meu coração e não conhecem o sabor de meu corpo. Eles buscam o calor e prazer sexual que perecem e amam a carne que será comida pelos vermes. Assim, estas pessoas se unem em matrimônio sem o laço e união de Deus Pai, sem o amor do Filho e sem o consolo do Espírito Santo. Quando o casal vai para a cama, meu Espírito o abandona imediatamente e o espírito de impureza se aproxima em seu lugar porque eles se unem somente pelo prazer e não conversam entre si. Mas, minha misericórdia ainda estará com eles desde que se convertam a mim. Devido ao meu grande amor, Eu coloco uma alma vivente criada por meu poder na semente deles. Às vezes, permito que os maus pais tenham bons filhos, mas é mais frequente que nasçam maus filhos de maus pais, pois estes filhos imitam as más ações e injustiças de seus pais tanto quanto podem e os imitariam ainda mais se minha paciência permitisse. Um casal assim, nunca verá meu rosto, a menos que se arrependa, porque não há pecado tão pesado ou grave que não possa ser limpo pela penitência e o arrependimento. Por essa razão, desejo voltar ao matrimônio espiritual, o tipo que é apropriado para Deus ter com uma alma casta e corpo puro. Existem sete coisas boas nele em oposição aos males mencionados acima. Primeiro, não há desejo pela beleza da forma ou beleza corporal ou olhares voluptuosos mas somente olhares e amor de Deus. Segundo, não há desejo de possuir nada mais do que é necessário para sobreviver, e somente as necessidades com nada em excesso. Terceiro, eles evitam as conversas vãs e frívolas. Quarto, eles não se preocupam com ver amigos ou parentes, porque Eu sou o seu amor e desejo. Quinto, eles desejam manter a humildade interiormente em suas consciências e exteriormente no modo como se vestem. Sexto, eles nunca têm nenhuma vontade de conduzir-se pela luxúria. Sétimo, eles geram filhos e filhas para seu Deus, por meio de seu bom comportamento e bom exemplo e mediante o uso de palavras espirituais. Eles preservam sua fé incorrupta quando permanecem fora das portas de minha igreja onde me dão seu consentimento e Eu lhes dou o meu. Eles sobem ao meu altar onde desfrutam do gozo espiritual de meu corpo e sangue, em cujo deleite eles desejam ser um só coração, um só corpo e uma só vontade comigo, e Eu, verdadeiro Deus e homem, todo poderoso no Céu e na terra, serei como o terceiro com eles e preencherei seus corações. Os esposos mundanos começam seu matrimonio em desejos luxuriosos como bestas brutas, e mesmo pior que bestas brutas! Mas esses esposos espirituais começam em amor e temor de Deus e não se preocupam em agradar ninguém a não ser a mim. No casamento mundano o espírito do mal enche e incita ao deleite carnal onde não há nada mais que podridão, mas esses de casamento espiritual são cheios do meu Espírito e inflamados com o fogo do meu amor que nunca lhes faltará. Eu sou um Deus em três pessoas, e um em divindade com o Pai e o Santo Espírito. Assim como é impossível para o Pai estar separado do Filho e o Espírito Santo estar separado de ambos, e assim como é impossível o calor estar separado do fogo, também é impossível para esses esposos espirituais estarem separados de mim; Eu sou sempre como o terceiro com eles. Meu corpo foi ferido uma vez e morreu em tormentos, mas ele nunca mais será ferido nem morrerá. Da mesma forma, aqueles que são incorporadas em mim com uma verdadeira fé e vontade perfeita, nunca morrerão longe de mim; pois onde quer que fiquem, ou sentem ou caminhem, estarei sempre com eles como seu terceiro.

               Palavras da Mãe à esposa sobre três coisas em uma dança; sobre como esta dança simboliza o mundo e sobre o sofrimento da Mãe na morte de Cristo.

               A Mãe de Deus falou à esposa: Filha minha, quero que saibas que onde há dança há três coisas: alegria vazia, vozes confusas e trabalhos sem sentido. Se alguém entra na dança angustiado e triste, então seu amigo que se encontra em pleno desfrute da dança, mas que vê seu amigo entrando triste e melancólico, deixa imediatamente sua diversão, abandona a dança e se compadece de seu amigo angustiado". Esta dança é o mundo, que sempre se encontra tomado por uma ansiedade vazia que lhes parece gozo, mas é uma alegria vazia. Neste mundo há três coisas: alegria vazia, palavreado frívolo e trabalho sem sentido, porque um homem há de deixar para trás tudo aquilo em que trabalhou. Quem, na plenitude desta dança mundana, vai considerar minhas fadigas e angústias e vai se compadecer comigo – que abandone todo gozo mundano – e vá apartar-se do mundo! Quando meu Filho morreu, eu era uma mulher com o coração transpassado por cinco espadas. A primeira foi sua vergonhosa e afrontosa nudez. A segunda espada foi a acusação contra Ele, pois lhe acusaram de traição, de falsidade e de deslealdade. Ele, quem eu sabia que era justo e honesto e que nunca ofendeu nem quis ofender a ninguém. A terceira espada foi sua coroa de espinhos que perfurou sua sagrada cabeça tão selvagemente que o sangue escorreu até sua boca, sua barba e seus ouvidos. A quarta espada foi sua voz mortiça na cruz, com a qual gritou ao Pai dizendo: ‘Pai, porque me abandonaste?’ Era como se dissesse: ‘Pai, ninguém se apieda de mim, somente tu. A quinta lança que cortou meu coração foi sua amaríssima morte. Seu preciosíssimo sangue se derramava por tantas veias quantas espadas transpassavam meu coração. As veias de suas mãos e pés perfurados e a dor de seus nervos feridos chegavam sem misericórdia até seu coração e de seu coração voltavam aos nervos. Seu coração era forte e vigoroso, por ser dotado de uma boa constituição, isto fazia com que sua vida resistisse lutando contra a morte e que sua amargura se prolongasse ainda mais no ápice da sua dor. À medida que sua morte se aproximava e seu coração se rompia diante de tanta e insuportável dor, de repente todo seu corpo se convulsionou e sua cabeça, que estava para trás, pareceu erguer-se de uma alguma maneira. Abriu levemente seus olhos semi-fechados e por vez abriu sua boca de forma que pude ver sua língua ensanguentada. Seus dedos e braços, que tinham estado muito contraídos, se esticaram. Nada mais houve depois disso e, assim, entregou seu Espírito e sua cabeça caiu sobre seu peito. Suas mãos escorregaram um pouco do lugar das feridas e seus pés tiveram que suportar a maior parte do peso. Então, minhas mãos se ressecaram, meus olhos se turvaram em escuridão e meu rosto ficou pálido como a morte. Meus ouvidos não ouviam nada, meus lábios não podiam articular palavra alguma, meus pés não me sustentavam e meu corpo caiu ao solo. Quando me levantei e vi meu Filho com um aspecto pior que um leproso, lhe entreguei toda minha vontade, sabendo que tudo havia ocorrido segundo sua vontade e que nada disso teria sucedido se Ele não tivesse permitido. Dei-lhe graças por tudo e certo júbilo se misturou com minha tristeza porque vi que Ele, que nunca havia pecado, por seu grandessíssimo amor, quis sofrer tudo pelos pecadores. Que estes que estão no mundo contemplem o que passei quando morreu meu Filho e que sempre o tenham em sua memória!

               Palavras do Senhor à esposa descrevendo como foi julgado um homem ante o tribunal de Deus e sobre a terrível sentença ditada sobre ele por Deus e por todos os Santos.

               A esposa viu que Deus estava enojado e que disse: Eu sou sem princípio e fim. Não há mudança em mim nem de anos nem de dias. Todo o tempo do mundo é como uma só hora ou momento para mim. Todos aqueles que me veem, contemplam e entendem tudo o que existe em mim em um instante. Entretanto, esposa minha, ao estares em um corpo material, não podes perceber nem conhecer como um espírito conhece. Por isso, para teu bem, te explicarei o que sucedeu. Eu estava, por assim dizer, sentado no tribunal para julgar, porque todo juízo me foi dado, e certa pessoa veio a ser julgada ante o tribunal.

               A voz do Pai ressoou e lhe disse: Mais te valeria não ter nascido. Não era porque Deus se tivesse arrependido de criá-lo, e sim como qualquer um que sentisse preocupação por outra pessoa e se compadecesse dela.

               A voz do Filho interveio: Eu derramei meu sangue por ti e aceitei uma duríssima penitência, mas tu te afastaste completamente e isso já não tem nada a ver contigo.

               A voz do Espírito disse: Eu busquei por todos os rincões do seu coração para ver se poderia encontrar algo de ternura e caridade, mas és tão frio como o gelo e tão duro como uma pedra. Este homem não me diz respeito.

            Estas três vozes não se ouviram como se fossem três deuses, mas foram ditas audíveis para ti, esposa minha, porque de outra forma não terias podido compreender este mistério.

               As três vozes, do Pai, Filho e Espírito Santo, se transformaram imediatamente em uma só voz que retumbou e disse: De nenhuma maneira merece o reino dos Céus! A Mãe da misericórdia permaneceu em silêncio e não moveu sua misericórdia, pois o defendido não era digno dela. Todos os Santos clamaram a uma voz dizendo: É justiça divina para ele o ser perpetuamente exilado de seu Reino e de seu gozo.

               Todos no purgatório disseram: Não temos uma penitência suficientemente dura para castigar teus pecados. Terás que suportar maiores tormentos e, portanto, tens que ser apartado de nós.

               Então, o mesmo defendido exclamou com uma voz horrenda: Ai, ai da semente que fecundou no ventre de minha mãe e da qual eu me formei! Por segunda vez exclamou: Maldita a hora em que minha alma se uniu a meu corpo e maldito aquele que me deu um corpo e uma alma! Voltou a clamar uma terceira vez: Maldita a hora em que sai do ventre de minha mãe!”

               Então chegaram três vozes horríveis do inferno que lhe diziam: “Vem conosco, alma maldita, como o líquido que se derrama até a morte perpétua e vive sem fim!” Por segunda vez, as vozes voltaram a chamá-lo: “Vem, alma maldita, vazia por sua maldade! Nenhum de nós deixará de encher-te com seu próprio mal e dor!” Por terceira vez assim juntaram: “Vem, alma maldita, pesada como uma pedra que se afunda e nunca alcança o fundo onde descansar! Descerás mais baixo que nós e não pararás até que não tenha chegado ao mais profundo do abismo”.

               Então, o Senhor disse: Como um homem com várias esposas, que vê cair uma e se separa dela, se volta para as outras que permanecem firmes e se alegra com elas, assim Eu separei dele meu rosto e minha misericórdia, e me volto para os que me servem e me obedecem e me alegro com eles. Portanto, agora que sabes de sua queda e desgraça, serve-me com maior sinceridade do que ele, em proporção à maior misericórdia que te dispenso! Aparta-te do mundo e de seus desejos! Por acaso eu aceitei tão amarga Paixão pela glória do mundo; ou porque não podia consumá-la em menos tempo e com mais facilidade? Claro que podia! Contudo, a justiça exigia isso. Como a humanidade pecou em todos e cada um de seus membros, tive que fazer cumprir a justiça em todos e cada um dos meus membros. Por isso, Deus, em sua compaixão pela humanidade e em seu ardente amor para com a Virgem, recebeu dela uma natureza humana através da qual pude suportar todo o castigo ao qual estaria fadada a humanidade. Ao haver tomado Eu sobre mim teu castigo, por amor, permanece firme na verdadeira humildade, como os meus servos, assim, não terás nada de que envergonhar-te nem nada que temer mais que a mim! Guarda tuas palavras de tal forma que, se essa fosse minha vontade, tu não falarias. Não te entristeças pelas coisas temporais que tão somente são passageiras. Eu posso fazer, a quem eu quiser, rico ou pobre. Assim, pois, esposa minha, deposita toda tua esperança em mim!

               Explicação: Esse homem era um cônego de nobre reputação e subdiácono que, havendo obtido uma falsa dispensa, quis casar-se com uma rica donzela. Contudo, foi surpreendido por uma morte repentina e não conseguiu seu objetivo.

               Palavras da Virgem à filha sobre duas senhoras, uma que se chamava “soberba” e a outra “humildade”, simbolizando esta última a mais doce das Virgens e sobre como a Virgem vem reunir-se com aqueles que a amam na hora de sua morte.

               A Mãe de Deus se dirigiu à esposa de seu Filho dizendo-lhe: Há duas senhoras. Uma delas não tem um nome especial, mas não merece nome; a outra é a humildade e se chama Maria. O demônio é o mestre da primeira senhora porque tem domínio sobre ela. Um de seus cavaleiros disse a essa dama: ‘Senhora minha, estou disposto a fazer o que puder por você, se puder copular contigo ao menos uma vez. Sou poderoso, forte e tenho um coração valente, não temo nada e estou até disposto a morrer por ti.

               Ela lhe respondeu: Servo meu, seu amor é grande. Mas, eu estou sentada em um trono muito alto, e eu tenho somente este trono e há três portas entre nós. A primeira porta é tão estreita que tudo que um homem está vestindo sobre seu corpo enroscará e rasgará deixando um buraco. A segunda é tão afiada que corta até as fibras nervosas. A terceira arde com um fogo tal que ninguém escapa de seu ardor sem ficar derretido como o cobre. Ademais, estou sentada tão alto que qualquer um que queira sentar-se comigo – ao ter eu somente um trono – cairia nas grandes profundidades do caos debaixo de mim.

               O demônio lhe respondeu: Darei minha vida por ti, pois uma queda não representa nada para mim. Esta senhora é a soberba e qualquer um que quiser chegar a ela passará, por três portas. Pela primeira porta entram aqueles, que dão tudo o que têm para receber honras humanas por sua soberba, e se não têm nada, mudam toda sua vontade em viver com orgulho e colher elogios. Pela segunda porta entra a pessoa que dedica todo seu trabalho e tudo o que faz, todo seu tempo, todos seus pensamentos e toda sua força para satisfazer sua soberba. E ainda assim, se tiver que deixar que firam seu corpo para conseguir honras e riquezas, o faria com gosto. Pela terceira porta entra a pessoa que nunca se cala e nem se aquieta e sim arde como o fogo com o pensamento de como conseguir alguma honra mundana ou posição de soberba. Mas quando obtém o que deseja, não pode permanecer muito tempo no mesmo estado e termina caindo miseravelmente. Apesar de tudo isso, a soberba ainda permanece no mundo.

               Disse Maria: Eu sou a mais humilde, estou sentada em um trono espaçoso, sobre mim não há sol, nem lua, nem estrelas e nem sequer nuvens senão um brilho inconcebível e uma calma maravilhosa da clara beleza da majestade de Deus. Abaixo de mim não há nem terra nem pedra, somente um incomparável descanso na bondade de Deus. Perto de mim não há nem barreiras nem paredes, senão a gloriosa corte dos Anjos e das almas santas. Ainda que, esteja sentada em um trono sublime, ouço meus amigos que vivem na Terra, entregando-me diariamente seus suspiros e suas lágrimas. Vejo suas lutas e sua eficácia, que é maior do que aqueles que lutam por sua senhora, a soberba. Por isso, os visitarei e os reunirei comigo em meu trono, porque este é espaçoso e há lugar para todos. Entretanto, ainda não podem vir e sentar-se comigo porque há ainda dois muros entre eles e eu, mediante os quais os conduzirei confiadamente para que possam chegar até meu trono.

            O primeiro muro é o mundo e é estreito. Assim, meus servos no mundo receberão consolação de minha parte.

            O segundo muro é a morte. Por isso, eu, sua mais querida Senhora e Mãe, comparecerei para unir-me com eles na morte de maneira que mesmo na morte possam sentir meu refrigério e consolo. Reuni-los-ei comigo no trono do gozo celestial de maneira que, na alegria sem fim, possam descansar eternamente nos braços do amor perpétuo e da glória eterna”.

               Amorosas palavras do Senhor à esposa sobre como se multiplica o número de falsos cristãos até o ponto de estarem voltando a crucificar Cristo e sobre como Ele ainda estaria disposto a aceitar a morte, uma vez mais, pela salvação dos pecadores, se fosse possível.

            Eu sou Deus. Criei todas as coisas para o benefício da humanidade, para que tudo lhe servisse e instruísse. Mas, os seres humanos abusam de tudo que fiz para seu beneficio, até sua própria condenação. Deus não lhes importa e o amam menos do que às coisas criadas. Os judeus prepararam três tipos de castigo para mim em minha Paixão: primeiro, a madeira na qual depois de ter sido açoitado e coroado de espinhos, fui pregado; segundo, o ferro com o qual cravaram minhas mãos e meus pés; terceiro, o fel que me deram para beber. Além disso, me lançaram blasfêmias como se Eu fosse um tolo devido à morte que livremente suportei e me chamaram de falso devido a meus ensinamentos. O número de pessoas assim tem se multiplicado agora no mundo; há muito poucos que me consolam. Penduram-me no madeiro por seu desejo de pecar, açoitam-me com sua impaciência, pois ninguém suporta nem uma palavra por mim e coroam-me com os espinhos de sua soberba que faz com que queiram chegar mais alto do que Eu. Cravam minhas mãos e pés com o ferro de seus corações endurecidos, visto que se gloriam em pecar e se endurecem tanto que não me temem. Pelo fel, oferecem-me tribulações e, por haver sofrido minha Paixão com alegria, me chamam de falso e vaidoso. Sou suficientemente poderoso para arruiná-los e também o mundo inteiro se quisesse, por causa de seus pecados. Todavia, se os arruinasse, os que ficassem me serviriam por medo e isso não seria correto porque as pessoas devem servir-me por amor. Se viesse pessoalmente e me misturasse com eles, de uma forma visível, seus olhos não suportariam ver-me, nem seus ouvidos escutar-me. Como poderia um ser mortal ver um outro imortal? Ainda assim, voltaria a morrer pela humanidade se fosse possível.

               Então, apareceu a bendita Virgem Maria e seu Filho lhe perguntou: Que desejas, minha Mãe, minha eleita?

               E ela disse: Tenha misericórdia de sua criação, meu Filho, por teu amor!

               Ele replicou: Serei misericordioso uma vez mais, por ti.

               Então, o Senhor falou à sua esposa, dizendo-lhe: Eu sou teu Deus, o Senhor dos Anjos. Sou Senhor da vida e da morte. Eu mesmo desejo habitar em teu coração. Eu te amo tanto! Os Céus, a Terra e tudo o que há nela não podem me conter, mas ainda assim desejo habitar em teu coração que não é mais que um pedaço de carne. O que hás de temer ou o que te há de faltar se tiveres dentro de ti Deus todo poderoso em quem se encontra toda a bondade? Deve haver três coisas em um coração para que me sirva de morada: uma cama em que possamos descansar; um assento onde possamos nos sentar e uma lâmpada que nos dê luz. Haja, pois, em teu coração uma cama para um sereno repouso onde possas descansar dos baixos pensamentos e desejos do mundo! Lembra-te sempre do gozo eterno! O assento há de ser tua intenção de permanecer comigo, ainda que, às vezes, tenha que sair. Iria contra a natureza se permanecesse continuamente em pé. A pessoa que está sempre de pé é a que sempre deseja estar no mundo e nunca vem sentar-se comigo. A luz da lâmpada há de ser a fé, mediante a qual crês que Eu posso fazer qualquer coisa, que sou todo poderoso sobre todas as coisas.

               Sobre como a esposa viu a dulcíssima Virgem Maria adornada com uma coroa e outros adornos de extraordinária beleza e sobre como São João Batista explicou à esposa o significado da coroa e das demais coisas.

               A esposa viu a Rainha dos Céus, a Mãe de Deus, usando uma preciosa e radiante coroa sobre sua cabeça, com seu cabelo extraordinariamente belo e solto sobre seus ombros, uma túnica dourada com lampejos de um brilho indescritível e um manto azul de um Céu claro e calmo. Estando a esposa tomada de amor ante esta maravilhosa visão e mantendo-se em seu encantamento como sobressaltada de gozo interior, apareceu-lhe o bendito São João Batista e lhe disse: Preste muita atenção ao que tudo isso significa. A coroa representa que ela é a Rainha, Senhora e Mãe do Reino dos Anjos. Seu cabelo solto indica que é uma virgem pura e imaculada. O manto da cor do céu quer dizer que ela está morta a tudo o que é temporal. A túnica dourada significa que ela esteve ardente e inflamada no amor de Deus, tanto internamente como em seu exterior.

            Seu Filho colocou sete lírios em sua coroa e, entre eles, sete pedras preciosas. O primeiro lírio é sua humildade; o segundo, o temor; o terceiro, a obediência; o quarto, a paciência; o quinto, a firmeza; o sexto, a mansidão, pois ela amavelmente dá a todos o que lhe pedem; o sétimo é sua misericórdia nas necessidades, pois, em qualquer contrariedade em que se encontre um ser humano, se a invocar com todo seu coração, será resgatado. Entre estes lírios resplandecentes, seu Filho colocou sete pedras preciosas.

            A primeira é sua extraordinária virtude, pois não existe virtude em nenhum outro espírito nem em nenhum outro corpo que ela não possua com maior excelência.

            A segunda pedra preciosa é sua perfeita pureza, pois a Rainha dos Céus é tão pura que nem uma só mancha de pecado nunca foi encontrada nela desde o princípio quando veio ao mundo pela primeira vez até o dia de sua morte. Todos os demônios juntos não poderiam encontrar nela nem a mínima impureza que coubesse na cabeça de um alfinete. Ela foi verdadeiramente pura, pois o Rei da Glória não poderia ter estado senão na mais pura e limpa, no vaso mais seleto entre os seres humanos.

            A terceira pedra preciosa foi sua beleza, para que Deus seja constantemente louvado pela beleza de sua Mãe. Sua beleza enche de gozo os Santos Anjos e todas as almas santas.

            A quarta pedra preciosa da coroa da Virgem Mãe é sua sabedoria, pois ela foi agraciada com toda a divina sabedoria em Deus e, graças a ela, toda sabedoria se completa e se aperfeiçoa.

            A quinta pedra é o poder, pois ela é tão poderosa diante de Deus que pode esmagar qualquer coisa que foi feita ou criada.

            A sexta pedra preciosa é sua radiante claridade, pois ela resplandece tão clara que projeta luz sobre os Anjos, cujos olhos brilham mais claros que a luz e os demônios não se atrevem nem a olhar o brilho de sua claridade.

            A sétima pedra preciosa é a plenitude de todo deleite e doçura espiritual, porque sua plenitude é tal que não há gozo que nela não seja incrementado, nem deleite que não se faça mais pleno e perfeito por ela e pela bendita visão que alguém possa ter dela, pois está cheia e repleta de graças, mais que todos os santos. Ela é o vaso puro onde descansa o pão dos Anjos e é nele que se encontra toda doçura e beleza. Estas são as sete pedras preciosas que seu Filho colocou entre os sete lírios de sua coroa. Por isso, como esposa de seu Filho, dá-lhe honra e louvores com todo teu coração, pois Ela é verdadeiramente digna de toda honra e louvor!

               Sobre como, atrás do conselho de Deus, a esposa elege a pobreza para si e renuncia às riquezas e desejos carnais; sobre a verdade das coisas reveladas a ela e sobre três pessoas notáveis mostradas por Cristo.

            Tu serás como alguém que se desprende do mundo e, no tempo certo, colherás. Tens que te desapegar das riquezas e colher virtudes, deixar aquilo que passará e acumular bens eternos, abandonar as coisas visíveis e se apossar do invisível. Ao contrário do prazer do corpo, dar-te-ei a exultação de tua alma; ao contrário das alegrias do mundo, dar-te-ei as do Céu; em vez da honra mundana, a honra dos anjos; em vez da presença da família, a presença de Deus; em vez de possuir bens, dar-te-ei a mim mesmo, doador e Criador de todas as coisas. Responda, por favor, às três perguntas que formularei: Primeiro, diga-me se queres ser rica ou pobre neste mundo”. Ela respondeu: “Senhor, prefiro ser pobre, pois as riquezas me criam ansiedade e me distraem ao servi-lo”. Diga-me, em segundo lugar, se encontraste algo repreensível para tua alma ou falso nas palavras que ouves de minha boca”. E ela disse: “Não Senhor, tudo é razoável”. Terceiro, diz-me se o prazer dos sentidos que tu experimentaste antes te agrada mais que os gozos espirituais que agora tens. E ela respondeu: “Em meu coração envergonho-me de pensar em meus deleites anteriores e agora parecem veneno, mais amargos quanto era meu desejo por eles. Prefiro morrer antes de voltar a eles; não se podem comparar com o deleite espiritual”. “Portanto, disse ele, se podes comprovar que todas as coisas que te disse são certas, por que, então, tens medo ou estás preocupada com o fato de eu atrasar tudo o que já disse que se fará? Tome em conta os Profetas, considere os Apóstolos e os Santos Doutores da Igreja! Eles descobriram algo em mim que não foi a verdade? É por isso que, para eles, não importaram nem o mundo nem seus desejos. Ou, por que crês que os profetas predisseram acontecimentos futuros com tanta antecipação se não foi pela vontade de Deus que eles dessem a conhecer as palavras antes dos fatos para que os ignorantes fossem instruídos na fé? Todos os mistérios de minha encarnação foram revelados com antecedência aos Profetas, inclusive a estrela que guiou os Magos. Eles creram nas palavras do Profeta e mereceram ver aquilo que haviam crido e lhes dei certeza no momento em que viram a estrela. Da mesma forma agora, minhas palavras deverão ser anunciadas, depois verão os fatos e se crerá neles com maior evidência. Mostrar-te-ei três pessoas. Primeiro, um homem cuja consciência está manchada com um pecado manifesto e, demonstrado por sinais evidentes. Por quê? Não poderia tê-lo destruído pessoalmente? Não poderia tê-lo expulsado para o abismo em um segundo se eu, assim o quisesse? Claro que sim. Mas o suporto ainda para a instrução dos outros e em prova de minhas palavras, mostrando como sou justo e paciente e quão infeliz é esse homem que é governado pelo demônio. O poder do demônio sobre ele aumentou por sua intenção de permanecer no pecado e por seu prazer nele, com o resultado de que nem minhas palavras amáveis nem as duras ameaças ou o medo da Gehenna (do inferno) podem recuperá-lo. E, também, em justiça, porque ele teve uma constante intenção de pecar, ainda que não o colocasse em prática, por isso, merece ser enviado ao demônio por toda a eternidade. O mínimo pecado é suficiente para condenar a quem se deleita nele e não se arrepende. Mostrar-te-ei agora os outros dois. O demônio atormentou o corpo de um deles, mas não chegou a entrar em sua alma. Escureceu sua consciência mediante suas maquinações, mas não pôde entrar em sua alma nem adquirir poder sobre ele. Tu podes perguntar: ‘Acaso não é a consciência o mesmo que a alma? Não está ele na alma quando está na consciência?’ Por certo que não. O corpo possui dois olhos para ver, mas, mesmo perdendo o poder da vista, o corpo pode manter-se são. Acontece o mesmo com a alma. Ainda que o intelecto e a consciência, às vezes, se perturbem na confusão como meio de penitência, ainda assim, a alma nem sempre fica manchada de maneira que incorra na culpa. Assim, pois, o demônio dominou a consciência de um homem, mas não sua alma. Mostrar-te-ei ainda um terceiro homem cujo corpo e alma estão completamente sujeitos ao demônio. A menos que o coaja com meu poder e graça especiais, nunca poderá ser expulso nem sair dele. O demônio sai de algumas pessoas por vontade e disposição próprias, mas de outras sai tão somente pela resistência e sob coação. Entretanto entra em algumas pessoas, devido ao pecado de seus pais ou por algum desígnio oculto de Deus – como, por exemplo, em crianças ou naqueles que carecem de inteligência – em outros entra por sua infidelidade e pelo pecado alheio. Desses últimos, o demônio sai voluntariamente quando é expulso por pessoas que conhecem exorcismo ou a arte de expulsar demônios, sempre que o façam sem vã glória ou por algum tipo de benefício temporal, pois o demônio tem poder para entrar naquele que o expulsa ou para voltar de novo para a mesma pessoa da qual tenha sido expulso, se não houver amor de Deus em nenhum deles. Nunca sai do corpo ou da alma daqueles que os possuem completamente, exceto mediante meu poder. Como o vinagre que, quando se mistura com o vinho doce, infecta a doçura do vinho e já não pode mais ser separado dele, igualmente o demônio não sai da alma de ninguém a quem possua, exceto mediante meu poder. Quem é este vinho senão a alma humana, que foi mais doce para mim que nenhum outro ser criado, e tão querida por mim que inclusive deixei que minha carne fosse cortada e meu corpo machucado até as costelas por sua salvação? Antes que perdê-la, aceitei morrer por ela. Este vinho foi conservado entre resíduos, da mesma forma que coloquei a alma em um corpo, onde foi guardada por minha vontade, como em uma urna selada. Todavia, o pior vinagre se misturou com este vinho doce, me refiro ao demônio, cuja maldade é mais azeda e abominável para mim que o vinagre. Por meu poder, este vinagre será eliminado da pessoa cujo nome te direi, de maneira que Eu possa revelar assim minha misericórdia e sabedoria através dele, mas mostrarei meu juízo e minha justiça através do homem anterior.

               Explicação: O primeiro homem foi um nobre e soberbo cantor, que foi a Jerusalém sem a permissão do Papa e foi atacado pelo demônio. O segundo endemoniado foi um monge cisterciense. O demônio o atormentou tanto que podia apenas ser dominado por quatro homens. Sua língua aumentada assemelhava-se a de uma vaca. Os grilhões de suas mãos foram feitos em pedaços de forma invisível. Este homem foi salvo pelas palavras do Espírito Santo através da Senhora Brígida ao cabo de um mês e dois dias. O terceiro endemoniado era um político de Östergötland (Suécia). Quando se lhe recomendou que fizesse penitência, disse a quem o aconselhou: “Não pode o dono de uma casa sentar-se onde quiser? Se o demônio possui meu coração e minha língua como posso fazer penitência?” Maldizendo os Santos de Deus, morreu naquela mesma noite sem os sacramentos ou confissão.

               Advertências do Senhor à esposa em relação com a verdadeira e falsa sabedoria e sobre como os bons anjos assistem aos bons aprendizes, enquanto que os demônios assistem aos maus aprendizes.

            Alguns dos meus amigos são como estudantes com três características: uma inteligência para discernir, maior do que é natural ao cérebro; segunda, uma sabedoria sem ajuda humana, tanta quanto eu lhes ensino interiormente; terceira, estão sempre cheios de doçura e amor divino com os quais derrotam o demônio. Mas hoje em dia, as pessoas abordam seus estudos de outra maneira. Primeiro, buscam o conhecimento com arrogância para serem considerados bons alunos. Segundo, buscam o conhecimento para manter e obter riquezas. Terceiro, buscam o conhecimento para alcançar honras e privilégios. Por isso, quando comparecem em suas escolas e entram ali, apartar-me-ei deles, pois estudam por orgulho mesmo Eu lhes ensinando a humildade. Entram por cobiça, quando Eu não tive nem onde repousar a cabeça. Entram para obter privilégios, invejosos de que outros estejam situados em lugares mais altos do que eles, enquanto que Eu fui sentenciado por Pilatos e enganado por Herodes. É por isso que os abandono, porque não estudam meus ensinamentos. Todavia, como sou bondoso e amável, dou a cada um o que pedem. Se me pedem pão, dou-lhes pão e se me pedem palha dou-lhes palha. Meus amigos pedem pão, porque buscam e estudam a divina sabedoria, onde se pode encontrar meu amor. Outros, ao contrário, pedem palha, ou seja, sabedoria mundana. Como a palha, não serve para nada e é o alimento dos animais irracionais, da mesma forma, não há nenhum uso na sabedoria do mundo que sirva de alimento para a alma. Não há nada mais que uma pequena reputação e esforço sem sentido, pois quando um homem morre, todo seu conhecimento se apaga da existência e aquilo que empregaram para se exaltarem já não o podem ver. Eu sou um grande Senhor com muitos servos que, por meio de seu Senhor, distribuem às pessoas o que necessitam. Desta forma, os anjos bons e os maus permanecem debaixo de minha autoridade. Os anjos bons ajudam as pessoas que estudam meu conhecimento, ou seja, aqueles que me servem, nutrindo-os de consolações e do proveito de seu trabalho. Os anjos maus assistem os sábios do mundo. Inspiram-lhes o que eles querem e os formam segundo seus desejos, inspirando-lhes especulações junto com grande quantidade de trabalho. Ainda assim, se voltam seus olhos para mim, poderia dar-lhes o pão que não tiveram por seu esforço e bastante do mundo como para saciá-los do que nunca se podem saciar, pois eles mesmos convertem o doce em amargo. Mas você, esposa minha, deve ser como um queijo e seu corpo como o molde, no qual o queijo se molda até que fica na forma do molde. Desta forma, sua alma, que é para mim tão deliciosa e saborosa como o queijo, deve ser provada e purificada no corpo o tempo suficiente para que o corpo e a alma se ponham de acordo e para que ambos mantenham a mesma forma de continência, de maneira que a carne obedeça ao espírito e o espírito guie a carne até a virtude.

               Instruções de Cristo à esposa sobre a forma de viver. Também sobre como o demônio admite diante de Cristo que a esposa ama a Cristo sobre todas as coisas; sobre a pergunta que o demônio fez a Cristo do porque a ama tanto e sobre a caridade que Cristo tem para com a esposa, e como descobre o diabo.

            Sou o Criador do Céu e da terra e nas entranhas da Virgem Maria fui verdadeiro Deus e homem, que morri ressuscitei e subi aos Céus. Tu, minha nova esposa, chegaste a um lugar desconhecido e, por isso, tens de aprender quatro coisas: Primeira, o idioma do lugar; segunda, como te vestir adequadamente; terceira como organizar teus dias e teu tempo segundo os hábitos do lugar; quarta; acostumar-te a uma nova alimentação. Como vieste da instabilidade do mundo para a estabilidade, deves aprender um novo idioma, ou seja, como abster-te de palavras inúteis e ainda das mais legítimas, devido à importância do silêncio e da quietude. Deves vestir-te de humildade interior e exterior, de forma que, nem te exaltes interiormente por crer-te mais santa do que outros, nem exteriormente te sintas envergonhada de atuar publicamente com humildade. Terceiro, teu tempo deve ser regulado de maneira que, da mesma forma que frequentemente costumavas dedicar tempo às necessidades do corpo, agora tenhas tempo para a alma e nunca queiras pecar contra mim. Quarto, sua nova alimentação é a prudente abstinência da gula e dos manjares tanto quanto possa suportar tua constituição natural. Os atos de abstinência que excedem a capacidade da natureza não me agradam, pois Eu exijo racionalidade e submissão dos desejos.”

               Neste momento apareceu o demônio. O Senhor lhe disse: Tu foste criado por mim e viste em mim toda justiça. Diga-me se esta nova esposa é legitimamente minha por direito demonstrado! Eu te permito que vejas e entendas seu coração para que saiba como me contestar! Ama ela algo mais que a mim ou me trocaria por algo?

O demônio lhe respondeu: Ela não ama nada como a ti. Antes que perder-te, se submeteria a qualquer tormento, sempre que tu lhe deres a virtude da paciência. Vejo, como um veículo de fogo, descendo de ti até ela, que amarra tanto seu coração a ti que ela não pensa nem ama nada mais que a ti.

               Então, o Senhor disse ao demônio: Dize-me o que sente teu coração e se gostas do grande amor que sinto por ela.

               O demônio respondeu: Tenho dois olhos, um corporal – mesmo que não sou corpóreo – por meio do qual percebo as coisas temporais tão claramente que não há nada escondido nem tão escuro que se possa esconder de mim. O segundo olho é espiritual, e com ele vejo toda dor, mesmo que seja muito leve, e posso entender a que pecado pertence. Não há pecado, por mais tênue e leve que seja, que eu não possa ver, a menos que tenha sido purgado pela penitência. Apesar de que não há órgãos mais sensíveis que os olhos, deixaria que duas tochas ardentes penetrassem meus olhos em troca de que ela não visse com os olhos do espírito. Também tenho dois ouvidos. Um deles é corporal, e ninguém fala tão privadamente que eu não o possa ouvir e saber graças a este ouvido. O segundo é o ouvido espiritual, e nem os pensamentos nem os desejos de pecar se me podem ocultar, a menos que tenham sido apagados com a penitência. Há certo castigo no inferno que é como uma torrente fervendo que jorra de um terrível fogo. Eu o sofreria dentro e fora dos meus ouvidos, sem cessar, em troca de ela deixar de ouvir com os ouvidos de seu espírito. Também tenho um coração espiritual. Desejaria que o cortassem interminavelmente em pedaços, e que se renovasse continuamente para ser cortado de novo, se assim seu coração esfriasse em seu amor por ti. Mas, agora, como és justo, quero fazer-te uma pergunta para que me a respondas: Diga-me, por que a amas tanto e por que não elegeu alguém de maior santidade, riqueza e beleza para ti?

               O Senhor respondeu: Porque isto é o que a justiça demanda. Tu foste criado por mim e viste em mim toda justiça. Agora que ela escuta, diga-me, por que foi justo que tu caísses tão baixo e em que pensavas quando caíste?

               O demônio respondeu: Eu vi três coisas em ti: Vi tua glória e honra sobre todas as coisas e pensei em minha própria glória. Em minha soberba, estava disposto não só a igualar-te, mas ser ainda mais que ti. Segundo, vi que era o mais poderoso de todos e eu quis ser mais poderoso do que ti. Terceiro, vi o que havia de ser no futuro, e como tua glória e honra não tem nem princípio nem fim, invejei-te, e pensei que com gosto seria torturado eternamente com todo o tipo de castigos, se assim, te fizesse morrer. Com tais pensamentos caí e, assim, se criou o inferno.

               O Senhor acrescentou: Perguntaste-me por que amo tanto esta mulher. Asseguro-te, é porque Eu transformo em bondade toda tua maldade. Ao te tornares tão soberbo e não quererdes ter a mim, teu Criador, como a um igual, humilhando-me de todas as maneiras, reúno os pecadores comigo e me faço seu igual compartilhando minha glória com eles. Segundo, por este desejo tão baixo de querer ser mais poderoso que Eu, faço os pecadores mais poderosos que tu e compartilho com eles meu poder. Terceiro, pela inveja que me tens, estou tão cheio de amor que me ofereço a todos. Agora, pois, demônio – continuou o Senhor – teu coração de escuridão saiu da luz. Diz-me, enquanto ela escuta, quanto a amo.

               E o demônio disse: Se fosse possível, estarias disposto a sofrer em todos e cada um de teus membros a mesma dor que sofreste na cruz em vez de perdê-la.

               Então o Senhor replicou: Se sou tão misericordioso que não recuso perdoar a ninguém que me peça humildemente, pede-me tu mesmo misericórdia e Eu a darei.

               O demônio lhe respondeu: Isso não farei de nenhuma maneira! No momento de minha queda foi estabelecido um castigo para cada pecado, para cada pensamento ou palavra indigna. Cada um dos espíritos que caiu terá seu castigo. Mas antes de dobrar meu joelho ante ti, buscaria todos os castigos para mim enquanto minha boca possa abrir e fechar no castigo e o renovaria eternamente para ser castigado de novo.

               Então, o Senhor disse à sua esposa: Veja que endurecido está o príncipe do mundo e que poderoso é contra minhas graças, a minha oculta justiça! Tenha certeza de que poderia destruí-lo em um segundo por meio do meu poder, mas não lhe faço mais dano assim como a um bom anjo do Céu. Quando chegar seu tempo, e já está se aproximando, o julgarei e também a seus seguidores. Por isso, esposa minha, persevera nas boas obras! Ama-me com todo teu coração! Não temas a nada mais que a mim! Pois Eu sou o Senhor que está acima do demônio e de tudo que existe.

               Palavras da Virgem à esposa, explicando sua dor na paixão de Cristo, e sobre como o mundo foi vendido por Adão e Eva e recuperado mediante Cristo e sua Mãe, a Virgem.

               Falou Maria: Considera, filha, a Paixão de meu Filho. Senti como se os membros de seu corpo e seu coração fossem os meus. Da mesma forma como as outras crianças são normalmente geradas no útero de sua mãe, aconteceu em mim. Todavia, Ele foi concebido pelo ardor do amor de Deus, enquanto que outros são concebidos pela concupiscência da carne. Assim, seu primo João disse corretamente: ‘O verbo se fez carne’. Ele veio e esteve em mim por amor. O verbo e o amor o criaram em mim. Ele foi para mim como meu próprio coração e, por isso, quando dei à luz, senti que a metade de meu coração havia nascido e saído de mim. Quando Ele sofria, eu sentia como se sofresse meu próprio coração. Quando algo está metade fora e metade dentro, se a parte de fora está ferida, a parte de dentro sente uma dor parecida. Da mesma maneira, quando meu Filho foi açoitado e ferido, era como se meu próprio coração estivesse sendo açoitado e ferido. Eu era a pessoa mais próxima a Ele em sua Paixão e nunca me separei dele. Estive ao lado de sua cruz e, como quem está mais próximo da dor a sofre mais, assim sua dor foi pior para mim que para os demais. Quando ele me olhou da cruz e eu o olhei, minhas lágrimas brotaram de meus olhos como sangue das veias. Quando Ele me viu assoberbada de dor, se sentiu tão angustiado por minha dor que toda a dor de suas próprias feridas se atenuou ao ver a dor em mim. Por isso, posso dizer que sua dor era minha dor e que seu coração era meu coração. Da mesma forma como Adão e Eva venderam o mundo por um simples fruto, podemos dizer que meu Filho e Eu recuperamos o mundo com um só coração. Assim, Filha minha, pensa em como estava Eu quando morreu meu Filho e, com isso, não será difícil para você renunciar ao mundo.

               Resposta do Senhor a um Anjo que estava rezando, de que à esposa se dariam padecimentos no corpo e na alma e sobre como às almas mais perfeitas se dão maiores moléstias.

               O Senhor disse a um Anjo que rezava pela esposa de seu Senhor: És como um soldado do Senhor que nunca abandona seu posto por causa do tédio e que nunca aparta seus olhos da batalha por medo. És tão firme como uma montanha e ardes como uma chama. És tão limpo que não há mancha em ti. Pedes-me que tenha misericórdia de minha esposa. Mesmo que conheças e vejas tudo em mim, diga-me, enquanto ela escuta, que tipo de misericórdia estás pedindo para ela? Em resumo, a misericórdia é tripla. Existe a misericórdia, pela qual o corpo é castigado e a alma preservada, como ocorreu com meu servo Jó, cuja carne foi sujeita a todo tipo de dores, mas cuja alma se salvou.

            O segundo tipo de misericórdia é aquela mediante a qual o corpo e a alma são preservados como foi o caso do rei que viveu com todo tipo de luxos e não sentiu dores nem em seu corpo nem em sua alma enquanto esteve no mundo. O terceiro tipo de misericórdia é a que faz com que corpo e alma, sejam castigados resultando que ambos experimentam angústias em seu corpo e dor em seu coração, como é o caso de Pedro, Paulo e outros Santos. Há três estados para os seres humanos no mundo. O primeiro estado é daqueles que caem em pecado e se levantam de novo. Algumas vezes, permito que estas pessoas experimentem angústias em seu corpo para que se salvem. O segundo estado é o daqueles que vivem sempre com o objetivo de pecar. Todos os seus desejos se dirigem ao mundo. Se fazem algo por mim, muito de vez em quando, o fazem com a esperança de conseguir benefícios temporais de engrandecimento e prosperidade. A estas pessoas não se lhes dão muitas dores de corpo nem do coração. Permito que sigam com seu poder e desejos, porque eles receberão aqui sua recompensa até pelo mínimo bem que tenham feito por mim, pois lhes espera um castigo eterno, tanto como eterna é sua vontade de pecar. O terceiro estado é o daqueles que têm mais medo de pecar contra mim e de contrariar minha vontade do que do castigo em si. Antes, prefeririam o insuportável castigo eterno a provocar conscientemente minha ira. A estas pessoas, se lhes dão tribulações no corpo e no coração, como é o caso de Pedro, de Paulo e de outros Santos, de forma que corrijam suas transgressões neste mundo. Também são castigados, durante certo tempo, para merecerem uma glória maior, ou como exemplo para outros. Expliquei esta tríplice misericórdia aplicada a três pessoas deste reino cujos nomes tu conheces. Assim, pois, Anjo e servo meu, que tipo de misericórdia pedes para minha esposa?

               E ele disse: Misericórdia de corpo e alma, para que ela possa emendar suas transgressões neste mundo e nenhum de seus pecados se submeta a teu juízo.

               O Senhor respondeu: Faça-se segundo tua vontade!

            Então, dirigiu-se à esposa: És minha e farei contigo o que eu quiser. Não ames a nada mais do que a mim! Purifica-te constantemente do pecado em todo momento, segundo o conselho daqueles a quem te encomendei. Não ocultes nenhum pecado! Não deixes que fique nada sem examinar, não penses que nenhum pecado seja leve ou sem importância! Qualquer coisa que passe por despercebido, Eu te a recordarei e julgarei. Nenhum pecado teu será julgado por mim se for expiado nessa vida mediante tua penitência. Aqueles pecados pelos quais não se tenha feito penitência serão purgados, ou no purgatório ou por meio de algum dos meus juízos secretos, se caso ainda não tiver sido reparado aqui na Terra.

               Palavras da Mãe à esposa descrevendo a excelência de seu Filho; sobre como Cristo é agora mais duramente crucificado por seus inimigos, os maus cristãos do que pelos judeus e sobre como, em consequência, essas pessoas receberão um castigo mais duro e amargo.

               A Mãe disse: Meu Filho teve três qualidades. A primeira foi que ninguém jamais teve um corpo tão perfeito como Ele ao ter duas naturezas perfeitas, uma divina e outra humana. Ele foi tão puro como não se pode encontrar nenhum cisco em um olho cristalino; nenhuma só deformidade podia encontrar-se em seu corpo. A segunda qualidade foi que Ele nunca pecou. Outras crianças, às vezes, carregam os pecados de seus pais, além de seus próprios. Este menino, que nunca pecou, carregou o pecado de todos. A terceira qualidade foi que, enquanto algumas pessoas morrem por Deus e por uma maior recompensa, Ele morreu tanto por seus inimigos quanto por mim e seus amigos. Quando seus inimigos o crucificaram, fizeram-lhe quatro coisas. Em primeiro lugar, o coroaram de espinhos. Em segundo, cravaram suas mãos e pés. Terceiro, deram-lhe fel para beber e quarto transpassaram seu lado. Mas minha dor é que seus inimigos, que agora estão no mundo, crucificam meu Filho mais duramente do que fizeram os judeus. Mesmo assim, poderias dizer que Ele não pode sofrer e morrer agora, por isso o crucificam através de seus vícios. Um homem pode lançar insultos e injúrias sobre a imagem de um inimigo seu e, mesmo que a imagem não sentisse o dano, o perpetrador seria acusado e sentenciado por sua maliciosa intenção de injuriar.  Igualmente, os vícios pelos quais crucificam meu Filho, em um sentido espiritual, são mais abomináveis e mais sérios para Ele que os vícios de quem o crucificou no corpo. Mas você pode perguntar ‘Como o crucificam?’ Bem, primeiro o colocam sobre a cruz que prepararam para Ele, isto é, quando não têm em conta os preceitos de seu Criador e Senhor. Depois o desonram quando Ele os adverte através de seus servos, desprezando as advertências e fazem o que lhes apetece. Crucificam sua mão direita confundindo justiça e injustiça ao dizer: ‘O pecado não é tão grave nem odioso para Deus como se diz, nem Deus castiga ninguém para sempre, mas suas ameaças são para assustar-nos. Por que haveria de redimir-nos se quisesse que morrêssemos?’ Eles não consideram que até o mínimo pecado no qual uma pessoa se deleita é suficiente para entregar ele ou ela ao castigo eterno. Posto que Deus não deixa que nem o mínimo pecado fique sem castigo, nem o mínimo bem sem recompensa, eles serão castigados sempre que mantenham a intenção constante de pecar e meu Filho, que vê seus corações, conta isso como um ato. Pois, se meu Filho o permitisse, eles realizariam obras segundo suas intenções. Crucificam sua mão esquerda convertendo a virtude em vício. Querem continuar pecando até o fim, dizendo: Se, ao final, uma única vez dissermos: ”Deus tem misericórdia de mim”, a misericórdia de Deus é tão grande, que Ele nos perdoará”. O querer pecar sem emendar-se, querer a recompensa sem lutar por ela, não é virtude, a menos que haja algo de contrição em seu coração, ou ao menos que a pessoa deseje realmente emendar seu caminho, sempre que não o impeça uma enfermidade ou qualquer outra condição. Crucificam seus pés comprazendo-se no pecado, sem pensar, uma única vez, no amaríssimo castigo de meu Filho, nem dar-lhe graças de coração, dizendo: ‘Senhor, quão amargamente sofreste! Louvado sejas por tua morte!’ Tais palavras nunca saem de seus lábios. Coroam-no com uma coroa de escárnios ao zombar de seus servos e considerar inútil seu serviço. Dão a ele fel para beber quando se deleitam e se comprazem em pecar. Nunca sentem no coração quão sério e multifacetado é o pecado. Transpassam seu lado quando têm a intenção de perseverar no pecado. Digo-te, em verdade, e se o podes dizer a meus amigos, que para meu Filho essas pessoas são mais injustas que aquelas que o sentenciaram, piores inimigos que aqueles que o crucificaram, mais sem vergonha que aqueles que o venderam. A eles os espera maior castigo que aos outros. De fato, Pilatos supôs muito bem que meu Filho não tinha pecado e que não merecia a morte. Entretanto, por medo de perder o poder temporal e pela insistência dos judeus, ainda relutante, teve que sentenciar meu Filho à morte. Que temeriam estas pessoas que o serviram? Ou que honra ou privilégio perderiam se o honrassem? Eles receberão, pois, uma sentença mais dura por ser piores que Pilatos na consideração de meu Filho. Pilatos o sentenciou por medo, submetendo-se ao pedido e intenções de outros. Estas pessoas o sentenciam por seu próprio benefício e sem medo algum, desonrando-o pelo pecado do qual poderiam abster-se, se assim o quisessem. Mas eles não se abstêm de pecar nem se envergonham de terem cometido pecados, pois não percebem que não merecem nem a mínima consideração daquele a quem eles não servem. São piores que Judas, pois Judas, depois de ter traído o Senhor, reconheceu que Jesus era mesmo Deus e que havia pecado gravemente contra Ele. Desesperou-se, entretanto, e se precipitou ao inferno pensando que já não merecia viver. Mas estas pessoas reconhecem seu pecado e, ainda assim, perseveram nele, sem arrependimento em seus corações. No entanto, desejam arrebatar a Deus o Reino dos Céus por uma espécie de força e violência, crendo que o possam conseguir, não por seus feitos, mas por sua vã esperança, vã porque não se o dará a ninguém mais, que aos que trabalham e fazem algum sacrifício para o Senhor. São piores que os que o crucificaram. Quando viram as boas obras de meu Filho, como a ressurreição da morte ou a cura de leprosos, pensaram em seu interior: ‘Este opera maravilhas inauditas e inusitadas, superando facilmente a todos com uma só palavra, conhecendo nossos pensamentos, fazendo tudo o que deseja. Se continuar assim, teremos que nos submeter a seu poder e ser seus servos’. Por isso, em lugar de submeter-se a Ele, o crucificam com sua inveja. Mas se soubessem que Ele é o Rei da Glória, nunca o teriam crucificado. Por outro lado, essas pessoas veem cada dia suas grandes obras e milagres e se aproveitam de sua bondade. Escutam como têm que servi-lo e se acercam Dele, mas em seu interior pensam: ‘Seria duro e insuportável renunciar a nossos bens temporais para fazer sua vontade e não a nossa’. Por isso, desprezam a vontade Dele, colocam acima seus desejos egoístas e crucificam meu Filho por sua teimosia, acumulando pecado sobre pecado contra suas próprias consciências. São piores que seus carrascos, pois os judeus agiram por inveja e não sabiam que Ele era Deus. Estes, porem, sabem que é Deus e, por maldade, presunção e cobiça, o crucificam, em um sentido espiritual, mais duramente que os que crucificaram fisicamente seu corpo, pois estas pessoas já foram redimidas e aquelas ainda não eram. Assim, pois, esposa, obedece e teme a meu Filho, pois tudo o que Ele tem de misericordioso Ele tem também de justo!

               Agradável diálogo de Deus Pai com o Filho sobre como o Pai deu ao Filho uma nova esposa; sobre como o Filho a tomou carinhosamente para si e sobre como o Esposo ensina à esposa a paciência e a simplicidade mediante uma parábola.

               O Pai disse ao Filho: Acudi com amor a Virgem e recebi dela teu verdadeiro corpo. Tu, portanto, estás em mim e Eu em ti. Assim como o fogo e o calor nunca estão separados, também é impossível separar tua natureza divina e humana.

               O Filho respondeu: Glória e honra a ti, Pai! Faça-se tua vontade em mim e a minha em ti!

               O Pai, por sua vez, acrescentou: Olha, Filho meu, confio-lhe esta nova esposa como um cordeiro que deve ser guiado e alimentado. Como um pastor, então, deves procurar queijo para comer, leite para beber e lã para vestir. Quanto a você, esposa, tens que obedecer-lhe. Tens três deveres: deves ser paciente, obediente e alegre.

               Então, o Filho disse ao Pai: Tua vontade vem com poder, teu poder com humildade, tua humildade com sabedoria, tua sabedoria com misericórdia. Que tua vontade, que é e sempre será sem princípio nem fim, se faça em mim! A ela, abrirei as portas de meu amor em teu poder e na inspiração do Espírito Santo, pois somos, não três, mas um só Deus.

               Então, o Filho disse à sua esposa: Ouviste como o Pai te confiou a mim como um cordeiro. Por isso, deves ser simples e paciente como um cordeiro e produzir alimento e vestido. Há três grupos de pessoas no mundo. O primeiro está completamente nu, o segundo sedento e o terceiro faminto. Os primeiros equivalem a fé de minha Igreja, que está nua porque todos se envergonham de falar sobre a fé e meus mandamentos. E se alguém fala, é desprezado e chamado de mentiroso. Minhas palavras, procedentes de minha boca, hão de vestir esta fé como a lã. Assim como a lã cresce no corpo da ovelha mediante o calor, também minhas palavras hão de entrar em teu coração através do calor de minhas naturezas divina e humana. Elas vestirão minha santa fé em um testemunho de verdade e sabedoria e demonstrarão que, o que agora é considerado insignificante, é verdadeiro. Como resultado, as pessoas que até agora têm sido tíbias sobre o vestir sua fé em obras de amor, se converterão quando ouvirem minhas palavras de amor e serão reanimadas para falar com fé e atuar com coragem. O segundo grupo equivale a aqueles amigos meus que possuem um sedento desejo de ver minha honra reposta e se entristecem quando sou desonrado. A doçura que sentem com minhas palavras os embriagará com um maior amor por mim e, junto a eles, outros, que agora estão mortos, se reinflamarão no meu amor, quando ouvirem sobre a misericórdia que tenho demonstrado com os pecadores. O terceiro grupo de pessoas são aqueles que, em seu coração, pensam assim: ‘Se ao menos soubéssemos – dizem – a vontade de Deus e de que maneira temos que viver e se ao menos nos ensinasse a forma correta de viver, com muito gosto faríamos o que pudéssemos’. Estas pessoas estão famintas de conhecer meu caminho, mas ninguém as satisfaz, pois ninguém lhes mostra exatamente o que devem fazer. Mesmo se alguém o mostra, ninguém vive de acordo com ele. Portanto, as palavras parecem estar como mortas para elas, pois ninguém vive de acordo com elas. Por isso, Eu lhes mostrarei diretamente o que devem fazer e as encherei com minha doçura. As coisas temporais, que parecem as mais desejadas por todos agora, não podem satisfazer a natureza humana a não ser melhor avivar o desejo de buscar mais e mais coisas. Minhas palavras e meu amor, entretanto, satisfazem os homens e os enchem de abundante consolação. Por isso, esposa minha, que és uma das minhas ovelhas, cuida-te de manter a paciência e a obediência. És minha por direito e, por isso, deves seguir minha vontade. Uma pessoa que deseja seguir a vontade de outra faz três coisas: primeiro, tem o mesmo pensamento que a outra, segundo, age de forma similar, terceiro, se mantém longe dos inimigos da outra. Quem são meus inimigos senão o orgulho e cada um dos pecados? Por isso, mantem-te longe deles se desejas seguir minha vontade”.

               Sobre como a fé a esperança e a caridade se acharam perfeitamente em Cristo no momento de sua morte e deficientemente em nós.

            Eu tive três virtudes em minha morte. Primeiro, fé, quando dobrei meus joelhos e rezei, sabendo que o Pai podia livrar-me de meus sofrimentos. Segundo, esperança, quando perseverei resolutamente dizendo: ‘Não se faça a minha vontade’. Terceiro, caridade, quando disse: ‘Faça-se tua vontade!’ Também padeci agonia física devido ao temor natural de sofrer e um suor de sangue emanou do meu corpo. Por isso, para que meus amigos não temam ser abandonados quando lhes chegar o momento da prova, Eu lhes demonstrei em mim que a débil carne sempre trata de escapar da dor. Poderias perguntar, talvez, como foi que meu corpo segregou um suor de sangue. Bem, da mesma forma em que o sangue de uma pessoa enferma se resseca e se consome em suas veias, meu sangue se consumiu pela angústia natural da morte. Querendo mostrar a maneira em que o Céu se abriria e como as pessoas poderiam entrar nele depois de seu exílio, o Pai amorosamente entregou-me à minha Paixão para que meu corpo fosse glorificado, uma vez que a paixão se tinha consumado. Porque minha natureza humana não podia simplesmente entrar em sua glória sem sofrer, apesar de que Eu fui capaz de fazê-lo mediante o poder de minha natureza divina. Por que, então, as pessoas com pouca fé, vãs esperanças e sem amor, mereceriam entrar em minha glória? Se tivessem fé no gozo eterno e no terrível castigo, não desejariam nada mais que a mim. Se elas realmente cressem que Eu vejo todas as coisas e tenho poder sobre todas as coisas e que exijo um juízo para cada uma, o mundo lhes resultaria repugnante e não ousariam pecar na minha presença por temor a mim e não pela opinião humana. Se tivessem uma firme esperança, todo seu pensamento e entendimento se dirigiriam até mim. Se tivessem amor divino, suas mentes pensariam, ao menos, sobre o que fiz por eles, os esforços que fiz ao ensinar, a dor que padeci em minha Paixão, o grande amor que tive ao morrer, tanto que preferi morrer antes que perdê-los. Mas sua fé é débil e vacilante, apontando a uma queda fulminante, porque estão dispostos a crer quando estão ausentes dos impulsos da tentação, mas perdem confiança quando se veem de frente com a adversidade. Sua esperança é vã, porque esperam que seu pecado seja perdoado sem um juízo e sem uma correta sentença. Confiam que podem conseguir o Reino dos Céus gratuitamente. Desejam receber minha misericórdia sem a atuação da justiça. Seu amor para comigo é frio, pois nunca se põem a buscar-me ardentemente a menos que se sintam forçados pela tribulação. Como vou compadecer-me das pessoas que nem sustentam uma fé reta nem uma firme esperança nem uma fervente caridade por mim? Por isso, quando me implorarem e disserem: ‘Senhor, tem piedade de mim!’, não merecerão ser ouvidas nem entrar na minha glória. Se não querem acompanhar o seu Senhor no sofrimento não o acompanharão na glória. Nenhum soldado pode agradara a seu Senhor e ser bem recebido de novo, depois de um deslize, a menos que primeiro se humilhe para reparar sua ofensa.

               Palavras nas quais o Criador apresenta três perguntas de Graça à sua esposa: a primeiro sobre a servidão do marido e a dominação da mulher; a segunda sobre o trabalho do esposo e o gasto da esposa; a terceira sobre o Senhor desprezado e o servo exaltado.

            Eu sou teu Criador e Senhor. Responde-me a três perguntas que te vou apresentar. Qual é a situação em uma casa em que a esposa está vestida como uma grande senhora e o esposo como um servo? É correto isso?”

               Ela respondeu interiormente em sua consciência: Não, meu Senhor, isso não está bem.

               E o Senhor disse: Eu sou o Senhor de todas as coisas e o Rei dos Anjos. Eu me vesti de servo, ou seja, a minha natureza humana, tão somente visando à utilidade e a necessidade. Não desejei nada do mundo, a não ser um mero alimento e roupa. Tu, entretanto, que és minha esposa, queres igualar-te a uma grande senhora, com riquezas e honras, ser exaltada. Qual é o benefício de tudo isso? Todas as coisas são vaidades e todas as coisas devem ser abandonadas. A humanidade não foi criada para essa frivolidade, senão para possuir o que necessita a natureza. O orgulho inventou o supérfluo que agora se mantém e se deseja como o normal.

            Em segundo lugar, diga-me, é correto que o marido trabalhe desde a manhã até a noite enquanto a mulher gasta em uma hora tudo o que ele conseguiu com seu esforço?”

               Ela respondeu: Não, não é correto. Ao contrário, a esposa deve viver e atuar seguindo a vontade de seu esposo.

               E o Senhor disse: Eu trabalhei como o homem que trabalha de manhã até a noite. Trabalhei desde minha juventude até o momento de meu sofrimento, mostrando o caminho para o Céu, pregando e pondo em prática o que pregava. A esposa, ou seja, a alma humana que deveria ser como minha mulher, gasta todo meu salário em viver luxuosamente. Como consequência, de nada do que fiz se pode beneficiar, nem encontro nela virtude alguma em que deleitar-me.

            Terceiro, diga-me, não é errado e detestável para o senhor do lar ser desprezado sendo o servo exaltado?

               E ela disse: Sim, é verdade.

               E o Senhor disse: Eu sou o Senhor de todas as coisas. Meu lar é o mundo. Todos os membros da humanidade deveriam estar a meu serviço. Entretanto, Eu, o Senhor, agora sou desprezado no mundo, enquanto que a humanidade é exaltada. Portanto, tu, a quem Eu elegi, cuide de cumprir minha vontade, porque tudo no mundo não é mais que uma brisa do mar e um falso sonho!

               Palavras do Criador na presença da Corte Celeste e de sua esposa, nas quais que se queixa dos cinco homens que representam o Papa e seus clérigos, os leigos corruptos, os judeus e os pagãos. Também sobre a ajuda enviada aos seus amigos que representam toda a humanidade e sobre a dura condenação de seus inimigos.

            Eu sou o Criador de todas as coisas. Nasci do Pai antes que existisse Lúcifer. Existo inseparavelmente no Pai e o Pai em mim e há um Espírito em ambos. Por conseguinte, há um Deus – Pai, Filho e Espírito Santo – e não três Deuses. Eu sou Aquele que fiz a promessa da herança eterna a Abraão e conduzi meu povo para fora do Egito através de Moisés. Eu sou o que falei através dos Profetas. O Pai me colocou no ventre da Virgem sem se separar de mim, permanecendo comigo inseparavelmente para que a humanidade, que abandonou Deus, possa retornar a Deus através do meu amor. Agora, entretanto, em vossa presença, Corte Celeste, apesar de que vedes e sabeis tudo de mim, pelo bem do conhecimento e a instrução desta desposada minha que não pode perceber o espiritual se não por meio do físico, Eu declaro meu pesar ante vós em relação aos cinco homens aqui presentes, por serem eles ofensivos para mim de muitas maneiras. Da mesma forma que Eu, em uma ocasião, incluí todo o povo israelita no nome de Israel, na Lei, agora mediante estes cinco homens, me refiro a todos no mundo. O primeiro homem representa o líder da Igreja e seus sacerdotes; o segundo, os leigos corruptos; o terceiro, os judeus, o quarto os pagãos e o quinto, meus amigos. E o que diz respeito a ti, judeu, tenho feito uma exceção com todos os judeus que são cristãos em segredo e que me servem em caridade sincera, conforme a fé e em seus trabalhos perfeitos em segredo. Em relação a você, pagão, tenho feito uma exceção com todos aqueles que com gosto caminhariam pelas sendas de meus mandamentos se tão somente soubessem como e se fossem instruídos, os que tratam de pôr em prática tudo o que podem e do que são capazes. Estes, não serão, de nenhuma maneira, sentenciados convosco. Agora declaro meu desgosto para contigo, cabeça de minha Igreja, tu que te sentas em minha cátedra. Concedi este cargo a Pedro e a seus sucessores para que se sentassem com uma tripla dignidade e autoridade: primeiro, para que pudessem ter o poder de ligar e desligar as almas do pecado; segundo, para que pudessem abrir o Céu aos penitentes; terceiro, para que fechassem o Céu aos condenados e àqueles que me desprezam. Mas tu, que deverias estar absolvendo almas e me as oferecendo, és realmente um assassino das minhas almas. Designei Pedro como pastor e servo de minhas ovelhas, mas tu as dispersas e as feres, és pior que Lúcifer. Ele tinha inveja de mim e não perseguiu para matar ninguém mais que a mim, de forma que pudesse governar em meu lugar. Mas tu és o pior, porque não só me matas ao apartar-me de ti por teu mau trabalho senão que, também, matas as almas devido ao teu mau exemplo. Eu redimi almas com meu sangue e te as recomendei como a um amigo fiel. Mas tu as devolves ao inimigo do quais eu as resgatei, és mais injusto que Pilatos. Ele tão somente me condenou à morte. Mas tu não somente me condenas como se Eu fosse um pobre homem indigno, como também condenas as almas de meus eleitos e deixas livres os culpados. Mereces menos misericórdia que Judas. Ele tão somente me vendeu, mas tu, não só me vendes como também vendes as almas de meus eleitos com base em teu próprio proveito e vã reputação. Tu és mais abominável que os judeus. Eles tão somente crucificaram meu corpo, mas tu crucificaste e castigaste as almas de meus eleitos para quem tua maldade e transgressão são mais afiadas que uma espada. Assim, posto que és como Lúcifer, mais injusto que Pilatos, menos digno de misericórdia que Judas e mais abominável que os judeus, meu aborrecimento contigo está justificado.

            O Senhor disse ao segundo homem, ou seja, o que representa os leigos: Eu criei todas as coisas para teu uso. Tu me deste teu consentimento e Eu a ti. Prometeste-me tua fé e me juraste que me servirias. Agora, entretanto, te separaste de mim como alguém que não conhece a Deus. Referes-te às minhas palavras como mentiras e a meus trabalhos como carentes de sentido. Dizes que minha vontade e meus mandamentos são muito duros. Tens violado a fé que me prometeste. Destruíste teu juramento e abandonaste meu Nome. Tens te afastado a ti mesmo da companhia de meus Santos e te integraste na companhia dos demônios fazendo-te sócio deles. Tu não crês que ninguém mereça louvor e honra a não ser tu mesmo. Consideras difícil tudo o que tem a ver comigo e o que estás obrigado a fazer por mim, enquanto que as coisas que gostas de fazer são fáceis para ti. É por isso que meu aborrecimento contigo está justificado, porque quebraste a fé que me prometeste no batismo e depois dele. Alem disso, me acusas de mentir sobre o amor que te mostrei por palavra e através de fatos. Disseste que eu era um louco por sofrer.

            Ao terceiro homem, ou seja, o representante dos judeus, disse-lhe: Eu comecei meu amoroso idílio contigo. Eu te elegi como meu povo, libertei-te da escravidão, dei-te minha Lei e conduzi-te até a Terra que havia prometido a teus pais e te enviei profetas que te consolaram. Depois, elegi uma Virgem dentre vós e tomei dela, a natureza humana. Meu desgosto contigo é que ainda recusas crer em mim dizendo: “Cristo não veio, mas, ainda virá.

            O Senhor disse ao quarto homem, ou seja, aos pagãos: Eu te criei e o te redimi para que fosses cristão. Fiz para ti todo o bem. Mas tu és como alguém que está fora de seus sentidos, porque não sabes o que fazes. És como um cego, porque não sabes para onde vais. Adoras as criaturas em lugar do Criador, a falsidade em lugar da verdade. Ajoelhas diante das coisas que são inferiores a ti. Esta é a causa do meu desgosto em relação a ti”. Ao quinto homem, disse: “Aproxima-te mais, amigo!” E se dirigiu diretamente à Corte Celestial: “Queridos amigos, este amigo meu representa meus muitos amigos. Ele é como um homem cercado por corruptos e mantido em um duro cativeiro. Quando diz a verdade, atiram pedras em sua boca. Quando faz algo bom, cravam uma lança em seu peito. Ai! Meus amigos e santos! Como posso suportar essas pessoas e quanto tempo suportarei semelhante desprezo?

               São João Batista respondeu: És como um espelho imaculado. Vemos e sabemos todas as coisas em ti como em um espelho, sem necessidade de palavras. És a doçura incomparável na qual saboreamos todo o bem. É como a mais afiada das espadas e um Justo Juiz.

               O Senhor lhe respondeu: Amigo meu, o que disse é certo. Meus eleitos veem toda a bondade e justiça em mim. Os espíritos diabólicos ainda o fazem, mesmo que não na luz mas em sua própria consciência. Como um homem na prisão, que aprendeu as letras e ainda as conhece quando as encontra na escuridão e não as vê; os demônios, apesar de não verem minha justiça à luz da caridade, ainda assim, conhecem e veem em sua consciência. Eu sou como uma espada que corta em dois. Eu dou a cada pessoa o que ele ou ela merecem.

Então, o Senhor acrescentou, falando ao Bem-Aventurado Pedro: Tu és o fundador da fé e da minha Igreja. Enquanto o escuta meu exército, declara a sentença desses cinco homens!

               Pedro respondeu: Glória e honra a Ti, Senhor, pelo amor que tens demonstrado à Terra! Que toda tua Corte te bendiga, porque tu nos fazes ver e saber em Ti tudo o que é e o que será! Vemos e sabemos tudo em Ti. É verdadeiramente justo que o primeiro homem, o que se senta em tua cátedra e realiza os feitos de Lúcifer, vergonhosamente deva renunciar a esse lugar no qual presumiu sentar-se e compartilhar o castigo de Lúcifer. A sentença do segundo homem é que aquele que abandonou a fé deve descer ao inferno com a cabeça para baixo e os pés para cima, por ter desprezado a Ti, que deveria ser sua cabeça e por ter amado a si mesmo. A sentença do terceiro é que não verá teu rosto e será condenado por sua perversidade e avareza, posto que os que não creem não merecem contemplar a tua visão. A sentença do quarto é que deveria ser encerrado e confinado na escuridão como um homem fora de seus sentidos. A sentença do quinto é que deverá receber ajuda.

               Quando o Senhor ouviu isto, respondeu: Prometo por Deus, o Pai, cuja voz ouviu João Batista no Jordão, que farei justiça a esses cinco.

               Depois, o Senhor continuou e dizendo ao primeiro dos cinco homens: A espada de minha severidade atravessará teu corpo, entrando desde o alto de sua cabeça e penetrando tão profundo e firmemente que nunca poderá ser retirada. Tua cadeira se afundará como uma pedra pesada e não parará até que alcance a parte mais baixa das profundezas. Teus dedos, ou seja, teus conselheiros arderão em um fogo sulfuroso e inextinguível. Teus braços, ou seja, teus vigários, que deveriam ter conseguido o benefício das almas, mas que em seu lugar conseguiram proveitos mundanos e honras, serão sentenciados ao castigo de que fala Davi: ‘Que seus filhos fiquem órfãos e sua mulher viúva, que os estranhos arrebatem sua propriedade’. Que significa ‘sua mulher’ senão a alma que foi separada da glória do Céu e que ficará viúva de Deus? ‘Seus filhos’, ou seja, as virtudes que aparentaram possuir e minha gente simples, aqueles que se submeteram, serão separados deles. Sua classe e propriedade cairão nas mãos de outros e eles herdarão a eterna vergonha em lugar de sua posição privilegiada. Suas mitras afundarão no barro do inferno e eles mesmos nunca se levantarão dali. Por isso, a honra e o orgulho que alcançaram sobre outros aqui na terra os afundarão no inferno tão profundamente, mais que os demais e será impossível levantar-se. Suas extremidades, ou seja, todos os sacerdotes aduladores que os assessoram, serão separados deles e ilhados, como uma parede que se derruba, na qual não ficará pedra sobre pedra e o cimento já não irá aderir às pedras. A misericórdia nunca lhes chegará, porque meu amor nunca lhes aquecerá nem lhes recolocará na eterna Mansão Celestial. Em seu lugar, despojados de todo bem, serão eternamente atormentados junto aos seus líderes. Ao segundo homem, Eu lhe digo: Dado que tu não queres manter-te na fé que me prometeste nem manifestar amor para comigo, te enviarei um animal que procederá da torrente impetuosa para devorar-te. E, como uma torrente que sempre corre para baixo, o animal te levará às partes mais baixas do inferno. Tão impossível como é para ti viajar corrente acima contra uma torrente impetuosa, igualmente será difícil para ti subir do inferno. Ao terceiro homem, eu digo: ‘Já que tu, judeu, não queres crer que Eu já vim, quando eu voltar para o segundo juízo, não me verás em minha glória senão em tua consciência e comprovarás que tudo o que lhe disse era verdade. Então, te será aplicado o castigo como mereces’. Ao quarto homem, digo: ‘Como tu não te ocupaste de crer nem quiseste saber, tua própria escuridão será tua luz e teu coração será iluminado para que compreendas que meus juízos são verdadeiros, mas, entretanto, tu não alcançarás a luz’. Ao quinto homem, lhe digo: ‘Farei três coisas por ti. Primeiro, te encherei internamente com meu calor. Segundo, farei com que tua boca seja mais forte e mais firme que qualquer pedra, de modo que as pedras que te sejam arremessadas voltem a quem as atirou. Terceiro, te armarei com minhas armas, de forma que, nenhuma lança te ferirá senão que tudo cederá diante de ti como a cera frente ao fogo. Portanto, permaneça forte e resista como um homem! Como um soldado que, na guerra, espera a ajuda de seu Senhor e luta enquanto tiver fluido de vida, assim também tu mantenhas-te firme e luta! O Senhor, teu Deus, aquele a quem ninguém pode resistir, te ajudará. E, como sois poucos em número, vos honrarei e vos converterei em muitos. Vejam, amigos meus, vejam estas coisas e as reconheçam em mim e, por isso, mantenham-se diante mim’. As palavras que agora pronunciei se cumprirão. Aqueles homens nunca entrarão em meu Reino enquanto eu for o Rei, a menos que emendem seus caminhos. Porque o Céu não será senão para aqueles que se humilham e fazem penitência”. Então, toda a Corte respondeu: “Glória a Ti, Senhor Deus, que não tens princípio nem fim!

               Palavras da Virgem Maria aconselhando a esposa como deve amar a seu Filho sobre todas as coisas e sobre como cada virtude e graça está contida na Virgem Gloriosa.

               A Mãe falou: Eu tinha três virtudes pelas quais agradei meu Filho. Tinha tanta humildade que nenhuma criatura, Anjo ou ser humano, era mais humilde que Eu. Em segundo lugar, eu tinha obediência pela qual me esforcei em obedecer a meu Filho em todas as coisas. Em terceiro lugar, tinha uma grande caridade. Por esta razão, recebi honras tríplice de meu Filho. Primeiro, se me deu mais honra que aos Anjos e aos Homens, de forma que não há virtude em Deus que não se irradie de mim, apesar de que Ele é a fonte e o Criador de todas as coisas. Mas eu sou a criatura a qual Ele garantiu a Graça principal em comparação com as demais. Segundo, em razão da minha obediência, recebi tal poder que, não há pecador, por manchado que esteja, que não receba o perdão se voltar-se a mim com o propósito de emenda e coração contrito. Terceiro, em razão de minha caridade, Deus se aproximou tanto de mim que, qualquer um que veja Deus, vê a mim e, qualquer um que me veja pode ver a natureza divina e humana em mim e eu em Deus como se fosse um espelho. Porque quem vê a Deus vê três pessoas nele, e quem me vê, vê como se fosse três pessoas. Porque Deus me aproximou em alma e corpo de Si Mesmo e me cumulou de toda virtude, de maneira que não há virtude em Deus que não brilhe em mim, apesar de que Deus é o Pai e o doador de todas as virtudes. Como se tratasse de dois corpos conjugados – um recebe o que recebe o outro – assim fez Deus comigo. Não existe doçura que não esteja em mim. É como alguém que tem uma noz e compartilha um pedaço com outra pessoa. Minha alma e corpo são mais puros que o sol e mais limpos que um espelho. Por isso, assim como as Três Pessoas se veriam em um espelho se se situassem frente a ele, assim o Pai e o Filho e o Espírito Santo podem ver-se em minha pureza. Uma vez tive meu Filho em meu ventre e junto à sua natureza divina. Agora, Ele há de se ver em mim com suas duas naturezas, Divina e Humana, como em um espelho, porque eu fui glorificada. Por isso, esposa de meu Filho, procure imitar minha humildade e não ames nada mais que meu Filho.

               Palavras do Filho à esposa sobre como as pessoas se elevam de um pequeno bem ao bem perfeito e se afundam de um pequeno mal ao maior castigo.

               O Filho disse: Às vezes, surge um grande benefício a partir de um pequeno bem. A palmeira possui um odor maravilhoso e dentro de seu fruto, a tâmara, há como uma pedra. Se esta semente for plantada em um solo fértil, brotará e florescerá, crescendo até converter-se em uma altíssima árvore. Mas se plantar em solo estéril, secará. O solo que se deleita no pecado é absolutamente estéril, carente de bens. Se semeamos aí a semente das virtudes, elas não poderão nascer. Rico é o solo da mente que conhece seu pecado e se lamenta de tê-lo cometido. Se a ‘pedra’ da tâmara, ou seja, o pensamento de meu severo juízo e poder, se semear aí, surgirão três raízes na mente. A primeira raiz é o dar-se conta de que uma pessoa não pode fazer nada sem minha ajuda. Isto lhe fará abrir a boca para pedir-me. A segunda raiz é começar a encomendar-me a algumas almas pequenas pelo bem do meu Nome. A terceira raiz é retirar-se dos próprios assuntos para servir-me. A pessoa, então, começa a praticar a abstinência, o jejum e a negação de si mesma: isso é o tronco da árvore. Depois, vão crescendo os ramos da caridade à medida que um conduz ao bem todos os que podem. Posteriormente, cresce o fruto quando instrui a outros segundo seu conhecimento e, piedosamente, trata de ensinar maneiras de dar-me uma maior glória. Esse tipo de fruto é o mais prazeroso para mim. Desta forma, a partir de um pequeno começo, um se eleva até a perfeição. Enquanto a semente forma a raiz no princípio mediante a piedade, o corpo cresce por meio da abstinência, os ramos se multiplicam por meio da caridade e o fruto cresce através da oração. E, de igual maneira, uma pessoa se afunda a partir de um leve mal que a leva à condenação e ao castigo. Sabes qual é a carga mais pesada que impede que as coisas cresçam? Com certeza é a carga de um menino que está a ponto de nascer, mas que não pode sair e morre no ventre da mãe, e a mãe sofre uma hérnia da qual morre, e o pai a leva ao túmulo com a criança dentro e a enterra com a matéria putrefata. Isto é o que faz o demônio com a alma. A alma imoral é como a esposa do demônio que se submete à sua vontade em tudo. Ela concebe o filho pelo demônio ao obter prazer no pecado e regozijar-se nele. Assim como uma mãe concebe e gera o fruto mediante uma pequena semente que é quase insignificante, igualmente, deleitando-se no pecado, a alma dá muito fruto ao demônio. Posteriormente, a força e os membros do corpo se vão formando à medida que se junta pecado sobre pecado, e aumenta cada dia. A mãe se incha com o aumento dos pecados, quer dar a luz, mas não pode, porque sua natureza se consumiu pelo pecado e se cansou da vida. Ela teria preferido continuar pecando, mas não pode, e Deus não o permite. Então, o medo se faz presente porque ela não pode realizar seu desejo. A força e a alegria acabam e ela se vê rodeada de preocupações e pesares. Então, seu ventre arrebenta e ela perde a esperança de fazer o bem. Morre enquanto blasfema e renega a justiça divina. E, assim, é conduzida pelo pai, o demônio, até o sepulcro do inferno onde ela permanece enterrada para sempre com a podridão de seu pecado e com o filho de seu depravado deleite. Vês assim, como um pecado pequeno de início, chega a aumentar e crescer até a condenação.

               Palavras do Criador à esposa sobre como Ele é agora desprezado e ultrajado por pessoas que não prestam atenção ao que fez por amor, ao aconselhar-lhes mediante os profetas e mediante seu próprio sofrimento para sua salvação. Também sobre como ignoram o castigo que Ele dirigiu aos obstinados, corrigindo-lhes severamente.

            Eu sou o Criador e Senhor de todas as coisas. Eu fiz o mundo e o mundo me evita. Ouço no mundo um ruído parecido ao das abelhas que acumulam mel sobre a terra. Quando a abelha está voando e começa a pousar emite um zumbido. Agora, ouço como uma voz que zumbe no mundo e que diz: Não me importa! De fato, a humanidade não presta atenção nem se preocupa com o que fiz por amor, aconselhando-se mediante os profetas, pelo meu próprio ensinamento e mediante meu sofrimento por eles. Não lhes importa o que fiz em minha ira, ao corrigir os malvados e desobedientes. Só veem que são mortais e se sentem inseguros sobre a morte, mas não os preocupa. Ouvem e veem a justiça que infligi ao Faraó e a Sodoma devido ao pecado e ao que se aplicou sobre outros reis e princesas, permitindo-a diariamente mediante a espada e outras desgraças, mas parece que estão cegos diante de tudo isso. Assim como as abelhas, voam por onde querem. De fato, às vezes, voam como se disparassem para o alto, quando se exaltam a si mesmos pelo orgulho, mas, em seguida, caem de novo rapidamente quando voltam a sua luxúria e a sua gula. Reúnem mel da terra para si mesmos, fatigando-se e acumulando para si, premidas pela necessidade do corpo, mas não para a alma. Buscam o terreno mais que a honra eterna. Convertem o que é passageiro em um auto-castigo, o inútil em tormento eterno. Entretanto, pela intercessão de minha Mãe, enviarei minha voz clara a essas abelhas, exceto a meus amigos que se encontram no mundo somente em corpo, e isso requererá misericórdia. Se me atenderem, se salvarão.

               Resposta da Mãe, dos Anjos, dos Profetas, dos Apóstolos e dos demônios a Deus, na presença da esposa, testemunhando sua grandeza na Criação, Encarnação e Redenção; sobre como as pessoas contradizem hoje todas estas coisas e também acerca de seu severo juízo sobre eles.

               A Mãe de Deus disse: Esposa de meu Filho, veste-te e permanece firme porque meu Filho se acerca de ti. Saiba que sua carne foi espremida como a uva em um lagar, pois, como o homem pecou com todos os membros do seu corpo, meu Filho realizou a expiação em todos os membros de seu Corpo. Os cabelos Dele foram arrancados, seus tendões distendidos, suas articulações desencaixadas, seus ossos deslocados, suas mãos e pés completamente perfurados. Sua mente foi agitada, seu coração afligido pela dor, seu estômago absorvido até as costas e tudo isso porque a humanidade havia pecado com cada membro de seu corpo.

Então, o Filho, na presença da Corte Celeste disse: Ainda que todos saibam, falo para esta esposa minha que está aqui. A vós me dirijo, Anjos, dizei-me: Quem é que não teve princípio nem terá fim? E quem é que criou todas as coisas e não foi criado por ninguém? Falem e deem testemunho.

               Responderam os Anjos todos a uma voz: Senhor, esse és Tu e damos testemunho de três coisas: Primeiro, de que és nosso Criador e de tudo o que há no Céu e na Terra. Segundo, de que eras e será sem princípio, teu domínio é sem fim e teu poder eterno. Nada foi feito sem ti e sem ti nada pode existir. Em terceiro lugar, testemunhamos que vemos em ti toda justiça além de tudo o que foi e será. Todas as coisas são presentes para ti, sem princípio nem fim.

               Depois, disse aos Profetas e Patriarcas: Quem os conduziu da escravidão à liberdade? Quem dividiu as águas diante de vós? Quem vos deu a Lei? Profetas, quem vos deu a inspiração para falar?

               Eles responderam: Tu, Senhor. Tu nos tiraste da escravidão. Tu nos deste a Lei. Tu inspiraste nosso espírito para falar.

            Depois, disse à sua Mãe: Dá verdadeiro testemunho de tudo o que sabes de mim!

               Ela respondeu: Antes que o Anjo que me enviaste viesse a mim, eu estava só em corpo e alma. Quando foram pronunciadas as palavras do Anjo, teu corpo esteve dentro de mim em suas naturezas, divina e humana, e senti teu Corpo em meu corpo. Gerei-Te sem dor. Dei-Te à luz sem angústia. Envolvi-Te em panos e Te alimentei com meu leite. Estive contigo desde o teu nascimento até a tua morte.

               Então, o Senhor disse aos Apóstolos: Dizei a quem vistes, ouvistes e percebestes com vossos sentidos!

               Eles lhe responderam: Ouvimos estas palavras e as escrevemos. Ouvimos tuas palavras prodigiosas quando nos deste a Nova Lei, quando, com uma palavra, deste ordem aos demônios e eles saíram, quando, com uma palavra, ressuscitaste os mortos e curaste os enfermos. Vimos-Te em um corpo humano. Vimos teus milagres e a glória divina de tua natureza humana. Nós Te vimos sendo preso por teus inimigos e pregado em uma Cruz. Nós Te vimos sofrer da maneira mais amarga e, depois, ser colocado em um sepulcro. Nós te percebemos com nossos sentidos quando ressuscitaste. Tocamos teu cabelo e teu rosto. Tocamos teus membros e tuas partes chagadas. Tu comeste conosco e compartilhaste nossa conversa. Tu és verdadeiramente o Filho de Deus e o Filho da Virgem. Também Te percebemos com nossos sentidos quando subiste, em tua natureza humana, à direita do Pai, onde estás eternamente.

               Depois, disse Deus aos espíritos imundos: Ainda que, em vossas consciências ocultais a verdade, ordeno que digais quem foi que diminuiu vosso poder. Eles lhe responderam: Como ladrões que não dizem a verdade, a menos que tenham os pés presos em um duríssimo madeiro, nós não diríamos a verdade se não fôssemos forçados por Teu tremendo e divino poder. Tu és quem desceu ao inferno com toda tua força. Tu diminuíste nosso poder no mundo. Levaste do inferno o que te correspondia por próprio direito”. Então o Senhor disse: “Deem conta, todos os que têm um espírito e não estão envolvidos por um corpo, declaro seu testemunho da verdade diante de mim. Mas aqueles que têm um espírito e um corpo, ou seja, os seres humanos me contradizem. Alguns deles conhecem a verdade, mas não se importam. Outros não a conhecem e por isso dizem que não lhes importa e afirmam que tudo é falso.

               Ele disse novamente aos Anjos: Os seres humanos dizem que vosso testemunho é falso, que eu não sou o Criador e que nem todas as coisas se conhecem em mim. Portanto, amam mais a criação do que a mim.

               Ele disse aos Profetas: Os homens vos contradizem e dizem que a Lei não tem sentido, que vós ganhastes liberdade graças a vossa própria coragem e capacidade, que o Espírito era falso e que vós faláveis por própria vontade.

               À sua Mãe, disse: Alguns dizem que Tu não és Virgem, outros que Eu não me encarnei em ti, outros conhecem a Verdade, mas não se importam com ela.

               Aos Apóstolos, lhes disse: Os contradizem dizendo que sois mentirosos, que a Nova Lei é inútil e irracional. Há outros que creem que é verdadeira, mas não se importam com ela. Agora, pois, Eu pergunto: Quem será seu juiz?

               Todos eles responderam: Tu, Deus, que és sem princípio nem fim. Tu, Jesus Cristo, que és um com o Pai. O Pai Te outorgou todo o poder de julgar, Tu és seu Juiz.

               O Senhor respondeu: Eu fui seu acusador e agora sou seu Juiz. Entretanto, apesar de tudo saber e tudo poder, dá-me vosso veredito sobre eles.

               Eles, responderam: Assim como o mundo inteiro pereceu em seus inícios com as águas do dilúvio, igualmente agora o mundo merece ser consumido pelo fogo, pois a iniquidade e a injustiça são agora mais abundantes que outrora.

               O Senhor respondeu: Como sou justo e misericordioso e não faço juízo sem misericórdia e nem misericórdia sem justiça, uma vez mais enviarei minha misericórdia ao mundo pela intercessão de minha Mãe e dos meus Santos. Se os seres humanos não querem escutar, os seguirá uma justiça que será a mais severa.

               Palavras mútuas de louvor que, na presença de Santa Brígida, se dão Jesus e Maria, e sobre como as pessoas veem agora a Cristo como desleal, desgraçado e indigno dizendo que Ele é assim e também sobre a eterna condenação dessas pessoas.

               Maria falou a seu Filho dizendo: Bendito seja Tu, que é sem princípio nem fim! Tu tiveste o corpo mais nobre e belo; Tu foste o mais valente e virtuoso dos homens, o mais digno do seres.

               O Filho respondeu: As palavras que saem de teus lábios são doces e deleitam o mais profundo do meu coração como a mais doce das bebidas. Tu és para mim a mais doce das criaturas. Da maneira que uma pessoa pode ver distintos rostos em um espelho, mas nenhum lhe agrada mais que o seu próprio, assim, mesmo amando meus Santos, a amo com particular amor, porque nasci de tua carne. Tu és como um incenso seleto cujo odor subiu até a divindade e a atraiu para seu corpo. Esta mesma fragrância elevou teu corpo e tua alma até Deus, onde estás agora com todo teu ser. Bendita sejas, porque os Anjos se regozijam em tua formosura e todos os que te invocam, com o coração sincero, ficam libertos graças ao teu poder. Todos os demônios tremem diante de tua luz e não se atrevem a permanecer em teu esplendor porque eles sempre querem estar nas trevas. Tu me louvaste por três qualidades. Disseste que Eu tive o corpo mais nobre, depois afirmaste que Eu era o mais valente dos homens e, em terceiro, disseste que fui a mais digna das criaturas. Estas qualidades são contestadas, agora, por aqueles que possuem um corpo e uma alma. Dizem que Eu possuo um corpo ignóbil, que sou o homem mais desgraçado e a mais indigna das criaturas. O que é mais ignóbil do que arrastar o outro para o pecado? Isso é o que dizem de meu corpo: que conduz ao pecado. Dizem, literalmente, que o pecado não é tão repugnante nem desgosta a Deus tanto como Eu lhes havia dito. ‘Porque – segundo eles – nada existe a menos que Deus queira e nada foi criado sem Ele. Por que, então, não poderíamos usar tudo o que foi criado como nós quisermos? Nossa natural fragilidade assim o exige e esta é a forma com a qual todos temos vivido antes e ainda vivemos’. Assim é como, agora, as pessoas se dirigem a mim. Minha natureza humana, com a qual apareci entre os homens como Deus verdadeiro, é, efetivamente, considerada por eles como desprezível, apesar do quanto Eu apartei a humanidade do pecado e lhe mostrei a gravidade disso, como se Eu tivesse incentivado a fazer algo inútil e torpe. Dizem, literalmente, que nada é nobre exceto o pecado e tudo aquilo que satisfaça seus caprichos. Também dizem que eu sou o mais desgraçado dos homens. Quem é mais desgraçado que alguém que, quando diz a verdade, vê sua boca ferida pelas pedras que lhe arremessam e é golpeado na face e, além de tudo isso, escuta as censuras das pessoas dizendo-lhe: ‘Se fosse um homem se vingaria’? Isso é o que fazem comigo. Falo com eles através de sábios doutores e das Sagradas Escrituras, mas eles dizem que Eu minto. Ferem minha boca com pedras e com socos cometendo adultério, matando e mentindo. Dizem: ‘Se fosse um grande homem, se fosse o mais poderoso Deus, se vingaria dessas transgressões’. Todavia, Eu sofro em minha paciência. Cada dia, ouço-os afirmar que o castigo nem é eterno nem tão severo como se falou e minhas palavras são consideradas mentiras. Por último, me veem como a mais indigna das criaturas. O que é mais desprezível em uma casa do que um cachorro ou um gato que alguém estaria mais que contente em trocar por um cavalo, se pudesse? Mas as pessoas afirmam que Eu sou pior que um cachorro. Não me acolheriam se, para isso, tivessem que se desapegar do cachorro, e antes ainda, me recusariam e me negariam se tivessem que ficar sem a casinha do cachorro. Existe algo tão insignificante para a mente humana, que não seja considerado de maior valor ou que seja mais desejado que Eu? Se me tivessem em maior estima que as demais criaturas, me amariam mais que tudo. Mas não possuem nada tão insignificante que não o amem mais que a mim. Apiedam-se de qualquer coisa mais que de mim. Desgostam-se por suas próprias perdas e pelas de seus amigos. Afligem-se por uma única palavra ofensiva. Entristecem-se por ofender as pessoas de maior classe que eles, mas não se importam em ofender a, mim, o Criador de todas as coisas. Quem há, que seja tão desprezado que não seja ouvido quando pede algo ou que não seja compensado quando tenha dado algo? Eu sou totalmente indigno e desprezível a seus olhos, tanto que não me consideram merecedor de nenhum bem, apesar de Eu lhes ter dado todo o bem. Mãe minha, tu saboreaste mais de minha sabedoria que os demais e nada mais que a verdade saiu de teus lábios. Tampouco, dos meus lábios, pode sair outra coisa mais que a verdade. Em presença de todos os Santos, Eu me justificarei a mim mesmo ante o primeiro homem, o que disse que Eu tinha um corpo indigno. Demonstrarei que, de fato, possuo o corpo mais nobre, sem deformidade nem pecado, e esse homem cairá na eterna censura para que todos o vejam. Já para aquele que disse que minhas palavras eram mentiras e que não sabia se Eu era ou não Deus, demonstrar-lhe-ei que sou verdadeiramente Deus e ele deslizará como o barro até o inferno. E ao terceiro, ao que sustentava que eu era indigno, o condenarei ao castigo eterno, de maneira que nunca veja minha glória nem sinta meu gozo.

               Então, disse à esposa: Mantenha-te firme no meu serviço! Tu te vês rodeada por um muro, como dissemos, do qual não podes escapar nem escavar seus fundamentos. Assume voluntariamente esta pequena tribulação e chegarás a experimentar o eterno descanso em meus braços! Tu conheces a vontade do Pai, escutas as palavras do Filho e conheces meu Espírito. Obtenha alegria e consolo nos diálogos com minha Mãe e meus Santos. Por isso, mantenha-te firme! Do contrário, chegarás a conhecer essa minha justiça pela qual se verás forçada a fazer o que, agora amavelmente, eu a estou incentivando que faças.

               Palavras do Senhor à esposa sobre a adesão à Nova Lei; sobre como essa mesma Lei é agora rejeitada e desdenhada pelo mundo, sobre como os maus sacerdotes não são sacerdotes de Deus e sim traidores de Deus e sobre a sua maldição e condenação.

            Eu sou o Deus que em um tempo fui chamado de o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacó. Eu sou o Deus que deu a Lei a Moisés. Esta Lei era como uma vestimenta. Assim como uma gestante prepara o enxoval de seu bebê, Deus também preparou a Lei, que foi como a vestimenta, sombra e sinal das coisas por vir. Eu me vesti e me envolvi a mim mesmo com as vestes da nova Lei. À medida que um menino cresce, suas roupas são substituídas por outras novas. Da mesma forma, quando as vestimentas da Lei Antiga estavam a ponto de serem abandonadas, Eu me vesti com a nova roupa, ou seja, com a Nova Lei e a dei a todos que quisessem ter a mim e ás minhas vestes. Esta roupa não é muito apertada, nem difícil de vestir, mas é bem proporcionada em todas as partes. Não obriga as pessoas a jejuar ou a trabalhar demais, nem a matar-se, nem a fazer nada que esteja além dos limites de suas possibilidades, mas ela é benéfica para a alma e conduz à moderação e mortificação do corpo. Pois, quando o corpo adere demais ao pecado, o pecado o consome. Duas coisas podem ser encontradas na Nova Lei. Primeira, uma prudente temperança e o reto uso dos bens físicos e espirituais. Segunda, uma grande facilidade para manter-se na Lei, pelo fato de que, uma pessoa que não pode manter-se em um estado, pode permanecer em outro. Nela, pode-se ver que a pessoa que não conseguia viver o celibato, podia porém, viver um matrimônio honrado, podia levantar outra vez e prosseguir. Entretanto, agora, Minha Lei é rejeitada e menosprezada. As pessoas dizem que a Lei é muito rígida, pesada e sem atrativos. Eles a chamam de rígida, porque nos ordena a nos contentarmos somente com aquilo que é necessário e evitar o que é supérfluo. Porém, eles querem ter tudo além do razoável e mais do que o corpo pode suportar, como se fossem animais. É por isso que ela lhes parece ser muito rígida ou rigorosa. Em segundo lugar, eles dizem que é pesada, pois a Lei diz que a pessoa deve ser indulgente com os desejos de prazer submetendo-os à razão e em determinados momentos. Mas, querem ceder aos seus prazeres mais do que lhes convém e além dos limites. Terceiro, dizem que ela não é atrativa, pois a lei ordena que eles amem a humildade e atribuam todo bem a Deus. Querem ser orgulhosos e exaltarem-se a si mesmos pelos presentes bons que Deus lhes deu. É por isso que ela não é atraente para eles. Veja como eles depreciam as vestes que lhes dei! Eu acabei com as formas antigas e introduzi as novas para durarem até que Eu venha para o Juízo, pois os velhos caminhos eram muito difíceis. Porém, eles, afrontosamente descartaram as vestimentas com as quais Eu cobri a alma, ou seja, uma fé ortodoxa. Além de tudo isso somaram pecado sobre pecado, porque também querem me trair. Davi não disse no salmo: “Aquele que comeu de meu pão tramou a traição contra mim?” Quero que percebas duas coisas nessas palavras. Primeiro, ele não diz “trama”, mas “tramou”, como se fosse algo já passado. Segundo, ele aponta somente para um homem como traidor. Da mesma forma, Eu digo que são aqueles que no presente me traem, não aqueles que foram ou serão, mas aqueles que ainda estão vivos. Também digo que não se trata de apenas uma pessoa, mas de muitas. Mas tu deves me perguntar: ‘Não há dois tipos de pão, aquele invisível e espiritual, do qual os Anjos e os Santos vivem e o outro que pertence a Terra, pelo qual os homens se alimentam? Mas se os Anjos e os Santos não desejam nada que não esteja de acordo com a Tua vontade, e os homens não podem fazer nada que Tu não aceites, como, então, podem Te trair? Na presença de minha Corte Celestial que sabe e vê todas as coisas em mim, Eu respondo por teu bem, de forma que possas compreender: De fato, há dois tipos de pão. Um é aquele dos Anjos, que comem meu pão no meu Reino e são preenchidos com a minha glória indescritível. Eles não me traem, pois não querem nada que não seja aquilo que Eu quero. Mas aqueles que comem meu pão no altar me traem. Eu Sou verdadeiramente esse Pão. É possível perceber três coisas nesse Pão: a forma, o sabor e a circularidade. De fato, Eu sou esse Pão e, como tal, tenho três coisas em mim: sabor, forma e circularidade. Sabor, porque tudo é insípido, insubstancial e carente de sentido sem mim, assim como uma refeição sem pão não tem sabor e não é nutritiva. Eu também tenho a forma do pão enquanto me considero da terra. Vim da Mãe Virgem, minha Mãe é a de Adão, Adão é da Terra. Também tenho circularidade onde não há princípio nem fim, porque Eu não tenho princípio nem fim. Ninguém pode encontrar um fim ou um princípio na minha sabedoria, no meu poder e na minha caridade. Eu estou em todas as coisas, sobre todas as coisas e além de todas as coisas. Mesmo se alguém voasse perpetuamente como uma flecha, sem parar, nunca encontraria um final ou um limite ao meu poder e à minha força. Através dessas coisas, sabor, forma e circularidade, Eu sou o Pão que parece e tem sabor de pão no altar, mas que se transforma em meu corpo que foi crucificado. Do mesmo modo que qualquer madeira facilmente inflamável é rapidamente consumida quando se coloca no fogo, e não resta nada da forma da madeira, pois toda se converte em fogo, assim também acontece quando estas palavras são ditas: “Este é o meu Corpo”, o que antes era pão imediatamente se torna meu corpo. Faz-se uma chama, não como o fogo com a madeira, mas pela minha divindade. Por isso, aqueles que comem meu pão me traem. Que tipo de crime pode ser mais horrível do que quando alguém se mata a si mesmo? Ou que traição poderia ser pior do que quando duas pessoas unidas por um vínculo indissolúvel, como um casal, um trai o outro? O que um dos dois faz para trair o outro? Ele diz a ela enganando: ‘Vamos a tal e tal lugar de forma que eu passe meu futuro contigo!’ Ela vai com ele com toda simplicidade, pronta para satisfazer qualquer desejo de seu marido. Mas, quando ele encontra a oportunidade e o lugar, lança contra ela três armas traiçoeiras. Ou utiliza algo suficientemente pesado para matá-la com um único golpe, ou afiado o suficiente para cortar exatamente seus órgãos vitais, ou, algo asfixiante que sufoca diretamente nela o espírito de vida. Então, quando ela morre, o traidor pensa consigo mesmo: ‘Agora eu fiz mal. Se meu crime for descoberto e tornar-se público, serei condenado à morte’ Então, ele leva o corpo da mulher em um lugar escondido, de forma que seu pecado não seja descoberto. Esta é a forma com que sou tratado pelos meus sacerdotes, que são meus traidores. Pois eles e Eu estamos ligados por uma só vinculo quando eles tomam o pão, e, pronunciando as palavras, o transformam em meu verdadeiro Corpo, que recebi da Virgem. Nenhum dos Anjos pode fazer isto. Eu dei somente aos sacerdotes essa dignidade e os selecionei dentre as mais altas ordens. Mas eles me tratam como traidores. Fazem uma cara feliz e complacente para mim e me levam a um local escondido onde possam me trair. Estes sacerdotes fazem cara de felicidade aparentando ser bons e simples. Eles me levam a uma câmara escondida quando se aproximam do altar. Ali Eu sou como a noiva ou a recém casada, disposta a realizar todos os seus desejos e, em vez disso, eles me atraiçoam. Primeiro, me batem com algo pesado quando o Ofício Divino, que recitam para mim, se torna triste e pesado para eles. De bom grado diriam cem palavras para o bem do mundo do que uma só em minha honra. Antes dariam cem lingotes de ouro para o bem do mundo do que um só centavo em Minha honra. Trabalhariam cem vezes por seu próprio benefício do que uma só vez em minha honra. Eles me pressionam tanto com este pesado fardo que é como se eu estivesse morto em seus corações. Em segundo lugar, me transpassam com uma lâmina afiada que penetra em meus órgãos vitais cada vez que um sacerdote sobe ao altar, sabendo que pecou e arrependeu-se, mas está firmemente decidido a voltar a pecar, uma vez que tenha terminado seu Oficio. Este diz consigo mesmo: Eu de fato me arrependo do meu pecado, mas não penso deixar a mulher com a qual pequei, até que já não possa mais pecar.’ Isto me corta como a mais afiada das lâminas. Terceiro, é como se eles asfixiassem meu Espírito quando pensam: ‘É bom e prazeroso estar no mundo, é bom ser indulgente com os desejos e não me posso conter. Farei isto enquanto for jovem e quando me fizer mais velho, irei me abster e emendarei meus caminhos.’ E, através desse perverso pensamento, eles sufocam o espírito da vida. Mas como isso acontece? Pois bem, o coração destes se torna tão frio e tíbio em relação a mim e a cada virtude que nunca mais pode ser estimulado ou renascer no meu amor. Assim como o gelo não pega fogo, mesmo quando mantido sobre uma chama, mas apenas derrete, da mesma maneira mesmo que Eu lhes dê a minha graça e eles ouçam palavras de advertência, não melhoram no modo de vida, mas apenas crescem estéreis e frouxos a respeito de cada uma das virtudes. E assim me traem, naquilo que fingem ser simples quando na realidade não o são, e ficam tristes e desgostosos na hora de dar-me a glória em vez de regozijar-se e também naquilo que pretendem pecar e continuam pecando até o final. Eles também me escondem, por assim dizer, e me colocam em um local oculto quando pensam: ‘Sei que pequei. Mas se me abstiver de realizar o Oficio, ficarei envergonhado e todos irão me condenar.’ Assim que, imprudentemente, sobem ao altar e tocam a mim, verdadeiro Deus e verdadeiro homem. Fico como se estivesse em um lugar escondido, uma vez que ninguém sabe nem se dá conta de quão corruptos e sem vergonha são. Eu, Deus, permaneço ali, diante deles, como em uma dissimulação, porque, mesmo quando o sacerdote é o pior dos pecadores e pronuncia estas palavras “Este é o meu corpo”, ele ainda consagra meu Verdadeiro Corpo, e Eu, verdadeiro Deus e Homem, permaneço ali diante dele. Quando me põe em sua boca, entretanto, Eu já não estou presente para ele na graça das minhas naturezas divina e humana - só resta para ele a forma e o sabor do pão - não porque Eu não esteja realmente presente para os maus como para os bons devido à instituição do sacramento, mas porque os bons e os maus não o recebem com o mesmo efeito. Olhe, estes sacerdotes não são meus Sacerdotes, e sim na realidade, meus traidores! Eles também me vendem e me traem como Judas. Olho para os pagãos e judeus, mas não vejo ninguém pior que estes sacerdotes, já que caíram no pecado de Lúcifer. Agora, deixe-me dizer-te sua sentença e a quem se assemelham. Sua sentença é a condenação. Davi condenou aqueles que desobedeciam a Deus, não por ira, ou má vontade nem por impaciência, senão devido à justiça divina, pois ele era um honrado profeta e rei. Eu, também, que sou maior que Davi, condeno estes sacerdotes, não pela ira nem pela má vontade, mas pela justiça.

Maldito seja tudo o que retiram da Terra para seu próprio proveito, pois eles não louvam seu Deus e Criador que lhes deu estas coisas.

Maldito seja o alimento e a bebida que entra em suas bocas e que alimenta seus corpos para que se convertam em alimento dos vermes e destinem suas almas ao inferno.

Malditos sejam seus corpos que se levantarão novamente no inferno para ser queimados eternamente. Malditos sejam os anos de suas vidas inúteis.

Maldita seja sua primeira hora no inferno, que nunca terminará.

Malditos sejam por seus olhos que viram a luz do Céu.

Malditos sejam por seus ouvidos que ouviram minhas palavras e permaneceram indiferentes.

Malditos sejam por seu paladar, pelo qual experimentaram meus manjares. Malditos sejam por seu tato, pelo qual me tocaram.

Malditos sejam, por seu olfato, pelo qual sentiram aromas agradáveis e se descuidaram de mim, que Sou o mais agradável de todos. Agora, como são, exatamente amaldiçoados? Pois bem, sua visão está amaldiçoada porque não desfrutará da visão de Deus em si, mas apenas verão sombras e os castigos do inferno. Seus ouvidos estão amaldiçoados porque não ouvirão minhas palavras, senão somente o clamor e os horrores do inferno. Seu paladar está amaldiçoado porque não experimentarão os bens e o gozo eternos, mas sim a amargura eterna. Seu tato está amaldiçoado porque não conseguirão tocar-me, senão somente o fogo perpétuo. Seu olfato está amaldiçoado, porque não sentirão esse doce perfume do meu Reino, que supera todas as essências, mas terão apenas o fedor do inferno que é mais amargo do que a bílis e pior que o enxofre. Sejam malditos pela Terra e o Céu e por todas as bestas. Essas criaturas obedecem e glorificam a Deus, enquanto que eles o evitaram. Por isto eu prometo pela verdade, Eu que sou a Verdade, que se eles morrem assim, com essa disposição, nem meu amor nem minha virtude os cobrirá. Ao contrário, serão condenados para sempre.

               Sobre como, na presença da Corte Celestial e da esposa, a divina natureza fala à natureza humana contra os Cristãos, assim como Deus falou a Moisés contra o povo, sobre os sacerdotes condenáveis que amam o mundo e desprezam a Cristo e sobre seu castigo e maldição.

               A Corte Celestial foi vista no Céu e Deus lhe disse: Observe, pelo bem desta minha esposa aqui presente, que me dirijo a vós, amigos meus que me estais ouvindo, vós que sabeis, compreendeis e vedes tudo em mim. Como se alguém falasse consigo mesmo, minha natureza humana irá falar à minha natureza divina. Moisés esteve com o Senhor na montanha por quarenta dias e quarenta noites. Quando o povo viu que já fazia tempo que ele havia partido, pegaram ouro, fundiram-no no fogo e criaram com ele um bezerro, a que chamaram seu deus. Então, Deus disse a Moisés: ‘O povo pecou. Eliminá-lo-ei como se apagam as letras de um livro.’ Moisés respondeu: ‘Não o faças, Senhor! Lembra-te de como os guiaste desde o Mar Vermelho e fizeste maravilhas por eles. Se os eliminas, onde ficará então tua promessa? Não o faças, eu te rogo, pois teus inimigos dirão: O Deus de Israel é malvado, conduziu o povo até o mar e o matou no deserto.’ E Deus se aplacou com estas palavras. Eu sou Moisés, figurativamente falando. Minha natureza divina fala à minha natureza, como fiz com Moisés, dizendo-lhe: ‘Olha o que o fez teu povo, veja como me desprezaram! Todos os cristãos morrerão e sua fé ficará apagada.’ Minha natureza humana responde: ‘Não, Senhor. Lembra-te como conduzi o povo através do mar por meu sangue, quando fui espancado desde a planta dos meus pés até a o alto da minha cabeça! Eu lhes prometi a vida eterna. Tem misericórdia deles, por minha Paixão!’ Quando a natureza divina ouviu isto, se apiedou dele e lhe disse: ‘Assim seja, pois te foi dado todo juízo!’ Vejam que amor, meu amigos! Mas agora, em vossa presença, meus amigos espirituais, meus anjos e santos, e na presença dos meus amigos corpóreos, que estão no mundo, ainda que só em seu corpo, lamento o fato de que meu povo esteja acumulando lenha, acendendo uma fogueira e jogando ouro nela, da qual emerge um bezerro para que eles o adorem como a um deus. Assim como um bezerro, se sustenta em quatro patas, tem uma cabeça, uma garganta e um rabo. Quando Moisés se demorou na montanha, o povo dizia: ‘Não sabemos o que lhe aconteceu.’ Lamentaram-se de que lhes houvesse guiado para sair de seu cativeiro e disseram: ‘Vamos fazer outro deus que nos dirija!’ É assim que estes malditos sacerdotes estão me tratando agora. Eles dizem: ‘Porque vivemos uma vida mais austera que os demais? Qual é nossa recompensa? Estaríamos melhor se vivêssemos sem preocupações, na abundancia, Vamos pois amar o mundo do qual temos certeza! Apesar de tudo, não estamos seguros de sua promessa.’ Assim juntam lenha, ou seja, aplicam todos os seus sentidos para amar o mundo. Eles acendem uma fogueira quando todo seu desejo é para o mundo, e ardem à medida que cresce sua cobiça em sua mente e acaba resultando em obras. Depois, lhe jogam ouro, que significa que todo o amor e respeito que deveriam demonstrar por mim, o dedicam a obter o respeito do mundo. Então, emerge o bezerro, ou seja, o amor total do mundo, com suas quatro patas de preguiça, impaciência, alegria supérflua e avareza. Esses sacerdotes, que deveriam ser meus, sentem preguiça na hora de me honrar, impaciência diante do sofrimento, se excedem em alegrias vãs e nunca se contentam com o que conseguem. Este bezerro também tem uma cabeça e uma garganta, ou seja, um desejo de comilança que nunca se aplaca, nem mesmo se tragasse o mar inteiro. O rabo do bezerro é sua malícia, pois não deixam que ninguém mantenha sua propriedade, extorquem sempre que podem. Por seu exemplo imoral e seu desprezo, ferem e pervertem os que me servem. Assim é o amor ao bezerro que há em seus corações, e nele se regozijam e deleitam. Pensam em mim do mesmo modo que aqueles fizeram com Moises: ‘Ele se foi há muito tempo’, dizem. ‘Suas palavras parecem sem sentido e trabalhar para Ele é muito pesado. Façamos o que nos dê vontade, deixemos que nossas forças e prazeres sejam nosso deus! Também não se contentam parando aí e esquecendo-me por completo, mas alem disso me tratam como um ídolo! Os pagãos costumavam adorar pedaços de madeira, pedras e pessoas mortas, entre outros, adoravam um deus cujo nome era Belzebu. Seus sacerdotes lhe ofereciam incenso, genuflexões e gritos de louvor. Tudo que era inútil em sua oferta de sacrifícios se jogava no chão e as aves e moscas o comiam. Mas os sacerdotes podiam ficar com tudo aquilo que pudesse lhes ser útil. Então trancavam a porta de seu ídolo e guardavam a chave pessoalmente, para que ninguém pudesse entrar. É assim que os meus sacerdotes me tratam atualmente. Oferecem-me incenso, ou seja, falam e pregam belas palavras às pessoas para conseguir respeito para si mesmos e benefícios temporais, mas não por amor a mim. Da mesma forma que não se pode prender o aroma do incenso, ainda que o sintas e o vejas, também suas palavras não têm nenhum efeito nas almas, para criar raízes e manter-se em seus corações, mas são palavras que só se ouvem e agradam passageiramente. Oferecem orações, mas nem todas me agradam. Como quem grita louvores com seus lábios, mas mantem seu coração calado, ficam perto de mim rezando com os lábios mas no coração vagueiam pelo mundo. Entretanto, quando falam com uma pessoa da projeção, mantêm sua mente no que dizem para não cometer erros que poderiam ser observados pelos outros. Na minha presença, entretanto, os sacerdotes são como homens confusos que dizem uma coisa com a boca e tem outra no coração. As pessoas que os escutam não podem ter certeza sobre eles. Dobram seus joelhos diante de mim, ou seja, prometem humildade e obediência, mas, na verdade são tão humildes quanto Lúcifer. Obedecem seus próprios desejos, não a mim. Eles também me trancam e guardam a chave pessoalmente. Abrem-se a mim e me oferecem louvores quando dizem: ‘Faça-se tua vontade na Terra, como no Céu!’ Mas, depois, trancam-me novamente ao por em pratica seus próprios desejos, enquanto os meus se tornam como os de um preso e impotente porque não posso ser visto nem ouvido. Eles guardam a chave pessoalmente, no sentido de que por seu exemplo, também conduzem ao extravio os que querem fazer a minha vontade, e, se pudessem, evitariam que se fizesse minha vontade e se a cumprisse, exceto quando esta se ajustasse a seu próprio desejo. Mantêm para si tudo o que nas ofertas de sacrifício seja útil para eles e exigem todos os seus direitos e privilégios. De qualquer forma, parecem considerar inúteis os corpos das pessoas que caem no chão e morrem. Para eles estão obrigados a oferecer o sacrifício mais importante, mas os deixam aí às moscas, ou seja, para os vermes. Não se preocupam nem se importam com os direitos das pessoas ou com a salvação das almas. O que foi dito a Moisés? ‘Mata os que fizeram este ídolo!’ Alguns foram eliminados, mas não todos. Consequentemente, minhas palavras virão agora e os matarão, a alguns em corpo e alma através da condenação eterna; a outros em vida para que se convertam e vivam; outros ainda pela morte repentina ao tratar-se de sacerdotes que me são totalmente odiosos. Com que vou compará-los? De fato, eles são como os frutos das urzes, que por fora são bonitos e vermelhos, mas por dentro estão cheios de impurezas e espinhos. Da mesma forma, estes homens vêm até mim cheios de caridade e perante as pessoas parecem puros, mas por dentro estão cheios de sujeira. Se estes frutos se colocam no solo, deles saem e crescem mais brotos de urze. Assim, estes homens escondem seu pecado e maldade de coração, como no solo, e se tornam tão enraizados na maldade que nem sequer se envergonham de mostrar-se em público e gabar-se de seu pecado. Por isso, outras pessoas não só encontram ocasião de pecar, mas ficam seriamente manchadas em sua alma, pensando consigo mesmo: ‘Se os sacerdotes fazem isto, mais lícito será que o façamos nós.’ Acontece, assim, que não só se assemelham com o fruto da urze, mas também com seus espinhos. Pensam que não há ninguém mais sábio que eles e que podem fazer o que quiserem. Portanto, juro por minhas naturezas, divina e humana, na audiência de todos os anjos, que atravessarei a porta que eles fecharam para a minha vontade. Minha vontade se cumprirá e a deles será aniquilada e trancada em um castigo sem fim. Então, assim como foi dito antigamente, meu juízo começará com meu clero e no meu próprio altar.

               Palavras de Cristo à esposa sobre como Cristo é figurativamente comparado com Moisés dirigindo o povo fora do Egito, e sobre como os condenáveis sacerdotes que Ele tinha escolhido no lugar dos profetas como seus melhores amigos gritam agora: “Afasta-te de nós!”

               O Filho falou: Antes fui comparado figurativamente com Moisés. Quando ele guiava o povo, a água se colocou como uma parede à esquerda e à direita. De fato, Eu sou Moisés, figurativamente falando. Eu conduzi o povo Cristão, ou seja, abri o Céu para eles e lhes mostrei o caminho. Mas agora escolhi outros amigos para mim, mais especiais e íntimos que os profetas, na realidade, meus sacerdotes. Estes não só ouvem e veem minhas palavras quando veem a mim, mas até me tocam com as suas mãos, o que nenhum dos profetas ou Anjos puderam fazer. Estes sacerdotes, que escolhi como amigos no lugar dos profetas, me aclamam, mas não com desejo e amor como fizeram os profetas, mas me aclamam com duas vozes opostas. Não me aclamam como fizeram os profetas: ‘Vem, Senhor, porque és bom!’ Em vez disso os sacerdotes me gritam: ‘Afaste-se de nós, pois tuas palavras são amargas, e tuas obras são pesadas e um escândalo para nós’. Olhe o que dizem estes sacerdotes condenáveis! Estou diante deles como a mais mansa das ovelhas, eles obtém de mim lã para suas vestes e leite para seu alimento e, ainda assim, me odeiam por amá-los tanto. Estou diante deles como um visitante que diz: ‘Amigo, dá-me o necessário que não o tenho, e receberás a máxima recompensa de Deus!’ Mas em troca de minha mansa simplicidade, me lançam fora como se fosse um lobo mentiroso, a espera da ovelha principal. Em vez de dar-me sua acolhida, me tratam como a um traidor indigno de hospitalidade e se recusam a alojar-me. O que fará então o visitante rejeitado? Armar-se-á contra o anfitrião que o deixa fora de sua casa? De forma alguma. Isto não seria justo, pois o proprietário pode dar ou negar a sua propriedade a quem ele queira. O que fará, pois, o visitante? Certamente haverá de dizer a quem o rejeita: ‘Amigo, se tu não queres me receber, irei a outro que tenha pena de mim.’ E, indo a outro lugar poderá ouvir de um novo anfitrião: ‘Seja bem-vindo, senhor, tudo o que tenho é teu. Seja tu agora o dono! Eu serei teu servo e teu convidado.’ Estes são os tipos de casa onde gosto de estar, onde escuto essas palavras. Eu sou como visitante rejeitado pelos homens. Embora possa entrar em qualquer lugar em virtude do meu poder, ainda assim, sob o mandato da justiça tão somente entro onde as pessoas me recebem de boa vontade como a seu verdadeiro Senhor, não como a um hóspede, e confiam sua própria vontade em minhas mãos.

               Palavras de mútuo louvor da Mãe e do Filho, sobre a graça concedida pelo Filho à sua Mãe para as almas no purgatório e os que ainda estão neste mundo.

               Maria falou a seu Filho, dizendo: Bendito seja teu nome, meu Filho, bendita e eterna seja tua divina natureza que não tem principio nem fim! Em tua natureza divina há três atributos maravilhosos de poder, sabedoria, e virtude. Teu poder é como a mais ardente das chamas na qual, qualquer coisa firme e forte, assim também como a palha seca, passará pelo fogo. Tua sabedoria é como o mar, que nunca se pode esvaziar devido a sua abundancia e que cobre vales e montanhas quando aumenta e as inunda. É igualmente impossível compreender e penetrar tua sabedoria. Quão sabiamente criaste a humanidade e a estabeleceste sobre toda tua criação! Quão sabiamente ordenastes as aves no ar, os animais na terra e aos peixes no mar, dando a cada um, seu próprio tempo e lugar! Quão maravilhosamente a tudo dás ou tiras a vida! Quão sabiamente dás conhecimento aos pequeninos e o tiras dos soberbos! Tua virtude é como a luz do sol, que brilha no céu e enche a terra com seu resplendor. Tua virtude, desse modo, satisfaz de alto a baixo e preenche todas as coisas. Por isso, bendito sejas, meu Filho, que és meu Deus e meu Senhor!

               O Filho assim respondeu: Minha querida Mãe, tuas palavras me soam doces pois procedem de tua alma. És como a aurora que avança serenamente. Tu iluminas os Céus; tua luz e tua serenidade ultrapassam a de todos os anjos. Por tua serenidade, atraíste a ti o verdadeiro sol, ou seja, a minha natureza divina, tanto que o sol da minha divindade veio até a ti se instalou em ti. Por tua pureza tu recebeste a pureza do meu amor mais que todos, e por teu esplendor foste iluminada em minha sabedoria, mais do que todos. As trevas foram lançadas fora da terra e todos os Céus foram iluminados através de ti. Em verdade Eu digo que tua pureza, mais agradável para mim do que a de todos os anjos, atraiu tanto a minha divindade para Ti, que foste inflamada pelo calor do Espírito. Nele, Tu geraste o Verdadeiro Deus e Homem, resguardado em teu ventre, pelo qual a humanidade foi iluminada e os anjos cheios de alegria. Assim, bendita sejas por Teu bendito Filho! E por isso nenhum pedido teu chegará a mim sem ser ouvido. Qualquer um que peça misericórdia através de ti, e tenha a intenção de emendar seus caminhos, conseguirá graça. Como o calor vem do sol, igualmente, toda a misericórdia será dada através de ti. És como um abundante manancial do qual mana toda misericórdia para os infelizes.

               Por sua vez, a Mãe respondeu ao Filho: Teus sejam todo poder e glória, meu Filho! És meu Deus, um Deus de misericórdia. Todo o bem que tenho vem de ti. És como uma semente que, mesmo sem ser semeada cresceu e deu centenas e milhares de frutos. Toda misericórdia emana de ti, e ainda que sendo incontável e indizível, pode ser simbolizada pelo número cem, que representa a perfeição, pois todo o perfeito e a perfeição se devem a ti.

               O Filho, respondeu à Mãe: Mãe, me comparaste corretamente a uma semente que nunca foi semeada e, mesmo assim cresceu, pois em minha natureza divina eu vim a ti e minha natureza humana não foi semeada por inseminação alguma, e mesmo assim cresci em ti, e a misericórdia emanou de ti para todos. Tens falado corretamente. Agora, pois, porque extrais de minha misericórdia pela doçura de tuas palavras, pede-me o que desejas e se te dará.

               A Mãe acrescentou: Meu Filho, por haver conseguido a misericórdia, peço-te que tenhas misericórdia dos infelizes e os ajudes. Afinal de contas, há quatro lugares. O primeiro é o Céu, onde os Anjos e a alma dos Santos não precisam de mais nada além de ti, e te têm pois possuem todo o bem em ti. O segundo lugar é o inferno, e aqueles que estão lá, estão repletos de maldade e por isso, excluídos de qualquer piedade. Assim, nada bom pode entrar neles nunca mais. O terceiro é o lugar daqueles que são purificados. Estes precisam de uma tripla misericórdia, pois estão triplamente afligidos. Sofrem em sua audição, pois não ouvem nada mais que lamentos, dor e miséria. São afligidos em sua visão pois não veem mais que sua própria miséria. São afligidos em seu tato, pois somente sentem o calor insuportável do fogo terrível de seu angustioso sofrimento. Assegura-lhes tuas misericórdias, Senhor meu, Filho meu, por meus rogos!

               Jesus assim respondeu: Com gosto lhes garantirei uma tríplice misericórdia por ti. Em primeiro lugar, sua audição será aliviada, sua vista será mitigada, e seu castigo será reduzido e suavizado. Além disso, a partir deste momento, aqueles que se encontram no maior dos castigos do purgatório, passarão para a fase intermediaria, e os que estejam na fase intermediaria, avançarão para a punição mais leve. Os que estejam na punição mais leve, cruzarão para o descanso.

               A Mãe respondeu: Louvor e honra a ti meu Senhor! O quarto lugar é o mundo. Seus habitantes precisam de três coisas: primeiro, contrição por seus pecados; segundo, reparação; terceiro, força para fazer o bem.

               O Filho respondeu: A todo o que invoque meu nome e tenha esperança em Ti, junto com o propósito de emenda por seus pecados, serão dadas estas três coisas, alem do Reino dos Céus. Tuas palavras são tão doces para mim, que não posso negar-te nada do que me peças, pois tu não queres nada mais do que o que Eu quero. És como uma chama brilhante e ardente, pela qual as tochas apagadas se reacendem, e uma vez acesas, crescem em força. Graças a teu amor, que se elevou até meu coração e me atraiu a ti; aqueles que estão mortos pelo pecado reviverão e os que estejam tíbios e escurecidos como a fumaça negra, se fortalecerão em meu amor.

               Palavras da Mãe de louvor ao Filho e sobre como o Filho glorioso compara sua doce Mãe com um lírio do campo

               A Mãe falou a seu Filho, dizendo: “Bendito seja teu nome, meu Filho, Jesus Cristo! Louvores à tua natureza humana, que supera toda a criação! Glória a tua natureza divina acima de toda a bondade! Tua natureza divina e a humana são um único Deus.”

               O Filho respondeu: Minha Mãe, és como uma flor que cresceu em um vale em cujo redor há cinco montanhas." A flor brotou de três raízes, tendo uma haste perfeita sem nós. Esta flor tem cinco pétalas suavíssimas. O vale e sua flor ultrapassam as cinco montanhas e as pétalas da flor se estendem sobre cada altura do céu, e sobre todos os coros de anjos. Tu, minha querida Mãe, és esse vale em virtude da grande humildade que possuis em comparação com os demais. Este, ultrapassou as cinco montanhas. A primeira montanha foi Moisés, devido ao seu poder, pois manteve o poder sobre meu povo através da Lei, como se o sustentasse firme com seu pulso. Porém, tu mantiveste o Senhor de toda Lei em teu ventre e, por isso tu és mais alta que essa montanha. A segunda montanha foi Elias, tão santo que seu corpo e sua alma ascenderam ao lugar sagrado. Tu, porém querida Mãe foste assunta em alma ao trono de Deus sobre todos os coros dos anjos e teu puríssimo corpo está ali junto à tua alma. Tu, portanto, minha querida Mãe, és mais alta que Elias. A terceira montanha foi a grande força que possuía Sansão em comparação com outros homens. Contudo, o diabo derrotou-o através da astúcia. Mas tu venceste o demônio por tua força. Portanto, és mais forte que Sansão. A quarta montanha foi Davi, um homem de acordo com meu coração e vontade, que, apesar disso, caiu em pecado. Mas tu, minha Mãe, te submeteste completamente à minha vontade e nunca pecaste. A quinta montanha foi Salomão, que estava cheio de sabedoria mas se tornou tolo. Tu ao contrário, Mãe, estavas cheia de toda sabedoria e nunca foste ignorante nem enganada. És, pois, mais alta que Salomão. A flor brotou de três raízes no sentido de que possuíste três qualidades: obediência, caridade e conhecimento divino. Destas três raízes brotou a haste mais perfeita, sem um único nó, ou seja, sua vontade nunca se desviou para nada além da minha vontade. A flor também tinha cinco pétalas mais altas que todos os coros dos anjos. Tu, minha Mãe, és de fato a flor com estas cinco pétalas. A primeira pétala é sua nobreza, que é tão grande, que meus Anjos, que são nobres em minha presença, ao observar tua nobreza, a veem acima deles e mais exaltada que sua própria santidade e nobreza. Tu és, portanto, mais alta que os Anjos. A segunda pétala é a tua misericórdia, que foi tão grande que, quando viste a miséria das almas, te compadeceste delas e sofreste enormemente a dor da minha morte. Os Anjos estão cheios de misericórdia, contudo nunca sofrem dor. Tu, entretanto, amada Mãe, tiveste piedade dos miseráveis uma vez que experimentaste toda a dor de minha morte e, por essa misericórdia preferiste sofrer a dor do que livrar-te dela. É por isso que a tua misericórdia ultrapassa a de todos os anjos. A terceira pétala é tua doce amabilidade. Os Anjos são doces e amáveis, desejam o bem para todos mas tu, minha muito querida Mãe, tiveste tão boa vontade como um anjo, em tua alma e em teu corpo antes de tua morte, e fizeste o bem para todos. E agora não recusas atender a ninguém que reze razoavelmente para seu próprio bem. Assim, tua amabilidade é mais perfeita que a dos Anjos. A quarta pétala é a sua pureza. Cada um dos anjos admira a pureza dos demais e eles admiram a pureza de todas as almas e de todos os corpos. Entretanto, eles veem que a pureza da tua alma está acima do resto da criação e que a nobreza do teu corpo supera a de todos os seres humanos que foram criados. Assim, tua pureza ultrapassa a de todos os anjos e toda a criação. A quinta pétala é teu gozo divino, pois, nada te deleitou mais que Deus, assim como nada deleita os anjos mais que Deus. Cada um deles conhece e conheceu seu próprio gozo dentro de si. Mas quando viram teu gozo em Deus dentro de ti, lhes pareceu a cada um em sua consciência que sua alegria resplandecia neles como uma luz no amor de Deus. Perceberam teu gozo como uma grandíssima fogueira, ardendo com o mais aceso dos fogos com labaredas tão altas que chegavam perto da minha divindade. Por isso, dulcíssima Mãe, tua divina alegria ardeu muito acima dos coros dos Anjos. Esta flor, com estas cinco pétalas de nobreza, misericórdia, amabilidade, pureza e supremo gozo, era dulcíssima em todos os sentidos. Quem queira provar sua doçura deve se aproximar dela e recebê-la dentro de si. Isto foi o que tu fizeste, boa Mãe. Porque foste tão doce com meu Pai que ele recebeu todo teu ser no seu Espírito e tua doçura o deleitou mais que nenhuma outra. Pelo calor e energia do sol, a flor também gera uma semente e dela cresce um fruto. Abençoado seja este sol, ou seja, minha divina natureza que adotou a natureza humana do teu ventre virginal! Como uma semente faz brotar as mesmas flores em qualquer lugar que sejam semeadas, assim os membros de meu corpo são como os teus em forma e aspecto, embora eu tenha sido homem e tu mulher virgem. "Este vale, com sua flor, foi elevado sobre todas as montanhas quando o teu corpo, junto a tua santíssima alma, foi elevado sobre todos os coros dos Anjos.

               Palavras de louvor e orações da Mãe a seu Filho para que suas palavras se difundam por todo o mundo e deixem raízes nos corações de seus amigos. Sobre como a própria Virgem é maravilhosamente comparada a uma flor que cresce em um jardim, e sobre as palavras de Cristo dirigidas através da esposa ao Papa e a outros prelados da Igreja.

               A bendita Virgem falou ao Filho dizendo-lhe: Bendito sejas Filho meu e Deus meu, Senhor dos anjos e Rei de glória! Rogo que as palavras que pronunciaste deixem raízes nos corações de teus amigos e se fixem em suas mentes como o breu com o qual foi untada a arca de Noé, que nem as tempestades nem os ventos puderam dissolver. Que se espalhem pelo mundo como ramos e doces flores, cuja essência se impregna por toda a parte. Que também deem frutos e cresçam doces como a tâmara cuja doçura deleita a alma sem medida.

               O Filho respondeu: Bendita sejas tu, minha muito querida Mãe!" Meu anjo Gabriel te disse: 'Bendita sejas Maria sobre todas as mulheres!' Eu te dou testemunho de que és bendita e mais santa que todos os coros dos anjos. És como uma flor de jardim rodeada de outras flores perfumadas, mas que a todas supera em perfume, pureza e virtude. Estas flores representam todos os eleitos, desde Adão até o fim do mundo. Foram plantadas no jardim do mundo, e floresceram em diversas virtudes, mas entre todos os que foram e que ainda serão, tu foste a mais excelente em fragrância de uma vida santa e humilde, na pureza de uma gratíssima virgindade e na virtude da abstinência. Dou testemunho de que foste mais que um mártir em minha Paixão, mais que um confessor em tua abstinência, mais que um anjo em tua misericórdia e boa vontade. Por ti, eu fixarei minhas palavras, com o mais forte dos breus nos corações de meus amigos. Eles se espalharão como flores perfumadas e darão os frutos como a mais doce e deliciosa das palmeiras.

               Então, o Senhor falou à esposa: Diz a teu amigo que deve procurar repetir estas palavras quando escrever a teu pai, cujo coração está de acordo com o meu e, ele as dirigirá ao arcebispo e depois a outro bispo. Quando estes estiverem completamente informados, ele há de enviá-las a um terceiro bispo". Dize-lhe de minha parte: 'Eu sou teu Criador e o Redentor de almas. Eu sou Deus a quem tu amas e honras sobre tudo. Observa e considera como as almas que redimi com meu sangue são como as almas daqueles que não conhecem a Deus, como foram presas do demônio de forma tão espantosa, que ele as castiga em cada membro de seu corpo como se as passassem por uma prensa de uvas. Portanto, se em algo sentes minhas feridas em tua alma, se meus açoites e sofrimento significam algo para ti, então mostre, com obras, o quanto me amas! Faça que as palavras da minha boca sejam conhecidas publicamente e traga-as pessoalmente até a cabeça da Igreja! Eu te darei meu Espírito, de forma que, onde quer que haja diferenças entre duas pessoas, tu as possas unir em meu nome e através do poder que se te dá se elas acreditarem. Como evidência adicional de minhas palavras, apresentarás ao Pontífice os testemunhos daquelas pessoas que provam e se deleitam com elas. Pois minhas palavras são como gordura que se derrete mais rapidamente quanto mais quente esteja em seu interior. Lá, onde não há calor, são rejeitadas e não chegam ao interior das pessoas. As minhas palavras são assim, porque quanto mais as ingere e as mastiga uma pessoa com caridade fervente por mim, mais se alimenta com a doçura do desejo do Céu e de amor interior e mais arde por meu amor. Mas aqueles que não gostam de minhas palavras são como se tivesses gordura em sua boca. Quando a provam, cospem-na e a pisoteiam no chão. Algumas pessoas desprezam assim minhas palavras, porque não possuem gosto algum pela doçura das coisas espirituais. "O dono da terra, a quem escolhi como um dos meus membros e o fiz verdadeiramente meu, te auxiliará cavalheirescamente e te abastecerá das provisões necessárias para tua viagem, com meios corretamente adquiridos.

               Palavras de mútuas bênção e louvor da Mãe e do Filho, e sobre como a Virgem é comparada à arca onde foram guardados o cajado, o maná e as tabuas da Lei. Muitos detalhes maravilhosos estão presentes nesta imagem.

               Maria falou ao Filho: Bendito és, Filho meu, meu Deus e Senhor dos anjos"! És aquele cuja voz ouviram os Profetas, e cujo corpo viram os Apóstolos, aquele a quem perceberam os judeus e teus inimigos. Com tua divindade e humanidade e com o Espírito Santo, És um em Deus. Os Profetas ouviram o Espírito, os Apóstolos viram a glória da tua divindade e os judeus crucificaram tua humanidade. Portanto, bendito sejas, sem principio nem fim!

               O Filho respondeu: Bendita sejas tu, pois és Virgem e Mãe! És a arca do Antigo Testamento, na qual havia estas três coisas: o cajado, o maná e as tabuas. Três coisas foram feitas pelo cajado: primeiro, se transformou em serpente sem veneno. Segundo, o mar foi dividido por ele. Terceiro, fez com que a água brotasse da pedra. Este cajado é um símbolo meu, que repousei em teu ventre e assumi de ti a natureza humana. Primeiro, sou tão assustador para meus inimigos como o foi a serpente para Moisés. Eles fogem de mim assim como de uma serpente; aterrorizam-se ao ver-me e detestam-me como a uma serpente, embora eu não tenha veneno de maldade e seja cheio de misericórdia. Permito que se apoiem em mim, se desejarem. Voltarei a eles, se me pedirem. Correrei para eles, se me chamarem, como uma mãe que corre para seu filho perdido e encontrado. Se clamarem, eu lhes mostrarei minha misericórdia e perdoarei os seus pecados. Faço tudo isso por eles, e ainda me rejeitam como a uma serpente. Em segundo lugar, o mar foi dividido por este cajado, no sentindo de que o caminho para o Céu, que se havia fechado pelo pecado, foi aberto por meu sangue e minha dor. O mar foi, de fato, aberto, e o que havia sido inacessível se converteu em caminho quando a dor em todos os meus membros alcançou meu coração que se partiu pela violência da dor. Então, quando o povo foi conduzido para o mar, Moisés não o levou diretamente para a terra prometida, mas sim para o deserto, onde podiam ser testados e instruídos. Agora, também, uma vez que a pessoa tenha aceitado a fé e meu comando, não são levados diretamente ao Céu, mas, é necessário que os seres humanos sejam testados no deserto, ou seja, no mundo, para ver até que ponto amam a Deus. Além disso, o povo provocou Deus no deserto por três coisas: primeiro, porque fizeram um ídolo para si mesmos e o adoraram; segundo, pelo desejo de comer carne que haviam tido no Egito; terceiro, por soberba, quando quiseram subir e lutar contra seus inimigos sem a aprovação de Deus. Ainda agora, as pessoas no mundo pecam contra mim da mesma maneira. Primeiro, adoram um ídolo, porque amam o mundo e tudo o que há nele mais que a mim, que sou o Criador de tudo. De fato, Seu deus é o mundo, e não Eu. Como disse em meu Evangelho: ‘Ali onde está o tesouro de um homem, está seu coração.’ Seu tesouro é o mundo porque tem aí seu coração e não em mim. Portanto, da mesma forma que aqueles pereceram no deserto pela espada, que atravessou seu corpo, igualmente estes cairão pela espada do castigo eterno atravessando sua alma e viverão em eterna condenação. Segundo, pecaram por concupiscência da carne. Dei à humanidade tudo que precisa para uma vida honesta e moderada, mas eles desejam possuir tudo sem moderação nem discrição. Se sua constituição física suportasse, estariam, continuamente tendo relações sexuais, bebendo sem restrição, cobiçando sem medida e, tão rápido quanto pudessem pecar, nunca desistiriam de fazê-lo. Por esta razão, a estes ocorrerá o mesmo que àqueles do deserto: morrerão repentinamente. O que é o tempo desta vida comparado ao da eternidade se não um só instante? Portanto, devido à brevidade desta vida, eles terão uma rápida morte física, mas viverão eternamente em dor espiritual. Terceiro, pecaram no deserto por orgulho, porque desejaram lançar-se na batalha sem a aprovação de Deus. As pessoas desejam ir ao Céu por seu próprio orgulho. Não confiam em mim, apenas nelas mesmas, fazendo o que querem e abandonando-me. Portanto, da mesma forma que aqueles outros foram mortos por seus inimigos, assim também estes serão mortos em sua alma, pelos demônios e seu tormento será interminável. Assim, me odeiam como a uma serpente, adoram um ídolo em meu lugar e amam seu próprio orgulho em lugar de minha humildade. Entretanto, sou tão piedoso que se voltarem-se para mim com contrição, me voltarei para eles como um pai dedicado e lhes abrirei os braços. Em terceiro lugar, a rocha verteu água por meio deste cajado. Esta rocha é o endurecido coração humano. Quando é perfurado por meu temor e amor, fluem em seguida as lágrimas de contrição e a penitência. Ninguém é tão indigno nem tão mau que seu rosto não se inunde de lágrimas nem se agitem todos os seus membros com a devoção, quando regressa a mim, quando reflete minha Paixão em seu coração, quando recobra a consciência do meu poder, quando pensa em como minha bondade faz com que a terra e as árvores deem frutos. Na arca de Moisés, em segundo lugar se conservou o maná. Assim também em ti, minha Mãe e Virgem, se conserva o Pão dos anjos, das almas santas e dos justos, aqui na Terra, a quem nada agrada mais que a minha doçura, para quem tudo no mundo está morto, e quem, se fosse minha vontade, com gosto viveriam sem nutrição física. Na arca, em terceiro lugar, estavam as tabuas da Lei. Também em ti encontra-se o Senhor de todas as Leis. Por isso, bendita sejas sobre todas as criaturas no Céu e na Terra! Então, se dirigiu à esposa, dizendo: “Diga três coisas aos meus amigos. Quando habitei fisicamente no mundo, temperei minhas palavras de tal forma que fortaleceram os bons e os tornaram mais fervorosos. Também os maus se fizeram melhores, como foi claramente o caso de Maria Madalena, Mateus e muitos outros. De novo, temperei minhas palavras de tal forma que meus inimigos não foram capazes de diminuir sua força. Por isso, que aqueles aos quais são enviadas minhas palavras trabalhem com fervor, de modo que os bons se tornem mais ardentes em sua bondade por minhas palavras, os maus se arrependam de sua maldade; que evitem que meus inimigos obstruam minhas palavras.". Não faço mais dano ao demônio do que aos anjos do Céu. Pois, se quisesse, poderia muito bem pronunciar minhas palavras de modo que todo mundo as ouvisse. Sou capaz de abrir o inferno para que todos vejam seus castigos. Entretanto, isso não seria justo, pois as pessoas então me serviriam por medo, quando devem me servir por amor. Pois só a pessoa que ama pode entrar no Reino dos Céus. Além disso, eu estaria prejudicando o diabo, se levasse comigo os escravos que ele adquiriu vazios de boas obras. Também prejudicaria os anjos do Céu, se o espírito de uma pessoa imunda se pusesse no mesmo nível de outra que está pura e fervorosa no amor. Consequentemente, ninguém entrará no Céu, exceto aqueles que tenham sido provados como ouro no fogo do purgatório ou aqueles que tenham provado a si mesmo ao longo do tempo, fazendo boas obras na Terra, de tal modo que não fique neles mancha alguma pendente de ser purificada. Se tu não sabes a quem hão de dirigir-se minhas palavras, vou te dizer. Àquele que deseja obter méritos através das boas obras para vir ao Reino dos Céus ou quem já o mereceu por boas obras do passado. Minhas palavras hão de ser entregues aos que são assim e hão de penetrar neles. Àqueles que sentem um gosto por minhas palavras e esperam humildemente que seus nomes sejam inscritos no livro da vida, conservam minhas palavras. Aqueles que não a saboreiam, no princípio as consideram, mas depois, as rejeitam e as vomitam imediatamente.

               As palavras de um Anjo à esposa sobre se o espírito de seus pensamentos é bom ou ruim, sobre como há dois espíritos, um não criado e um criado e sobre suas características.

               Um anjo falou à esposa dizendo: Há dois espíritos, um não criado e um criado. O não criado possui três características. Em primeiro lugar, é quente, em segundo lugar, doce e em terceiro lugar, puro. Primeiro, emite calor não das coisas criadas, mas de si mesmo, pois, junto com o Pai e o Filho, ele é o Criador de todas as coisas e o todo poderoso. Ele emite calor sempre que a alma inteira se inflama pelo amor de Deus. Segundo, é doce, quando nada agrada e deleita a alma mais que Deus e o conjunto de suas obras. Terceiro, é puro e nele não se pode achar pecado nem deformidade, nem corrupção ou mutabilidade". Ele não emite calor como fogo material ou como o sol visível, que faz as coisas derreterem. Seu calor é o amor interno e o desejo da alma, que a plenifica e a engrandece em Deus. Ele é doce para a alma, não da mesma forma que é o vinho ou o prazer sensual ou algo que seja doce no mundo. A doçura do Espírito não se pode comparar com nenhuma doçura temporal e é inimaginável para aqueles que não a tenham experimentado. Terceiro, o Espírito Santo é tão puro quanto os raios do sol, onde nenhuma impureza pode ser encontrada. O outro, o espírito criado, também possui três características. Ele é ardente, amargo, e sujo. Primeiro, queima e consome como o fogo, pois incendeia a alma que possui, com o fogo da luxúria e o desejo depravado, de forma que a alma não pode nem pensar nem desejar outra coisa além de satisfazer seu desejo, até ao ponto de que, como resultado disso, sua vida temporal às vezes perde a honra e a dignidade. Segundo, é tão amargo como o fel, pois, ao inflamar a alma com sua luxúria, os outros prazeres se lhe parecem insossos e os gozos eternos lhe parecem tolices. Tudo o que tem a ver com Deus e que a alma haveria de fazer por Ele, se torna amargo e tão abominável como um vômito de bílis. Terceiro, é imundo, uma vez que deixa a alma tão vil e propensa ao pecado, que não se envergonha de pecar nem desistiria de fazê-lo se não fosse porque teme ver-se envergonhada diante de outras pessoas, mais que diante de Deus. É por isso que este espírito arde como fogo, pois queima pela iniquidade e incendeia a outros juntamente com ele. Também é por isso que este espírito é amargo, porque todo o bom se lhe parece amargo e deseja tornar o bem em amargura para os outros como faz consigo mesmo. Também é por isso que é imundo, porque se deleita na corrupção e busca tornar os outros como a si próprio. Agora, tu podes me perguntar e dizer: “Acaso não és também tu um espírito criado assim como esse? Por que, não és igual?" Eu responderei: Claro que sou criado pelo mesmo Deus que também criou o outro espírito, pois há somente um Deus, Pai, Filho e Espírito Santo, e estes não são três deuses mas um só Deus. Ambos fomos perfeitos e criados por Deus, porque Deus tão somente criou o bem. Mas eu sou como uma estrela, pois tenho me mantido fiel na bondade e no amor de Deus, em quem fui criado e ele é como o carvão porque abandonou o amor de Deus. Por isso, assim como uma estrela tem brilho e esplendor e o carvão é negro, um Santo Anjo, que é como uma estrela, tem seu esplendor, ou seja, o Espírito Santo. Pois tudo o que tem, o tem de Deus, do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Cresce inflamado no amor de Deus, brilha em seu esplendor se adere a Ele e se conforma com sua vontade sem querer nada mais do que Deus quer. É por isso que ele arde como uma labareda, é por isso que é puro. O demônio é como um carvão feio, mais feio do que qualquer outra criatura, pois, só pelo fato de ter sido o mais belo dos Anjos, tornou-se o mais feio entre todos, justamente por opor-se ao seu Criador. Assim como o anjo de Deus brilha com a luz de Deus e se inflama incessantemente em seu amor, assim o demônio está sempre se queimando na angústia de sua maldade. Sua maldade é insaciável, assim como a graça e a bondade do Espírito Santo são indescritíveis. Não há ninguém no mundo tão arraigado ao demônio, que o bom Espírito não o visite alguma vez e mova seu coração. Da mesma forma, não há ninguém tão bom que o demônio não tente tocá-lo com a tentação. Muitas pessoas boas e justas são tentadas pelo demônio com a permissão de Deus. Isto não é por maldade alguma de sua parte, mas para a sua maior glória. O Filho de Deus, uno em divindade com o Pai e com o Espírito Santo, foi tentado na natureza humana que tomou. Quanto mais seus eleitos são postos à prova para uma recompensa maior! Novamente, muitas pessoas boas, às vezes, caem no pecado e sua consciência se escurece pela falsidade do demônio, mas elas voltam a se levantar robustecidas e se mantêm mais fortes do que antes pelo poder do Espírito Santo. Entretanto, não há ninguém que não perceba em sua consciência, se a sugestão do demônio conduz à deformidade do pecado ou ao bem, se somente pensassem nisso e examinassem cuidadosamente. E assim, esposa do meu Senhor, tu não hás de duvidar se o espírito de seus pensamentos é bom ou mau. Pois a tua consciência te diz quais coisas hás de ignorar e quais escolher. O que há de fazer uma pessoa que está cheia do demônio se, por esta razão, o Espírito bom não pode entrar nela? Ela deve fazer três coisas. Há de fazer uma confissão clara e completa de seus pecados, na qual, mesmo se ela não estiver totalmente arrependida, devido à dureza de coração, mesmo assim se beneficie disso, na medida em que –devido a sua confissão- o demônio lhe dê certa trégua e saia do caminho do Espírito Santo. Segundo, há de ser humilde, decidir reparar os pecados cometidos e fazer todo o bem que possa e então o demônio começará a abandoná-la. Terceiro, para conseguir que volte a ela o bom Espírito, deve suplicar a Deus, em humilde oração, e com verdadeiro amor, arrepender-se dos pecados cometidos, já que o amor de Deus mata o demônio. O demônio é tão invejoso e malicioso que preferiria morrer cem vezes a ver alguém fazer uma boa ação por pequena que seja, por amor a Deus.

               Então, a bendita Virgem falou à esposa dizendo: Nova esposa de meu Filho, arruma-te, coloque seu broche, ou seja, a Paixão de meu Filho!

Ela lhe respondeu: Minha Senhora, coloque-o tu mesma!

E ela disse: Claro que o farei. Também quero que saibas como meu Filho estava disposto e por que os pais o almejaram tanto. Ele estava, como se disséssemos, entre duas cidades. Uma voz, da primeira cidade lhe chamou dizendo: Tu, que estás aí, entre as cidades, és um homem sábio, pois sabes como proteger-te dos perigos iminentes. Também és forte o bastante para resistir aos males ameaçadores. Além disso és valente, porque nada temes. Temos estado desejando-te e esperando-te! Abra nossa porta! Os inimigos a estão bloqueando para que não possa ser aberta!" Uma voz da segunda cidade foi ouvida dizendo: Tu, homem humaníssimo e fortíssimo escute nossas queixas e gemidos! Considera nossa miséria e nossa penúria! Estamos sendo podados como a erva cortada por uma foice. Estamos enfraquecidos, separados de toda bondade e toda nossa força nos abandonou. Vinde a nós e salvai-nos, pois só a ti temos esperado, temos posto nossa esperança em ti como nosso libertador! Vinde e acabai com nossa penúria, transformai em gozo nossos lamentos! Sede nossa ajuda e nossa salvação! Vinde digníssimo e sacratíssimo corpo, que procede da puríssima Virgem!’ Meu Filho ouviu estas duas vozes vindas das duas cidades, ou seja, do Céu e do Inferno. Por isso, em sua misericórdia, abriu as portas do inferno por meio de sua amarga paixão e o derramamento de seu sangue, e resgatou dali os seus amigos. Ele também abriu o Céu e deu alegria aos anjos ao conduzir para ali os amigos que havia resgatado do inferno. “Filha minha, pensa nestas coisas e mantenha-as sempre diante de ti!

               Sobre como Cristo é comparado a um poderoso senhor que constrói uma grande cidade e um lindo palácio, que representam o mundo e a Igreja, e sobre como os juízes, e trabalhadores da Igreja de Deus se converteram em um arco inútil.

            Sou como um poderoso senhor que construiu uma cidade e deu seu nome a ela. Na cidade, construiu um palácio no qual havia vários pequenos cômodos para armazenar o necessário. Depois de haver construído o palácio e organizado todos os seus assuntos, dividiu seu povo em três grupos, dizendo: ‘Estou partindo para uma região remota. Ficai firmes e trabalhai bravamente pela minha glória! Providenciei vossa comida e outras necessidades. Tendes juízes para julgá-los, defensores para protegê-los de vossos inimigos, e encarreguei a uns empregados para alimentá-los. Eles hão de pagar-me o dízimo de seu trabalho, reservando-o para meu uso e em minha honra.” Entretanto, passado certo tempo, o nome da cidade caiu no esquecimento. Então, os juízes disseram: ‘Nosso senhor viajou para uma região remota. Que julguemos corretamente e façamos justiça de modo que, quando ele retornar, não seremos acusados, e sim elogiados e abençoados’. Então, os defensores disseram: ‘Nosso senhor confia em nós e entregou sua casa a nossos cuidados. Vamos nos abster de alimentos e bebidas supérfluas, para não ficarmos inaptos em caso de batalha! Vamos nos abster do sono excessivo, para não sermos capturados de improviso! Estejamos também bem armados e em alerta constante, para não sermos surpreendidos em um ataque inimigo! A honra de nosso senhor e a segurança de seu povo dependem muito de nós’. Depois, os empregados disseram: A glória de nosso senhor é grande e sua recompensa é maravilhosa. Vamos trabalhar com vigor e demos a ele não apenas um décimo de nosso trabalho, mas sim, tudo o que nos sobrar daquilo que gastamos para viver! Todos nossos salários serão mais gloriosos quanto mais amor nosso senhor veja em nós. Depois disso, algum tempo mais se passou e o senhor da cidade e seu palácio foram ficando esquecidos. Então os juízes disseram para si mesmos: Nosso senhor está demorando muito. Não sabemos se voltará ou não. Assim, julguemos da forma que quisermos e façamos o que nos agrada! Os defensores disseram: Somos uns tolos porque trabalhamos e não sabemos qual será nossa recompensa! Aliemos-nos a nossos inimigos e durmamos e bebamos com eles! Pois, não é assunto nosso de quem hajam sido inimigos. Depois disso, os empregados disseram: Por que guardamos nosso ouro para outro? Não sabemos quem ficará com ele. É melhor, então, que o usemos e disponhamos de acordo com nossa vontade. Demos a décima parte aos juízes, e, tendo-os de nosso lado, poderemos fazer o que quisermos. Em verdade sou como esse poderoso senhor. Construí Eu mesmo uma cidade, isto é, o mundo, e ali coloquei um palácio, isto é, a Igreja. O nome dado ao mundo foi sabedoria divina, pois o mundo teve esse nome desde o princípio, ao haver sido feito na divina sabedoria. Este nome era venerado por todos e Deus era louvado por seu conhecimento e maravilhosamente aclamado por todas as suas criaturas. Nos tempos atuais, o nome da cidade foi desonrado e mudado, e sabedoria mundana é o novo nome que se usa. Os juízes, que no passado davam sentenças justas no temor do Senhor, agora se levantam em soberba e se tornam a ruína das pessoas simples. Aparentam ser eloquentes para receberem elogios humanos; falam agradavelmente para obter favores. Toleram quaisquer palavras para que digam que são bons e compassivos; mas permitem-se ser subornados para ditar sentenças injustas. São sábios no que diz respeito a seus próprios benefícios mundanos e a seus próprios desejos, mas são mudos em meu louvor. Menosprezam as pessoas simples e as mantêm quietas. Estendem a todos sua cobiça e convertem o certo em errado. Esta é a sabedoria apreciada nos dias de hoje, enquanto que a minha caiu no esquecimento. Os defensores da Igreja, que são os nobres e os cavaleiros, olham para meus inimigos, os assaltantes da minha Igreja, e fingem que não os veem Escutam suas repreensões e não se importam. Conhecem e compreendem as obras daqueles que violam meus mandamentos e, entretanto os suportam pacientemente. Eles os observam diariamente, perpetrando todo tipo de pecado mortal com impunidade e não sentem compulsão mas dormem lado a lado com eles e tem se relacionado com eles, ligando-se à suas companhias mediante juramento. Os empregados, que representam todos os cidadãos, rejeitam meus mandamentos e retêm meus presentes e dízimos. Subornam os juízes e lhes demonstram reverência para garantir sua boa vontade e favores. Atrevo-me a dizer, de fato, que a espada do temor a mim e a minha Igreja na terra foi degradada, e uma bolsa cheia de dinheiro foi aceita em troca.

               Palavras com as quais Deus explica a revelação anterior; sobre a sentença emitida contra estas pessoas e sobre como Deus em alguns momentos, aguenta os malvados pelo bem dos justos.

            Já te disse antes que a espada da Igreja havia sido degradada e um saco de dinheiro havia sido aceito em troca. Este saco está aberto por uma extremidade. No outro extremo é tão profundo que tudo o que nele entra nunca alcança o fundo, por isso, o saco nunca se enche. Este saco representa a ganância. Ela excedeu todos os limites e medidas e se tornou tão forte que o Senhor é desprezado e nada mais é desejado exceto o dinheiro e o egoísmo. Entretanto, Eu sou como um senhor que por sua vez é pai e juiz. Quando seu filho vai a julgamento, os ali presentes dizem: ‘Senhor, proceda rapidamente e dê logo o seu veredicto!’ O senhor lhes responde: ‘Esperem um pouco até amanhã, pois talvez meu filho mude de vida até lá!’. Quando chega o dia seguinte, as pessoas dizem: Prossiga e dê sua sentença, Senhor! Por quanto tempo irás adiá-la e não condenarás o culpado?’ O senhor responde: ‘Esperem um pouco mais, para vermos se meu filho muda! E então, se não se arrepender, farei o que for justo.’ Da mesma forma, eu tolero pacientemente as pessoas até o último momento, já que sou Pai e Juiz. Entretanto, como minha sentença é incomutável, apesar da demora para emiti-la, castigarei os pecadores que não se emendarem ou, se eles se converterem, lhes mostrarei minha misericórdia. Já te disse antes que classifiquei as pessoas em três grupos: juízes, defensores e empregados. O que os juízes simbolizam senão os sacerdotes que converteram minha a sabedoria divina em corrupção e vão conhecimento? Como alunos avançados, que recompõem um texto longo em outro mais breve e, com poucas palavras dizem o mesmo que se dizia com muitas, os sacerdotes de hoje em dia, tomaram meus dez mandamentos e os resumiram em uma só frase. E qual é essa única frase? ‘Estenda tua mão e dê-nos dinheiro! Esta é sua sabedoria: falar elegantemente e agir maldosamente, fingir que pertencem a mim e agir injustamente contra mim. Em troca de subornos, amavelmente suportam aos pecadores em seus pecados e, com seu exemplo provocam a queda das pessoas simples. Além disso, odeiam aqueles que seguem meus caminhos. Segundo, os defensores da Igreja, os nobres, são desleais. Quebraram sua promessa e juramento e toleram com gosto aqueles que pecam contra a fé e a Lei de minha Santa Igreja. Terceiro, os empregados, ou cidadãos, são como touros selvagens, pois fazem três coisas. Primeiro, marcam o chão com suas pisadas; segundo fartam-se até saciar-se; terceiro, satisfazem seus próprios desejos somente de acordo com sua vontade. Hoje, os cidadãos anseiam apaixonadamente pelos bens temporais. Reafirmam a si mesmos na glutonaria imoderada e na vaidade mundana. Satisfazem seus prazeres carnais de maneira irracional. Porém, embora meus inimigos sejam muitos, ainda tenho amigos entre esses, mesmo que escondidos. Foi dito a Elias, que acreditava não haver mais amigos meus além dele mesmo: ‘Existem sete mil homens que não dobraram seus joelhos diante de Baal. Da mesma forma, embora sejam muitos os inimigos, ainda tenho amigos escondidos entre eles, que se lamentam diariamente, pois meus inimigos prevalecem e meu nome é desprezado. Como um rei bondoso e caridoso que conhece os fatos perversos da cidade, mas tolera seus habitantes pacientemente e envia cartas a seus amigos alertando-os sobre o perigo que correm, assim também, em atenção às suas orações Eu envio minhas palavras aos meus amigos. Estas não são tão obscuras como as encontradas no Apocalipse que revelei a João sob um véu de obscuridade para que pudessem, a seu tempo, ser explicadas por meu Espírito quando Eu quisesse. Elas não são tão enigmáticas que não possam ser manifestadas -assim como quando Paulo viu alguns de meus mistérios e sobre os quais não lhe foi permitido falar- mas que são tão evidentes que todos, com pouca ou aguda inteligência, podem entendê-las, tão fáceis que quem quiser as pode captar. Portanto, que meus amigos vejam como minhas palavras atingem meus inimigos, para que talvez se convertam. Que se lhes deem a conhecer seus perigos e juízo para que se arrependam de suas obras! Caso contrário, a cidade será julgada e, como uma parede é derrubada sem deixar pedra sobre pedra ou mesmo duas pedras unidas no alicerce, assim acontecerá com a cidade, isto é, o mundo. Os juízes, certamente, queimarão no fogo mais ardente. Não há fogo que arda mais do que aquele alimentado com gordura. Estes juízes estavam untados, pois tiveram mais ocasiões de satisfazer seu egoísmo que os demais, sobrepujaram os outros em honras e abundância mundanas, e também em maldade e crueldade. Por isso, arderão na mais quente das panelas. Os defensores serão pendurados no mais alto dos patíbulos. Um patíbulo consiste em duas peças verticais de madeira com uma terceira colocada em cima, de forma transversal. Este patíbulo com dois postes de madeira representa seu cruel castigo que está, por assim dizer, feito com duas peças de madeira. A primeira peça significa que não tiveram esperança em minha recompensa eterna nem trabalharam para merecê-la por suas obras. A segunda peça de madeira indica que eles não confiaram em meu poder e bondade, crendo que Eu não era capaz de fazer tudo ou que não os quisesse prover suficientemente. A viga de madeira transversal, representa sua consciência deturpada, distorcida, pois eles entendiam bem o que estavam fazendo, mas fizeram o mal e não sentiram vergonha de ir contra sua consciência. A corda do patíbulo significa o fogo inextinguível, que não pode ser apagado pela água nem cortado por tesouras, nem quebrado ou acabado pelo tempo. Nesta forca de punição cruel e fogo inextinguível, eles ficarão pendurados e humilhados como traidores. Sentirão angústia, pois foram desleais. Ouvirão insultos, pois minhas palavras lhes eram desagradáveis. Gritos de dor estarão em suas gargantas, pois sentiram prazer em seu próprio louvor e glória. Corvos vivos, isto é, demônios que nunca se saciam, os machucarão neste patíbulo, mas, embora estejam feridos, nunca serão consumidos: viverão em tormento sem fim e seus carrascos viverão para sempre. Sofrerão um duelo que nunca acabará e uma desgraça que nunca diminuirá. Teria sido melhor para eles não haver nascido, e que sua vida não tivesse sido prolongada! A sentença dos trabalhadores será a mesma que é dada aos touros. Touros têm uma pele e uma carne muito espessas. Por isso, sua sentença é o afiadíssimo gume. Esta lâmina afiada significa a morte infernal que atormentará aqueles que me hajam desprezado e que tenham amado seus desejos egoístas mais que os meus mandamentos. A carta, isto é, minhas palavras, foram escritas. Que meus amigos trabalhem para fazê-las chegar aos meus inimigos com sabedoria e discrição, na esperança de que atendam e se arrependam. Se, tendo ouvido minhas palavras, alguém disser: "Esperemos um pouco mais, ainda não chegou o momento ainda não é sua hora". Então, pela minha natureza divina, que expulsou Adão do paraíso e mandou as dez pragas ao faraó, juro que irei até eles antes do que pensam. Pela minha natureza humana- que assumi da Virgem, sem pecado, para a salvação da humanidade e na qual sofri aflição em meu coração, experimentei dor em meu corpo e morri para que os homens vivam, e nela ressuscitei e subi ao Céu e estou sentado à direita do Pai, verdadeiro Deus e homem em uma pessoa- Eu juro que cumprirei minhas palavras. Por meu Espírito- que desceu sobre os Apóstolos no dia de Pentecostes e os inflamou de tal forma que eles falaram a língua de todos os povos, Eu juro que, a menos que emendem seus caminhos e voltem a mim como humildes servos, me vingarei deles em minha ira. Então, lamentar-se-ão em corpo e alma. Lamentar-se-ão por terem vindo viver no mundo e de haver vivido nele. Lamentar-se-ão de que o prazer que experimentaram foi muito pequeno e agora é nulo, e, entretanto, sua tortura será para sempre. Então, perceberão o que agora se recusam a acreditar, isto é, que minhas palavras eram palavras de amor. Assim, compreenderão que os aconselhei como um pai, mas eles não quiseram escutar-me. Em verdade, se não acreditaram nas palavras de bondade, terão de acreditar nas obras que estão por vir.

               Palavras o Senhor à esposa sobre como Ele é nutrição abominável e insignificante nas almas dos cristãos, enquanto o mundo é deleitável e amável para eles, e sobre a terrível sentença que recairá em tais pessoas.

               O Filho falou à esposa: ‘Os Cristãos me tratam agora da mesma forma que me trataram os judeus. Os judeus me expulsaram do templo e estavam inteiramente resolvidos a matar-me, mas, pelo fato de minha hora ainda não ter chegado, escapei de suas mãos. Os Cristãos me tratam assim agora. Expulsam-me de seu templo, ou seja, de sua alma, que deveria ser meu templo, e se pudessem me matariam em seguida. Em seus lábios sou como carne podre e mal cheirosa, creem que estou mentindo e não se preocupam comigo, em absoluto. Voltam-me suas costas, mas Eu afastarei minha face deles, pois não há nada mais que cobiça em suas bocas e só luxúria bestial em sua carne. Só a soberba os agrada, só os prazeres mundanos encantam seus olhos. Minha Paixão e meu Amor lhes são repugnantes e minha vida um peso. Por isso, agirei como o animal que tem muitas tocas: quando os caçadores o acossam em uma toca, foge para outra. Farei isto, porque estou sendo perseguido pelos cristãos com suas más obras e expulso da toca de seus corações. Por isso, irei aos pagãos, em cujas bocas agora sou amargo e insípido, mas chegarei a ser-lhes mais doce que o mel. Entretanto, ainda sou tão misericordioso que com gosto abrirei meus braços a quem me peça perdão e diga: ‘Senhor, sei que pequei gravemente e livremente quero melhorar minha vida por tua graça. Tem piedade de mim por tua amarga paixão!’ Mas, àqueles que persistirem no mal, lhes chegarei como um gigante com três qualidades: terrível, muito forte e muito áspero. Chegarei inspirando tanto medo aos cristãos que não se atreverão a levantar o dedo mínimo contra mim. Eu virei ainda com tanta força que eles serão como uma mosca diante de mim. Terceiro, eu virei com tal aspereza que se sentirão tristes no presente e lamentarão sem fim.

               As palavras da Mãe à esposa; doce diálogo da Mãe com o Filho, e sobre como Cristo é amargo, muito amargo, amaríssimo para os maus, porém doce, muito doce, dulcíssimo para os bons.

               A Mãe disse à esposa: Considera, jovem esposa, a Paixão de meu Filho. Sua paixão sobrepujou em amargura a paixão de todos os Santos. Assim como uma mãe ficaria amargamente abalada se tivesse que presenciar como cortavam em pedaços seu próprio filho vivo, assim eu fiquei abalada na paixão de meu Filho quando presenciei a crueldade de tudo aquilo’. Então ela disse a seu       Filho: ‘Bendito sejas, Filho meu, pois és santo, como diz a canção: ‘Santo, santo, santo, é o Senhor Deus do Universo. Bendito sejas, pois és doce, muito doce, e o mais doce! Eras santo antes da encarnação, santo em meu ventre santo, depois da encarnação. Foste doce antes da criação do mundo, mais doce que os anjos e o mais doce para mim em tua encarnação.

O Filho respondeu: Bendita sejas, Mãe, sobre todos os anjos! Assim como fui o mais doce para ti, como dizias agora, também sou amargo, muito amargo, o mais amargo para os maus. Sou amargo para aqueles que dizem que criei muitas coisas sem motivo, que blasfemam e dizem que criei as pessoas para morrer e não para viver. Que ideia tão miserável e sem sentido! Acaso Eu, que sou o mais justo e virtuoso, criei os anjos sem uma razão? Teria Eu dotado a natureza humana de tantas bondades se a tivesse criado para se condenarem? De maneira alguma! Eu fiz todo bem por amor, à humanidade dei todo bem. Entretanto, a humanidade converte todo o bem em mal para si. Não Sou eu que faço nada mau, e sim, são eles que o fazem, dirigindo sua vontade a tudo, menos ao que deveriam, de acordo com a Lei Divina. Isto é o que é mal. Sou mais amargo para aqueles que dizem que lhes dei livre arbítrio para pecar e não para fazer o bem, que dizem que sou injusto, porque condeno algumas pessoas enquanto que a outras, justifico; que me culpam por sua própria maldade, porque afasto deles minha graça. Sou muito amargo para aqueles que dizem que minha lei e meus mandamentos são muitos difíceis e que ninguém os pode cumprir; que dizem que minha paixão é indigna para eles, e que é por isso que não a consideram. Portanto, juro por minha vida, como jurei uma vez pelos profetas, que defenderei minha causa diante dos anjos e todos os meus santos. Aqueles para quem Eu sou amargo comprovarão por si mesmos que Eu criei tudo racionalmente e bem, para utilidade e instrução da humanidade, e que nem o menor dos vermes existe sem motivo. Aqueles para os quais sou muito amargo, comprovarão por si mesmos que Eu, sabiamente, dei ao ser humano livre arbítrio a respeito do bem. Descobrirão também que Eu sou justo, dando reino eterno às pessoas boas e castigando os maus. Não seria justo que o demônio, a quem criei como bom, mas que caiu por sua própria maldade, estivesse em companhia dos bons. Os maus também comprovarão que não é culpa minha que eles sejam perversos, mas sua. De fato, se fosse possível, com gosto me submeteria por todos e cada um dos seres humanos aos mesmos castigos que aceitei uma vez na cruz por todos, para restituir-lhes sua herança prometida. Mas a humanidade está sempre opondo sua vontade à minha. Dei-lhes liberdade para que me servissem se quisessem, e merecessem assim, o premio eterno. Mas se eles não quisessem, teriam que compartilhar o castigo do demônio, por cuja maldade e suas consequências, foi justamente criado o inferno. Como sou cheio de caridade, não quis que a humanidade me servisse por medo nem que fosse obrigada a fazê-lo como os animais irracionais, mas por amor a Deus, porque ninguém que sirva contra a sua vontade ou por medo de meu castigo pode ver minha face. Aqueles para os quais sou muito amargo perceberão em sua consciência, que minha lei era leve e meu jugo suave. Estarão inconsolavelmente tristes de haver menosprezado minha Lei e de haver amado o mundo em seu lugar, cujo jugo é mais pesado e muito mais difícil que o meu.

Então, sua Mãe acrescentou: Bendito sejas, Filho meu, meu Deus e Senhor! Porque tu eras minha doce delicia, rogo que os demais possam participar desta doçura.

O Filho respondeu: Bendita és tu, minha querida Mãe! Tuas palavras são doces e cheias de amor. Por isto bondosamente acudirei a quem receba tua doçura em sua boca e a conserve perfeitamente. Mas quem a receba e a rejeite será castigado da forma mais amarga.

A Virgem respondeu: “Bendito sejas, Filho meu, por todo o teu amor!

               Palavras de Cristo, na presença da esposa, contendo parábolas nas quais Cristo se compara com um camponês; os bons sacerdotes com um bom pastor; os maus sacerdotes com um mau pastor e os bons cristãos como uma esposa. Estas comparações são úteis de várias formas.

            Eu sou aquele que nunca pronunciou mentira alguma. O mundo me toma por um camponês cujo mero nome leva ao desprezo. Minhas palavras são tomadas por tolices e minha casa é considerada uma vil habitação. Agora, este camponês tinha uma esposa que não queria nada mais do que ele queria, que tinha tudo em comum com seu marido e o aceitou como seu mestre, obedecendo-lhe em tudo. Este camponês também tinha muitas ovelhas, e contratou um pastor para cuidar delas por cinco moedas de ouro e pelo suprimento de suas necessidades diárias. Este era um bom pastor, que fez bom uso do ouro e do alimento na medida de suas necessidades. Com o passar do tempo, esse pastor foi sucedido por outro pastor, um inferior, que usou o ouro para comprar uma esposa e dar-lhe seu alimento, que descansava com ela constantemente e não cuidava das pobres ovelhas, que foram acossadas e dispersadas por animais ferozes. Quando o camponês viu seu rebanho disperso, gritou: ‘Meu pastor não me é fiel. Meu rebanho se dispersou e algumas ovelhas indefesas foram devoradas por animais ferozes, enquanto que outras morreram ainda que seus corpos não tenham sido destroçados. Então, a mulher do camponês disse a seu marido: ‘Senhor, é certo que não recuperaremos os corpos que foram devorados. Mas, vamos levar para casa e usar aqueles corpos que ficaram intactos, ainda que já não haja um sopro de vida neles. Não poderíamos suportar o ficarmos sem nada.” Seu marido lhe respondeu: ‘O que faremos? Como os animais têm veneno em seus dentes, a carne das ovelhas está infectada de veneno mortal, a pele está corrompida, a lã está ruim’. Sua mulher acrescentou: ‘Se tudo foi desperdiçado e tudo foi perdido, então, do que vamos viver?’ O marido disse: ‘Vejo que há algumas ovelhas ainda vivas em três lugares. Algumas delas parecem mortas e não ousam respirar por medo. Outras estão enterradas no barro e não podem se levantar. Ainda outras estão escondidas e não ousam sair. Vem, esposa, vamos levantar as ovelhas que estão tentando pôr-se de pé, mas não conseguem sem ajuda, e vamos usá-las!’ Observa, Eu, o Senhor, sou o camponês. Os homens me veem como o traseiro de um burro criado em um estábulo de acordo com sua natureza e hábitos. Meu nome é a mente da Santa Igreja. Ela é considerada como desprezível, na medida em que os sacramentos da Igreja, batismo, crisma, unção, penitência e matrimônio são, de alguma forma, recebidos com zombaria e administrados a alguns com ganância. Minhas palavras são consideradas tolas, pois as palavras da minha boca, pronunciadas em parábolas, passaram de um entendimento espiritual a ser convertidas em entretenimento para os sentidos. Minha casa é vista como desprezível, enquanto que as coisas da terra são mais amadas que as do Céu. O primeiro pastor que tive simboliza meus amigos, isto é, os sacerdotes que costumava ter na Santa Igreja, (por ‘um’ quero dizer muitos). A eles confiei meu rebanho, isto é, o meu venerável corpo para que o consagrassem e as almas de meus eleitos para que as governassem e protegessem. Também lhes dei cinco coisas boas, mais preciosas que ouro, a saber, a compreensão inteligente de todos os temas enigmáticos para que distinguissem entre o bem e o mal, entre a verdade e a falsidade. Segundo, dei-lhes discernimento e sabedoria de temas espirituais; isto foi esquecido, agora e em seu lugar se ama o conhecimento do mundo. Terceiro, dei-lhes castidade; quarto, temperança e abstinência em tudo para autocontrole de seu corpo; quinto, estabilidade nos bons hábitos, palavras e obras. Depois deste primeiro pastor, ou seja, depois destes meus amigos que faziam parte da minha Igreja no passado, agora entraram outros pastores malvados. Eles compraram uma esposa para si mesmos, em troca de ouro, isto é, em troca de sua castidade e, por essas cinco coisas boas, tomaram para si o corpo de uma mulher, isto é, a incontinência. Por isso, meu Espírito afastou-se deles. Quando têm total vontade de pecar ou de satisfazer à sua esposa, isto é, sua luxúria, de acordo com seu sentido de prazer, meu Espírito está ausente deles, pois não se importam com a perda do rebanho enquanto possam seguir sua própria vontade. As ovelhas que foram completamente devoradas representam aqueles cujas almas estão no inferno e cujos corpos estão enterrados em túmulos a espera da ressurreição para a condenação eterna. As ovelhas cujos corpos estão intactos, mas cujos espíritos de vida já não estão nelas, representam as pessoas que nem me amam, nem me temem, não sentem devoção alguma nem se importam comigo. Meu espírito está longe delas, já que os dentes envenenados das feras contaminaram sua carne. Em outras palavras, seus pensamentos e espírito, como o simbolizam a carne e entranhas das ovelhas, são para mim tão repugnantes como comer carne envenenada. Sua pele, isto é, seu corpo, está desprovido de toda bondade e caridade e não têm condições de servir em meu reino. Ao contrario, seja enviado ao fogo eterno do inferno depois do juízo. Sua lã, isto é, suas obras, são tão inúteis que não há nada nelas que lhes faça merecer meu amor e minha graça. O que, então, minha esposa, que simboliza os bons Cristãos, podemos fazer? Vejo que ainda há ovelhas vivas em três lugares. Algumas delas assemelham-se à ovelha morta e não ousam respirar por medo. Estes são os pagãos que, de boa vontade, adotariam a verdadeira fé se ao menos a conhecessem. Entretanto, não ousam respirar, isto é, não ousam perder a fé que já têm e não se atrevem a aceitar a verdadeira fé. O segundo grupo de ovelhas é daquelas que permanecem escondidas e não ousam sair. Estas representam os judeus que, por assim dizer, estão como detrás de um véu. Sairiam com prazer se tivessem certeza do meu nascimento. Escondem-se por trás do véu, na medida em que sua esperança de salvação está nas imagens e sinais que costumavam simbolizar-me na antiga Lei, mas que foram verdadeiramente realizados em mim, quando me encarnei. Por sua vã esperança, têm medo de passar à verdadeira fé. Em terceiro lugar, as ovelhas que ficaram afundadas na lama são os cristãos em estado de pecado mortal. Por temerem o castigo, estão desejosos de levantar-se de novo, mas não o conseguem devido à gravidade de seus pecados e porque lhes falta caridade. Por isso, esposa minha, ou seja meus bons cristãos, ajudem-me! Assim como homem e mulher são considerados uma só carne e um só membro, assim, o cristão é meu membro e Eu sou dele, pois estou nele e ele em Mim. Assim pois, minha esposa, meus bons Cristãos, dirijam-se comigo às ovelhas que ainda respiram um pouco e vamos levantá-las e revivê-las! Sustentem seus dorsos enquanto eu lhes sustento a cabeça! Alegro-me em carregá-las em meus braços. Uma vez as carreguei todas sobre minhas costas, quando estas estavam feridas e pregadas na cruz. Ó meus amigos! Amo tão ternamente essas ovelhas que, se me fosse possível sofrer, por qualquer dessas ovelhas individualmente, a morte que sofri uma vez na cruz por todas elas, preferiria redimi-las antes que perdê-las. Por isso, com todo o meu coração, rogo a meus amigos que não poupem esforços nem bens por mim. Se não me pouparam da repreensão quando estive no mundo, que não se retraiam eles, na hora de dizer a verdade sobre mim. Não me envergonhei de morrer uma morte desprezível por eles, mas permaneci lá assim como vim ao mundo, nu, perante os olhos de meus inimigos. Seus punhos golpearam meus dentes; fui arrastado pelos cabelos; fui flagelado por chicotes; fui pregado à madeira com suas ferramentas, e pregado na cruz junto com meliantes e ladrões. Por esse motivo, meus amigos, não se poupem por mim que suportei tudo isso por amor a vocês! Trabalhem corajosamente e ajudem meu necessitado rebanho! Por minha natureza humana - que é o Pai porque o Pai está em mim - e por minha natureza divina - que é meu Espírito porque o Espírito está nela e porque o mesmo Espírito está em mim e Nele, sendo estes três um só Deus em três Pessoas – juro que irei àqueles que se esforçarem em carregar minhas ovelhas comigo, e os ajudarei enquanto caminham e lhes darei um precioso pagamento: Eu mesmo, em seu gozo eterno.

               Palavras do Filho à esposa sobre três tipos de cristãos, simbolizados pelos judeus que viviam no Egito, e sobre como estas revelações foram dadas à esposa para que fossem transmitidas, publicadas e pregadas pelos amigos de Deus.

               O Filho falou à esposa dizendo-lhe: Eu sou o Deus de Israel, aquele que falou com Moisés. Quando foi enviado ao meu povo, Moisés pediu um sinal, dizendo: O povo não crerá em mim de outra maneira. Se o povo ao qual Moisés foi enviado pertencia ao Senhor, por que ele não tinha confiança? Deves saber que havia três tipos de pessoas entre os judeus. Alguns acreditavam em Deus e em Moisés. Outros acreditavam em Deus, mas não confiavam em Moisés, imaginando se, talvez, não estaria ele dizendo e fazendo tudo por invenção própria e presunção. O terceiro tipo era daqueles que não acreditavam em Deus nem em Moisés. Da mesma forma, existem atualmente três tipos de pessoas entre os Cristãos como simbolizado pelos hebreus. Existem alguns que realmente acreditam em Deus e em minhas palavras. Existem outros que acreditam em Deus, mas não confiam em minhas palavras, pois não sabem como distinguir entre um espírito bom e um mau. O terceiro grupo é daqueles que não acreditam em mim nem mesmo em ti, esposa minha, a quem tenho transmitido minhas palavras. Mas, como disse, embora alguns hebreus não confiassem em Moisés, todos – sem dúvida - cruzaram o Mar Vermelho com ele em direção ao deserto onde, aqueles que não tinham confiança adoraram ídolos e provocaram a ira de Deus, motivo pelo qual seu fim foi uma morte miserável, embora apenas para aqueles que tinham má fé. Por esta razão, como o espírito humano é lento para crer, meu amigo deve transmitir minhas palavras àqueles que creiam nele. Depois, eles as divulgarão a outros que não sabem distinguir um espírito bom de um mau. Se os ouvintes lhe pedirem por um sinal, que mostrem a essas pessoas um cajado, assim como fez Moisés, ou seja, que expliquem a eles minhas palavras. O cajado de Moisés era firme e, devido à sua transformação em uma serpente, foi também temível para eles. Da mesma forma, minhas palavras são firmes e não há falsidade nelas. São temíveis também, porque emitem um juízo verdadeiro. Que expliquem e declarem que, pelas palavras e sons de uma única boca, o demônio se afastou de criaturas de Deus, esse mesmo demônio que poderia mover montanhas, não fosse ele impedido por meu poder. Que tipo de poder possuía ele, com a permissão de Deus, quando foi feito para fugir diante do som de uma só palavra? Segundo isso, da mesma forma que aqueles hebreus que não acreditavam em Deus nem em Moisés também deixaram o Egito em busca da terra prometida, sendo de alguma forma forçados a ir juntamente com os outros, assim também muitos cristãos se juntarão agora, a contragosto, a meus escolhidos, sem crer em meu poder para salvá-los. Não acreditam em minhas palavras de maneira alguma; possuem apenas uma falsa confiança em meu poder. Entretanto, minhas palavras se cumprirão sem que eles o desejem e de certo modo, serão forçados a caminhar para a perfeição até que cheguem onde me for conveniente.

 

200º - Inocêncio VI - 1352 - 1362

               Papa Inocêncio VI, nascido Étienne Aubert, foi o chefe da Igreja Católica e governante dos Estados Pontifícios de 18 de dezembro de 1352 até sua morte em 1362. Foi indicado Cardeal de Santos João e Paulo em 1342. Ele foi o quinto Papa de Avignon e o único com o nome pontifício de "Inocente". Durante seu Papado, realizou três consistórios, nomeando um total de 16 cardeais. Está enterrado em Villeneuve-lès-Avignon. Étienne foi coroado Papa em 30 de dezembro de 1352 pelo Cardeal Gaillard de la Mothe após o conclave papal de 1352. Após sua eleição, ele revogou um acordo assinado afirmando que o colégio de Cardeais era superior ao Papa. Sua política subsequente se compara favoravelmente com a dos outros Papas de Avignon. Ele introduziu muitas reformas necessárias na administração dos assuntos da Igreja e, por meio de seu legado, o Cardeal Albornoz, que estava acompanhado por Rienzi, procurou restaurar a ordem em Roma. Em 1355, Carlos IV, Sacro Imperador Romano, foi coroado em Roma com a permissão de Inocêncio, após ter feito um juramento de que deixaria a cidade no dia da cerimônia. Foi em grande parte por meio dos esforços de Inocêncio VI que o Tratado de Brétigny (1360) entre a França e a Inglaterra foi realizado. Durante seu Pontificado, o Imperador bizantino João V Paleólogo ofereceu-se para submeter a Igreja Ortodoxa Grega à Sé Romana em troca de assistência contra João VI Cantacuzeno. Os recursos à disposição do Papa, entretanto, eram todos necessários para as necessidades mais próximas, e a oferta foi recusada. A maior parte da riqueza acumulada por João XXII e Bento XII foi perdida durante o extravagante Pontificado de Clemente VI. Inocêncio VI economizou cortando o pessoal da capela (capellani capelle) de doze para oito. Obras de arte foram vendidas em vez de encomendadas. Seu Pontificado foi dominado pela guerra na Itália e pela recuperação de Avignon da peste, ambas exigindo drasticamente recursos de seu tesouro. Em 1357, ele se queixava da falta de recursos. Inocêncio VI era um patrono liberal das letras. Mesmo com a extrema severidade de suas medidas contra os Fraticelli consegui manter uma grande reputação de justiça e misericórdia. No entanto, Santa Brígida da Suécia denunciou os Fraticelli como perseguidores de cristãos. O Papa morreu em 12 de setembro 1362 e foi sucedido por Urbano V. Hoje seu túmulo pode ser encontrado no Chartreuse du Val de Bénédiction, o mosteiro cartuxo em Villeneuve-lès-Avignon.

 

201º - Urbano V - 1362 - 1370

               O Papa Urbano V, nascido Guillaume de Grimoard, foi Papa de 28 de setembro de 1362 até sua morte em 1370 e também foi membro da Ordem de São Bento. Ele foi o sexto Papa de Avignon e o único Papa de Avignon a ser beatificado. Mesmo após sua eleição como Pontífice, ele continuou a seguir a regra beneditina, vivendo de maneira simples e modesta. Seus hábitos nem sempre lhe davam adeptos acostumados a vidas ricas. Urbano V pressionou por reformas em todo o seu Pontificado e também supervisionou a restauração e construção de igrejas e mosteiros. Um dos objetivos que ele estabeleceu na eleição para o Papado foi o reencontro das igrejas orientais e ocidentais. Ele chegou tão perto quanto alguns de seus antecessores e sucessores, mas não teve sucesso. Como Papa, Urbano V continuou a seguir a disciplina da Regra de São Bento e a vestir seu hábito monástico. Urbano V trabalhou contra o absenteísmo, o pluralismo e a simonia, enquanto procurava melhorar o treinamento e o exame de escritório. Deve-se ter em mente, no entanto, que, com o treinamento de um monge, a reforma era uma questão de retorno aos valores e princípios ideais através da disciplina, não uma questão de encontrar novas soluções. Com a formação de um advogado, a reforma era uma questão de codificar e fazer cumprir as decisões e precedentes estabelecidos. O Papa Urbano V introduziu reformas consideráveis ​​na administração da justiça e no aprendizado liberal. Ele fundou uma universidade na Hungria. Concedeu à Universidade de Pavia o status de Studium Generale (14 de abril de 1363). Em Toulouse, ele concedeu à Faculdade de Teologia os mesmos direitos que a Universidade de Paris. Em Montpellier, ele restaurou a escola de medicina e fundou o Colégio de São Bento, cuja igreja, decorada com inúmeras obras de arte, mais tarde se tornou a Catedral da cidade. Ele fundou uma igreja colegiada em Quézac, e uma igreja e biblioteca em Ispagnac. No topo de uma colina perto de Bédouès, a paróquia em que o Château de Grisac está situado, ele construiu uma igreja onde os corpos de seus pais foram enterrados. Por uma bula Papal de dezembro de 1363, ele instituiu uma faculdade de seis Cânones Sacerdotes, juntamente com um diácono e um subdiácono. Urban V emitiu um consentimento preliminar para o estabelecimento da Universidade de Cracóvia, que em setembro de 1364 havia obtido pleno consentimento Papal. Forneceu livros e os melhores professores para mais de 1 000 estudantes de todas as classes. Em torno de Roma, também plantou vinhedos. Ele impôs a penalidade de excomunhão a qualquer um que molestasse os judeus ou tentasse conversão e batismo forçados. A grande característica do reinado de Urban V foi o esforço para devolver o Papado à Roma e reprimir seus poderosos rivais pela soberania temporal lá. Ele começou enviando seu irmão, Cardeal Angelicus Grimoard, como legado Papal no norte da Itália. Em 1362, Urban ordenou que uma cruzada fosse pregada em toda a Itália contra Bernabò Visconti, Giangaleazzo Visconti e seus parentes, acusados ​​de assaltantes da propriedade da igreja. Em março de 1363, Bernabò foi declarado herege. No entanto, o Papa Urban achou necessário comprar a paz em março do ano seguinte, enviando o recém-criado Cardeal Androin de la Roche, antigo Abade de Cluny, como Legado Apostólico para a Itália para organizar os negócios. Então, através da mediação de Carlos IV do Sacro Império Romano-Germânico, Urbano levantou sua excomunhão contra Bernabò, obtendo Bolonha somente depois que assinou uma paz apressada que era altamente favorável a Bernabò. Em maio de 1365, o Imperador Carlos visitou Avignon, onde ele apareceu com o Papa em pleno traje Imperial. Ele então seguiu para Arles, que era um de seus domínios, onde foi coroado rei pelo Arcebispo Pierre de Cros, OSB. O maior desejo de Urbano V era o de uma cruzada contra os turcos. Em 1363, o rei João II de França e Pedro I de Chipre, chegaram a Avignon, e foi decidido que deveria haver uma guerra contra os turcos. Era Urbano e Pedro que estavam mais ansiosos pela cruzada; os franceses estavam exaustos com as recentes perdas na Guerra dos Cem Anos, e alguns de seus líderes ainda estavam presos na Inglaterra. O Papa realizou uma cerimônia especial no sábado santo de 1363 e concedeu a cruz do cruzado aos dois Reis e também ao Cardeal Hélie de Talleyrand-Périgord. João II foi nomeado Reitor e Capitão Geral da expedição. O Cardeal de Talleyrand foi nomeado Legado Apostólico para a expedição, mas morreu em 17 de janeiro de 1364, antes que a expedição pudesse começar. ​​A montagem do exército mostrou-se uma tarefa impossível, e o rei João retornou à prisão na Inglaterra.

               O rei Pedro de Chipre, decepcionado com o retorno do rei João ao cativeiro na Inglaterra e a morte do Cardeal de Talleyrand, reuniu todos os soldados que pôde e, em 1365, lançou um ataque bem-sucedido a Alexandria (11 de outubro de 1365). Contudo, não havia apoio adicional e, visto que o inimigo superava em número os cruzados, ele ordenou o saque e a queima da cidade e depois se retirou. Ele continuou a assediar as costas da Síria e do Egito até ser assassinado em 1369. Urbano, no entanto, não teve participação na cruzada ou em suas consequências. Amadeus de Savoy e Louis da Hungria também organizaram uma cruzada no reinado de Urban em 1366. Inicialmente eles tiveram sucesso, e Amadeus até capturou Galípoli. Mas, apesar dos sucessos iniciais, cada um foi forçado a se retirar.

               Problemas contínuos na Itália, bem como pedidos de figuras como Francisco Petrarca e Brígida Birgersdotter da Suécia, levaram o Urbano V a Roma, apenas para descobrir que seu vigário, o Cardeal Albornoz havia acabado de morrer. Ele conduziu os restos mortais do Cardeal a Assis, onde foram enterrados na Basílica de São Francisco de Assis. O Papa chegou à cidade de Roma em 16 de outubro de 1367, o primeiro Papa em sessenta anos a pôr os pés em sua própria diocese. Foi recebido com alegria pelo clero e pelo povo, e apesar da satisfação de ser assistido pelo Imperador Carlos IV em São Pedro e de colocar a coroa na cabeça da Imperatriz Elizabeth (1 de novembro de 1368), logo ficou claro que, mudando a sede de seu governo, ele não havia aumentado seu poder. Em Roma, ele foi capaz de receber a homenagem do rei Pedro I de Chipre, da Rainha Joana I de Nápoles e a confissão de fé do Imperador bizantino João V Paleólogo. Santa Brigida da Suécia, que morava em Roma e tentava obter aprovação para uma nova ordem religiosa, os Bridgettines, havia realmente comparecido ao Papa em Montefiascone em 1370, enquanto se preparava para retornar à França; na presença do Cardeal Pierre Roger de Beaufort, o futuro Papa, previu a morte do Papa se ele deixasse Roma. Incapaz de resistir à urgência dos Cardeais franceses e, apesar de várias cidades dos Estados Papais ainda estarem em revolta, o Urbano V embarcou em um navio em Corneto em direção à França em 5 de setembro de 1370, chegando em Avignon no dia 24 do mesmo dia. Alguns dias depois, ele ficou gravemente doente. Sentindo sua morte se aproximando, ele pediu que fosse transferido do Palácio Papal para a residência vizinha de seu irmão, Angelic de Grimoard, a quem ele havia feito Cardeal, para que ele pudesse estar perto daqueles que amava. Ele morreu lá em 19 de dezembro de 1370. E a Profecia se cumpriu. Foi Papa por oito anos, um mês e dezenove dias. Seu corpo foi inicialmente colocado na Capela de João XXII, na Catedral de Santa Maria de Domps, em Avignon. Em 31 de maio de 1371, seus restos mortais foram transferidos para o mosteiro de Saint-Victor, em Marselha, onde ele construíra uma esplêndida tumba.

               A Guerra dos Cem Anos foi uma série de conflitos travados entre os reinos da Inglaterra e da França durante o final da Idade Média. Originou-se de reivindicações inglesas ao trono francês entre a Casa Real Inglesa de Plantageneta e a Casa Real Francesa de Valois. Com o tempo, a guerra se transformou em uma luta de poder mais ampla envolvendo facções de toda a Europa Ocidental, alimentada pelo nacionalismo emergente de ambos os lados.

               Foi um dos conflitos mais significativos da Idade Média. Durante 116 anos, interrompidos por várias tréguas, cinco gerações de reis de duas dinastias rivais lutaram pelo trono do maior reino da Europa Ocidental. O efeito da guerra na história europeia foi duradouro. Ambos os lados produziram inovações em tecnologia e táticas militares, incluindo exércitos permanentes profissionais e artilharia, que mudaram permanentemente a guerra na Europa; cavalaria, que atingiu seu auge durante o conflito, posteriormente declinou. Identidades nacionais mais fortes criaram raízes em ambos os países, que se tornaram mais centralizados e gradualmente ascenderam como potências globais.

               O termo "Guerra dos Cem Anos" foi adotado por historiadores posteriores como uma periodização historiográfica para abranger conflitos relacionados, construindo o conflito militar mais longo da história europeia. A guerra é comumente dividida em três fases separadas por tréguas: a Guerra Eduardiana (1337-1360), Guerra Carolina (1369-1389) e a Guerra Lancastriana (1415-1453). Cada lado atraiu muitos aliados para o conflito, com as forças inglesas inicialmente prevalecendo; a Casa de Valois finalmente manteve o controle sobre a França, com as monarquias francesas e inglesas anteriormente entrelaçadas permanecendo separadas.

 

SEDE DA IGREJA VOLTA PARA ROMA.

 

202º - Gregório XI - 1370 – 1378

               Papa Gregório XI, nascido Pierre-Roger de Beaufort (Château de Maumont, Saint-Julien-Maumont, Diocese de Limoges, França, 1329 ou 1331 – Roma, 27 de Março de 1378), foi eleito para a Cátedra de São Pedro, pelo Conclave, em 30 de Dezembro de 1370 e Pontificou até à sua morte. Assumindo durante o período do Papado de Avinhão, fortemente influenciado por Santa Catarina de Siena retornou à Santa Sé para Roma. De fato, na qualidade de Bispo de Roma, cuja Catedral é a Basílica de São João de Latrão, neste local deveriam residir os Papas. Após sua morte iniciou-se o Grande Cisma do Ocidente.  Os Papas, desde Clemente V, foram obrigados a estabelecer residência em Avinhão, na França, isto porque príncipes bandoleiros, não raras vezes franceses, atacaram a Igreja, apoderando-se de seus bens.  Hostilidades de todo o tipo, guerras, crimes, violências, escândalos e heresias surgiram em consequência da vitória do Papa Gregório IX que, corajosamente lutou contra os abusos do Estado contra a Igreja.  Foi Henrique IV quem promoveu de forma acentuadíssima a venda de Bispados e abadias a pessoas indignas. Sob a influência pacificadora de Santa Catarina de Siena, o Papa Gregório XI restabeleceu a Santa Sé em Roma, fato que gerou séria divergência entre Cardeais Italianos e franceses.  Logo após sua morte, o Papa Urbano VI foi legitimamente eleito, mas os franceses elegeram outro Papa cognominado "Clemente VII", residente em Avinhão. O mau exemplo e insubordinação de Príncipes e prelados, instigou o povo à entrega de novas heresias que já despontavam e que iriam culminar posteriormente no levante do protestantismo através de seus propugnadores:  Lutero, na Alemanha; Zwinglio, na Suíça; Calvino, na França e Holanda; e Henrique VIII, na Inglaterra.

 

202 . 1 - Santa Francisca Romana

               O Divino Salvador instituiu Sua Igreja sobre alicerces bem seguros. Mas, ao longo da História, as forças infernais não deixaram de investir contra essa rocha inabalável. Uma dessas investidas teve início com as agitações políticas e sociais que forçaram o Papa Clemente V a transferir, em 1309, a sede do Papado para a cidade francesa de Avignon, onde os sucessores de Pedro permaneceram até 1376. Foi um longo período de conturbações que culminaram no Grande Cisma do Ocidente (1378-1417). A eclosão do Cisma veio agravar ainda mais a situação, a ponto de a Cidade Eterna ficar reduzida a uma situação de miséria, açoitada por guerras, carestia e pestes. Nesse contexto, destacou-se como luminoso anjo da caridade uma jovem dama da alta nobreza: Santa Francisca Romana, a qual, por sua prodigiosa atividade em favor dos pobres e doentes, conquistou o honroso título de Advocata Urbis (Advogada da Cidade). Nascida em 1384, Francisca pertencia a uma rica família de patrícios romanos. Seus pais, Paulo Bussa de Leoni e Jacovella de Broffedeschi, proporcionaram-lhe uma primorosa educação cristã. Desde a mais tenra idade, acompanhava a mãe nas práticas de piedade, como abstinências, orações, leituras espirituais e visitas a igrejas onde pudessem lucrar indulgências. Frequentava muito a Basílica de Santa Maria Nova, a preferida de sua mãe, confiada aos monges beneditinos de Monte Olivetto. Ali, Francisca começou a receber, ainda criança, direção espiritual de Frei Antonio di Monte Savello, com quem se confessava todas as quartas-feiras. Aos onze anos, manifestou o desejo de consagrar-se a Deus pelo voto de virgindade. Sua inclinação para a vida monástica se fez notar quando — a conselho do diretor espiritual, para provar a autenticidade de sua vocação — começou a praticar em casa algumas austeridades próprias a certas ordens religiosas femininas. Seu pai, porém, opôs-se a esses infantis projetos, pois ela estava já prometida em casamento à Lourenço Ponziani, jovem de nobre família, bom caráter e grande fortuna. Francisca foi sempre esposa exemplar. Por desejo do marido, apresentava-se em público com a categoria de dama romana, usando belas joias e suntuosos trajes. Mas debaixo deles vestia uma tosca túnica de tecido ordinário. Dedicava à oração suas horas livres, e nunca negligenciava as práticas de vida interior. Transformou em oratório um salão do palácio e aí passava longas horas de vigília noturna, acompanhada por Vanozza. Era objeto de mofa das pessoas mundanas, mas sua família a considerava um “anjo da paz”. Francisca dedicava à oração suas horas livres, e nunca negligenciava as práticas de vida interior. Três anos após seu casamento, contraiu uma grave enfermidade que se prolongou por doze meses, deixando temerosos todos os membros da família. Francisca, porém, não temia, pois colocara sua vida nas mãos de Deus, com inteira resignação. Nesse período de prova, por duas vezes apareceu-lhe Santo Aleixo. Na primeira, perguntou-lhe se queria curar-se, e na segunda comunicou-lhe que “Deus queria que permanecesse neste mundo para glorificar seu nome”. Colocando então seu manto dourado sobre ela, restituiu-lhe a saúde. Essa enfermidade, contudo, a fizera meditar profundamente sobre os planos da Providência a seu respeito. E uma vez restabelecida, decidiu, com Vanozza, levar uma vida mais conforme ao Evangelho, renunciando às diversões inúteis e dedicando mais tempo à oração e às obras de caridade. Foi nessa época que Deus enviou-lhe um Anjo especial para guiá-la na via da purificação. Ela não o via, mas ele estava constantemente a seu lado e se manifestava por meio de sinais claros. Além de amigo e conselheiro, era vigilante admoestador, que a castigava quando ela cometia qualquer pequena falta. Certa vez em que Francisca, por respeito humano, não interrompeu uma conversa superficial e frívola, ele aplicou-lhe na face um golpe tão forte que deixou sua marca por vários dias e foi ouvido na sala inteira! O demônio empreendia todo tipo de esforços para perturbar a vida e, sobretudo, impedir a Santificação de Francisca. Como a Santa sempre triunfava de suas tentações, ele recorria com frequência a ataques diretos. Assim, em certa ocasião ela e Vanozza retornavam da Basílica de São Pedro e decidiram tomar um atalho, pois já era tarde. Chegando à margem do Tibre, inclinaram-se para tomar um pouco de água. Empurrada por uma força invisível, Francisca caiu no rio. Vanozza lançou-se para salvá-la e foi também arrastada pela correnteza. Sentindo em perigo suas vidas, recorreram a Deus e no mesmo instante se viram de novo na margem, sãs e salvas. Quando em 1400 nasceu seu primeiro filho, João Batista, não duvidou em deixar algumas de suas mortificações e exercícios piedosos, para melhor cuidar do menino. Ao carinho materno, unia a firmeza da boa educadora, corrigindo-o em suas infantis manifestações de teimosia, obstinação e cólera, sem nunca ceder às suas lágrimas de impaciência. Foi modelo de mãe igualmente para João Evangelista e Inês, que nasceram alguns anos depois. Seu Anjo ajudou-a a levar sua vida matrimonial com amor e dedicação, tanto para o esposo quanto para os filhos. Cumpria com perfeição seu ofício de dona de casa, compreendendo que os sacrifícios impostos pelas tarefas cotidianas fazem parte da purificação necessária nesta vida e têm prioridade sobre as mortificações particulares. Desempenhou-se de tal maneira que, em 1401, quando faleceu a esposa do velho Ponziani, seu sogro, este incumbiu-a do governo do palácio. Nessa função, a jovem senhora demonstrou grande capacidade, inteligência e, sobretudo, bondade. Organizou os trabalhos da numerosa criadagem de modo a todos terem tempo de cumprir seus deveres religiosos. Assistia-os em suas necessidades materiais e os incentivava a levar uma vida verdadeiramente cristã. Quando algum deles adoecia, Francisca se fazia de enfermeira, mãe e irmã. E se a enfermidade acarretava perigo de vida, ela mesma ia buscar a assistência espiritual de um sacerdote, a qualquer hora do dia ou da noite. Por volta de 1413, a fome se abateu sobre Roma. O sogro de Francisca alarmou-se ao ver que ela conti­nuava muito generosa em ajudar os necessitados… distribuindo-lhes parte das provisões que ele reservara para sustento da família, e proibiu-a de fazê-lo. Não podendo mais a caridosa dama dispor daqueles víveres para socorrer os famintos, começou a pedir esmolas para eles. E certo dia, tomada de súbita inspiração, foi com Vanozza a um celeiro vazio do palácio para procurar o que pudesse ter restado de trigo no meio da palha. À custa de paciente trabalho, conseguiram recolher alguns poucos quilos do desejado grão. Coisa admirável: logo após a saída das duas, Lourenço, seu esposo, entrou no celeiro e lá encontrou 40 sacos contendo, cada um, 100 quilos de trigo dourado e maduro! Idêntico prodígio se deu na mesma época: querendo levar aos pobres um pouco de vinho, Francisca recolheu a escassa quantidade que restava no fundo de um tonel e no mesmo instante este encheu-se milagrosamente de um excelente vinho. Esses prodigiosos fatos muito contribuíram para suscitar em Lourenço um temor reverencial e amoroso por sua esposa. Em consequência, ele lhe deu liberdade de dispor de seu tempo para suas obras apostólicas e lhe permitiu trocar seus belos trajes e joias — os quais ela apressou-se a vender para distribuir aos pobres o dinheiro — por roupas simples e pouco vistosas. Muitas provações ainda a aguardavam. A situação política da Península Itálica e a crise decorrente do Grande Cisma do Ocidente acarretaram-lhe muitos sofrimentos. Roma estava dividida em dois grupos que travavam encarniçada guerra: a favor do Papa, os Orsini, de cuja facção Lourenço fazia parte; de outro lado, os Colonna, apoiando Ladislau Durazzo, rei de Nápoles, que invadiu Roma três vezes. Na primeira invasão, Lourenço foi gravemente ferido em combate, sendo curado pela fé e dedicação da esposa. Na segunda, em 1410, as tropas saquearam o Palácio dos Ponziani, e os bens da família foram confiscados. Pior ainda, Francisca viu seu esposo e seu filho Batista partirem para o exílio. Em 1413 e 1414, a capital da cristandade ficou entregue à pilhagem e reduzida à miséria. Um novo flagelo, a peste, veio agravar essa situação. A Santa transformou o Palácio em hospital e cuidava pessoalmente das vítimas da terrível doença. Era um anjo da caridade naquela infeliz cidade assolada pelo infortúnio. Sua própria família não ficou imune a essa tragédia: em 1413 morreu Evangelista, seu filho mais novo, e no ano seguinte a pequena Inês. Por fim, ela também contraiu a doença, mas foi milagrosamente curada por Deus. Em meio a guerras e à peste, Francisca foi um anjo da caridade naquela infeliz cidade assolada pelo infortúnio. Ainda em 1413, apareceu-lhe seu filho falecido havia pouco, tendo a seu lado um jovem do mesmo tamanho, parecendo ser da mesma idade, mas muito mais belo.

— És realmente tu, filho do meu coração? — perguntou ela.

Ele respondeu que estava no Céu, junto com aquele esplendoroso Arcanjo que o Senhor lhe enviava para auxiliá-la em sua peregrinação terrestre.

Dia e noite o verás ao teu lado e ele te assistirá em tudo — acrescentou.

Aquele Espírito celestial irradiava uma tal luz que Francisca podia ler ou trabalhar à noite, sem dificuldade alguma, como se fosse dia. E lhe iluminava o caminho quando precisava sair à noite. Na luz desse Arcanjo, ela podia ver os pensamentos mais íntimos dos corações. Recebeu, ademais, o dom do discernimento dos espíritos e o de conselho, os quais usava para converter os pecadores e reconduzir os desviados ao bom caminho. Deus a favoreceu com numerosas outras visões. As mais impressionantes foram as do inferno. Viu em pormenores os suplícios pelos quais são punidos os condenados, de acordo com os pecados cometidos. Observou a organização hierárquica dos demônios e as funções de cada um na obra de perdição das almas, uma paródia da hierarquia dos Coros Angélicos. Lúcifer é o rei do orgulho e o chefe de todos. Viu ainda como os atos de virtude praticados pelos bons atormentam essas miseráveis criaturas e prejudicam sua ação na terra. Tendo falecido o rei Ladislau, restabeleceu-se a paz na Cidade Eterna, seu esposo e seu filho Batista regressaram do exílio, e a família Ponziani recuperou os bens injustamente confiscados. Por meio de orações e boas palavras, a Santa conseguiu convencer Lourenço a reconciliar-se com seus inimigos e a entregar-se a uma vida de perfeição. E após o casamento do filho, entregou à nora — convertida por ela — o governo do palácio para dedicar-se inteiramente às obras de caridade e de apostolado. Lourenço deixou-a livre para fundar uma associação de religiosas seculares, com a condição de continuar vivendo no lar e não parar de guiá-lo no caminho da santidade. Orientada por seu diretor espiritual, fundou uma sociedade denominada Oblatas da Santíssima Virgem, segundo o modelo dos beneditinos de Monte Olivetto. Em 15 de agosto de 1425, Francisca e outras nove damas fizeram sua oblação a Deus e a Maria Santíssima, mas sem emitir votos solenes. Vivia cada qual em sua casa, seguindo os conselhos evangélicos, e se reuniam na igreja de Santa Maria Nova para ouvir as palavras de sua fundadora, que para elas era guia e modelo a imitar. Alguns anos depois, ela recebeu a inspiração de transformar essa sociedade em congregação religiosa. Adquiriu o imóvel de nome Tor de’ Specchi e, em março de 1433, dez Oblatas de Maria foram revestidas do hábito e ali se estabeleceram, em regime de vida comunitária. Em julho desse mesmo ano, o Papa Eugênio IV erigiu a Congregação das Oblatas da Santíssima Virgem, nome mudado posteriormente para Congregação das Oblatas de Santa Francisca Romana. Era uma instituição nova e original para seu tempo: religiosas sem votos, sem clausura, mas de vida austera e dedicadas a um genuíno apostolado social. Comprometida como estava pelo matrimônio, somente depois da morte do esposo, em 1436, Francisca pôde afinal realizar o maior desejo de sua vida: fazer-se religiosa. Entrou como mera postulante na congregação por ela fundada. Mas foi obrigada — pelo capítulo da comunidade e pelo diretor espiritual — a aceitar os encargos de superiora e fundadora. Viveu no convento apenas três anos. Em 1440, viu-se forçada a retornar ao Palácio Ponziani para cuidar de seu filho, gravemente enfermo. Atingida por uma forte pleurisia, ali permaneceu, por não ter mais forças. Soube então que havia chegado seu derradeiro momento. Padeceu terrivelmente durante uma semana, mas pôde dar seus últimos conselhos às suas filhas espirituais e despedir-se delas. No dia 9 de março, depois de agradecer a seu diretor, o Padre Giovanni, em seu nome e no da comunidade, quis rezar as Vésperas do Ofício da Santíssima Virgem. Com os olhos muito brilhantes, dizia estar vendo o Céu aberto e haverem chegado os Anjos para buscá-la. Com um sorriso iluminando-lhe a face, sua alma deixou esta Terra.

As visões do Inferno da Santa Francisca Romana

               O inferno é dividido em três partes: o superior, o do meio e o inferior. Lúcifer encontra-se no fundo do inferno inferior. A Lúcifer, chefe universal, subordinam-se três outros demônios, os quais exercem império sobre os demais: Asmodeu: que preside os pecados da carne, e era antes da queda um Querubim; Mamon: que preside os pecados da avareza, era um Trono. O dinheiro fornece, ele sozinho, uma das três grandes categorias; Belzebu: preside aos pecados de idolatria. Tudo que tem algo a ver com magia, espiritismo, é inspirado por Belzebu. Ele é, de um modo especial, o príncipe das trevas, e mediante as trevas ele é atormentado e atormenta suas vítimas. Uma parte dos demônios permanece no inferno, a outra no ar, e uma terceira atua entre os homens, procurando desviá-los do certo caminho. Os que ficam no inferno dão ordens e enviam seus embaixadores; os que residem no ar agem fisicamente sobre as mudanças atmosféricas e telúricas, lançando por toda parte suas más influências, empestando o ar, física e moralmente. Seu objetivo é debilitar a alma. Quando os demônios encarregados da Terra veem uma alma enfraquecida pelos demônios do ar, eles a atacam no seu ponto fraco, para vencê-la mais facilmente. É o momento em que a alma não confia na Providência. Essa falta de confiança, inspirada pelos demônios do ar, prepara a alma para a queda solicitada pelos demônios da Terra. Assim, enfraquecidos pela desconfiança, os demônios inspiram na alma o orgulho, em que ela cai tanto mais facilmente quanto mais fraca esta. Quando o orgulho aumentou sua fraqueza, vêm os demônios da carne que atacam seu espírito. Quando os demônios da carne aumentam mais ainda a fraqueza da alma, vêm os demônios que insuflam os crimes do dinheiro. E quando estes diminuíram ainda mais os recursos de sua resistência, chegam os demônios da idolatria, os quais completam e concluem o que os outros começaram. Todos se articulam para o mal, sendo esta a lei da queda: todo pecado cometido, e do qual a alma não se arrependeu, prepara-a para outro pecado. Assim, a idolatria, a magia, o espiritismo esperam no fundo do abismo aqueles que foram escorregando de precipício em precipício. Todas as coisas da hierarquia celeste são parodiadas na hierarquia infernal. Nenhum demônio pode tentar uma alma sem a permissão de Lúcifer. Os demônios que estão no inferno sofrem a pena do fogo. Os que estão no ar ou na terra não sofrem atualmente tais penas, mas padecem outros suplícios terríveis, e particularmente a visão do bem que praticam os santos. O homem que faz o bem inflige aos demônios um tormento indescritível. Quando Santa Francisca era tentada, sabia, pela natureza e violência da tentação, de que altura tinha caído o anjo tentador e a que hierarquia pertencera. Quando uma alma cai no inferno, seu demônio tentador é felicitado pelos demais. Mas quando a alma se salva, o demônio tentador recebe insulto dos outros, que o levam para Lúcifer e este lhe inflige um castigo a mais, além das torturas que já padece. Este demônio entra às vezes no corpo de animais ou homens. Ele finge ser a alma de um morto. Quando um demônio consegue perder certa alma, após a condenação desta transforma-se em tentador de outro homem, mas torna-se mais hábil do que foi a primeira vez. Aproveita-se da experiência que a vitória lhe deu, tornando-se mais forte para perder o homem. Santa Francisca observava um demônio em cima de alguém que estivesse em estado de pecado mortal. Confessado o pecado, via ela o mesmo demônio ao lado da pessoa. Após uma excelente confissão, o anjo mau ficava enfraquecido e a tentação não tinha mais o mesmo grau de energia. Ao ser pronunciado santamente o nome de Jesus, Santa Francisca via os demônios do ar, da terra e do inferno inclinarem-se com sofrimentos espantosos, tanto maiores quanto mais santamente o nome de Jesus fora pronunciado. Se o nome de Deus é pronunciado em meio a blasfêmias, os demônios ainda assim são obrigados a se inclinar, mas um certo prazer é misturado à dor causada pela homenagem que são obrigados a render. Se o nome de Deus é blasfemado por um homem, os anjos do céu inclinam-se também, testemunhando um respeito imenso. Assim, os lábios humanos, que se movem tão facilmente e pronunciam tão levianamente o nome terrível, produzem em todos os mundos efeitos extraordinários e ecos, dos quais o homem não é capaz de compreender nem a intensidade nem a grandeza.

Inúmeras visões da Santa

               Elas são muitas e se compõem de 109 Visões que Francisca teve ao longo de dez anos, de Julho de 1430 a Dezembro de 1439. È um decênio trabalhoso e crucial na vida da Santa, por que nele viveu intensamente a fundação da “Tor de’ Specchi” (1433), mas também decisivo na história da Igreja, pelo conflito dramático entre o Papa e os Padres participantes do Concílio na Suíça, que iluminada pela luz de Deus, ajudou de maneira preponderante. Atendendo ao pedido de seu confessor, Padre Giovanni Mattiotti, a serva de Cristo descreveu minuciosamente todas as Visões e os encontros com o Senhor e a Mãe de Deus. Também, nestas Visões descreve a condição dos justos na existência após a morte, a vida dos Anjos e a glória e esplendor do Paraíso Divino.

Visões do Paraíso

               Participando da Santa Missa na Capela preferida, assim que recebeu o Santíssimo Corpo de Cristo Sacramentado foi arrebatada em êxtase. Terminada a Santa Missa, ainda em êxtase, o pai espiritual pode presenciar a notável transformação ocorrida na sua expressão fisionômica, ficando a sua face visivelmente iluminada, e permanecendo assim em êxtase por quase uma hora. Voltando ao estado normal, por obediência ao pai espiritual, descreveu sua Visão. O seu espírito foi conduzido por uma luz brilhante a um local esplendidamente iluminado, repleto de infinitos tesouros. Estava naquele lugar Nosso Senhor Salvador na forma humana, com as cicatrizes de suas santíssimas chagas, das quais saiam admiráveis esplendores luminosos de tão considerável claridade que o seu espírito não podia fixar o olhar por muito tempo. Mas aquela claridade iluminava também todos os espíritos existentes no mesmo lugar, indescritivelmente felizes e com imensa alegria. Então, vi a Santíssima Mãe de Deus sentada num magnífico trono, numa medida inferior ao trono de Deus, seu Filho. Estava coroada com uma tríplice coroa: a primeira precisamente por sua Virgindade; a segunda por sua Humildade e a terceira para revelar a sua Glória. E esta última funcionava como maravilhoso adorno da primeira. Aquela querida Rainha do Céu estava com a aparência inflamada de amor sempre olhando carinhosamente o seu diletíssimo Jesus, Filho de Deus. Francisca confessa que estava entusiasmada com aquela admirável Visão e inflamada pelo Amor de Deus, e vendo também, uma imensidão de tesouros estendidos ao redor do Senhor teve o desejo de saber o significado. Então uma voz lhe respondeu: “Deus é o tesouro e a gloria das almas, a alma venturosa alcança o precioso tesouro que é Deus”.

               A seguir, a Voz do Senhor Deus lhe falou: “Eu Sou o Amor Eterno, que arrasto o coração favorito afastando-o de todos os bens terrenos, e o ensino a meditar mais alto e mais profundamente. Faço seduzi-lo, depois de observá-lo, e em minha observação faço transformá-lo totalmente. É plenificado com imensa caridade e depois de arder em amor celeste, imediatamente terá a maior consideração e assumirá ele mesmo, convidar todos a se inflamarem, como se permitisse unir integralmente a sua vontade com a Vontade Divina. O próprio sempre contemplará desejoso de me abraçar. O seu amor alcançará o meu coração”.

               A venturosa serva de Cristo ouvindo aquela voz, ainda em êxtase, fez sinal com a cabeça afirmando concordar totalmente com a Vontade Divina, e se recomendava humildemente aos dois corações juntos, do Altíssimo Criador e de sua Santíssima Mãe. Logo que se retirou da Visão, o seu pai espiritual e Rita Covelli, sua filha espiritual em Cristo, ouviram a sua narrativa. Entretanto, antes de deixarem a Igreja, numa última oração, aconteceu outro êxtase com duração de um quarto de hora, quando ela ouviu a voz de Nossa Senhora que disse: “A Alma que ignora o tesouro Divino, que é ingrata e não procura conhecer e, que não se faz submissa a Vontade de Deus, não consegue a paz interior, embora satisfeita com os bens terrenos, cultivará a contradição, e só conseguirá contradizer as nossas palavras.”

               Esta Visão aconteceu no dia 30 de Setembro de 1431: Depois de receber a Sagrada Comunhão naquela Capela, Francisca entrou em êxtase, o qual teve a duração aproximada de 50 minutos. Respondendo as perguntas de seu pai espiritual disse: veio uma grande luz que conduziu o meu espírito a outra luz maior. E a seguir a luz foi conduzindo o meu espírito para um céu estrelado e depois para um céu cristalino, e seguindo, o meu espírito foi conduzido para um céu superior (empíreo), embora adiante ele fosse conduzido para um número maior de outros céus. Seu pai espiritual a interrogou quanto àqueles céus estavam distantes um do outro, ela respondeu: o céu estrelado é totalmente cheio de claridade, pelo fato de aparecer azulado a nossa observação, com brilho cristalino que o torna mais resplandecente. O céu superior tem um esplendor indizível, superior aos outros céus. Disse: quanto ao céu ornado de estrelas tem tanta amplitude e magnitude que nenhum raciocínio humano consegue meditar sobre as suas dimensões e seu magnífico brilho cristalino. Porém o céu superior possui também uma grande e incrível dimensão. Disse ainda, o céu cristalino está mais afastado do céu semeado de estrelas como o céu estrelado está tão distante de nossos olhos na Terra. O céu superior está mais distante do cristalino do que o cristalino para o estrelado. Também interrogada pelo pai espiritual sobre as estrelas ela disse que algumas são maiores do que a Terra e outras são diferentes, ainda que para nós não apareça assim, a distância de uma constelação a outra é muito grande. Por outro lado, o espírito dessa humilde serva de Cristo assim conduzido, viu e contemplou a Divina Majestade em seu excelso trono e Jesus Nosso Salvador glorificado em Sua Humanidade. Das chagas saiam tão grande esplendor que lhe é impossível descrever. Embora das chagas das mãos e dos pés saíssem um indizível brilho, contudo aquela vasta luz que saía das mãos não era maior e nem mais esplendorosa que a luz incomparável irradiada pela chaga do lado. Todos aqueles raios de luz que saíam das santíssimas chagas se derramavam por toda a corte celeste, e todos os gloriosos espíritos, tanto angélicos como os humanos, se rejubilavam com muita alegria, dando louvores e indizíveis glórias ao Senhor, mostrando Cristo Pantocrator, Senhor do Universo e Redentor do Mundo.

               Em outro trono inferior a aquele trono excelso estava à querida Mãe de Deus coroada com a tríplice coroa. Embora, como dissemos, os raios luminosos que saíam das chagas do Salvador eram lançados sobre todos os espíritos que se alegravam imensamente, todavia de modo indizível envolvia completamente a Rainha do Céu e seu esplendor brilhava admiravelmente, além disso, alcançava imediatamente depois, mais ou menos, o resto dos espíritos, isto de acordo com o mérito de cada um. Viu ainda que os raios luminosos que saíam das Santíssimas Chagas do Salvador não só se irradiavam sobre os espíritos beatíficos, mas também sobre os corpos das criaturas mortais em nosso planeta, conforme maior ou menor o mérito de cada um. Os raios luminosos que saiam dos Santíssimos pés do Salvador se derramavam sobre as criaturas fazendo-as crescer espiritualmente, e estas são aquelas que tinham grande afeto ao Senhor Salvador. Aquelas criaturas que recebiam os raios luminosos que saiam das preciosíssimas chagas das mãos, são aquelas que tinham caridade e fervoroso amor ao Senhor Salvador. Aqueles que recebiam os esplendores luminosos que saiam da caríssima chaga do lado são aquelas pessoas que amam e são amigas do Salvador com todo o seu espírito e com o coração puro. Entre as pessoas beneficiadas pela grande irradiação luminosa das chagas, algumas recebiam o dobro de intensidade, outras três vezes mais e algumas, quatro vezes.  Das cinco irradiações luminosas das chagas, aqueles que recebiam quatro vezes mais, sem dúvida, eram os que tinham mais merecimentos. Francisca também viu que os raios luminosos enviados pelo misericordiosíssimo e begníssimo Nosso Senhor Jesus Cristo, eram as suas graças, também derramadas para todo o mundo. Contudo muitos da humanidade são indiferentes, não se interessam e desdenham as graças do Senhor. Todavia a Bondade do Senhor continua a derramar graças, incessantemente, para a conversão do coração, o bem de todos e harmonia da vida no mundo. Continuando a sua narrativa, Francisca disse que o seu espírito estava contemplando a santíssima chaga do lado no Salvador, com indizível alegria e júbilo, quando percebeu com admiração o maravilhoso e tranquilo mar de luz que se descortinava da gloriosíssima chaga, cuja maior distância na sua extremidade final seguramente não via, mas que estava num abismo. Sobretudo, estando no mencionado espaço beatífico, de tanto ver e pensar ouviu uma suavíssima voz dizendo: “Eu Sou o Amor fiel, que ponho a alma na verdade”.

Esta Visão aconteceu no dia 1º de Novembro de 1430. (Pentecostes)

               Nesta época Francisca estava impedida de andar, e então, no Domingo, não podia ir a Santa Missa para receber o Sagrado Corpo Sacramentado do Senhor. Mas ouvia os cantos, de seu pequeno quarto na parte superior da casa, onde habitualmente rezava e dava espaço às sagradas meditações. Claudicando e não podendo curvar o joelho, viu uma grande chama brilhante do amor Divino que conduziu o seu espírito para uma poderosa luz que emanava daquele Anjo que lhe foi enviado para servir, conforme mencionamos. E aquela luz incandescente conduziu o seu espírito para outra luz maior e mais luzidia, onde viu a gloriosíssima Rainha do Céu coroada com um lindíssimo diadema de ouro e pedras preciosas, estando presentes inumeráveis e gloriosos espíritos angélicos e humanos, cantando maravilhosas e suavíssimas melodias. A seguir o seu espírito foi separado dos outros gloriosos espíritos e colocado como um peregrino visitante num lugar, onde viu um magnífico trono todo enfeitado e circundado por incontáveis esplendores com admirável zelo. No trono havia letras escritas, as quais certamente maravilhosas estavam num outro idioma. Das letras saíam um brilho e embora fosse diferente aquele idioma, todas as pessoas estavam estimuladas e comovidas, motivadas também pela alegria das outras excitações. As letras formavam este texto: “Amor, para quem Eu Amo. Amor que me honra, Amor a mim dedicado, sinceramente devotado a mim. Diante de tudo ele é colocado em diferentes lugares, onde o espírito está livre. Consagrando a min vocês me dão uma profunda consolação. Eu vos prometo Amor, por que dá consolo, estimula a perseverança e é refúgio para tudo, quando estão livres. Sempre fostes preparados com todo o meu querer e graças a minha boa amizade fostes um comigo e fostes escrito no Livro da Vida. Agora coloco naquele lugar bem marcado (no coração), o verdadeiro estimulo e a compreensão ao meu Amor, que depois os conduzirá a pátria celeste. Aqueles que forem fieis sempre recordarão do meu Amor eterno: agora, alegria a todo o momento por que existe Amor em quantidade e para todos”.

               Disse também aquela serva do Senhor, não só no dia de Pentecostes, quando os Apóstolos e os Discípulos receberam graças derramadas pelo Espírito Santo, mas corretamente Ele continua a derramar suas graças em qualquer lugar do mundo em qualquer dia ou hora, a todas as almas justas. Entretanto, conforme a capacidade de cada pessoa, isto é, conforme ela esteja mais ou menos em “estado de graça”. Naquele mesmo dia, o seu espírito foi conduzido por uma luz esplendida para dentro de outra luz imensa, esplendorosa, e nesta fulgurante luz viu um trono maravilhoso todo ornado admiravelmente por infinitos tesouros. E no trono havia o letreiro: “Princípio sem fim”. Daquele trono ouviu uma voz dizendo: “Ame, ó alma, o teu Senhor, ame Aquele que tanto te ama. Do Céu desceu a Terra como teu servo. O ódio que existe no mundo é vitória do dragão. Ame o próprio Amor, para embelezar a carne humana que te veste. Tanto te amou que Teu Sangue foi derramado para que tu tenhas uma existência fiel e feliz. Siga aquele caminho que te ilumina, e por tal rota deve caminhar em ordem de sempre amar. Quer subir aos Céus e descobrir o ardor Divino? O próprio Amor te ensina como trabalhar com grande fervor. Usufrua as dádivas do tempo de trabalho de maneira responsavelmente. Seja humilde, doce e despojado de toda vaidade, competente em obediência para permitir sempre rapidamente um amor fervoroso a Deus, invocando-O de modo a ter êxito em teus empreendimentos. A justa medida é se deixar transformar e se inflamar no Divino Amor. Olhe sempre para o seu Deus Altíssimo e o seu nobre Amor. Este perseverará sempre, sem influência dos olhares e das coisas. Gozar agradavelmente do sabor da eternidade, é a garantia que recebe do Amor, que te inflama no ardor de Deus. Então, ame o Senhor, e Ele te amará eternamente. Ele mesmo te conduzirá com imenso júbilo nesta grande transformação, te colocando neste maravilhoso abismo muitíssimo inflamado de Amor. E sempre deverá permanecer com esta mesma vontade, principalmente para fortalecer a sua alma e viver sem temor. Vivendo e morrendo na altitude (cultivando a santidade por amor a Deus), com o pensamento e o coração em Deus, não tomando conhecimento de sua imagem pessoal, por que o Amor Divino é tão grande e profundo que envolverá a sua existência”.

               Esta Visão aconteceu no dia 8 de Junho de 1432, solenidade de Pentecostes. (Francisca fala do Paraíso. Seu guia foi o Apóstolo São Paulo): Aquela serva devota de Deus, depois de receber o preciosíssimo sacramento (o Sagrado Corpo do Senhor Sacramentado), naquela Capela, entrou em êxtase. Logo lhe apareceu Santa Madalena e disse: “O alma, que te privaste do teu próprio desejo e quiseste servir vigorosamente o Altíssimo Criador, abandonando todas as tuas vontades, e de todos os modos queres colocar o teu zelo neste grande abismo secreto, por conseguinte, deve contentar o próprio amor com todas as coisas agradáveis, em todas e por todos, deves tributar honra a Deus. Seja sempre consistente e firme, não queira se desviar do caminho, sendo suficiente a todas as almas, e conhecendo, tome cuidado com todas as ciladas do inimigo, seja sempre submissa e adormeça neste ardor. Alma, estes cuidados são necessários e descanse no Amor de Deus, e depois, nesta água corrente será transformada num abismo de amor, evidentemente no Amor de Jesus Cristo, fazendo que sejas fiel e sempre autêntica, te renovando na celeste caridade que te fará arder de amor. A alma que é fiel será inflamada de tanto ardor e será renovada neste grande abismo de amor. E deste modo, a alma renovada será reverente ao dulcíssimo Senhor. Prepare-se para reverenciar no Céu a Divindade, que dá beleza a alma. E esta formosura permite modelar a alma para ela ser sempre nova e bela, sem nenhum defeito. A alma sem defeito é trabalho da virtude de Deus. Quanto mais humilde ela for, tanto mais alto será elevada. Por outro lado, a própria virtude de Deus transforma todo o ambiente celeste, não deixando entrar a visão das trevas, por que todo esplendor da luz supri e satisfaz todas as necessidades. Então, se reconciliando com a Vontade de Deus, seja firme e proceda com coragem, abandonando os seus próprios desejos, por que o Senhor te escolherá num próprio noivado”.

               E logo depois é acompanhada em êxtase visitando todos os lugares do Paraíso Celeste. E naquela visão beatífica ouviu as palavras: “O glorioso Apóstolo Paulo está lhe conduzindo na festa de hoje, da parte do Redentor e Criador e da Santíssima Trindade, que é só Amor. Quanto ao fato, a festa da Santíssima Trindade celebra aquela santíssima união, que acendeu o fogo do amor e da graça em plena e total abundância no Coração Divino. E assim, grande deve ser o respeito por aquele fogo amoroso, que se revela tão ativo como naquele abismo do rio, e assim, no brilho da Divindade. Por que foi com grande ardor que o Verbo Divino desceu e inflamou toda a humanidade, e permaneceu entre nós, em espírito e verdade, e com seu infinito Amor Divinizou a humanidade. Três Pessoas Divinas numa Única e com a mesma Essência, e, a saber, a Essência é incomensurável e todas as Três com perfeita noção de tudo, e com idêntico poder, com a mesma sabedoria, e por Sua infinita misericórdia seus servos se encantam com seu Imenso Amor. Como um abismo de um grande rio, distribui ardores inflamados, que se transformam numa infinita felicidade pela graça do amor, conservando todos os santos espíritos, saciando e colocando em ordem os espíritos angélicos, os quais inflamados e com puro amor, são mantidos e governados. Pois os espíritos seráficos, aqueles que estão nos três Coros Hierárquicos mais próximos do trono de Deus, assim como qualquer daqueles nove Coros, todos eles possuem suas residências e são governados pela vontade do Senhor”.

               Francisca repetiu ao seu pai espiritual as palavras de São Paulo, dizendo: "Existem verdadeiramente três Patriarcas em algum lugar. Primeiro está Abraão, em segundo Isaac e em terceiro Jacó. Outros Patriarcas além destes três existem nos Coros, a saber, conforme semelhantemente a justa medida de sua capacidade no conhecimento de Deus. Em primeiro está o glorioso João Batista, que segura uma bandeira de amor vitoriosa (pelo seu martírio), e precisamente todos os outros seguem o mesmo caminho, conforme revelaram progressos para amar. Os Profetas estão na primeira residência do primeiro Coro, e também no segundo e terceiro. Na segunda residência do primeiro e segundo Coro estão os gloriosos Apóstolos, mas na segunda residência do primeiro Coro está São Pedro, São Paulo e Jacob Zebedeu. A digníssima Rainha do Céu está no primeiro Coro, superior a todos os espíritos angélicos e humanos. Em residências abaixo, neste primeiro Coro, estão espíritos humanos, contudo não em grande número, existem lugares vagos na expectativa da chegada de espíritos merecedores que vivem na Terra, e que estão escritos no livro da vida, e do mesmo modo, também outros espíritos, que ainda estão para nascer".

               "É incontável o número de Anjos, mas, embora sejam numerosos, eles são determinados nas visões Divinas e na compreensão e discernimento dos espíritos humanos, de modo que geralmente são os mesmo Anjos observados nas Visões. Assim também em segredo Divino aqueles espíritos humanos são observados tanto os que buscam a salvação, como aqueles de procedimento condenável. Mas aqueles espíritos que no tempo futuro devem ser salvos ou condenados, permanecem ocultos e indulgentes no Coração Divino, e isso, por causa do “Livre Arbítrio” que Deus concedeu a todas as almas. Assim, os atos Divinos permanecem intactos, respeitando evidentemente a presciência Divina da salvação ou da condenação, por que somente Deus conhece o presente, o passado e o futuro, e por outro lado, as almas permanecem do mesmo modo independentes, com total liberdade de pensamento, movimento e ação". Por último, o glorioso Apóstolo disse para os Sacerdotes: “Não queiram por fim na bondade e misericórdia Divina, que é infinita, mas sempre em teu segredo e no teu coração tenham e guardem o conselho e a fé, e a indubitável esperança, por que sempre cheia de pleno encanto, deve permitir a conduzi-lo e a reconduzi-lo no caminho do direito. E sempre confiando no Senhor, que tudo faz, bem feito, por que sua graça dá aparência à humanidade de acordo com a Sua Vontade. Pois, em sua bondade, sempre envia todas as coisas, Ele faz ou permite sempre deixando as pessoas satisfeitas, e sua obra conduz não só ao bom caminho, mas conduz de maneira excelente o próprio trabalho e os empreendimentos, e em seu consentimento, vê mais amplo e mais longe, e conhece na medida o que pode ser permitido. Disse também o glorioso Apóstolo São Paulo, que sejam vigorosos e sempre permaneçam na graça de Deus, dando glórias e louvores a Ele, alegrando-se sempre com Ele e Nele, e se afastando das coisas irrefletidas, por isso mesmo, não assumindo o direito de julgar a Obra de Deus conforme a sua maneira de ver, mas conforme o beneplácito Divino”. Esta Visão aconteceu no dia 23 do Mês de Junho de 1433

               Outra visão: Francisca descreveu ao seu pai espiritual: Certo dia, com a alma dirigida a Deus, enlevada pelas orações e santas meditações, surgiram vinte e seis espíritos malignos que me injuriaram e me lançaram terríveis insultos, e se preparavam para arremessar fogo sobre a cidade, dizendo: “Isto é a ira de Deus que envia fogo sobre a cidade de Roma por causa dos abomináveis pecados do povo. Dois de nós, a começar por qualquer região, serão os executores do castigo Divino, sufocando e destruindo a cidade”. Para grande angústia e inquietação da alma da serva de Cristo, os demônios se consideravam incumbidos de punir o povo e destruir a cidade. Continuando suas orações com fé e confiança, a graça Divina se manifestou. O Salvador surgiu no espaço brilhando com tão intenso esplendor, que os falsos emissários Divino reconheceram. Para completar o consolo da serva de Cristo, teve a Visão não dos falsos julgadores, mas a imagem da verdadeira Mãe de Deus coroada, tendo o menino Jesus aos braços, o bem aventurado João Batista e os gloriosos apóstolos Pedro e Paulo, que de joelhos, suplicavam ao Senhor em benefício das almas corretas e liberação da cidade. Então Francisca ouviu uma suavíssima voz, dizendo: “O excelso e misericordioso Senhor, se inclinou aceitar as súplicas dos Santos e da bem-aventurada Virgem Maria, retrocedendo a sentença contra a cidade, mas se eles não se corrigirem graves penas inesperadas acontecerão”. Como sinal, imediatamente três diabos lançaram flechas de fogo: a primeira sobre a torre da Basílica de São Paulo, a segunda sobre a torre da Basílica de São Pedro e a terceira sobre a Capela do Senhor na Basílica de São João de Latrão. Isto ocorreu no mês de Julho do ano do Senhor de 1430.

               Outra visão: Depois das orações na Capela e recebendo o Santíssimo Sacramento, a serva de Cristo entrou em êxtase, permanecendo imóvel pelo espaço de uma hora. Depois retornando ao natural, por obediência ao pai espiritual que a interrogou sobre a visão, respondeu que seu espírito foi conduzido por uma grande luz, em direção a outra maior, onde estava um lindo tabernáculo, próximo a um pequeno tamborete. Em cima do tabernáculo estava um cordeiro com uma candura incomparável, e diante dele três admiráveis cordeiros branco como a neve, alegres e cheios de graça. Juntos atravessaram diante do Cordeiro, humildes e agradecidos fazendo uma profunda reverencia, e assim, cada qual passou, recebendo o seu tamborete. Aqueles ardorosos espíritos permaneceram com muita alegria durante uma hora, mantendo o corpo sempre imóvel, naquele lugar e ouviram uma suavíssima voz dizendo: “Eu sou aquele Amor, que dou frutos perfumados nesta pátria. Toda alma que sentir este perfume, sentirá gosto por ele, e então, a grandeza do perfume do meu Amor fará a alma renunciar a tudo na terra e arder em fervoroso amor por mim. Por isso, depois que ela renunciar, sempre lastimará as coisas que fez. Pensará em ser acessível e de se fazer insignificante, renegando a sua própria vontade; desejará examinar e observar tudo, apelando ao martírio e se submetendo a obediência, de modo a poder se unir Aquele de Quem se encantou”.

               Retornando do êxtase, o seu pai espiritual e sua filha em Cristo, Rita Covelli, ouviram estas palavras: “Contigo desejo estar, nem deste lugar proponho me afastar. Pessoa convidada, não deve se violentar. Agora que ela tem, porque se faz como se não tivesse? Não quero mais me demorar, não tenho preguiça e nem temo qualquer perigo. Quero permanecer Contigo e nunca Ti abandonar. Tu és o Espírito Criador e tens tudo para oferecer com amor. E assim, não quero e nem sei como me ocultar”.

               Entrando novamente em êxtase, ouviu uma voz que disse: “Quem tem sede, venha e beba”. E então, aquele cordeiro branquíssimo volveu o seu peito para o outro cordeiro com um aspecto bom e gracioso, e fez sinal com a cabeça para ele vir e beber numa grande chaga em seu peito. O cordeiro, com a fisionomia tranquila, para aquela grande chaga correu e bebeu, e também esta alma devota de Deus foi conduzida para aquela chaga profundíssima e de onde viu um mar de luz infinita, e não satisfeita só de beber, pois desejava entrar lá dentro, se lhe fosse permitido, mas foi impedida por que ignorava. Mas quando perspicasmente contemplou, vendo um mar de luz tão mais profundo, com maior atenção e paixão, desejou caminhar para lá. E assim, ouviu uma voz dizendo: “Eu Sou uma Ilha de Amor, que em alta voz digo: Quem tem sede, venha e beba. E chegando para querer se saciar, abra o meu Coração, de modo que possa ser recebido como hóspede”. Esta Visão aconteceu no dia 22 de Julho de 1431, festa da Bem-aventurada Maria Madalena:

               Em outra ocasião, a humilde serva de Cristo rezando na Capela do Santo Anjo, na Igreja de Santa Maria em Trastevere, depois de receber a Sagrada Comunhão foi arrebatada em êxtase.  Então, sua fisionomia revelou um grande jubilo, ostentando imensa alegria, e ainda, fazendo gestos e modos iguais à de uma mulher que tivesse em seus braços uma pequena criança. O braço segurava apertadíssimo ao peito, movendo a criança de lá para cá, mostrando-se muito contente com aquele preciosíssimo tesouro em seus braços, olhando-o com frequência e contemplando-o carinhosamente. E assim ficou pelo espaço de aproximadamente meia hora.

Voltando ao seu estado normal, o pai espiritual lhe interrogou a respeito da Visão e por obediência Francisca respondeu: “Vi uma Hóstia grande lindíssima da cor semelhante a uma imensa quantidade de neve branquíssima. Fiquei contemplando atentamente, e neste momento, certa luz claríssima conduziu o meu espírito a um céu cristalino. Depois fui conduzida a outra luz maior, na qual estavam muitos espíritos angélicos, que ela ficou impedida de fixar o olhar e examinar, porque a luminosidade era muito grande e ela não estava habituada a uma luz tão intensa, semelhante à luz solar, isto por que, todos brilhavam com magnificência, cheios de luz, transparentes embora visíveis, e eram brilhantes e ardorosos. Naquela luz imensa estava a celeste Rainha, com o Filho de Deus em seus braços, agora, na sua humanidade, muito pequeno com quase oito meses de vida. A luz que emanava da Mãe de Deus era mais brilhante e muito mais intensa, do que aquela onde os espíritos angélicos estavam. E naquele ambiente celeste apareceu outra suntuosa e inestimável luz, vinda de Deus que deslocou o Filho, o menino Jesus, dos braços da Mãe para os meus braços. Minha emoção foi indescritível, por que não encontro palavras carinhosas e cheias de ternura, para descrever a imensa alegria de meus sentimentos”. Esta Visão aconteceu no dia da Festa da Natividade da Virgem Maria, 8 de Setembro de 1431.

Visões do Purgatório

               Toda pessoa ao morrer, sua alma ficará diante de uma encruzilhada por onde será conduzida a dois diferentes caminhos, conforme suas virtudes, as qualidades e o seu próprio desempenho ao longo da existência: se bom, médio ou mau. Os dois Caminhos conduzem: a vida feliz no Paraíso Divino ou a Condenação Eterna no inferno, na companhia de satanás e seus asseclas. Assim, se os seus merecimentos lhe conduzirem pelo caminho da Eternidade feliz, estará livre da condenação eterna e logo serão avaliados, se a alma seguirá direto para o Céu, ou se deverá antes passar pelo Purgatório para uma ligeira imersão purificadora, ou para permanecer algum tempo incinerando todos os seus pecados e transgressões cometidos contra a Justiça Divina e não devidamente arrependidos e perdoados sacramentalmente em vida. Para que se firme ainda mais a crença nesta realidade, desde o século XIV o Senhor bondade infinita, permitiu que sua serva Francisca conhecesse todas as dependências do Purgatório, objetivando poder transmitir fielmente à humanidade as informações em benefício da vida de cada criatura.

               O texto foi escrito pelo Padre Giovanni Mattiotti, confessor da Santa, e ele, respeitosamente inicia assim: Em nome da Santíssima Trindade começo o Tratado do Purgatório, descrevendo todos os locais onde esta humilde serva de Cristo esteve conduzida pelo Arcanjo São Rafael. Francisca logo no princípio de sua narrativa diz que o Purgatório é divido em três imensos planos: um inferior, o médio e o plano superior. Na entrada viu as letras que diziam: “Aqui é o Purgatório, lugar de esperança; neste lugar as almas se elevam; é momento de trégua e purificação, diante do único desejo de salvação.” Observou que é um local com muita disciplina e ordem, completamente diferente daquilo que viu no inferno, e como disse o Arcanjo São Rafael e a serva do Senhor escreveu: “O Purgatório é onde as almas se purificam de todos os seus defeitos, e por isso é denominado lugar de súplica e de esperança para outro lugar”.

               O Plano Inferior é um local cheio de um fogo claro, diferente do fogo do inferno que é negro e tenebroso. Este fogo do Purgatório tem a chama alta, de cor vermelha, contudo não infunde brilho nas almas. Por esse motivo, a alma neste lugar está sempre cercada por trevas exteriores. Mas se torna brilhante interiormente por causa das imensas graças alcançadas durante a sua purificação, que a faz reconhecer a verdade justa que fixou os limites do tempo de sua permanência. A alma cheia de pecado lamenta o estado de sua vida e deixa tudo a critério do Anjo encarregado de fazer a infusão para a sua purificação naquele fogo. E deste modo, conforme a qualidade e quantidade de seus pecados, o pecador permanecerá no fogo o tempo necessário para expiar os seus crimes praticados contra a Justiça de Deus.

               Todas as almas que estão no "Lugar Inferior do Purgatório" se mostram com disposição para a tortura e todos os sofrimentos, e são envolvidas completamente pelas chamas, suportando aquele fogo ardente que as atormenta vigorosamente, proporcionalmente a quantidade e qualidade dos pecados que cada uma cometeu. Assim, a alma que está no fogo, insensivelmente vai purgando os seus pecados, do mesmo modo que cresce nela a pureza espiritual. E terminado o tempo da dívida, ela deixa aquele lugar e sobe para um local logo acima, que é o "Plano Médio do Purgatório". Todavia, se a alma que está no "Plano Inferior" foi condenada por ter cometido pecado mortal, deverá permanecer neste Local num mínimo de setenta anos, sob intenso fogo para purificar todos os pecados. Francisca disse ainda que, aqueles favores que as pessoas no mundo fazem em beneficio das almas que estão no Purgatório sempre dão bons resultados, mesmo no caso das almas que estão no "Plano Inferior cujas" penas não podem ser reduzida, contudo, elas também lucrarão com a preciosa ajuda, pois haverá redução na intensidade do fogo, o qual não as atormentará tanto. Assim sendo, os favores, orações e esmolas, feitas pelas pessoas no mundo, contribuem efetivamente para que aquele fogo não seja tão atroz e ardente para as almas que lá estão em purificação. O "Plano Inferior do Purgatório" é aquele que está mais próximo do inferno, mas os espíritos malignos não podem entrar, permanecem de fora, no lado esquerdo, para evitar que as almas que lá estão, além das severas penas, sofram também ao ficarem expostas aos demônios, perto daquelas horríveis visões e ouvindo as repreensões, os xingamentos e terríveis impropérios dos diabos. Francisca disse ainda que por causa das penas severas que sofrem neste lugar, clamam chorosamente com vozes humildes e incansáveis: “Ó Deus piedade e misericórdia, misericórdia, misericórdia”. Certamente conhecendo quão justa e correta é a Justiça Divina, as almas que lá estão compreendem que estas penas são justas e dignas de suportar. E por isso também elas mesmas, apesar de suas constantes súplicas, ficam contentes, sentindo certa consolação, sabendo que à medida que vão transcorrendo os dias da purificação, vão se aproximando os dias de sua libertação à abençoada glória. Esta alma devota de Deus disse que aquele fogo do Purgatório se assemelha ao fogo do inferno do meio, ainda que com alguma diferença, porque o fogo do inferno é negro e escuro, e aquele do Purgatório é claro. Ela disse que viu na entrada do "Purgatório Inferior" letras escritas que diziam: “Prostibulo”. E viu logo acima, letras relacionando os maiores pecados mortais, que se praticado por uma alma ela estará condenada a sofrer naquele fogo por setenta anos completos (no mínimo), e nada poderá diminuir esta quantidade de tempo mencionada. No "Purgatório Inferior" ela ainda observou que haviam três locais separados. Um lugar maior onde são infligidas as penas, e nele havia também almas de sacerdotes, onde precisamente a parte do fogo era muito mais ardente. Na segunda parte havia almas de pessoas e de membros do clero não havendo, todavia, sacerdotes, e na qual o fogo não era tão ardente. Na terceira parte havia muitas almas de homens e mulheres seculares com grandes pecados cometidos e em cuja parte o fogo não era tão ardente, como na segunda parte. E, no entanto, os sacerdotes não expiavam pecados tão graves e tão pesados quanto aqueles dos seculares (homens e mulheres civis). Contudo suportavam penas maiores por um motivo racionalmente exigente: a "dignidade sacerdotal", que é tão grande e tão importante, que supera a maldade dos grandes pecados. Também, porque tiveram um conhecimento muito maior, mais oportunidade de santificação e estimulo ao discernimento espiritual, que as pessoas seculares tem apenas uma parte. Aquela devota serva de Cristo disse ainda que a alma do sacerdote também suporta castigos maiores e tão grandes, conforme outras circunstâncias, referentes à qualidade e quantidade dos pecados cometidos, em razão da qualidade funcional e da dignidade do cargo que exerceu.

               Depois Francisca foi conduzida pelo Arcanjo São Rafael para visitar o "Local do Purgatório Médio", no qual também tem três divisões cujos lugares são suficientemente grandes e onde, da mesma forma, a Justiça Divina realiza de modo perfeito o seu trabalho. Na primeira área, o local estava cheio de gelo diferente e especial, extremamente frio; o segundo estava cheio de madeira liquefeita misturada com óleo ferventíssimo e outras coisas para tornar o sofrimento da pena mais difícil; o outro local estava cheio de alguma coisa metálica liquefeita, provavelmente ouro ou prata, formando uma espécie de liga bem clara incandescente. Assim, depois que a alma sai do "Lugar Inferior" ela sobe para o "Purgatório Médio". Por outro lado, a administração Divina, é constituída por trinta e oito Anjos que recebem as almas saídas (com os pecados já eliminados) do fogo do "Purgatório Inferior", e recebem também as almas que no corpo estavam no mundo, que não cometeram graves pecados, de modo não merecer estar no fogo inferior. E estes gloriosos Anjos recebem estas almas e as submetem ao seu grau de purificação. Eles as recebem de modo gracioso e humano, mudando-as de local em local, à medida que vão cumprindo a pena, e fazem isso com grande caridade. Precisamente estes Anjos não são aqueles que enviam as próprias almas para a infusão, para extrair o mal que existe em cada uma, mas são Anjos a serviço das ordens da Divina misericórdia. Francisca disse ainda, que as almas que estão no "Purgatório Médio", que vieram do grande "Lugar Inferior" onde recentemente foram queimadas completamente, todas e qualquer uma delas, se praticaram algum pecado mortal permanecerão neste mesmo local do "Purgatório Médio", por quinze anos contínuos, ainda que já tivessem sofrido pelos seus grandes pecados e já tivessem permanecido no "Lugar Inferior" no mínimo por setenta anos. Porém, estes quinze anos de pena neste "Lugar Médio" poderão ser abreviados pelo sufrágio de orações e esmolas da humanidade, dirigidas a todas as almas que estão no Purgatório. Também disse esta alma devota de Deus que neste "lugar Médio do Purgatório", as almas não têm aquela visão horrível dos demônios, que permanecem externamente ao lado do "Purgatório Inferior", e também não ouvem os impropérios daqueles demônios, lançando censuras as almas, por causa de seus muitos pecados. A alma que está no "Lugar Inferior" sempre grita e suplica por piedade clamando: “Misericórdia, misericórdia”, mas as almas que estão no "Lugar Médio" sempre louvam a misericórdia infinita do Senhor, e repetem muitas vezes os seus agradecimentos. Por outro lado, o favor e qualquer benefício que as pessoas no mundo por caridade fazem às almas que estão no Purgatório, vão ajudar mais efetivamente aquelas que estão sendo purificadas no "Lugar Médio". Elas não só lucrarão a diminuição do castigo temporal, mas também a diminuição da pena total, tanto as almas que foram condenadas diretamente ao "Purgatório Médio" como aquelas que vieram do "Fogo do Purgatório Inferior". Disse ainda aquela humilde serva de Cristo, que todas as boas obras, orações e sacrifícios feitos por amigos e parentes em benefício das almas que estão em qualquer lugar do Purgatório, os próprios auxílios serão mais úteis se feitos por plena caridade, por que assim, também beneficiará a todas as outras almas existentes em purificação. Disse também que as orações e esmolas feitas caridosamente por amigos e parentes em beneficio daquelas almas que agora já estão na gloria, e, portanto, não necessitam das mesmas, tais orações e bons benefícios alcançam a finalidade, ajudando as outras almas necessitadas pelas quais ninguém faz sufrágios, ninguém reza e nem dão esmolas. Isto é geral para todas as almas que estão no Purgatório. Ainda disse, sobre o sufrágio, que se as almas a quem os mesmos são dirigidos estão no inferno, elas não poderão receber qualquer benefício. Os sufrágios, resultarão em benefício das pessoas que os praticarem. Esta feliz alma viu também algumas letras escritas no mencionado "Lugar Médio do Purgatório" dizendo que a alma com o pecado mortal naquele lugar deverá permanecer por quinze anos se não receber nenhum sufrágio.

               Do "Lugar Médio do Purgatório", cumprida as suas penas, as almas são conduzidas pelos Anjos ao "Lugar Superior". Ela viu dois setores no "Lugar Superior do Purgatório", que precisamente são os melhores locais quanto às penalidades. Ali é onde existe uma "imensa Fonte de Água" que lava a alma, tornando-a mais bonita, digna e honrada. Neste local existem vários Anjos e um deles é o Superior e dá as ordens. Ele ordena as almas a ficar sempre com a parte superior da cabeça naquela corrente de água, e de repente o próprio Anjo as mergulha totalmente na correnteza, a fim de limpar o restante do mal existente. Algumas almas se retiram mais rapidamente do que outras daquele lugar tão grande, de acordo com a quantidade de seus pecados cometidos e purificados, porque completada a sua purificação elas estarão sem nenhuma pena ou culpa. Aquela alma devotíssima de Deus viu também, que quando uma alma vem do mundo e não tem nenhuma pena a cumprir, é colocada por aquele Anjo glorioso na mencionada água, e mais rapidamente a retira de lá, porque a alma está limpa. Ela viu a alma de um homem e também de uma mulher, que neste mundo trabalharam em santas obras e se conformavam com a Vontade Divina.  Viu também a alma de uma criança recentemente batizada que nunca cometeu um pecado e a alma de um jovem que recebeu o martírio por amor a Deus. Todos eles passaram rapidamente pela água rumo à eternidade feliz. Desse modo, por pequena que seja a alma neste mundo, sendo justa e fazendo penitencia poderá ingressar nesse lugar, mas é necessário que antes de alcançar a glória beatífica seja colocada naquela água, que seguramente é de purificação e completa a limpeza espiritual.  Contudo, exceção para as almas que são privilegiadas por Nosso Senhor Jesus Cristo e por sua Mãe Santíssima, que sobem direto para a felicidade eterna.

               Neste "Lugar Superior do Purgatório" havia na entrada umas poucas letras que diziam: “Lugar de Purificação”. No "Lugar Inferior" havia também o letreiro que dizia: “Aqui é o Lugar dos Corruptos”. Na entrada do "Lugar do Purgatório Médio" o letreiro dizia: “Aqui é o Lugar do Purgatório”. Também disse esta alma devota de Deus, que, passada na mencionada água, a alma recebe com grande alegria e júbilo aquele Anjo que lhe foi dado em custódia para fazer a infusão, e com ele segue até um lugar denominado "Seio de Abraão". Dali, ela viu como o Anjo Custódio fazia a infusão nas almas e avaliava o grau de purificação, e conforme o mérito, ela podia ficar nesse lugar, ou permanecer no Coro dos Anjos mais baixo. São nove os Coros dos Anjos, e sobre este assunto Francisca fez uma ampla exposição no Tratado das Visões. Os Anjos que custodiavam a infusão para a purificação, sempre conduziam primeiro as almas para aquele local, no "Seio de Abraão". Na verdade, aqueles Anjos dados em custódia para as almas e, por conseguinte, que fazem as infusões, são os Anjos do Coro mais baixo e das residências dos referidos Coros. Assim, depois que a alma está naquele lugar que é denominado "Seio de Abraão", sem demora os Anjos, que são do Coro para onde elas devem subir, vêm satisfeitos e com a máxima alegria, as conduzem para o seu Coro e sua residência, e ali as almas vivem muito felizes e com bastante júbilo e euforia, na companhia dos Anjos. E do mesmo modo, se por ventura a alma deve ser conduzida para outro Coro, por exemplo, para o terceiro Coro, os Anjos do Terceiro Coro virão a esse lugar, a fim de conduzir a alma ou as almas para o seu Coro e Residência. Disse também essa venturosa alma dileta de Deus que quando uma feliz alma chega isenta de pecado, pelo seu mérito poderá alcançar o Coro Seráfico. Isto acontecendo, nenhum dos outros Coros Angélicos se aproximará para conduzir aquela alma a outro Coro. Se aquela feliz alma está no lugar que foi dito "Seio de Abraão", será envolvida por um som melodioso de suavíssima música, que se eleva admiravelmente, atravessando todos os Coros e a Divina Providência coloca aquela feliz alma na morada do Coro dos Serafins. E quando aquelas felizes almas, purificadas de todos os seus pecados, se aproximam do "Seio de Abraão" e seus méritos são avaliados, conforme a Providência Divina, todos os Anjos gloriosos que estão naquele Coro e nas Residências do Coro, fazem uma grande festa com muita alegria para todas elas. E quanto mais ela subir, pelos seus méritos e pela misericórdia de DEUS, para os Coros e Residências Superiores, maiores solenidades e muito mais júbilo acontecerão, e aquela alegria pouco a pouco vai aumentando, e assim por todos os Coros Angélicos e em toda pátria celeste acontece uma alegria indizível com todas as almas que sobem para a glória beatífica. Uma vez, o seu pai espiritual abordando o assunto sobre o espírito humano e os Anjos, perguntou-lhe se eles eram perfeitos? Ela respondeu dizendo que os espíritos humanos na glória eterna são mais perfeitos e têm maiores aptidões do que vivendo no mundo, porém os espíritos angélicos são puros, serenos, virtuosos, belos e formosos, e são também simples e precisos na compreensão do abismo Divino. Assim em seu cantar eles são suaves e com lindas melodias sempre louvam e bendizem o misericordiosíssimo Senhor por suas graças. Porém a serva de Cristo fez questão de realçar, as melodias para a gloriosa Rainha do Céu feitas por todos os espíritos angélicos e humanos transcendem, e excedem em beleza e ternura, são maravilhosas. De fato se o canto angélico tem uma melodia tão grandiosa que não é possível de se imaginar, com muito mais amplidão, perfeição e suavidade são as músicas dedicadas a Mãe de Deus que ressoam na pátria eterna. Aquela feliz Francisca, disse, além disso, que quando ela própria estava naquela visão beatífica, observando o posicionamento dos espíritos humanos na glória celeste, disse que eles se olham com humildade, e lá mantêm sua compreensão e capacidade individual como estavam na carne mortal. Ao mesmo tempo se consideram dentro do espetáculo Divino, não somente admirando por que não podem compreender as coisas Divinas profundamente, mas até ficam aturdidos, impressionados, todas as vezes que observavam a precisão agudíssima, sutil e penetrante dos espíritos seráficos, e a tão imensa compreensão que eles têm daqueles indizíveis abismos Divinos. Por esta compreensível razão, aquela humilde serva de Cristo, estava excessivamente admirada e com uma impressão muito ampla e preciosa, sobre a grandeza indizível da profundidade Divina na criação e no governo dos próprios espíritos seráficos. Além disso, Francisca estava também impressionada com a compreensão e harmonia única que existe entre os espíritos seráficos, se entendendo mutuamente com imenso discernimento penetrante, ciência infusa, saber e prudência, em todos os Coros Angélicos, e se excedendo em ternura e pontualidade conforme a sua capacidade, atuando da mesma maneira como se fosse um único ser. E isto é uma advertência, por que os espíritos seráficos apresentam de fato muita inteligência e perspicácia, e da mesma forma em todos os outros Coros Angélicos. Por isso, quem quiser estar mais próximo da morada Divina, deve procurar seguir a Vontade do Senhor a fim de alcançar a maior propensão de compreender e conhecer as coisas de Deus. Francisca ainda disse que em todas as moradas de qualquer Coro tem uma mesma quantidade de espíritos Angélicos, e todos os Anjos numa morada são semelhantes em nobreza e sobriedade, mesmo em moradas diferentes. Disse também, que quanto mais o espírito é capaz ou inteligente, tanto mais se satisfaz com a visão beatífica. E embora todos os espíritos na eternidade sintam uma imensa e plena satisfação nas visões beatíficas, contudo, uns mais que outros têm maior compreensão conforme a sua própria capacidade e sobriedade em entender a Divina Vontade. De fato, por exemplo, os próprios Apóstolos quando estavam na carne, uns mais do que outros receberam graças vinda do Espírito Santo, isto por que nenhum deles tinha o necessário conhecimento, igual capacidade, profunda perspicácia e discernimento, assim como a mesma e viril disposição para realizar a missão que o Senhor lhes confiou. Só depois, quando receberam os dons e as graças de Deus, tornaram-se brilhantes e lúcidos Apóstolos do Senhor, assim mesmo, cada um com sua própria natureza. Francisca ao concluir afirmou: o Purgatório é um lugar de esperança. Apesar das muitas transgressões e dos pecados da humanidade, o Purgatório é um estimulo as pessoas para se corrigirem dos seus vícios e hábitos perversos, buscando o caminho do direito e do amor fraterno, por que enseja uma oportunidade segura de alcançar a eternidade feliz. A estrada da conversão do coração é estreita e árdua, requer perseverança, fidelidade e amor, passando pelo exercício das penitências, das permanentes orações, das Santas Missas, da correta recepção dos Sacramentos, das pequenas e grandes abstinências e de uma profunda consciência da renúncia. Só assim será possível alcançar êxito na reconquista da amizade do Senhor, de quem se afastou pelos seus muitos pecados cometidos.

 

CISMA DO OCIDENTE

 

203º - Urbano VI - 1378 - 1389

               Urbano VI, nascido Bartolomeo Prignano; c. 1318 — Roma, 15 de outubro de 1389, foi Papa e líder da Igreja Católica de 8 de abril de 1378 até a data da sua morte. A sua eleição foi rodeada de polêmica, ele foi o último Papa a ser eleito fora do Colégio dos Cardeais, e que resultou no Grande Cisma do Ocidente. Em 8 de abril de 1378 foi eleito Papa por pressão da população de Roma, eleito para o cargo ainda era um Arcebispo, pois o povo queria ver um italiano no Pontificado para assegurar a permanência do Papado na cidade. Com a subida na hierarquia, Urbano VI revelou uma personalidade colérica e intempestiva que depressa lhe arranjou inimigos. Entre eles, especialmente os Cardeais de origem francesa, que revoltaram-se contra ele e começaram a conspirar a sua substituição. No fim do verão do mesmo ano, reuniram novo conclave e elegeram Roberto de Genebra, que tomou o nome de Clemente VII. Nessa altura excomungou Clemente e declarou-o o novo anticristo, mas nada pode fazer contra o seu estabelecimento em Avinhão. A sua impetuosidade não ajudou a sua causa e em breve algumas potências europeias passaram para o lado de Clemente. Não foi o caso do Reino de Portugal que se manteve ao lado dele, como sinal de apoio à vontade do Reino da Inglaterra. Em agosto de 1388, Urbano passou por Perugia, com milhares de tropas. Para angariar fundos, ele havia proclamado um Jubileu, que seria realizado em 1390. Na época do anúncio, apenas 38 anos se passaram desde o Jubileu anterior, que foi comemorado sob Clemente VI. Durante a marcha, Urbano caiu de sua mula em Narni e teve que se recuperar no início de outubro em Roma, onde ele foi capaz de derrubar a regra comum do Banderesi e restaurar a autoridade Papal. Ele morreu logo depois, provavelmente de ferimentos causados ​​pela queda, mas não sem rumores de envenenamento. Vale ressaltar que durante a reconstrução da Basílica de São Pedro, os restos de Urbano quase foram jogados fora onde seriam destruídos para que seu sarcófago pudesse ser usado para cavalos de água. O sarcófago foi salvo apenas quando o historiador da igreja, Giacomo Grimaldi chegou e, percebendo sua importância, ordenou preserva-lo. Os Cardeais franceses, não se conformando com as medidas rigorosas e severas do Papa Urbano VI, procederam a eleição de um antipapa, que adotando o nome de "Clemente VII", fixou residência novamente em Avinhão, na França.  Ao contrário da versão de muitos historiadores, não houve, nesse período, dualidade de Papas, já que Urbano VI foi eleito legitimamente, além do que a Igreja só reconhece no Papa de nome Clemente VII, Giulio de Medici, que governou a Igreja de 1523 a 1534. Este foi um período marcado por sérias tribulações. Membros do clero e do povo católico dividiram-se entre opiniões diversas e o fogo da rebeldia alastrou-se nutrido por diversas inconveniências. Aqui deu-se o que ficou conhecido como o "Cisma do Ocidente".

 

204º - Bonifácio IX - 1389 - 1404

               Bonifácio IX, nascido Piero Tomacelli, em Nápoles (Casarano, ca. 1356 – Roma, 1 de outubro de 1404) foi um Papa eleito a 2 de Novembro de 1389 que reinou até a sua morte. Com sede em Roma, o seu Pontificado foi marcado pela oposição dos antipapas de Avinhão e pelo Grande Cisma do Ocidente. Não se reconciliou com o antipapa Clemente, de Avinhão, mantendo o cisma ocidental. De uma família nobre de Nápoles, porém empobrecida, na sua formação não resultou em um grande teólogo ou mesmo perito em assuntos clericais, mas era por natureza diplomático e prudente e de caráter firme. Investiu na restauração do respeito do Papado pelos países orientais como Alemanha, Inglaterra, Hungra, Polônia, além da Inglaterra e de grande parte da Itália. Corou Ladislao, herdeiro de Carlos III de Nápoles e Margarita de Durazzo, como rei de Nápoles, em Gaeta (1390), e conseguiu expulsar eficazmente de Itália as forças de Angevin. Estabeleceu a supremacia do Papa sobre Roma, fortificou de novo o Castelo de Sant’Angelo (1398), retomou o controle sobre porto de Óstia, e com suas paulatinas conquistas formou os Estados Pontifícios como eles apareciam no século XV. Precavido contra a violência dos romanos, frequentemente mudava de moradia e viveu em Perúgia, Assis, e outros lugares. Após o falecimento de Clemente VII (1394), os Cardeais que o apoiavam elegeram um novo antipapa para suceder Clemente, que foi o Cardeal Pedro de Luna, o Bento XIII, mantendo o cisma ocidental. Durante o Pontificado de Bonifácio, celebraram-se os jubileus, o 3º e o 4º Anos Santos (1396/1400) que atraíram para Roma uma grande multidão de peregrinos, de vários nacionalidades. No final de seu Pontificado (1404) recebeu mais uma delegação enviada para tentar mais uma vez um acordo. A nova tentativa falhou e ele muito irritado agravou uma crise de litíase que o levou a morrer em dois dias. Papa de número 204, morreu em 1º de outubro, em Roma, foi sepultado na Basílica de São Pedro. Durante este Pontificado o Cardeal Pedro de Luna assumiu como sucessor do antipapa Clemente VII, que faleceu em 1394.   Pedro de Luna, cognominado Bento XIII, governou como antipapa até o Pontificado do Papa Gregório XII.  Tinha estreito relacionamento com São Vicente Ferrer, que grande luta travou para o fim do grande cisma. Apesar de reconhecer em Bento XIII, sua autoridade eclesiástica na qualidade de Cardeal, tentou persuadi-lo para que renunciasse a autoridade Pontifícia, mas não obteve êxito e, por este motivo, São Vicente preferiu retirar-se do Palácio recusando as dignidades hierárquicas que repetidamente lhe foram oferecidas.

 

205º - Inocêncio VII - 1404 - 1406

               Inocêncio VII (c. 1339 — 6 de novembro de 1406), nascido Cosimo de' Migliorati, foi Papa da Igreja Católica entre 1404 até sua morte. O seu Pontificado foi disputado pelo Antipapa Benedito XIII, o seu rival de Avinhão durante o Grande Cisma do Ocidente. Natural de Sulmona, L’Aquila, Itália, eleito em 11 de novembro (1404) como sucessor de Bonifácio IX e como Pontífice deu mostras de ser intransigente com o antipapa Bento XIII e mostrou preocupação pelos estudos e introduziu novas faculdades: medicina, filosofia e grego. Nomeado Arcebispo de Ravena (1387), tornou-se titular da diocese de Bolonha dois anos depois e foi nomeado Cardeal. Legado Pontifício na Lombardia e na Toscana (1390), foi escolhido para suceder Bonifácio IX enquanto o antipapa Bento XIII reinava em Avinhão. Homem de cultura, mas de caráter débil, tentou solucionar o cisma e as trágicas condições em que se encontrava o Estado e a Igreja. Com o fracasso da tentativa de Bento XIII chegar até Roma para tentar um acordo (1405), o Papa teve de enfrentar desordens populares na cidade, e foi obrigado a refugiar-se em Viterbo por alguns meses. Voltou a Roma e expulsou os Colonna, que haviam sido responsáveis pelas agitações. Protetor das artes e das ciências, reorganizou a universidade de Roma, ampliando o número de cursos e criando novas disciplinas. Morreu em 6 de novembro de 1406 em Roma, e foi sucedido por Gregório XII.

 

206º - Gregório XII - 1406 - 1415 

               Papa Gregório XII, nascido Angelo Correr (Veneza, 13 de maio de 1326 - Recanati, 18 de outubro de 1417) foi Patriarca latino de Constantinopla, eleito Papa no dia 30 de novembro de 1406. Com mais de oitenta anos de idade, foi coroado no dia 19 de dezembro do mesmo ano. Seu Papado foi marcado pela divisão da Igreja Católica, com dois antipapas. Angelo Correr foi feito Bispo de Castello em 1380 e, dez anos depois, Patriarca Latino de Constantinopla; durante o Papado de Inocêncio VII, foi Secretário apostólico no Legado de Ancona. Feito Cardeal de San Mareo em 1405, já no ano seguinte foi eleito por seus pares como sucessor de Inocêncio, adotando por nome Gregório. Durante seu Papado viveu a Igreja o processo divisionista do Cisma de Avinhão em que coexistiram três papados: o dele em Roma, o de Bento XIII em Avinhão e o de Alexandre V em Pisa onde, durante o Concílio ali realizado em 1409 deixou de comparecer assim como Bento, ambos foram considerados depostos. Gregório enviou esforços fracassados para reunificar a Igreja; fez dez novos Cardeais e convocou também em 1409 o Concílio em Cividale del Friuli (perto de Aquileia) ao qual poucos Bispos se fizeram presentes; ali os outros dois Papas foram acusados de provocarem o cisma, de perjúrio e de destruírem a Igreja. Com a morte do antipapa Alexandre, de Pisa, os Cardeais daquela cidade elegeram por sucessor a João XXIII; ocorre em seguida o Concílio de Constança em 1415 que procurou legitimar uma só autoridade Papal, com a renúncia dos três pretendentes ao Trono de São Pedro; Gregório apresentou sua renúncia a 4 de julho daquele ano. Bento foi preso e morreu, na Espanha, e João XXIII foi acusado de vários crimes e, preso, foi levado ao cárcere de Pisa. Ele então retirou-se das funções eclesiásticas, pouco mais de dois anos após sua renúncia veio a falecer em Recanati e, apesar de ter renunciado, somente após sua morte é que um novo Papa foi escolhido, em 1417. A principal realização de seu Papado foi a de adotar a hóstia como elemento da missa em lugar do pão, e a restrição do uso do cálice ao sacerdote - regras estas estabelecidas em 1414. Antipapas deste período: Clemente VII (1378-1394), Bento XIII (1394-1423), Alexandre V (1409-1410), João XXIII (1410-1415).

 

FIM DO CISMA DO OCIDENTE

 

207º - Martinho V - 1417 – 1431

               Martinho V (Roma, 1369 – Roma, 20 de fevereiro de 1431), nascido como Oddone Colonna, foi Papa da Igreja Católica de 1417 até sua morte. Foi durante seu Papado que se encerrou o Grande Cisma do Ocidente. Papa da Igreja Católica Romana, natural de Genazzano, Roma, que eleito em 21 de novembro como sucessor de Gregório XII (1406-1415), exerceu uma ação enérgica de saneamento moral, civil e administrativo e obrigou o uso do traje talar aos Eclesiásticos. Cardeal (1405), participou do Concílio de Pisa e do de Constança, durante o qual foi eleito Papa, após a renúncia de Gregório XII, pondo fim ao grande cisma do Ocidente. Em seguida passou a apoiar a tese da superioridade do Papa sobre o concílio, que antes negava e, com o fim do Concílio de Constança (1418), deixou aquela cidade para dirigir-se a Mântua e a Florença, fixando-se, por fim, em Roma (1420). Embora não fosse muito propenso às mudanças e reformas, foi bom administrador e contribuiu para a reconstrução e o embelezamento da cidade de Roma. Foi protetor das artes, quando começava o Renascimento, celebrou o 5º Ano Santo (1423) e, pela primeira vez, abriu-se a Porta Santa na Basílica de São João de Latrão. Também foi durante seu Pontificado que aconteceu a célebre aventura de Joana D’Arc. Faleceu em 20 de fevereiro de 1431, em Perúgia e foi sucedido por Eugênio IV. Durante quatro séculos, depois do Grande Cisma do Ocidente, com a eleição deste Papa no Concílio de Constança (1417), todos os conclaves foram realizados em Roma, com exceção de Pio VII. Os dois primeiros, após o Cisma, foram realizados no convento dos Dominicanos, de Minerva.

OBS: Lembrar que Martinho é o nome de somente três Papas católicos, apesar da numeração ascender a cinco; não existiram Papas antecessores com o nome de Martinho II ou III. Quando este Papa ascendeu a trono Papal e escolheu seu nome de sagração, acreditava-se que já teria havido três Papas com esse nome e foi proclamado como o de número IV. Na realidade tratavam-se de Papas com o nome de Marino ou Marinho.

 

207 . 1 - Santa Joana D`arc

               Joana d’Arc foi uma camponesa que teve participação relevante na Guerra dos Cem Anos, liderando as tropas de Carlos VII em conquistas importantes. Capturada pelos ingleses, foi julgada e condenada à morte na fogueira por bruxaria, sendo executada aos 19 anos de idade. No século XX, teve sua imagem reabilitada e hoje é um dos grandes nomes da história francesa. Joana d’Arc nasceu em Domrémy, vila no nordeste da França, no ano de 1412. Atualmente, a vila onde ela nasceu se chama Domrémy-la-Pucelle, como forma de homenageá-la, pois pucelle significa “donzela” e uma das formas pelas quais ela ficou conhecida foi “Donzela de Orleans”.  Joana d’Arc era uma camponesa e filha de Jacques d’Arc e Isabelle Romée. Os pais dela possuíam uma pequena terra, de onde tiravam seu sustento, e Jacques ainda cumpria funções como coletor de impostos local. Joana d’Arc foi a filha caçula do casal, que ao todo teve cinco filhos. Sua criação foi católica. No século XV, a França enfrentava as consequências da Guerra dos Cem Anos, um conflito dinástico que se estendeu ao longo de 116 anos e que foi marcado por alguns intervalos. O desentendimento entre franceses e ingleses se iniciou em 1328, quando Carlos IV, rei francês, faleceu e não deixou herdeiros diretos para assumir o trono. O rei da Inglaterra, Eduardo III, alegou ter direito ao trono francês, porque possuía descendência com Carlos IV por via materna. Acontece que a possibilidade de um monarca inglês ser coroado como rei da França não agradou à nobreza francesa, que temia que isso fosse se transformar em perda de autonomia. Assim, a pretensão de Eduardo III foi rejeitada com base na Lei Sálica, lei francesa que proibia que mulheres e seus descendentes assumissem o trono do país. Assim, Filipe VI foi coroado rei francês, o que criou um certo desgaste nas relações entre ingleses e franceses. A aliança da França com a Escócia acabou motivando o início da Guerra dos Cem Anos em 1337. A guerra com a Inglaterra se relacionava com Joana d’Arc da mesma forma como se relacionava com a vida de milhares de outros camponeses. O conflito trazia destruição para a terra; a terra destruída produzia menos; uma produção reduzida causava fome, e a fome enfraquecia uma população paupérrima, trazendo-lhe doenças. A coroação de Carlos VII em Reims só foi possível porque Joana d’Arc liderou a conquista dessa cidade. Além disso, os camponeses viam suas vidas sendo ameaçadas toda vez que um ataque inimigo acontecia. A própria vila em que Joana d’Arc nasceu já tinha sido atacada por borguinhões (aliados dos ingleses). A criação religiosa somada à vontade de ver a guerra acabar transformou Joana d’Arc em um dos grandes nomes da história francesa. Foi um instrumento de Deus para cessar a guerra e engrandecer o cristianismo. Joana d’Arc alegava que tinha visões e ouvia as vozes do arcanjo Miguel, da Santa Catarina de Alexandria e da Santa Margarida de Antioquia. Nessas aparições sobrenaturais, ela era orientada a tomar parte na guerra contra os ingleses para expulsá-los da França e para garantir a coroação de Carlos VII, o rei da França. Segundo Joana d’Arc, as aparições sobrenaturais aconteciam desde que ela tinha 13 anos e, aos 16, ela decidiu tomar parte na guerra. Assim, ela pediu para ser levada para Vaucouleurs, local onde existia uma guarnição francesa liderada por Robert de Baudricourt. Lá ela foi falar com Baudricourt para que ele arranjasse um transporte que a levesse a Chinon para encontrar o rei. O comandante se negou a dar ouvidos a Joana d’Arc, mas a camponesa conseguiu convencer a população local de seu propósito e logo muitos exigiam que Baudricourt fizesse o que Joana d’Arc pedia. Assim ele fez e então Joana d’Arc se preparou para encontrar o rei francês. Ela conseguiu uma reunião privada com Carlos VII, mas como ela obteve isso é um mistério. Outro mistério que envolve o encontro de Joana d’Arc com o rei francês foi como ela conseguiu convencer Carlos VII a dar tudo de que ela precisava: homens, armas, armaduras e o comando das tropas. Assim, Joana d’Arc participou ativamente da Guerra dos Cem Anos, mas entre os historiadores existe certa polêmica acerca do grau de envolvimento dela. Muitos historiadores desacreditam que ela tenha lutado no campo de batalhas. De acordo com eles, ela apenas cumpriu papéis que envolviam a montagem da estratégia e preparação das tropas, assim como a motivação dos soldados. Apesar disso, Joana d’Arc foi fundamental para duas vitórias expressivas da França: em Orleans e em Reims.

               Reims, inclusive, era o local onde tradicionalmente os monarcas franceses eram coroados. A conquista dessa cidade permitiu a coroação de Carlos VII, em 17 de julho de 1429. Apesar das vitórias expressivas, Joana d’Arc também conheceu derrotas, como foi no caso do fracassado cerco de Paris, ainda em 1429. De toda forma, o envolvimento da jovem quebrou um ciclo de derrotas francesas.

               Em 1430, borguinhões capturaram Joana d’Arc durante a Batalha de Compiègne. Ela foi vendida para os ingleses e permaneceu aprisionada, pois seria levada para julgamento. Os ingleses queriam tirar a credibilidade da francesa para tornar a coroação de Carlos VII sem validade. A Santa Inquisição foi utilizada para julgá-la. O julgamento estendeu-se por quatro semanas e dezenas de acusações se acumularam. No final, o fato de usar roupas masculinas e a alegação de que ouvia vozes se tornaram os fatores para a sua condenação. Em virtude da acusação de bruxaria (as vozes que ela ouvia foram tidas como vozes emitidas pelo demônio), Joana d’Arc foi condenada à morte na fogueira. A execução aconteceu no dia 30 de maio de 1431, em praça pública, na cidade de Rouen. Conta-se que no dia ela recebeu o sacramento da Eucaristia, foi vestida de branco e levada para a sua execução. Joana d’Arc foi queimada viva, e os relatos contam que ela gritava por Jesus. Na ocasião, ela tinha 19 anos. No século XX, a imagem de Joana d’Arc foi inteiramente reabilitada. Assim, ela foi canonizada em 1920 por Bento XV. Carlos VII não interveio no processo de Joana d’Arc e não tentou salvá-la do destino que ela teve. Entretanto, depois que ela faleceu, ele procurou atuar para que ela tivesse o seu processo anulado, pois ter a sua imagem ligada com a de uma mulher condenada por bruxaria não era bom para seu reinado. Assim, ele obteve do Papa Calisto III a anulação da condenação de Joana d’Arc. A reabilitação da imagem de Joana d’Arc se completou no século XX, quando ela foi beatificada e canonizada. Sua beatificação aconteceu em 1909, e a canonização foi realizada pelo Papa Bento XV, em 1920. Esse acontecimento foi parte de um esforço da Igreja Católica de reatar laços com a França, país que foi extremamente secularizado a partir da Revolução Francesa. Santa Joana d’Arc é considerada padroeira nacional da França e sua data comemorativa é 30 de maio."

 

208º - Eugênio IV - 1431 - 1447

               O Papa Eugênio, (Veneza, 1383 — Roma, 23 de fevereiro de 1447), nascido Gabriele Condulmer, foi Papa de 3 de março de 1431 até a data da sua morte. Homem severo e de índole "feroz como um tigre", era temido pela sua ampla correção e pela "justa palavra". Morreu vítima de envenenamento. A tradição atribui a este Pontífice a instituição de ampla distribuição da Hóstia consagrada na casa dos enfermos graves. Nascido em Veneza, eleito em 3 de Março de 1431 como sucessor de Martinho V, que decretou o fim dos antipapas residentes antes em Avinhão e depois em Pisa. Descendente de uma nobre família de Veneza era sobrinho de Gregório XII. Eleito, proclamou o 17.º Concílio Ecumênico em Basileia. Depois de sofrer pressões para dissolver o Concílio de Basileia (1431), fugiu de Roma após a proclamação da República em 1434. Assina a bula Rex Regnum em 8 de Setembro de 1436 um dos documentos que conferiam a Portugal o dever de evangelizar as populações nativas dos territórios sob seu domínio e transferiu-o para Ferrara (1437) e mais tarde para Florença. Declarando a supremacia do Papa sobre os concílios, os adversários e os padres conciliares elegeram em 1439 o antipapa Félix V, Amadeu VIII de Saboia. Graças ao apoio de Afonso de Aragão, investido por ele para o Reino de Nápoles, pôde retornar a Roma em 1443, após nove anos de ausência. Morreu em 23 de fevereiro de 1447 em Roma.

 

208 . 1 - Aparição de Nossa Senhora de Caravaggio - Itália.

               O município de Caravaggio, terra da aparição, se encontrava nos limites dos estados de Milão e Veneza e na divisa de três dioceses: Cremona, Milão e Bérgamo. Ano de 1432, época marcada por divisões políticas e religiosas, ódio, heresias, assolada por bandidos e agitada por facções, traições e crimes. Além disso, teatro da segunda guerra entre a República de Veneza e o ducado de Milão, passou para o poder dos venezianos em 1431. Pouco antes da aparição, em 1432, uma batalha entre os dois estados assustou o país. Neste cenário de desolação, às 17 horas da segunda-feira, 26 de maio de 1432, acontece a aparição de Nossa Senhora a uma camponesa. A história conta que a mulher, de 32 anos, era tida como piedosa e sofredora. A causa era o marido, Francisco Varoli, um ex-soldado conhecido pelo mau caráter e por bater na esposa. Maltratada e humilhada, Joaneta Varoli colhia pasto em um prado próximo, chamado Mazzolengo, distante 2 km de Caravaggio, suplicando: “Ó Senhora Santíssima, ajudai-me Vós...que eu já não consigo suportá-lo. Só Vós ó querida Mãe, podeis fazer cessar esses meus sofrimentos. Ninguém me ajuda e me consola... Tende piedade de mim!” Estava assim dirigida esta sua oração a Nossa Senhora, quando eis que uma luz inesperada a envolve e lhe chama a atenção para algo misterioso, ao seu redor. Ergue os olhos e ei-la diante da Rainha do Céu, que sem demora lhe diz:

"Não temas, ó filha, consola-te, que as tuas orações foram atendidas pelo meu Divino Filho, por minha intercessão e já te estão preparados os tesouros do Céu. Mas agora, dobra os joelhos por terra e ouve com reverência aquilo que te vou dizer: O mundo cheio de iniquidades, tinha provocado a indignação do Céu. O meu Divino Filho queria punir severamente esses homens, autores de iniquidade e cheios de pecados e de crimes, mas eu rezei pelos miseráveis pecadores, supliquei longamente e, finalmente meu Divino Filho aplacou-Se. Por isso, ordena que, por tão assinalado benefício, jejuem uma sexta-feira a pão e água e festejem um sábado em minha honra, porque eu quero este sinal de gratidão dos homens pela importantíssima graça por mim obtida a seu favor. E a gora vai, ó filha, e revela a todos esta minha vontade".

               Atordoada pela admiração e pela maravilha, Giannetta responde: "Como poderei eu, ó minha Mãe, fazer aquilo que me pedis? Quem acreditará nas minhas palavras? Eu sou demasiado pobre e mesquinha, e ninguém me acreditará!".

            "Acreditar-te-ão”, porque eu mesma confirmarei as tuas palavras com evidentes milagres!" Dito isto, desapareceu, deixando gravadas, no lugar em que se havia manifestado as pegadas de seus beatíssimos pés, junto das quais brotou uma fonte de água.

               Nossa Senhora de Caravaggio pede ao povo que volte a fazer penitência, jejue nas sextas-feiras e vá orar na igreja no sábado à tarde em agradecimento pelos castigos afastados e pede que lhe seja erguida uma capela. Como sinal da origem divina da aparição e das graças que ali seriam dispensadas, ao lado de onde estavam seus pés, brota uma fonte de água límpida e abundante, existente até os dias de hoje e nela muitos doentes recuperam a saúde. Joaneta, na condição de porta-voz, leva ao povo e aos governantes o recado da Virgem Maria para solicitar-lhes – em nome de Nossa Senhora – os acordos de paz. Apresenta-se a Marcos Secco, senhor de Caravaggio, ao Duque Felipi Maria Visconti, senhor de Milão, ao imperador do Oriente, João VIII Paleólogo, no sentido de unir a igreja dos gregos com o Papa de Roma. Em suas visitas, levava ânforas de água da fonte sagrada, que resultavam em curas extraordinárias, prova de veracidade da aparição. Os efeitos da mensagem de paz logo apareceram. A paz aconteceu na pátria e na própria Igreja (Concílio de Basileia-Ferrara-Florença). Até mesmo Francisco melhorou nas suas atitudes para com a esposa Joaneta. Sobre ela, após cumprida a missão de dar a mensagem de Maria ao povo, aos estados em guerra e à própria Igreja Católica. Por alguns anos foi visitada a casa onde ela morou que, com o tempo desapareceu no anonimato. A construção do atual santuário, autorizada por São Carlos Borromeu, começou em 1575 sob a direção de Pellegrino Tibaldi e só terminou no século XVIII. Hoje Basílica, o Santuário é bastante visitado por peregrinos devotos de Maria sob a denominação Nossa Senhora de Caravaggio.

 

209º - Nicolau V - 1447 - 1455

               Papa Nicolau V, (13 de novembro de 1397 - 24 de março de 1455), nascido Tommaso Parentucelli, foi chefe da Igreja Católica e governante dos Estados Papais de 6 de março de 1447 até sua morte, em março de 1455. O Papa Eugênio IV fez dele um Cardeal em 1446, após viagens bem-sucedidas à Itália e Alemanha, e quando Eugênio morreu no ano seguinte, Parentucelli foi eleito em seu lugar. Ele adotou o nome de Nicolau em memória de suas obrigações para com Niccolò Albergati. O Pontificado de Nicolau viu a queda de Constantinopla para os turcos otomanos e o fim da Guerra dos Cem Anos. Ele respondeu convocando uma cruzada contra os otomanos, que nunca se concretizou. Pela Concordata de Viena, ele garantiu o reconhecimento dos direitos Papais sobre Bispados e benefícios. Ele também provocou a submissão do último dos antipapas, Félix V, e a dissolução do Sínodo de Basel. Uma figura chave na Renascença romana, Nicolau procurou fazer de Roma o lar da literatura e da arte. Ele fortaleceu fortificações, restaurou aquedutos e reconstruiu muitas igrejas. Ordenou planos de projeto para o que viria a ser a Basílica de São Pedro. Ele é o último Papa a adotar o nome Pontifício de "Nicolau". Tommaso Parentucelli nasceu de Andreola Bosi de Fivizzano e do médico Bartolomeo Parentucelli em Sarzana, uma importante cidade de Lunigiana. A região de Lunigiana há muito tempo foi disputada por forças concorrentes da Toscana, da Ligúria e de Milão. Três anos antes do nascimento de Parentucelli, a cidade foi tomada dos florentinos pela República genovesa. Seu pai morreu quando ele era jovem. Parentucelli mais tarde tornou-se tutor, em Florença, das famílias dos Strozzi e Albizzi, onde conheceu os principais estudiosos humanistas. Parentucelli estudou em Bolonha e Florença, graduando-se em teologia em 1422. O Bispo Niccolò Albergati ficou tão impressionado com suas capacidades que o colocou a seu serviço e lhe deu a chance de continuar seus estudos, enviando-o em uma excursão pela Alemanha, França e Inglaterra. Ele era capaz de colecionar livros, pelos quais tinha uma paixão de intelectual, por onde passava. Alguns deles sobrevivem com suas anotações marginais. Parentucelli participou do Concílio de Florença e em 1444, quando seu Patrono morreu, foi nomeado Bispo de Bolonha em seu lugar. Os distúrbios cívicos em Bolonha foram prolongados, então o Papa Eugênio IV logo o nomeou como um dos legados enviados a Frankfurt. Ele deveria ajudar na negociação de um entendimento entre os Estados Papais e o Sacro Império Romano, a respeito de minar ou pelo menos conter os decretos reformadores do Concílio de Basel (1431–1439). A diplomacia bem-sucedida de Parentucelli rendeu-lhe a recompensa, em seu retorno a Roma, do título de Cardeal-Sacerdote de Santa Susanna em dezembro de 1446. No conclave Papal de 1447, ele foi eleito Papa na sucessão de Eugênio IV em 6 de março. Em apenas oito anos, seu pontificado produziu importantes conquistas na história política, científica e literária do mundo. Politicamente, precisava reparar as relações que se romperam no Pontificado de Eugênio IV. Ele convocou o congresso que produziu o Tratado de Lodi, garantiu a paz com Carlos VII da França e concluiu a Concordata de Viena ou Aschaffenburg (17 de fevereiro de 1448) com o rei alemão Frederico III, pela qual os decretos do Concílio de Basel contra anais Papais e reservas foram revogadas no que dizia respeito à Alemanha. No ano seguinte, ele garantiu um triunfo tático ainda maior com a renúncia do antipapa Félix V em 7 de abril e seu próprio reconhecimento pela retaguarda do Concílio de Basel reunido em Lausanne. Em 1450, Nicolau celebrou um Jubileu em Roma, e as ofertas dos numerosos peregrinos que se aglomeraram em Roma deram-lhe os meios de promover a causa da cultura na Itália, que ele tanto desejava. Em março de 1452, ele coroou Frederico III como Sacro Imperador Romano na Basílica de São Pedro, naquela que foi a última coroação imperial realizada em Roma. Dentro da cidade de Roma, Nicolau introduziu o novo espírito do Renascimento, tanto intelectual quanto arquitetonicamente. Seus planos eram embelezar a cidade com novos monumentos dignos da capital do mundo cristão. Foi em reconhecimento a esse compromisso com a construção que Leon Battista Alberti dedicou a Nicolau V seu tratado De re aedificatoria. Seu primeiro cuidado foi prático, reforçar as fortificações da cidade, limpando e até calçando algumas ruas principais e restabelecendo o abastecimento de água. O fim da Roma antiga às vezes é datado da destruição de seu magnífico conjunto de aquedutos por invasores do século VI. Na Idade Média, os romanos dependiam de poços e cisternas para obter água, e os pobres tiravam a água do Tibre amarelo. O aqueduto Aqua Virgo, originalmente construído por Agrippa, foi restaurado por Nicolau e esvaziado em uma bacia simples que Alberti projetou, o antecessor da Fontana di Trevi. Ele continuou a restauração das principais Basílicas romanas, mas também de muitas outras igrejas romanas, incluindo Sant'Apostoli, Sant'Eusebio, San Lorenzo fuori le Mura, Santa Maria in Trastevere, Santa Prassede, San Salvatore, Santo Stefano Rotondo, San Teodoro e principalmente São Celso. Ele reconstruiu a Ponte Sant 'Angelo, que havia desabado em 1450, e apoiou a reconstrução da área circundante como um prestigioso bairro comercial e residencial. O foco principal de Nicolau V era estabelecer o Vaticano como a residência oficial do Papado, substituindo o Palácio de Latrão. Ele acrescentou uma nova ala substancial, incluindo uma capela privada para o Vaticano, e – de acordo com Giannozzo Manetti, biógrafo de Nicolau – planejou mudanças substanciais no distrito de Borgo. Ele também colocou 2.522 carrinhos de mármore do Coliseu em ruínas para uso nas construções posteriores. Os contemporâneos do Papa criticaram seus pródigos gastos com a construção: Manetti traçou paralelos com a riqueza e os gastos de Salomão, sugerindo que a riqueza Papal era aceitável desde que fosse gasta para a glória de Deus e o bem da Igreja. A decoração da Capela Nicolina por Fra Angelico demonstrou esta mensagem através de suas representações de São Lourenço (martirizado por se recusar a entregar ao estado romano a riqueza da Igreja) e Santo Estêvão. Sob o generoso patrocínio de Nicolau, o humanismo também avançou rapidamente. O novo aprendizado humanista havia sido visto com desconfiança em Roma, uma possível fonte de cisma e heresia de um interesse doentio pelo paganismo. Para Nicolau, o humanismo tornou-se uma ferramenta para o engrandecimento cultural da capital cristã, e ele enviou emissários ao Oriente para atrair estudiosos gregos após a queda de Constantinopla. O Papa também contratou Lorenzo Valla para traduzir histórias gregas, tanto pagãs quanto cristãs, para o latim. Essa indústria, surgindo pouco antes do surgimento da imprensa, contribuiu enormemente para a súbita expansão do horizonte intelectual. Nicolau, com a ajuda de Enoque de Ascoli e Giovanni Tortelli, fundou uma Biblioteca de cinco mil volumes, incluindo manuscritos resgatados dos turcos após a queda de Constantinopla. O próprio Papa era um homem de vasta erudição, e seu amigo Aeneas Silvius Piccolomini, mais tarde Papa Pio II, disse dele que "o que ele não sabe está fora do alcance do conhecimento humano". Bibliófilo ao longo da vida, ele valorizava os livros: enquanto a biblioteca do Vaticano ainda estava sendo projetada e planejada, ele mantinha os livros mais raros perto de si em seu quarto, com os outros em uma sala próxima. Muitas vezes pensando com carinho em seu antigo trabalho como bibliotecário, ele certa vez comentou: "Tive mais felicidade em um dia do que agora em um ano inteiro". Ele foi compelido, no entanto, a acrescentar que o brilho de seu Pontificado seria para sempre enfraquecido pela queda de Constantinopla, que os turcos tomaram em 1453. Malsucedido em uma campanha para unir as potências cristãs para ajudar Constantinopla, pouco antes da conquista daquela grande cidadela, Nicolau ordenou que 10 navios Papais navegassem com navios de Gênova, Veneza e Nápoles para defender a capital do Império Romano do Oriente. No entanto, a antiga capital caiu antes que os navios pudessem oferecer qualquer ajuda. O Papa sentiu amargamente esta catástrofe como um duplo golpe para a cristandade e para as letras gregas. "É uma segunda morte", escreveu Aeneas Silvius, "para Homero e Platão". Nicolau pregou uma cruzada e se esforçou para reconciliar as animosidades mútuas dos estados italianos, mas sem muito sucesso. Ao realizar essas obras, Nicolau foi movido "para fortalecer a fé fraca da população pela grandeza daquilo que ela vê". A população romana, no entanto, não apreciou nem seus motivos nem seus resultados e, em 1452, uma formidável conspiração para derrubar o governo Papal sob a liderança de Stefano Porcari foi descoberta e esmagada. Essa revelação de desafeto, juntamente com a queda de Constantinopla em 1453, obscureceu os últimos anos do Papa Nicolau. No final da primavera de 1452, o Imperador bizantino Constantino XI escreveu ao Papa Nicolau pedindo ajuda contra o cerco iminente do sultão otomano Mehmed II. Nicolau emitiu a bula Dum Diversas (18 de junho de 1452) autorizando o rei Afonso V de Portugal a "atacar, conquistar e subjugar sarracenos, pagãos e outros inimigos de Cristo onde quer que se encontrem". Emitida menos de um ano antes da queda de Constantinopla, a bula pode ter sido destinada a iniciar outra cruzada contra o Império Otomano. A propriedade das Ilhas Canárias continuou a ser uma fonte de disputa entre Espanha e Portugal e Nicolau foi convidado a resolver a questão, em última análise, a favor dos portugueses. A área geográfica da concessão dada na bula não é explícita, mas o historiador Richard Raiswell considera que se refere claramente às terras recentemente descobertas ao longo da costa da África Ocidental. Os emprendimentos portugueses destinavam-se a competir com as caravanas muçulmanas trans-sahara, que desempenhavam um papel fundamental no altamente lucrativo comércio de escravos muçulmanos e também detinham o monopólio do ouro e marfim da África Ocidental. Os portugueses reclamavam direitos territoriais ao longo da costa africana por terem investido tempo e dinheiro na sua descoberta; a reivindicação castelhana baseava-se no fato de serem herdeiros dos visigodos. Em 1454, uma frota de caravelas de Sevilha e Cádis navegavam ao longo da costa africana e, ao regressarem, foram interceptadas por uma esquadra portuguesa. Enrique IV de Castela ameaçou a guerra. Afonso V apelou ao Papa para obter apoio moral do direito de Portugal ao monopólio do comércio nas terras que ela descobriu. A bula Papal Romanus Pontifex, emitida em 8 de janeiro de 1455, endossou a posse portuguesa de Cuerta (que eles já possuíam), e o direito exclusivo de comércio, navegação e pesca nas terras descobertas, e reafirmou o anterior Dum Diversas. Concedeu permissão a D. Afonso e seus herdeiros para "... fazer compras e vendas de quaisquer coisas e bens, e quaisquer provisões, que lhe pareça conveniente, com quaisquer sarracenos e infiéis nas referidas regiões; ... desde que não sejam instrumentos de ferro, madeira de construção, cordas, navios e qualquer tipo de armadura". A bula conferia direitos comerciais exclusivos aos portugueses entre Marrocos e as Índias com o direito de conquistar e converter os habitantes. Uma importante concessão dada por Nicolau em súmula ao rei Alfonso em 1454 estendeu os direitos concedidos aos territórios existentes a todos os que pudessem ser conquistados no futuro. Consistente com esses objetivos amplos, permitia aos portugueses "invadir, procurar, capturar, vencer e subjugar todos os sarracenos e pagãos, e outros inimigos de Cristo onde quer que estivessem, e os reinos, ducados, principados, domínios, possessões e todos os bens móveis e imóveis que sejam detidos e possuídos por eles e reduzir suas pessoas à escravidão perpétua". No entanto, junto com uma segunda referência a alguns que já foram escravizados, isso foi usado para sugerir que Nicolau sancionou a compra de escravos negros do "infiel": "... muitos guineenses e outros negros, levados por força, e alguns por troca de artigos não proibidos, ou por outro contrato legal de compra, foram... convertidos à fé católica, e espera-se, com a ajuda da misericórdia divina, que se tal progresso continuar com eles, ou esses povos serão convertidos à fé ou pelo menos as almas de muitos deles serão ganhas para Cristo”. É com base nisso que se argumentou que, coletivamente, as duas bulas emitidas por Nicolau davam aos portugueses o direito de adquirir escravos ao longo da costa africana pela força ou pelo comércio. Ao lidar com chefes africanos locais e comerciantes de escravos muçulmanos, os portugueses buscaram se tornar os principais atores europeus no lucrativo comércio de escravos. As concessões feitas neles foram confirmadas por bulas emitidas pelo Papa Calixto III (Inter Caetera quae em 1456), Sisto IV (Aeterni regis em 1481), e tornaram-se modelos para bulas subsequentes emitidas pelo Papa Alexandre VI: Eximiae devotions (3 de maio 1493), Inter Caetera (4 de maio de 1493) e Dudum Siquidem (23 de setembro de 1493), nas quais conferiu direitos semelhantes à Espanha em relação às terras recém-descobertas nas Américas.

 

FIM DO IMPÉRIO BIZANTINO – ANO 1453

 

209 . 1 - Santa Catarina de Gênova

                Catarina de Gênova (Catarina Fieschi Adorno, 1447 – 15 de setembro de 1510), foi uma Santa e mística italiana católica, admirada por seu trabalho entre os doentes e os pobres e decidiu escrever ambas essas ações e suas experiências místicas. Ela era um membro da nobre família Fieschi e passou a maior parte de sua vida e de seus meios à servir os doentes, especialmente durante a peste que assolou Gênova, em 1497 e 1501. Sua fama se estendeu fora de seu país natal, a cidade está conectada com a publicação do livro em 1551, conhecido em português como a Vida e a Doutrina de Santa Catarina de Gênova. Catarina nasceu em Gênova, em 1447, como a última de cinco filhos. Os pais de Catarina eram Jacopo Fieschi e Francesca di Negro, ambos de linhagem nobre italiana. A família estava ligada a dois anteriores Papas, e Jacopo tornou-se Vice-rei de Nápoles. Catarina quis se introduzir em um convento, quando tinha cerca de 13 anos, talvez inspirada por sua irmã, que era uma Freira Agostiniana. No entanto, as freiras tinham que passar primeiro por seu confessor, que a recusou por conta de sua juventude, e após isso, Catarina parece ter colocado a ideia de lado, sem qualquer tentativa futura. Após a morte de seu pai em 1463, com apenas 16 anos, ela foi casada pelos pais, ao desejo de um jovem nobre Genovês, Giuliano Adorno, um homem que, depois de várias experiências na área do comércio e no mundo militar no Oriente Médio, voltou para a Gênova para se casar. O casamento deles foi, provavelmente, uma manobra para acabar com a briga entre as duas famílias. O casamento acabou: ele não tinha filhos e Giuliano provou ser infiel, violento, mau humorado e um brutamonte, fez a vida de sua esposa uma miséria. Os detalhes são escassos, mas parece que pelo menos claro que Catarina passou os cinco primeiros anos do seu casamento, em silêncio, na melancolia e submissão ao marido; e que ela, por mais cinco anos, virou um pouco para o mundo, para consolação em seus problemas. Então, depois de dez anos de casamento, desesperada para escapar, ela orou por três meses, para que Deus mantivesse seu marido doente na cama, e sua oração foi respondida.

               Depois de dez anos de casamento, ela foi convertida por uma experiência mística, durante a confissão, em 22 de março de 1473; é descrita como um avassalador sentimento de amor de Deus para com ela. Após desta revelação, ela saiu da igreja sem terminar a sua confissão. Isto marcou o início de sua vida de íntima união com Deus na oração, sem a utilização de formas de oração. Começou a receber a Comunhão, quase que diariamente, uma prática extremamente rara para pessoas leigas na Idade Média. Ela combinou isso com o serviço para o doente em um hospital em Gênova, em que seu marido se juntou a ela, depois que ele também tinha sido convertido. Mais tarde, ele tornou-se um Franciscano terciário, mas ela não se juntou a nenhuma ordem religiosa. Ele e Catarina decidiram viver no Pammatone, um grande hospital, em Gênova, e dedicar-se a obras de caridade. Ela eventualmente se tornou gerente e tesoureira do hospital. Morreu em 15 de setembro de 1510 em Gênova na Itália, desgastada com trabalhos de corpo e alma. Sua morte foi lenta, com muitos dias de dor e sofrimento, teve visões e vacilou entre a vida e a morte. Assim descreveu Catarina em sua visão do Purgatório.

Descrição do estado das almas do purgatório:

               “As almas do purgatório não têm outra alternativa, a não ser ficarem onde estão, visto ter sido isso que Deus ordenou. Não podem nem pecar, nem merecer pelo fato de se absterem de pecar. Não há paz comparável à delas, a não ser a dos Santos no céu, e tal paz cresce incessantemente por influência de Deus, à medida que os impedimentos vão desaparecendo. Tais impedimentos são como que ferrugem e a felicidade das almas aumenta à medida que esta ferrugem diminui. Deus aumenta nelas o desejo de o verem e acende-lhes no coração um fogo de caridade tão poderoso que se lhes torna insuportável depararem com um obstáculo entre elas e o seu fim. No fim da vida terrena, a alma permanece para sempre confirmada no bem ou no mal que escolheu. As almas do purgatório encontram-se, portanto, confirmadas na graça. Deus castiga menos os condenados do que eles merecem. As almas do purgatório conformam-se perfeitamente com a vontade, de Deus. Sentem-se tão fortemente atraídas para Deus que nenhuma comparação pode exprimir tal atração. Imaginemos, todavia, um único pão para matar a fome a todas as criaturas humanas e que bastava vê-lo para a fome ser satisfeita. O inferno e o purgatório manifestam a sabedoria admirável de Deus. No próprio instante em que a alma se separa do corpo, ela dirige-se para o lugar que lhe corresponde e que lhe assinalam. Mesmo a alma em pecado mortal, não encontrando lugar mais próprio para si, precipita-se por si mesma no inferno… A alma justa, que ainda não tem a pureza necessária para a união divina, lança-se voluntariamente no purgatório para ser purificada. Pelo que diz respeito a Deus, vejo que o céu tem portas e pode entrar nele quem quiser, porque Deus é todo bondade; mas a essência divina é tão pura que a alma, se nota em si qualquer impedimento, precipita-se no purgatório e encontra esta grande misericórdia: a destruição de tal impedimento. A maior pena destas almas consiste em terem pecado contra a divina Bondade e terem ainda em si como que uma ferrugem, que são restos do pecado. A alma vê que Deus, pelo seu grande amor e Providência constante, jamais deixará de a atrair à sua última perfeição. Vê também que, ligada pelos restos do pecado, não pode por si mesma corresponder a esta atração. Se encontrasse um purgatório mais penoso, no qual pudesse ser mais rapidamente purificada, mergulharia nele imediatamente. Vejo raios de fogo que purificam as almas como o ouro no cadinho é libertado das suas escórias. Quando a alma fica completamente purificada, o fogo já nada tem a queimar; e se ela se aproxima dele não sentirá dor alguma. O seu desejo de ver a Deus é tão ardente e tão poderosamente reprimido, que se torna um tormento para ele. Deus, pela sua misericórdia, esconde-lhe consequências do pecado, que ainda restam nela, e quando estiverem destruídas, dar-lhas-á a conhecer, para que compreenda a ação divina que lhe restituiu a pureza. O amor divino, ao subjugar estas almas, confere-lhes uma paz indescritível. Têm, assim, grande alegria e grande pena; uma não diminui a outra. Se ainda pudessem merecer, bastaria um só ato de arrependimento para se libertarem da sua dívida, em virtude da intensidade deste ato. Elas sabem que nem um óbulo sequer lhes será perdoado; eis o decreto da justiça divina. E se a favor delas são oferecidos piedosos sufrágios por pessoas deste mundo, tal fato só as alegra de harmonia com a vontade de Deus e sem amor próprio. Enquanto a purificação não estiver concluída, estas almas compreendem que, se se aproximassem de Deus pela visão beatífica, não estariam no seu lugar e por isso sentiriam um maior sofrimento do que se permanecessem no purgatório. Esclarecidas, assim, a respeito da necessidade da reparação, gostariam de dizer aos mortais: «Ó criaturas miseráveis, por que vos deixais cegar de tal modo pelas coisas transitórias, que não fazeis nenhum aprovisionamento para a grande necessidade que cairá sobre vós? Dizeis: «Confessar-me-ei, ganharei uma indulgência plenária e serei salva». Lembrai-vos que a confissão completa e a perfeita contrição requeridas para ganhar a indulgência plenária não se atingem assim facilmente.” Estas almas sofrem tão voluntariamente as suas penas, que não desejariam o menor alívio, por conhecerem quão justas são. Esta espécie de purificação a que vejo sujeitas as almas do purgatório, experimentei-a em mim mesma durante dois anos. Tudo o que constituía para mim um alívio corporal ou espiritual foi-me tirado gradualmente. Finalmente, para concluir: vede bem que tudo o que é humano o nosso Deus todo poderoso e misericordioso transforma-o radicalmente. Não é outra a obra que se leva a cabo no purgatório.”

 

210º - Calixto III - 1455 - 1458

               Papa Calisto III nascido Alonso de Borja, em italiano Alfonso Borgia (Valência, 31 de dezembro de 1378 – Roma, 6 de agosto de 1458) foi Papa de 8 de abril de 1455 até a data da sua morte. Este Papa reviu a condenação de Joana d'Arc e reconheceu sua inocência em 1456. Filho de Domingo de Borja e de sua mulher Francisca Martì, foi tio materno doutro Papa da família Bórgia, Alexandre VI e do Cardeal Luis Juan de Milà y Borja. O seu túmulo encontra-se na igreja de Santa Maria in Monserrato, em Roma. Papa da Igreja cristã Romana nascido em Jativa, Espanha, eleito em 20 de agosto, aos oitenta anos de idade, para suceder Nicolau V, tornando-se o primeiro Papa da família Bórgia. Doutorado em Utroque Jure pela Universidade de Lérida, na Catalunha, tornou-se protegido do rei Afonso V de Aragão, que o nomeou seu conselheiro. Depois de ter sido Bispo de Valência em 1429 e Cardeal (1444), foi eleito Papa e governou apenas três anos. Sua primeira preocupação foi convocar uma cruzada contra os turcos que haviam ocupado Constantinopla. Mas, não obstante a libertação de Belgrado (1456) e as batalhas vitoriosas na Albânia, a iniciativa fracassou devido ao desinteresse das potências europeias. Fez florescer o cristianismo na Suécia, Noruega e Dinamarca, porém sua política de expansão favorável ao rei Afonso V de Aragão, que se tornou soberano de Nápoles com o nome de Afonso I, levou o Papa à beira da guerra. Também seu excessivo nepotismo em relação aos muitos catalães e aos seus parentes Borgia chamados a Roma, como a nomeação de seu sobrinho Rodrigo como Cardeal, fez nascer ao seu redor um ambiente de ressentimento e de ódio. Papa de número 210, morreu em 6 de agosto, em Roma e foi sucedido por Pio II.

               Um fato importantíssimo ocorrido no ano de 1455, foi a impressão do primeiro exemplar da Bíblia. Johannes Gutenberg, o alemão que inventou a impressão em caracteres, começou a impressão da primeira Bíblia em 1450, porém o processo terminou somente em 23 de fevereiro de 1455. A Bíblia das 42 linhas ou Bíblia de Gutenberg, era a versão impressa da Vulgata, uma tradução ao latim usada pela Igreja Católica. Ele a chamou de Bíblia das 42 linhas pela quantidade de linhas impressas, em duas colunas, em cada página. Atualmente existem 48 exemplares, mas só 21 estão completos. Um deles está na Espanha e se conserva na Biblioteca Pública de Burgos.

 

210. 1 - Os catorze santos auxiliares

               Os catorze santos auxiliares são um grupo de Santos invocados pelos cristãos em casos de necessidade especial, geralmente para se curar doenças particulares. As tradições cristãs contam que a devoção a esses santos nasceu na Alemanha, na região da Renânia século XV, quando o Menino Jesus apareceu ao pastor Hermann Leicht Langheim, a peste negra assolava a Europa.

               Entre o grupo encontram-se três virgens mártires: Santa Margarida de Antioquia, Santa Bárbara e Santa Catarina de Alexandria, conhecidas também como Santas de Casa. Como os outros Santos começaram a ser invocados juntos dessas três virgens mártires, eles passaram a ser representados juntos em trabalhos artísticos. A veneração popular teve início nos mosteiros que traziam dentro de si as relíquias dos ditos Santos. Todos os catorze, com exceção de Santo Egídio, foram martirizados. Como o culto aos Catorze Santos Auxiliadores mostrou-se forte no século XVI, o Papa Nicolau V estendeu indulgência àqueles que mantivessem devoção pelos Santos do grupo, o que não foi longamente aplicado.

               Embora tenham festas em dias separados, os catorze são comemorados no dia 8 de agosto, embora essa data nunca tenha tomado parte do Calendário Romano Geral para veneração universal. Quando esse calendário foi revisto em 1969, as celebrações individuais de Santa Bárbara, Santa Catarina de Alexandria, São Cristóvão e Santa Margarida de Antioquia foram abandonadas, embora em 2004 o Papa João Paulo II tenha restituído para 25 de novembro uma memória facultativa a Santa Catarina de Alexandria. A celebração individual de todos os catorze foi incluída no Calendário Geral Romano de 1954, do Papa Pio XII e o Calendário Geral Romano de 1962.

               Comparado ao culto dos catorze Santos auxiliadores foi o dos Quatro Santos Marechais, que também foram venerados na Renânia como os Marechais de Deus. Os quatro Santos marechais eram São Quirino, Santo Antão do Deserto, Papa Cornélio e Santo Humberto.

Os quatorze Santos auxiliares são:

               Santo Acácio, 8 de maio - Agátio, também conhecido por Achacio ou Acácio (em latim: Acacius), é um mártir e Santo da Igreja Católica Romana, considerado como um dos 14 Santos Auxiliadores e um Santo militar. Agátio era um centurião romano natural da Capadócia e estacionado na Trácia, que durante a perseguição de Diocleciano foi martirizado em Bizâncio no ano de 303, segundo a tradição, no dia 8 de Maio, dia em que o calendário litúrgico o recordava. Também era celebrado a 16 de Janeiro, data da trasladação solene das suas relíquias. Foi torturado, flagelado e decapitado por não renunciar à sua fé cristã.

               Várias igrejas de Constantinopla eram-lhe dedicadas, incluindo uma mandada construir por Constantino. Considerado um dos Santos Auxiliadores, é invocado contra as dores de cabeça e para proteção dos soldados. É em geral representado como um soldado vestido com cota de malha e escudo tendo na mão um punhado de espinhos, símbolo do seu martírio. As suas relíquias foram transferidas por volta do ano de 630 para a cerca do mosteiro de Vivário, construído no século anterior por Cassiodoro, em Squillace, uma cidade costeira da Calábria, onde foram colocadas numa fonte monumental. As relíquias repousam hoje na catedral de Squillace, onde o Santo é venerado.

               Santa Bárbara, 4 de dezembro - Bárbara de Nicomédia (Nicomédia, c. 280 – Nicomédia, c. 317) foi uma virgem mártir do século III comemorada como Santa cristã na Igreja Católica Romana, na Igreja Ortodoxa e na Igreja Anglicana. Em Portugal e no Brasil, tornou-se popular a devoção a Santa Bárbara, invocada como protetora por ocasião de tempestades, raios e trovões, dando origem à expressão "Só se lembram de Santa Bárbara quando troveja". Ela é comemorada no dia 4 de dezembro de cada ano, qual seria a data que morta pelo seu pai.

               Santa Bárbara foi, segundo a Tradição católica, uma jovem nascida na cidade de Nicomédia (na região da Bitínia), atual İzmit antiga Pérsia, Turquia, nas margens do Mar de Mármara, isto nos fins do século III da Era cristã. A moça era a filha única de um rico e nobre habitante desta cidade do Império Romano chamado Dióscoro.

               Por ser filha única e com receio de deixar a filha no meio da sociedade corrupta daquele tempo, Dióscoro decidiu fechá-la numa torre. Santa Bárbara na sua solidão, tinha a mata virgem como quintal, e questionava-se se de fato, tudo aquilo era criação dos ídolos que aprendera a cultuar com seus tutores naquela torre. Por ser muito bela e, acima de tudo, rica, não lhe faltavam pretendentes para casamentos, mas Bárbara não aceitava nenhum.

               Desconcertado diante da cidade, Dióscoro estava convencido que as "desfeitas" da filha justificavam-se pelo fato dela ter ficado trancada muitos anos na torre. Então, ele permitiu que ela fosse conhecer a cidade; durante essa visita ela teve contato com cristãos, que não eram bem vistos na região naquela época, lhe contaram sobre os ensinamentos de Jesus sobre o mistério da união da Santíssima Trindade. Pouco tempo depois, um padre vindo de Alexandria a batizou.

               Em certa ocasião, seu pai decidiu construir uma casa de banho com duas janelas para Bárbara. Todavia, dias mais tarde, ele viu-se obrigado a fazer uma longa viagem. Enquanto Dióscoro viajava, Bárbara ordenou a construção de uma terceira janela na torre, visto que a casa de banho ficara na torre. Além disso, ela esculpira uma cruz sobre a fonte.

               O seu pai Dióscoro, quando voltou, reparou que a torre onde tinha trancado a filha tinha agora três janelas em vez das duas que ele mandara abrir. Ao perguntar à filha o porquê das três janelas, ela explicou-lhe que isso era o símbolo da sua nova Fé. Este fato deixou o pai furioso, pois ela se recusava a seguir a Religião da Roma Antiga.

               Debaixo de um impulso e fúria, e obedecendo a suas tradições romanas, Dióscoro denunciou a própria filha ao prefeito Marciniano que a mandou torturar numa tentativa de a fazer renunciar sua fé, fato que não aconteceu. Assim, Márcio condenou-a à morte por degolação. Durante sua tortura em praça pública, uma jovem cristã de nome Juliana denunciou os nomes dos carrascos, e imediatamente foi presa e entregue à morte juntamente com Bárbara.

               Ambas foram levadas pelas ruas de Nicomédia por entre os gritos de raiva da multidão. Bárbara teve os seios cortados, depois foi conduzida para fora da cidade onde o seu próprio pai a executou, degolando-a. Quando a cabeça de Bárbara rolou pelo chão, um imenso trovão estrondou pelos ares fazendo tremer os céus. Um relâmpago flamejou pelos ares e atravessando o céu fez cair por terra o corpo sem vida de Dióscoro.

               Santa Bárbara passou a ser conhecida como "protetora contra os relâmpagos e tempestades" e é considerada a Padroeira dos artilheiros, dos mineiros e de todos quantos trabalham com fogo. Santa Bárbara é frequentemente retratada com correntes em miniatura e uma torre. Como uma das catorze Santas auxiliares, Bárbara continua a ser uma Santa popular nos tempos modernos.

               São Brás, 3 de fevereiro - São Brás (Roma, c. 264 – Sebaste, c. 316) foi um mártir, Bispo e Santo católico que viveu entre os séculos III e IV na Armênia. Ficou conhecido porque retirou, após uma breve oração, um espinho da garganta de uma criança. Por esse motivo, é padroeiro das doenças da garganta e, no dia de sua celebração a 3 de fevereiro, nas cidades da Espanha, Campanário (Ribeira Brava), Arco da Calheta, Calheta (Madeira) e algumas da América Latina, as mães levam os filhos para benzerem a garganta. Foi capturado pelos romanos e decapitado no ano 316, sendo enterrado na cidade de Sebaste. Seu culto se expandiu, tanto no Oriente quanto no Ocidente, a partir do século VIII, invocando-se suas bênçãos para doentes e animais por associação aos milagres que lhe foram atribuídos. Seus emblemas são um rastelo (ancinho) ou duas velas cruzadas. É o Santo patrono dos trabalhadores da lã. Na igreja latina, sua festa ocorre em 3 de fevereiro, nas igrejas orientais, seu dia é comemorado em 11 de fevereiro.

               Santa Catarina de Alexandria, 25 de novembro - Catarina de Alexandria, é uma Santa e mártir cristã que foi uma notável intelectual no início do século IV. Passados 1100 anos, Joana d'Arc disse que Santa Catarina apareceu-lhe várias vezes. A Igreja Ortodoxa a venera como uma "grande mártir", e na Igreja Católica, ela é tradicionalmente reverenciada como um dos Catorze santos auxiliares.

               Catarina nasceu na cidade egípcia de Alexandria e cresceu como uma pagã, mas em sua adolescência converteu-se ao cristianismo. Diz-se que ela visitou seu contemporâneo, o imperador romano Maximino Daia, e tentou convencê-lo do erro moral na perseguição aos cristãos. Ela conseguiu converter a esposa de Maximiano, e também muitos pagãos que o imperador enviou para disputar com ela.

               Numa visão, Catarina foi transportada para o céu, encontrou-se com o menino Jesus e a Virgem Maria e, em êxtase, casou-se misticamente com Cristo, convertendo-se ao cristianismo. Ela tinha, na época, dezoito anos de idade. Foi então à presença do imperador romano Maximino Daia, que perseguia os cristãos, censurando-o por sua crueldade. Apontou a limitação do imperador, por ser pagão, e afirmou que o seu Deus era o único realmente vivo e o seu rei era Jesus Cristo.

               O imperador mandou prendê-la no cárcere até que viessem os 50 maiores sábios da província de Alexandria e a humilhassem por causa da sua argumentação aparentemente simples. Quando chegaram, os sábios riram-se do imperador por tê-los convocado para contra-argumentar com uma simples garota. Porém, o imperador os advertiu que, se conseguissem convencê-la, ele os presentearia com os melhores bens do mundo; mas se não conseguissem, ele os condenaria à morte. Catarina foi tão plenamente sábia nas suas colocações e argumentos que mesmo perante esta ameaça os sábios não conseguiram convertê-la aos ídolos. Pelo contrário, vencidos pela eloquência de Catarina, converteram-se ao cristianismo. Frustrado, o imperador mandou prender e torturar Catarina na masmorra. Visitada na prisão pela esposa do imperador e pelo chefe de sua guarda, Catarina os converteu, fazendo o mesmo com inúmeros soldados. Mais enfurecido ainda, o imperador mandou assassinar os sábios e a sua esposa, lançou os guardas aos leões no Coliseu e condenou Catarina à morte lenta na roda (instrumento de tortura que mutilava e causava grande sofrimento). Quando foram amarrar Catarina na roda, ela fez o sinal da cruz e a roda se quebrou. Ao determinar sua execução, apareceu-lhe o arcanjo Miguel para confortá-la e Catarina rezou suplicando que, em nome do seu martírio, Deus ouvisse as orações de todos aqueles que a ele recorressem e que tudo obtivessem por sua intercessão. Por fim, Catarina de Alexandria, então com apenas 18 anos, morreu decapitada. Três séculos mais tarde, o seu corpo, incorrupto, foi encontrado por monges e levado para o Mosteiro da Transfiguração, onde algumas das suas relíquias e o seu nome ficaram até hoje.

               Foi ouvindo a voz de Santa Catarina que Santa Joana d'Arc encontrou a espada que usaria em sua missão que mudaria a história da França. Junto de Santa Margarida e do arcanjo Miguel, era uma das vozes que falavam com ela e a instruíram na sua missão de salvar a França. Santa Catarina é considerada padroeira dos estudantes, filósofos e professores e também invocada pelos que trabalham com rodas e contra acidentes de trabalho. No Brasil, é a padroeira principal do Estado e da Ilha de Santa Catarina, e co-padroeira da Catedral metropolitana de Florianópolis.

               São Cristóvão, 25 de julho - A figura mais frequente de São Cristóvão é representada por um gigante barbudo, que carrega o Menino Jesus nos ombros, ajudando-o a atravessar um rio; o Menino segura o mundo nas pontas dos dedos, como se brincasse com uma bola. Esta imagem remonta a uma das histórias hagiográficas mais famosas sobre a vida do Santo, martirizado em 25 de julho em Anatólia, na Lícia. Segundo a tradição, seu verdadeiro nome era Reprobus, um gigante que queria prestar serviço ao rei mais poderoso do mundo.

               Ao chegar à Corte de um rei, que achava ser invencível, pôs-se ao seu serviço. Mas, certo dia, percebeu que o rei, ao escutar o canto de um trovador que falava do diabo, fez o Sinal da Cruz. Então, perguntou-lhe porquê. E o rei lhe respondeu que tinha medo do diabo e que todas as vezes que o ouvia falar em seu nome, fazia o Sinal da Cruz para buscar proteção.

               O gigante então partiu em busca do diabo, que ele julgava ser mais poderoso que seu rei. Não demorou muito e o encontrou; assim, pôs-se a servi-lo e a segui-lo. Porém, um dia, passando por uma rua onde havia uma cruz, o diabo desviou seu caminho. Então, Reprobus perguntou-lhe porquê havia agido desta maneira. E o diabo foi obrigado a admitir que Cristo tinha morrido na Cruz; por isso, diante da Cruz, tinha que fugir de medo.

               Por fim, Reprobus deixou o diabo de lado e pôs-se à busca de Cristo. Certo dia, encontrou um eremita que lhe sugeriu construir uma cabana às margens de um rio, cujas águas eram perigosas, e colocar-se à disposição das pessoas a atravessá-lo, uma vez que tinha uma estatura gigantesca.

               Um belo dia, o bom gigante ouviu uma voz de criança, que lhe pedia ajuda: era um menino que queria atravessar o rio. Então, o gigante o colocou sobre os ombros e o carregou para o outro lado daquele rio perigoso. Enquanto fazia a travessia, o peso daquela criança aumentava cada vez mais, tanto que, com muito custo, conseguiu chegar à outra margem. Lá, o menino revelou sua identidade: era Jesus e o peso, que havia carregado, era o do mundo inteiro, salvado pelo sangue de Cristo. Esta história, além de inspirar a iconografia ocidental, fez com que São Cristóvão fosse invocado como Padroeiro dos barqueiros, peregrinos, viajantes e motoristas.

               O martírio de Cristóvão aconteceu em Anatólia, na Lícia. O Santo resistiu às torturas com hastes de ferro e metal incandescentes. Até as flechas que lhe atiraram, ficaram suspensas no ar; uma delas, voltou e transpassou o olho do soberano, que lhe havia ordenado o suplício. Assim, o rei mandou decapitar Cristóvão. Mas, antes de morrer, disse-lhe: “Banhe os olhos com o meu sangue e ficará curado”. O rei recuperou a visão e se converteu. Desde então, São Cristóvão foi invocado contra as doenças da vista.

               São Ciríaco, 8 de agosto - Ciríaco de Roma é um mártir cristão perseguido e morto por ordem de Diocleciano, sendo um dos vinte e sete Santos católicos a usarem este nome. É um dos Catorze Santos auxiliares. São Ciríaco é venerado pela cristandade e seu dia consagrado é 8 de agosto.

               De acordo com a tradição cristã, Ciríaco era um nobre romano que após se converter ao cristianismo decidiu doar todos os seus bens materiais aos pobres e passou a evangelizar os escravos que trabalhavam na construção das Termas de Diocleciano. Sob o governo de Maximiano, Ciríaco foi perseguido e decapitado na Via Salária no ano de 303. Ciríaco também exorcizou Atermia, filha de Diocleciano fato que resultou na conversão dela e de sua mãe, Serena. Outra menina a ser exorcizada por Ciríaco foi Jobias, filha de Sapor I fato que resultou na conversão de toda a família real persa.

               São Denis, 9 de outubro - São Dinis de Paris ou São Dionísio de Paris foi um mártir e Santo cristão, tendo sido Bispo de Paris no século III. Foi martirizado aproximadamente no ano de 250. Segundo a Tradição, São Dinis ainda caminhou até sua igreja logo após ser decapitado. É venerado pela Igreja Católica Romana como co-padroeiro de Paris.

               Foi enviado como missionário a Paris, e depois foi o primeiro Bispo de Paris. Notável pregador, converteu centenas de pessoas. Seu sucesso provocou a ira dos pagãos locais e foi feito prisioneiro pelo governador romano. Martirizado nas perseguições do imperador Valeriano para renegar sua fé, junto com São Eleutério e São Rústicus que eram seus diáconos. A história diz que após ter sido decapitado ele andou segurando sua cabeça por algum tempo em direção a sua igreja. Seu túmulo tornou-se um local de peregrinação e vários milagres foram creditados a sua intercessão.

               Santa Genoveva (padroeira de Paris) construiu uma Basílica sobre sua tumba e sua festa foi adicionada ao calendário romano em 1568 pelo Papa Pio V, embora ela seja celebrada na França desde 800 d.C. Ele é um dos catorze Santos auxiliares. Foi decapitado no ano de 258 em Montmartre e seu corpo atirado no Sena, mas recuperado e sepultado à noite pelos seus convertidos e devotos. Na arte litúrgica da Igreja pode ele ser mostrado como um Bispo carregando sua cabeça, às vezes usando uma mitra e também com uma videira crescendo em seu pescoço. É padroeiro da França e de Paris e no passado era invocado contra a dor de cabeça. Geralmente, é invocada sua intercessão contra a hidrofobia, ira, furor, possessão demoníaca e a raiva (doença).

               Santo Erasmo, 2 de junho - Erasmo de Formia, morto cerca de 303, também conhecido como Santo Elmo ou São Telmo, é o Santo padroeiro dos marinheiros. Erasmo é um dos catorze Santos auxiliares das lendas cristãs, invocados na Europa Central como intercessores.

               Ele pertencia ao clero da Antioquia. Foi forçado, durante a perseguição do imperador Diocleciano, a esconder-se numa caverna no Monte Líbano durante sete anos. Capturado e longamente torturado, foi levado para ser julgado pelo imperador, que tentou de todas as formas fazer com que renegasse a fé em Cristo. Porém Erasmo manteve-se firme e por isso novamente voltou para a prisão. De lá, foi milagrosamente libertado por um anjo que o levou para a Dalmácia, onde fez milhares de conversões durante mais sete anos.

               Na época do imperador Maximiano, novamente foi preso e no tribunal, além de destruir um ídolo falso, declarou sua incontestável religião cristã. Tal atitude de Erasmo fez milhares de pagãos converterem-se, os quais depois foram mortos pela perseguição desse enfurecido imperador. Outra vez foi horrivelmente torturado e também libertado, agora pelo arcanjo Miguel, que o conduziu para a costa do sul da Itália. Ali se tornou o Bispo de Fórnia, mas por um breve período. Morreu pouco depois devido às feridas de seus dois suplícios, por este motivo recebeu o título de mártir.

               As muitas tradições descreveram algumas particularidades sobre as crueldades impostas nas suas torturas. Dizem que seu ventre foi cortado e aos poucos os seus intestinos foram retirados. Devido a esse suplício, Santo Erasmo tornou-se, para os fiéis, o protetor das enfermidades do ventre, dos intestinos e das dores do parto.

               Os marinheiros ainda hoje são muito devotos de Santo Erasmo, ou Santo Elmo ("Sant'Elmo"), como também o chamam. Desde a Idade Média eles o tomaram como seu padroeiro, invocado-o especialmente durante as adversidades no mar. As fontes históricas da Igreja também comprovam a existência de Erasmo como mártir e Bispo de Fórnia, Itália. Dentre elas estão o Martirológio Gerominiano, que indicou o dia 2 de junho para sua veneração e a inscrição do seu nome entre os mártires no calendário marmóreo de Nápoles.

               O Papa São Gregório Magno, no fim do século VI, escrevendo ao Bispo Bacauda, de Fórnia, atestou que o corpo de Santo Erasmo estava sepultado na igreja daquela diocese. No ano 842, depois de Fórnia ser destruída pelos sarracenos muçulmanos, as suas relíquias foram transferidas para a cidade de Gaeta e escondidas num dos pilares da igreja, de onde foram retiradas em 917. A partir de então, Santo Erasmo foi declarado padroeiro de Gaeta e, em sua homenagem, foram cunhadas moedas com a sua efígie.

               Santo Eustáquio, 20 de setembro - Eustáquio é um mártir cristão e Santo militar, que viveu no final do século I e inícios do século II da nossa era. Alguns elementos da sua história estão presentes na vida de outros santos. Antes da sua conversão ao cristianismo, Eustáquio era um general romano de nome Plácido (latim: Placidus) ao serviço do imperador Trajano. Enquanto caçava nas proximidades de Roma, Eistáquio teve uma visão de Jesus entre os anjos. Desde então converteu-se, fez-se batizar a si e à sua família, e mudou o seu nome para o grego Eustachion, que significa “boa fortuna”.

               Uma série de calamidades abateram-se sobre o recém-convertido e a sua família para testar a sua fé: foi roubado, a sua esposa raptada pelo capitão do navio onde seguia e, por fim, ao atravessar um rio, os seus dois filhos foram levados, um por um lobo, outro por um leão. Tal como Jó, Eustáquio lamentou-se, mas não vacilou nem perdeu a fé.

               Acabaria por recuperar o seu prestígio, cargos e reunir a família. Porém, quando demonstrou a sua nova fé ao recusar-se a fazer um sacrifício pagão, o imperador Adriano condenou Eustáquio, a esposa e os filhos à morte, ordenando que fossem cozinhados vivos dentro de um touro de bronze, no ano de 118 d.C. Eustáquio tornou-se Santo patrono dos caçadores, sendo também invocado em tempos de adversidade; foi incluído entre os catorze Santos auxiliares. A ilha de Santo Eustáquio, nas Antilhas Neerlandesas, foi assim chamada em sua honra.

               São Jorge, 23 de abril - São Jorge (entre 275 e 280 — 23 de abril de 303), também conhecido como Jorge da Capadócia e Jorge de Lida foi, conforme a tradição, um soldado romano no exército do imperador Diocleciano, venerado como mártir cristão. Na hagiografia, São Jorge é um dos Santos mais venerados no Catolicismo, na Igreja Ortodoxa, bem como na Comunhão Anglicana. É imortalizado na lenda em que mata o dragão. É também um dos catorze santos auxiliares. No cânon do Papa Gelásio (496 DC), São Jorge é mencionado entre aqueles que “foram justamente reverenciados pelos homens e cujos atos são conhecidos somente por Deus”.

               Considerado como um dos mais proeminentes Santos militares, a memória de São Jorge é celebrada nos dias 23 de abril e 3 de novembro – a primeira é a data de sua morte, e a segunda, a data da consagração da igreja dedicada a ele em Lida (Israel), na qual se encontram sua sepultura e suas relíquias. A igreja de São Jorge em Lida foi erguida a mando do imperador romano Constantino.

               São Jorge é o Santo padroeiro em diversas partes do mundo, tais como: Inglaterra, Geórgia, Lituânia, Sérvia, Montenegro e Etiópia, além de ser um padroeiro menor de Portugal; bem como das seguintes cidades: Londres, Barcelona, Génova, Régio da Calábria, Ferrara, Friburgo, Moscovo e Beirute. No Oriente, ele é conhecido como “megalomártir”, ou seja, “grande mártir”. Ele também é reconhecido como modelo de virgem masculino, ao lado de São João Evangelista e do próprio Jesus Cristo.

               Santo Egídio, 1 de setembro - Santo Egídio ou São Gil, foi um Santo católico eremita do século VI originário da Grécia que se tornou popular na região da Provença e na Escócia. A abadia onde viveu Santo Egídio, na comuna francesa de Saint-Gilles, é local de peregrinação e parada oficial dos Caminhos de Santiago. Pouco se sabe sobre a infânica e juventude de Santo Egídio, porém sabe-se que ele era filho de nobres atenenses. Após a morte de seus pais, Egídio passou a ser eremita e habitou na região do rio Ródano e do rio Gard.

               Egídio se mudou para uma floresta na região de Nimes para viver como eremita e se dedicar ao estudo de Deus e durante essa época seu único companheiro foi um cervo. Porém, seu refúgio foi decoberto por capangas do rei que o haviam perseguido secretamente. Uma flecha atingiu em cheio sua mão enquanto tentava proteger uma corça dos caçadores do rei visigodo Vamba. Como forma de reconciliação o rei disponibilizou médicos para cuidarem dos ferimentos da mão de Egídio e também construiu um enorme monastério para Egídio que mais tarde se tornou monastério beneditino.

               Egídio veio a falecer em 720 d.c em seu monastério e sua sepultura se tornou local de peregrinação e parte dos Caminhos de Santiago que levam até a Espanha. Santo Egídio também foi consagrado um dos Catorze Santos auxiliares da Igreja Católica.

               Santa Margarida de Antioquia, 20 de julho - Margarida de Antioquia, também conhecida como Santa Margarida, é uma Santa cristã, virgem e mártir, inscrita no grupo dos Catorze Santos auxiliares, cuja celebração litúrgica se situa, tal como na Igreja Anglicana, a 20 de julho. Na Igreja Ortodoxa é venerada como Marina de Antioquia, três dias antes, a 17 de julho. A sua devoção Ocidental foi reavivada com as Cruzadas. A sua reputação incluía indulgências muito poderosas para todos quanto escrevessem ou lessem a sua vida, ou invocassem a sua intercessão.

               De acordo com a Legenda Áurea, Margarida (ou Marina) nasceu em Antioquia da Pisídia e era filha de um sacerdote pagão chamado Aedesius. Renegada pelo pai por causa da sua fé, foi viver com uma mãe adotiva na Ásia Menor, atual Turquia, acabando a guardar ovelhas. Olybrus, o governador, fascinado com a beleza da jovem, propôs-lhe casamento, em troca da sua renúncia ao cristianismo. Não ocultando que era cristã, o governador decidiu então entregá-la aos cuidados de uma mulher nobre. Detinha a esperança que esta a convenceria renegar Cristo. Mas Margarida manteve-se firme e negou-se a oferecer um sacrifício aos ídolos. Encarcerada por não ceder aos pedidos do prefeito, submeteram-na então às mais terríveis torturas, entre as quais se contam o açoitamento com varas, o cortar do seu corpo com tridentes, o cravar de cravos e a sua laceração por meio de um gancho. Contam-se então alguns episódios; Um relata que, sobrevivendo milagrosamente, conseguiu, mediante o sinal da cruz, expulsar de si mesma um demónio da sua garganta. Noutro momento, engolida por Satanás (que assumira a forma de um dragão), ela rasgou a pele do mesmo com um crucifixo que possuía, saindo então, de dentro do animal. É óbvio que se trata de uma alusão a sua fé inabalável que vencia todos os desafios propostos por Satanás. Margarida é então condenada à morte no ano de 304.

               As suas relíquias encontravam-se em Constantinopla até à tomada da cidade pelos cruzados no ano de 1204. O braço de Santa Margarida encontra-se no monte Atos no Mosteiro de Vatopedi. Sendo reconhecida como Santa pela Igreja Católica, a sua festa litúrgica foi colocada no Martirológio Romano em 20 de julho. Do século XII ao século XX, ela fora incluída entre os Santos celebrados onde quer que se celebrasse o rito romano. Margarida teria aparecido para Joana d'Arc, junto com Santa Catarina de Alexandria e São Miguel, para ajudarem Joana a salvar a França dos ingleses. É tida como padroeira da gravidez. O seu principal atributo é o dragão que leva preso ou que jaz a seus pés; por vezes é representada guardando o seu rebanho ou sustém uma cruz entre as mãos e um rosário de pérolas.

               São Pantaleão, 27 de julho - São Pantaleão é um Santo católico, que viveu no século IV. Sendo um dos Catorze Santos auxiliares, é invocado contra o mal do cancro e da tuberculose e é patrono dos médicos. O seu sangue foi conservado por séculos na Itália onde anualmente, a 27 de julho, miraculosamente torna-se líquido.

               Parte das relíquias do seu corpo foram guardadas e veneradas na Sé cidade do Porto, Portugal. É o padroeiro desta cidade, tendo sido para aqui transportado pela comunidade armênia, em fuga de Constantinopla, prevenindo-se da invasão otomana. Outras estão na França na Basílica de Saint-Denis, em Paris, e sua cabeça é mantida em Lyon. Na Itália estão na cripta da igreja de São João e Reparata em Lucca, e ainda um braço que é preservado na igreja de São Pantaleão, em Veneza. No sagrado Monte Athos, na Grécia, um dos vinte mosteiros da comunidade russa que ainda existem é-lhe dedicado.

               Tendo estudado Medicina, tornou-se médico pessoal do césar Galério. Converteu-se ao cristianismo, vindo a ser acusado pelo Imperador de ter recebido o batismo. Preso e torturado, foi martirizado por decapitação, por se recusar a abjurar de sua fé, em Nicomédia, na Ásia Menor, em 303. Tinha então menos de 23 anos de idade. O imperador queria poupá-lo e tentou convencê-lo a se retratar como ateu. Pantaleão, no entanto, confessou abertamente sua fé cristã, e para mostrar estar certo curou ali mesmo um paralítico com palavras de Cristo.

               Foi condenado pela primeira vez ao fogo, mas as chamas foram extintas. Em seguida mergulhado em chumbo derretido, mas o chumbo é milagrosamente resfriado. Depois atirado ao mar com uma pedra amarrada no pescoço, mas a pedra começou a flutuar. Adiante condenado às feras, mas os animais que eram supostamente para rasgá-lo em pedaços começaram a fazer-lhe festas, em seguida, foi amarrado a uma roda mas as cordas e a roda quebraram. Foi feita uma tentativa de decapitá-lo, mas a espada curvava. Pantaleão orou a Deus sempre para perdoá-los, razão pela qual ele também recebeu o nome de Panteleemon (em grego, aquele que tem compaixão por todos). Finalmente, quando deu o seu consentimento, os carrascos conseguiram o seu intento. Também há representações pictóricas de São Pantaleão crucificado numa aspa, martírio semelhante ao do Apóstolo Santo André.

               São Vito, 15 de junho - São Vito ou São Guido (Sicília, 290 - Basilicata, 303) é um Santo católico originário da Sicília que viveu durante a perseguição aos cristãos e morreu como mártir da Igreja pelas mãos dos Imperadores Diocleciano e Maximiano. Sua festa é celebrada em 15 de junho.

               No final da Idade Média, as pessoas na Alemanha celebravam a festa de Vitus dançando diante de sua estátua. Essa dança se tornou popular e o nome "Saint Vitus Dance" foi dado à doença neurológica da coreia de Sydenham. Também levou Vito a ser considerado o Santo padroeiro dos dançarinos e dos artistas em geral.

               Vito é considerado o Santo padroeiro dos atores, comediantes, dançarinos e epiléticos, da mesma forma que Gênesis de Roma. Diz-se também que ele protege contra raios, ataques de animais e dormir demais. Vito é o Santo padroeiro da cidade de Rijeka na Croácia; as cidades de Ciminna e Vita, na Sicília, Polignano a Mare, na Puglia, Forio, na ilha de Ischia, na Campânia, Itália; a contrada de San Vito, em Torella dei Lombardi, em Avellino, Itália; a cidade de Rapone, Itália; a cidade de Winschoten na Holanda, a colônia italiana de San Vito na Costa Rica, e da cidade de St. Vith localizado na Bélgica. Vários lugares na Áustria e na Baviera são nomeados Sankt Veit em sua homenagem.

               Segundo a tradição, Vito, Modesto e Crescentia eram mártires de Diocleciano. O primeiro testemunho de sua veneração é oferecido pelo "Martyrologium Hieronymianum". O fato de a nota estar nos três manuscritos mais importantes indica que também estava no exemplo comum deles, que apareceu no século V. O mesmo Martyrologium fez no mesmo dia outra menção a Vitus no topo de uma lista de nove mártires, com a declaração do local, em Eboli, "Em Lucania ", ou seja, na província romana desse nome no sul da Itália entre o mar da Toscana e o golfo de Taranto.

               Vito era filho de um senador de Lucania. Ele resistiu às tentativas de seu pai, que incluíam várias formas de tortura, para fazê-lo se afastar de sua fé. Ele fugiu com Lucest, seu tutor Modestus e a esposa de Modestus, Crescentia, que era a babá de Vito. Ele foi levado de lá para Roma para expulsar um demônio que havia tomado posse de um filho do imperador Diocleciano. Isso ele fez e, no entanto, permanecendo firme na fé cristã, foi torturado junto com seus tutores. Por um milagre, um anjo levou de volta os três a Lucania, onde morreram pelas torturas que haviam sofrido. Três dias depois de morto, Vito apareceu para uma matrona distinta chamada Florentia, que então encontrou os corpos e os enterrou no local onde estavam.

               Em alguns dias do ano litúrgico a invocação de um dos Santos acima é substituída pela de Santo Antão, São Leonardo de Noblac, São Nicolau, São Sebastião, Santo Osvaldo, Papa Sisto II, Santa Apolônia, Santa Doroteia, São Wolfgang ou São Roque. Na França a Virgem Maria é adicionada ao rol dos catorze Santos auxiliares.

               A Basílica em Vierzehnheiligen construída em estilo barroco, foi erguida entre 1743 e 1772, é o maior templo do mundo em honra aos Catorze Santos Auxiliares. A devoção começou na região em 24 de setembro de 1445, quando Hermann Leicht, um jovem que pastoreava as ovelhas de um mosteiro franciscano, viu uma criança chorando num campo próximo a um mosteiro da Ordem de Cister em Langheim. Quando ele se agachou para tomar nos braços a criança que chorava, ela desapareceu subitamente. Algum tempo depois, a mesma criança apareceu no mesmo lugar. Dessa vez, duas velas queimavam próximas a ele. Em junho de 1446, Leicht viu a criança pela terceira vez. Dessa vez, a criança trazia junto de si uma rosa vermelha num cesto e estava acompanhada de outras treze crianças. A criança disse: “Nós somos os catorze auxiliadores e desejamos que construa uma capela aqui, onde possamos descansar. Se você for nosso servo, nós o seremos de você!”

               Um curto espaço de tempo depois, Leicht viu novamente duas velas descendendo queimando sobre o lugar. A partir de então, curas milagrosas começaram a ser manifestadas e atribuídas aos catorze Santos. Os irmãos da Ordem de Cister, a quem pertenciam as terras, logo construíram uma capela que começou a receber peregrinos imediatamente. Um altar foi consagrado por volta de 1448. Muitos peregrinos continuam a visitar a Basílica ainda hoje, em grande fluxo principalmente entre os meses de maio e outubro.

 

211º - Pio II - 1458 - 1464

               Pio II, nascido Enea Silvio Piccolomini, (Corsignano, 18 de outubro de 1405 — 14 de agosto de 1464), foi Papa e líder mundial da Igreja Católica de 19 de agosto de 1458 até sua morte. Nascido em Corsignano, na Itália, no território sienês de uma família nobre, porém em decadência, também foi um intelectual autor de diversas obras, como a história de sua vida, intitulada Comentários, a única autobiografia já feita por um Papa. Papa amante das artes, escreveu vários livros e fez com que sua cidade natal fosse rebatizada por ele de Pienza, após reconstruída em seus monumentos pelo urbanista Rossellino. Inicialmente dedicou-se aos estudos jurídicos e adquiriu uma vasta cultura humanista. Trabalhando como leigo, seu primeiro contato direto com o clero foi quando exerceu a função de Abreviador e participou do Concílio de Basiléia (1432). Depois foi Secretário do Imperador Frederico III e só por volta dos quarenta anos é que resolveu abraçar a carreira Eclesiástica, por sinal rápida mas muito brilhante. Foi Bispo de Trieste (1447), de Siena (1450), Cardeal em 1456, e finalmente eleito Papa em 19 de agosto, assumiu o Trono de São Pedro a 3 de setembro, para suceder Calisto III. Confirmou em Mântua a aliança dos reis da França, Borgonha, Hungria e Veneza, para socorrer as províncias oprimidas pelos turcos. Canonizou em 1461 Catarina Benincasa (1347-1380), Santa Catarina de Siena, proclamada padroeira da Itália por Pio XII e declarada doutora da igreja em 1970 pelo Papa Paulo VI. Extraordinariamente culto, foi autor de várias obras em latim, como De duobus amantibus história (História de dois amantes), Cosmographia e uma autobiografia Commentarii rerum memorabilium quae temporibus suis contigerunt. Tentou organizar uma nova cruzada contra os turcos muçulmanos que estavam atacando a Terra Santa, e fracassou em sua tentativa de convencer os Príncipes cristãos a se envolver em tal empresa. Mesmo assim decidiu agir por conta própria e proclamou a guerra Santa em 1463. Dirigindo-se a Ancona, de onde deviam partir os cruzados, acabou morrendo em Ancona antes de ver concretizado o seu intento.

 

212º - Paulo II - 1464 - 1471

               Paulo II, nascido Pietro Barbo (Veneza, 23 de Fevereiro de 1417 — Roma, 26 de Julho de 1471), foi Papa entre 30 de Agosto de 1464 e a data da sua morte. Sobrinho do Papa Eugênio IV, adere à carreira Eclesiástica quando da eleição do tio, em 1431. As suas promoções foram rápidas: Cardeal em 1440 e eleito Papa por unanimidade em 30 de Agosto de 1464, sucedendo ao Papa Pio II. Tendo passado sua juventude em Florença, tornou-se Arquidiácono de Bolonha e depois Bispo de Cervia e Vicenza antes de ser feito Cardeal aos 23 anos por seu tio, o Papa Eugênio IV. Homem de considerável fortuna, exerceu grande influência na Cúria sob os Papas Nicolau V e Calisto III e em 1456 tornou-se governador geral da Campania e das regiões marítimas. As Capitulações elaboradas pelos cardeais às vésperas da eleição do sucessor do Papa Pio II afirmavam que o novo Papa, uma vez eleito, deveria fixar o número de Cardeais, reformar a Cúria, abrir um concílio geral dentro do terceiro ano de seu Pontificado, e retomar a guerra contra os turcos. Paulo foi eleito na primeira votação, mas recusou-se firmemente a publicar uma bula confirmando as provisões do pacto eleitoral. Supremamente ciumento de sua autoridade, ele governou como um monarca ostentoso, impondo à Corte Papal um estilo no modo do primeiro Renascimento italiano. No entanto, ele mesmo não era humanista no sentido pleno da palavra; por exemplo, em 1468 ele dissolveu a Academia Romana fundada por Pomponio Laetus. Por outro lado, cercou-se de estudiosos e encorajou a fundação da primeira gráfica da Itália no Subiaco (1465). Seu gosto por pompa e luxo foi expresso no famoso Palácio de São Marcos, hoje o Palazzo Venezia, que ele começou em Roma já em 1455 e fez sua residência principal a partir de 1466. O Pontificado de Paulo foi dominado pela intensificação da guerra contra os turcos otomanos. Imediatamente, em 1464, Paulo recolheu os fundos necessários para renovar a luta e, em 1466, deu seu apoio ao chefe albanês Scanderbeg. Para o benefício da Santa Sé, ele fortaleceu seu monopólio de alúmen ao proibir qualquer negociação de alume com os turcos, mas ele não poderia impedir a fortaleza de Negromonte (Euboea) de cair (julho1470). Ele se distraiu da luta apenas quando sentiu que era seu dever intervir na Boêmia em oposição ao rei Jorge Poděbrad e à igreja Hussita. Por instigação do Papa, Matias Corvino, Rei da Hungria, declarou guerra à Poděbrad (31 de março de 1468), a quem Paulo já havia declarado deposto. Corvino recebeu a coroa da Boêmia do Papa em março de 1469. Poděbrad, entretanto, obteve o apoio do Rei Luís XI da França, e juntos exigiram a convocação de um concílio geral da Igreja e iniciaram um processo contra o ex-favorito de Paulo, o Cardeal Jean Balue. Para apaziguar Luís XI, que antes consentira na abolição da Pragmática Sanção de Bourges (1461), apesar do Parlamento, Paulo deu oficialmente a ele e seus sucessores o título de “O Maior Rei Cristão”. Paulo também se dedicou à extirpação na igreja dos heréticos Fraticelli, iniciando um processo contra eles em 1466 e processando seus adeptos na Alemanha. Por sua bula de 19 de agosto de 1470, Paulo decretou que os futuros Anos Santos seriam realizados a cada 25 anos (a partir de 1475). Na primavera de 1471, ele realmente contemplou a convocação de um Concílio em Ferrara. Tentou uma reconciliação com a Igreja Bizantina e estava negociando uma aliança com o príncipe iraniano Uzom-Hassan contra os turcos quando ele morreu repentinamente. Seu famoso túmulo renascentista no Vaticano é o trabalho de Mino de Fiesole e Giovanni Dalmato.

 

213º - Sisto IV - 1471 - 1484

               O Papa Sisto IV (21 de julho de 1414 – 12 de agosto de 1484), nascido Francesco della Rovere, foi Papa de 9 de agosto de 1471 até sua morte em 1484. Suas realizações como Papa incluíram a construção da Capela Sistina e a criação dos Arquivos do Vaticano. Patrono das artes, promoveu escavações arqueológicas em Roma, contratou vários artistas importantes do Renascimento, levando-os a Roma para decorar Palácios, Capelas e igrejas, patrocinando várias obras-primas. Sisto fundou a Inquisição Espanhola, pela bula Exigit sincerae devotionis affectus em 1478, embora lutasse para evitar abusos, e anulou os decretos do Concílio de Constança. Ele era conhecido por seu nepotismo e esteve pessoalmente envolvido na infame conspiração dos Pazzi. Papa da Igreja cristã Romana natural de Cella Ligure, perto de Savona, república de Gênova, cujo Papado caracterizou-se pelo patrocínio às letras e às artes e também por intrigas, conspirações e atos de nepotismo. Membro de uma família aristocrática, ingressou na ordem franciscana, onde se doutorou em teologia e ocupou a função de ministro-geral. Cardeal em 1467, sucedeu ao Papa Paulo II, numa época em que perdia força o ideal das cruzadas contra os turcos e as relações entre o Papado e a França eram tensas, pois o rei Luís XI sustentava a independência da igreja francesa, além de fracassarem as tentativas de unir as igrejas russa e romana. Entre concessões de privilégios e envolvimento em escândalos e conspirações, como um fracassado atentado contra Lourenço o Magnífico e a sua excomunhão, até a incitação de conflitos entre províncias como Veneza, Nápoles e Milão, que mantiveram a Itália em situação caótica. Neste complexo contexto da Itália renascentista, o Papado foi marcado pela transformação em principado italiano. No catolicismo instituiu a festa da Imaculada Conceição, em 8 de dezembro, anulou formalmente os decretos do Concílio de Constança (1478) e aprovou oficialmente a festa de São José. Condenou os abusos da Inquisição espanhola (1482) e garantiu inúmeros privilégios às ordens mendicantes, sobretudo a dos franciscanos, à qual pertencia. Criou a primeira casa para menores abandonados e edificou numerosas igrejas, como a Santa Maria del Popolo e começou a construção da igreja de Santa Maria da Paz. Promoveu a construção de importantes obras públicas e comissionou grandes artistas, como Botticelli e Pollaiuolo. Protegeu os humanistas e enriqueceu a Biblioteca Vaticana, que franqueou aos pesquisadores. Sua principal obra arquitetônica foi a construção da célebre Capela Sistina. Morreu em Roma e foi sucedido por Inocêncio VIII.

 

Cristóvão Colombo chega às Américas – ano 1492

 

214º - Inocêncio VIII - 1484 - 1492

               Papa Inocêncio VIII, nascido Giovanni Battista Cibo (Génova, 1432 – Roma, 25 de Julho de 1492), foi Papa de 29 de agosto de 1484 até a data da sua morte. Proclamou em 5 de dezembro de 1484, a bula Summis Desiderantis Affectibus. Neste documento, ele relacionava os crimes atribuídos aos bruxos e dava plenos poderes à Inquisição para prender, torturar e punir todos aqueles que fossem suspeitos do 'crime de feitiçaria'. Sumo Pontífice italiano da igreja Católica Apostólica Romana, cujo Pontificado trouxe muito desprestígio para a Igreja e contribuiu para o declínio do prestígio Papal, em virtude de sua fraqueza de espírito, embora tivesse o mérito de apoiar a empreitada de Cristóvão Colombo junto ao rei da Espanha. Pertencente a uma família da nobreza de Gênova, era filho de um senador romano, quando jovem levou uma vida libertina e teve dois filhos ilegítimos, Franceschetto e Teodorina. Mas depois regenerou-se e encaminhou-se para a carreira Eclesiástica; depois de ter concluído os estudos em Pádua, onde foi ordenado. Foi Bispo em Savona (1467) e em Olfetta, Nápoles (1473) e tornou-se Cardeal (1473) por ordem do Papa Sisto IV. Foi eleito em 12 de setembro (1484) como substituto de Sisto IV, escolhendo o nome de Inocêncio VIII. Essa eleição já previa a falta de apio de seus membros. Os principais rivais e pretendentes a tiara Papal eram Giuliano della Rovere, o mais ativo dos sobrinhos do Papa Sisto V e futuro Papa Júlio II (1503-1513) e Rodrigo Bórgia, o seguinte Alexandre VI (1492-1503), sobrinho de Calisto III (1455-1458). Seu nome surgiu de um acordo entre Della Rovere e Bórgia. Eleito sobretudo por meio de intrigas, em uma época de crise moral do Papado, condicionado pelos poderes políticos então dominantes. De caráter fraco, corrupto e nepotista, a primeira parte do seu pontificado foi dominada pelo Cardeal Giuliano della Rovere, mas pouco a pouco permitiu a Lorenzo de Médici conduzir sua política na última parte do seu Pontificado. Defrontou-se com o rei de Nápoles, Fernando de Aragão, dando o seu apoio à chamada Conjura dos barões (1485), promovendo a insurreição de várias cidades do sul da Itália e entrando em contato com o rei da França, Carlos VIII, para convidá-lo para uma expedição contra Nápoles. Daí originou-se uma guerra (1489-1491), que terminou, por um lado, por causa das dificuldades do Papa em controlar a turbulenta situação interna de seus Estados e, por outro, pela intervenção em seu favor de Milão e sobretudo de Florença. Isso consolidou as relações do Papa com Lourenço de Médici, que casou sua filha Madalena com Franceschetto Cybo (1488), obtendo a nomeação para Cardeal do filho João (1475-1521), então com treze anos e futuro Papa Leão X, estipulando que ele não deveria assumir as vestes e obrigações cardinalícias até ter dezoito anos. Seu prestígio declinou mais ainda ao reconhecer a sua paternidade de Franceschetto, que vivia uma vida dissoluta, a quem muito favoreceu bem como ao sobrinho Lorenzo Cybo. Numa atitude extremamente desonesta, aceitou do sultão Bayazid II grandes somas de dinheiro para deter em Roma o Príncipe otomano Gem, irmão e rival do sultão. Para arrecadar fundos aumentou o número de cargos negociáveis e perdeu o controle da corrupção entre seus ministros, inclusive com a proliferação da venda de bulas falsificadas e teve que condenar à morte os falsificadores descobertos, porém o dano já era irreparável. Nesse ambiente de corrupção ética amadurecem as condições culturais para a reação protestante à Igreja Romana. De importância política para a Igreja em seu Pontificado apenas a queda de Granada pelos exércitos de Fernando e Isabel, a pacificação entre os estados católicos e a condenação do comércio de escravos, além de ajudar Cristóvão Colombo no descobrimento da América. Foi protetor de artistas, literatos, humanistas, o que não o impediu de condenar as teorias de Pico della Mirandola. Seu sepulcro em São Pedro foi obra de Pollaiolo. No seu leito de morte reconheceu sua incapacidade e pediu aos Cardeais perdão por ter feito tão pouco e suplicou a eles que elegessem um sucessor melhor.

 

214 . 1 - Aparição de Nossa Senhora da Guarda - Itália

               Era o dia 29 de agosto de 1487. E Benedetto Pareto foi, como de costume, trabalhar desde cedo no monte Figogna, perto da cidade italiana de Gênova. Este era um dos montes chamados de guarda, porque naqueles remotos tempos a praga da pirataria muçulmana era considerável; e para as pessoas terem tempo de fugir, e as defesas serem preparadas, vigias faziam a guarda no alto de pontos estratégicos. Benedetto era pastor e costumava levar suas ovelhas para pastarem nessas paragens. Sua esposa levava-lhe o almoço por volta das 10 h da manhã, e esta era normalmente a única interrupção na sua rotina. Mas nesse dia ele viu aproximar-se uma bela senhora, que se apresentou como a Mãe de Jesus. Primeiramente foi necessário que Ela o tranquilizasse, pois ele se impressionara muito ao vê-la. Em seguida a senhora pediu-lhe que construísse uma capela nesse local, bem no alto do monte. Benedetto estranhou, pois os pastores eram uma classe pobre, e ele não era exceção. Por isso objetou:

— Mas eu sou muito pobre, e para construir neste monte alto e deserto será preciso tanto dinheiro, que duvido que o consiga.

Não tenhas medo. Serás muito ajudado.

Tocado pela graça, Benedetto correu à sua casa para contar à família o que acabava de lhe acontecer. Mas as reações da família não foram as que ele talvez esperasse. Especialmente cética e sarcástica, sua esposa lhe diz: — “Até hoje todos te consideravam uma pessoa simples, mas de hoje em diante vão te considerar um tosco ou completamente louco.” E ela se empenhou tanto em que ele nada fizesse ou dissesse, que afinal ele decidiu seguir esse mau conselho. No dia seguinte, ao voltar novamente ao trabalho, decidiu recolher alguns figos. Quando subiu na árvore, o ramo no qual se apoiava quebrou-se, e ele caiu por terra. As feridas eram sérias, e poderiam até mesmo provocar-lhe a morte. Levado para casa, ficou alguns dias de cama. Nessa situação, Nossa Senhora apareceu-lhe novamente. Com bondade materna, repreendeu-o suavemente por sua atitude. Pediu-lhe novamente que construísse uma capela, e curou suas feridas. Agora Benedetto não teve mais dúvidas. Não perguntou a ninguém, nem quis saber o que os outros pensavam. Imediatamente percorreu as localidades vizinhas, contando o acontecido e pedindo ajuda para construir a capela. E de fato, o que Nossa Senhora lhe dissera aconteceu. Ele foi muito ajudado, e em pouco tempo terminou de construir a capela no alto do monte Figogna. Essa capela original era pequena, de forma retangular e com teto de madeira, e hoje se encontra incluída numa edificação posterior, que a envolve totalmente.  A notícia da aparição percorreu a região, e as pessoas começaram a fazer peregrinações ao local. Dezenas de anos depois, já em 1530, foi decidida a construção de um santuário para acolher os peregrinos, cada vez mais numerosos. A nobre família Ghersi contribuiu largamente para que o santuário fosse edificado. O prédio que hoje embeleza o local data do final do século XIX, quando além das edificações religiosas foi também erguido um alojamento para peregrinos. O Papa Bento XV, que era natural da cidade de Gênova, concedeu em 1915 à igreja a condição de Basílica. Fez também construir nos jardins do Vaticano uma capelinha dedicada a Nossa Senhora da Guarda.

 

215º - Alexandre VI - 1492 - 1503

               Nascido em Valência, na Espanha, em primeiro de janeiro de 1431, Rodrigo de Borja era filho de Isabella Borja com Jofre Lançol. Rodrigo levou uma vida despreocupada com a carreira religiosa, teve um relacionamento com a romana Vanozza dei Cattanei, com quem teve quatro filhos. Mas não foi tudo, Rodrigo ainda foi pai mais duas vezes. Foi estudante na Universidade de Bolonha, época que alterou seu nome para Borgia, e beneficiado nos bastidores da Igreja Católica pelo seu tio, irmão de sua mãe, Affonso Borja, Cardeal que se tornaria o Papa Calisto III. Seu tio o fez Cardeal também e o concedeu cargos de muita qualidade, como Bispo e vice-chanceler da Igreja. Especializou-se como grande diplomata servindo a Cúria Romana, acumulando experiência, riqueza e influência. Mas faltava-lhe o poder de fato. Então, com o falecimento do Papa Inocêncio VIII, Rodrigo comprou a maior parte dos votos dos Cardeais no conclave que o elegeria. Assim superou seus adversários e foi eleito, no dia 11 de agosto de 1492, como Papa Alexandre VI. Apesar de iniciar seu Papado com tranquilidade, tornou tudo mais complicado em função da ganância que tinha por favorecer sua família. Fez de muitos dos seus parentes Cardeais. Tinha como inimigo o Cardeal Giuliano della Rovere que o acusou de simonia e ajudou o rei francês Carlos VIII invadir a Itália para depô-lo. Todavia, o Papa negociou com o rei e pacificou a situação. Sua ganância pelo poder familiar só foi moderada quando seu filho, Duque de Gandia, foi assassinado. O Papa Alexandre VI encontrou seu corpo mutilado no Rio Tibre e ficou entristecido considerando que era uma punição de seus pecados. Isso o levou a convocar os Cardeais e acabar com o nepotismo. No entanto, as reformas não tiveram prosseguimento. O Papado de Alexandre VI é destacadamente negativo na história da Igreja Católica. Roma sofria, na época, com a criminalidade e a violência nas ruas, mas o Papa estava mais preocupado com suas comédias, seus banquetes e seus bailes, pagos com as finanças da instituição religiosa. Alexandre VI era reconhecidamente corrupto e pouco dado às virtudes cristãs. Possuía seus vários filhos, tinha muitas amantes e ainda organizava orgias no Vaticano. Alexandre VI foi patrocinador das artes e, neste sentido, deixou um legado de restaurações e decorações em Roma, permitindo ainda o florescimento de poetas e outros artistas. Seu principal legado, contudo, foram as Bulas Alexandrinas, iniciando a divisão de terras entre portugueses e espanhóis no mundo, que seria definitivamente confirmada com o Tratado de Tordesilhas, no Papado de Júlio II. Mas é certo que Alexandre VI não era preparado para o cargo que ocupava. É considerado por muitos o pior Papa da história da Igreja Católica. Após 11 anos de Papado, Alexandre VI foi acometido por uma grave doença, juntamente com seu filho César. Este conseguiu se recuperar, mas sucumbiu no dia 18 de agosto de 1503, aos 72 anos de idade. Seu sepultamento foi breve e sem muitas comemorações na igreja Santa Maria in Monserrato, na Espanha.

 

216º - Pio III - 1503

               O Papa Pio III (9 de maio de 1439 a 18 de outubro de 1503), nascido Francesco Todeschini Piccolomini, foi chefe da Igreja Católica e governante dos Estados Papais entre 22 de setembro de 1503 até sua morte, tendo um dos Pontificados mais curtos da história Papal. Nascido em Siena, eleito em 8 de outubro sucessor de Alexandre VI, e que aceitou sua eleição depois de várias pressões, por causa de sua saúde precária. Era sobrinho do Papa Pio II e foi educado sob a responsabilidade do tio. Estudou leis em Perugia, onde recebeu um doutorado em leis canônicas e imediatamente nomeado pelo tio-Papa para o Arcebispado de Siena em 1460. Depois seguiu para Ancona, onde teve o experiente Bispo de Marsico como seu conselheiro. Foi enviado por Paulo II à Germânia, onde fez grande sucesso como religioso e diplomata e voltou a Roma durante os Pontificados de Sixto IV e Alexandre VI, a quem substituiu com estremo sacrifício, para resolver uma situação quase que beligerante entre três pretendentes ao trono: Amboise, Rovere e Sforza. Adotou o nome em homenagem ao seu tio e benfeitor, o Papa Pio II. Com sessenta e quatro anos, tinha metade do corpo paralisado devido à gota, e celebrou a missa de sua coroação sentado. Foi Papa por cerca de um mês, entre setembro a outubro de 1503 e fez pouca coisa, por causa da brevidade de seu Pontificado e de seu estado de saúde.

 

217º - Julio II - 1503 - 1513

18 de abril de 1506: o Papa Júlio II lança a pedra fundamental da nova Basílica de São Pedro.

1508: Michelangelo começa a pintar o teto da Capela Sistina.

               Papa Júlio II, nascido Giuliano della Rovere O.F.M. (Savona, 5 de dezembro de 1443 - Roma, 21 de fevereiro de 1513), foi Papa de 1 de novembro de 1503 até a data da sua morte. Era frade franciscano. Natural de Albisola, na Ligúria, de caráter enérgico e grande protetor das artes, tornou-se um dos mais poderosos Papas do Renascimento e foi chamado de segundo fundador dos estados Papais. Entrou para a ordem dos franciscanos em 1468 e foi eleito Cardeal (1471), por seu tio, o Papa Sisto IV e lhe conferiu importantes cargos eclesiásticos. Extremamente ambicioso passou a desejar tiara Papal, mas em sua primeira tentativa, após a morte de seu tio (1484), viu-se forçado a aceitar Inocêncio VIII. Após a morte desse, disputou e perdeu a eleição para Rodrigo Bórgia que assumiu como Alexadre VI, como qual manteve uma relação de animosidade, inclusive colaborou com Carlos VIII da França para invadir Itália. Com a morte de Alexandre (1503), mais uma vez frustrou-se com a eleição de Pio III. Porém logo o novo Papa morreu e finalmente ele foi eleito e tomou o nome Júlio II. Como Pontífice manifestou-se firmemente contra a simonia, tráfico de coisas sagradas ou espirituais, nas nomeações Eclesiásticas. Sua ação mais notável foi a convocação do V Concílio de Latrão, que tratou de corrigir a lamentável situação que o Clero atravessava. Na política dedicou atenção à restauração do poderio dos estados Pontifícios, que graças a sua habilidade diplomática logo se converteram na maior potência da península itálica. Na sua tarefa de se tornar o senhor dos estados Papais, expulsou Caesar Borgia do país, tirou os Baglioni de Perugia, e excomungou os resistentes Bentivoglio de Bolonha e seus aliados. Formou a Liga de Cambrai com o Imperador Maximiliano e Luis XII da França para subjugar a orgulhosa república de Veneza e, depois, com uma política de alianças e com o lema Fora os “bárbaros!”, formou a Santa Liga com Fernando e sua velha inimiga Veneza, para expulsar os franceses para além dos Alpes, contendo as intenções expansionistas de Luís XII da França na península. Após consolidar seu poder temporal, voltou-se para o espiritual. Nas artes transformou Roma no maior centro artístico da Itália, a Meca dos artistas e amantes da arte. Confiou ao arquiteto Donato Bramante a reedificação da Basílica de São Pedro, encarregou Michelangelo da decoração da capela Sistina e encomendou a Rafael a decoração das salas vaticanas. Também chamou a Roma outros grandes artistas, como Luca Signorelli, Pinturicchio e Perugino. Morreu em Roma e, embora tenha mandado construir seu mausoléu na igreja de São Pedro, em Vincoli, onde foi erigida a célebre escultura Moisés de Michelangelo, seus restos repousam na Basílica de São Pedro.

 

INÍCIO DO PROTESTANTISMO

 

218º - Leão X - 1513 - 1521

31 de outubro de 1517: Martinho Lutero publica suas 95 teses, protestando contra a venda de indulgências.

3 de janeiro de 1521: Martinho Lutero é excomungado pelo Papa Leão X na bula Decet Romanum Pontificem, porque não quis se retratar.

               Leão X, nascido João de Lourenço de Médici, (Florença, 11 de dezembro de 1475 – Roma, 1 de dezembro de 1521) foi Papa de 1513 até sua morte. Ele é conhecido principalmente por ser o Papa do início da Reforma Protestante, iniciada por Martinho Lutero por suas 95 teses e por ter sido o último Papa a ter visto a Europa Ocidental totalmente católica. Ele era o segundo filho de Clarice Orsini e Lourenço de Médici, o governante mais famoso da República Florentina. Seu primo, Giulio di Giuliano de Medici, viria a suceder-lhe como Papa Clemente VII (1523-34).  No Quinto Concílio de Latrão, durante dois ou três anos de intrigas políticas e guerra incessante, não pôde realizar seus intentos. O objetivo principal do concílio era a reforma da disciplina e moral da igreja, que só poderia ser obtida adequadamente com consenso dos reinos cristãos, e nem Leão nem o concílio conseguiram obter esse acordo. Suas conquistas mais importantes foram o registro na sua décima primeira sessão (9 de dezembro de 1516), com a confirmação da concordata entre Leão X e Francisco I da França, que estava destinada a regular as relações entre a Igreja francesa e a Santa Sé. Leão fechou o concílio em 16 de março de 1517, conseguindo encerrar o cisma pisano.

Guerra de Urbino

               O ano que marcou o encerramento do Concílio de Latrão também foi marcado pela guerra de Leão contra Francisco Maria I, Duque de Urbino. Leão tinha intenção de que seu irmão Giuliano e, seu sobrinho Lorenzo, tivessem uma brilhante carreira secular. Ele havia chamado os patrícios romanos, que ele havia colocado no encargo de Florença, para criar um reino no centro da Itália, formado pelos ducados de Parma e Placência, Ferrara e Urbino. A morte de Giuliano em março de 1516, no entanto, transferiu o favoritismo do Papa para Lorenzo. A guerra durou de fevereiro a setembro 1517 e terminou com a expulsão do duque e a vitória de Lorenzo.

Planos para uma cruzada

               O sultão Selim I conseguiu diversos avanços territoriais e começava a ameaçar invadir a Europa Ocidental. Consequentemente, Leão sentiu a necessidade de paralisar o avanço do Império Otomano e elaborou planos para uma cruzada. Uma trégua deveria ser proclamada em toda a cristandade, ficando o Papa como o árbitro de disputas, o Imperador Romano-Germânico e o Rei da França a liderar o exército, e Inglaterra, Espanha e Portugal deveriam fornecer a frota; e as forças combinadas deveriam ser dirigidas contra Constantinopla. A diplomacia Papal para manter a paz falhou, e por conseguinte os planos para uma cruzada, e grande parte do dinheiro arrecadado foi gasto noutros fins. Em 1519, o Reino da Hungria concluiu uma trégua de três anos com Selim I, mas o sultão seguinte, Solimão, o Magnífico, recomeçou a guerra em junho de 1521 e a 28 de agosto capturou a cidadela de Belgrado.

               O Papa demonstrou-se muito assustado, e enviou cerca de 30 000 ducados para ajudar os cristãos húngaros. Em resposta a divergências teológicas e preocupações sobre má conduta de alguns funcionários da igreja, em 1517 Martinho Lutero postou suas 95 teses na porta da igreja em Wittenberg. Leão não compreendeu totalmente a importância do movimento, e em fevereiro de 1518 dirigiu-se ao vigário-geral dos agostinianos para controlar os seus monges. Em 30 de maio, Lutero enviou uma explicação de suas teses ao Papa, em 7 de agosto, ele foi intimado a comparecer em Roma. Um acordo foi efetuado, no entanto, segundo o qual a petição foi cancelada, e Lutero foi para Augsburgo em outubro de 1518 para explicar-se ao legado Papal, Cardeal Caetano, mas nem os argumentos do Cardeal, nem a bula papal de 9 de novembro fez Lutero retrair-se. Um ano de negociações infrutíferas se seguiram, durante os quais a controvérsia espalhou-se por todos os estados alemães do Sacro Império Romano-Germânico. A bula Papal adicional Exsurge Domine de 15 de junho de 1520, condenou quarenta e uma proposições extraídas dos ensinos de Lutero, e foi levado para a Alemanha por Eck, na sua qualidade de Núncio apostólico. Leão formalmente excomungou Lutero pela bula de 3 de janeiro de 1521. Foi também sob o Pontificado de Leão que o movimento protestante foi criado na Escandinávia. O Papa tinha em 1516 enviado o núncio Papal Arcimboldi para a Dinamarca. O rei Cristiano II, que desejava consolidar seu poder, expulsou Arcimboldi em 1520 e convocou teólogos luteranos para Copenhague. Cristiano aprovou um plano pelo qual uma igreja estatal devia ser estabelecida na Dinamarca, todos os apelos para a Santa Sé deviam ser abolidos, e o rei devia possuir a jurisdição final em causas eclesiásticas. Leão enviou um novo Núncio para Copenhague (1521), Francesco Minorite de Potentia, que resolveu parcialmente o problema. Leão apoiou o rei Luís XII da França e ratificou uma aliança com Veneza, fazendo um esforço para recuperar o Ducado de Milão, após tentativas infrutíferas para manter a paz, juntou-se à Liga dos Mechlin em 5 de abril de 1513 com o imperador Maximiliano I, Fernando II de Aragão e Henrique VIII de Inglaterra. Os franceses e os venezianos tiveram sucesso primeiramente, mas foram derrotados em junho, na Batalha de Novara. Os venezianos continuaram a luta até outubro. Em 9 de dezembro, foi ratificada a paz com Luís XII. Uma nova crise ocorreu entre o Papa e o novo rei da França, Francisco I, que desejava recuperar Milão e o Reino de Nápoles. Leão então formou uma nova liga com o Imperador e com o rei da Espanha, e obteve apoio inglês. Francisco invadiu a península Itálica em agosto e em 14 de setembro e ganhou a Batalha de Marignano. Em outubro, Leão retirou as suas tropas de Parma e Placência, concentrando-as na defesa de Roma e Florença. A morte do Imperador Maximiliano em 1519 afetou seriamente a situação. Leão vacilava em apoiar os candidatos para a sua sucessão, inicialmente ele favoreceu Francisco I. Ele finalmente aceitou Carlos I da Espanha como o sucessor inevitável, e a eleição de Carlos (como Imperador Carlos V (28 de junho de 1519) ocasionou a deserção de Leão de sua aliança francesa. Em maio de 1521, um tratado de aliança foi assinado em Roma entre ele e o Imperador. Milão e Gênova seriam tomadas da França e reanexadas ao Sacro Império Romano-Germânico, e Parma e Placência seriam anexadas aos Estados Papais após a expulsão dos franceses. A despesa de alistar dez mil suíços foi distribuída equitativamente entre o Papa e o Imperador. Carlos tomou Florença e colocou-a sob proteção da família Médici. Leão concordou em coroá-lo Imperador em Nápoles, para ajudar em uma guerra contra Veneza. Estava previsto que a Inglaterra e os suíços poderiam participar. Henrique VIII anunciou sua adesão, em agosto. Francisco I já tinha começado a guerra contra Carlos em Navarra. E, na Itália, também, os franceses fizeram o primeiro movimento hostil em 23 de junho de 1521. Leão pediu que Francisco cedesse Parma e Placência. Em novembro de 1521, as tropas Papais capturariam as províncias, assim como Milão dos franceses. Tendo ficado doente de broncopneumonia, Leão X morreu repentinamente em 1 de dezembro de 1521. Ele foi enterrado na Igreja de Santa Maria sopra Minerva.

 

219º - Adriano VI - 1522 - 1523

               Nascido no dia dois de março de 1459, em Utrecht, nos Países Baixos, Adriano Floriszoon Boeyens era um homem de origem humilde que cresceu em condições modestas de vida. Era filho do carpinteiro Florens Boeyens van Utrecht com Gertruid. Desde muito novo, Adriano estudou em Zwolle. Aos dez anos de idade, seu pai faleceu. Mas ele continuou estudando até receber uma bolsa de estudos da Duquesa de Borgonha para entrar para a Universidade de Lovaina para se dedicar à filosofia, à teologia e ao direito canônico. Em 1491, Adriano se tornou Doutor em Teologia e vice-chanceler da Universidade de Lovaina. Até então, sua vida pessoal relacionava-se com a religiosidade apenas no campo dos estudos. Reconhecido por seus conhecimentos, foi nomeado tutor do neto do Imperador Maximiliano I, o qual viria a ser o Imperador Carlos V. Somente em 1515, quando foi enviado à Espanha em missão diplomática, que o Papa Leão X nomeou Adriano como Cardeal Sacerdote da Basílica dos Santos João e Paulo. Começava assim sua atuação no mundo religioso.

               Adriano Boeyens foi ainda co-regente da Espanha, junto com o Cardeal Francisco de Cisneros, durante a menoridade de Carlos V, antes de ser nomeado inquisidor-mor de Castela e Aragão. Com o falecimento do Papa Leão X, um conclave se reuniu para eleger o novo líder da Igreja. O Cardeal Adriano nem estava presente, mas, devido a um impasse sobre o sucessor, seu nome foi sugerido e eleito quase que por unanimidade. Para sua própria surpresa, Adriano se tornou o Papa Adriano VI. O Imperador Carlos V ficou muito satisfeito com a surpreendente eleição de seu tutor, achava ele que teria benefícios por isso. Mas o Papa Adriano VI demonstrou imparcialidade desde cedo e ganhou o apoio, inclusive, dos adversários do Imperador espanhol. Eleito no dia nove de janeiro de 1522, ele só seria coroado no dia 31 de agosto daquele ano, aos 63 anos de idade. O Papa Adriano VI era um reformador que combatia os abusos da Cúria Romana e o comércio de indulgências, conquistando, por isso, muitos inimigos. Os italianos também não eram muito simpáticos ao novo Papa porque não agradavam a liderança de um estrangeiro, ao qual atribuíam todos os tipos de adjetivos pejorativos. Na verdade, Adriano VI era um fraco político e não tinha muito apreço pelas artes. Ele não tinha sensibilidade para resolver problemas entre cristãos e tampouco compreendeu a verdadeira amplitude da nascente Reforma Protestante. Uma curiosidade de seu Papado foi a conclusão da primeira viagem de circunavegação da Terra. Os marinheiros sobreviventes chegaram à Europa alegando estarem em um dia que não coincidia com a contagem dos europeus. Seria a primeira observação do tempo no globo terrestre que viria a ser solucionada pela Linha Internacional de Data. O único Papa nascido nos Países Baixos até hoje, exerceu o cargo por pouco mais de um ano. Faleceu no dia 14 de setembro de 1523 e foi o último Papa não italiano pelos próximos 456 anos.

 

220º - Clemente VII - 1523 - 1534

6 de maio de 1527: Saque de Roma.

               O Papa Clemente VII, (26 de maio de 1478 — 25 de setembro de 1534), nascido Giulio di Giuliano de Médici, foi chefe da Igreja Católica e governante dos Estados Papais de 19 de novembro de 1523 até a data da sua morte. “O mais infeliz dos Papas”, o reinado de Clemente VII foi marcado por uma rápida sucessão de lutas políticas, militares e religiosas - muitas em andamento - que tiveram consequências de longo alcance para o Cristianismo e política mundial. O saque de Roma, ocorrido em 6 de maio de 1527, foi um evento militar realizado na cidade de Roma, então parte do Estados Pontifícios pelas tropas rebeldes de Carlos V, Imperador do Sacro Império Romano-Germânico.

               Natural de Florença, cujo Pontificado foi marcado pela preocupação em manter o poderio dos Medici frente à ameaça espanhola e francesa, e crescimento do domínio do protestantismo por quase todo o norte da Europa. Sobrinho de Leão X, Arcebispo de Florença e Cardeal (1513), foi escolhido como Papa em 26 de novembro de 1523, sucedendo ao Papa Alexandre VI, com o nome de Clemente VII. Celebrou o 9º jubileu (1525) e aliou-se a Francisco I da França, na Liga de Cognac (1526), contra o Imperador Carlos V, do Sacro Império Romano-Germânico. Neste ano foi aprisionado e confinado ao Castelo de Sant’Angelo até acatar as pretensões de Carlos V: sua coroação como Imperador, o que ocorreu em Bolonha três anos mais tarde, e a celebração de um concílio para reformar a igreja e deter o avanço do luteranismo na Alemanha. Sua indecisão em convocar o concílio, favoreceu a difusão do protestantismo e impediu-o de adotar uma postura enérgica diante do cisma anglicano, provocado pela recusa Papal a anular o casamento de Henrique VIII. Excomungou Henrique VIII da Inglaterra, o qual renegou a fé católica e passou a perseguir a Igreja, condenou Santo Thomas Morus à morte e fundou o Anglicanismo. A ruptura da Inglaterra com Roma (1533-1534), também abriu caminho para o protestantismo naquele país. Tardiamente tentou, sem sucesso, impedir as lutas entre católicos e luteranos e a Igreja perdeu a Alemanha, a Escandinávia e a Suíça. Saques e pestes reduziram Roma a 30.000 habitantes. Morreu em 25 de setembro de 1534, em Roma, e foi sucedido por Paulo III. Enterrado na Basílica de São Pedro, depois seus restos foram trasladados para a igreja de Santa Maria Minerva.

 

220 . 1 - Santa Ângela de Mérici

               Ângela Mérici nasceu em 1470, na cidade de Desenzano, no norte da Itália. O período histórico era o do Renascimento e da Reforma da Igreja, provocada pela doutrina luterana. Os pais eram camponeses pobres e muito religiosos. E desde pequena, ela teve seu coração inclinado pela vida religiosa, preferindo a leitura da vida dos Santos. De fato, sua provação começou muito cedo, na infância, quando ficou órfã de pai. Logo em seguida perdeu a mãe e a irmãzinha, com quem se identificava muito. Assim, ela foi viver na casa de um tio, que a havia adotado, mas que também veio a falecer. Voltou à terra natal. Depois de passar dias e dias chorando, com apenas treze anos, pediu para ingressar num convento, entrando para a Ordem Terceira de São Francisco de Assis. Ângela tinha apenas o curso primário e chegou a ser "conselheira" de Governadores, Bispos, doutores e Sacerdotes. Os seus sofrimentos, sua entrega à Deus e a vida meditativa de penitência lhe trouxeram, através do Espírito Santo, o dom do conselho, que consiste em saber ponderar as soluções adequadas para todas as situação da vida. Ela também, percebeu que naquele momento histórico, as meninas não tinham quem as educassem e livrassem dos perigos morais, e que as novas teorias levavam as pessoas a querer organizar a vida como se Deus não existisse. Para lutar contra o paganismo, era preciso restaurar a célula familiar. Inspirada pela Virgem Maria, fundou a Comunidade das irmãs Ursulinas, em homenagem a Santa Úrsula, a mártir do século IV, que dirigia o grupo das moças virgens, que morreram por defender sua religião e sua castidade. Ângela acabou se tornando a portadora de uma mensagem inovadora para sua época. Organizou um grupo de vinte e oito moças, para ensinar catecismo em cada bairro e vila da região. As "Ursulinas" tinham como finalidade a formação das futuras mães, segundo os dogmas cristãos. Ângela teve uma concepção bastante revolucionária para sua época, quando se dizia que uma sólida educação cristã para as moças só seria possível dentro das grades de uma clausura. Decidiu que era a hora de fazer a comunidade se tornar uma Congregação religiosa. Consta, pela tradição, que antes de ir à Roma para dar início a esse projeto, quis fazer uma peregrinação em Jerusalém. Assim que chegou, ficou cega. Visitou os Lugares Sagrados e os viu com o espírito, não com os olhos. Só recobrou a visão, na volta, quando parou numa pequena cidade onde existia um crucifixo milagroso, foi até ele, rezou e se curou. Anos depois, foi recebida pelo Papa Clemente VII, durante o Jubileu de 1525, que deu início ao processo de fundação da Congregação, que ela desejava. Ângela a implantou na Bréscia, dez anos depois, quando saiu a aprovação definitiva. E ali, a fundadora morreu aos setenta e cinco anos, em 27 de janeiro de 1540 e foi canonizada, em 1807. Santa Ângela de Mérici, atualmente, recebe as homenagens no dia de sua morte.

 

220 . 2 - Aparição de Nossa Senhora em Guadalupe – México

               Os acontecimentos das quatro aparições de Nossa Senhora a Juan Diego foram registrados por um índio erudito, chamado Antônio Valeriano. O documento foi escrito em nahuatl, linguagem asteca, com precisão de detalhes. Juan Diego era um índio batizado, que continuava recebendo instruções sobre a fé católica. Foi no caminho de sua casa até a cidade, passando pelo monte Tepeyac, que sua história e a de todo o povo mexicano começou a mudar.

A primeira aparição

               Era sábado de madrugada, pouco antes do amanhecer. Juan Diego se encaminhava para a cidade e estava na altura do monte Tepeyac quando ouviu cantos acima da montanha, como se fossem cantos de vários lindos pássaros, e vozes. Admirado com isso, parou para ouvir melhor e então de repente houve um silêncio. Então, ouviu uma voz por cima da montanha dizendo: “Juanito, Juan Dieguito.”

               Subindo a montanha, viu uma Senhora que estava parada e disse-lhe para se aproximar. Ela tinha um vestido radiante como o sol, e tudo ao seu redor cintilava como o arco-íris. Até os matinhos entre as pedras brilhavam como ouro. Ele se inclinou diante da Senhora e Ela lhe disse: “Juanito, o mais humilde dos meus filhos, onde estás indo?”

               Ele respondeu: “Minha Senhora e Menina, eu tenho que chegar na Sua igreja no México, Tlatilolco, para seguir as coisas divinas, que nos dão e ensinam nossos sacerdotes, delegados de Nosso Senhor”. Por suas palavras, ele certamente já havia compreendido quem era a Senhora! Ela então lhe disse:

“Sabe e entende, tu és o mais humilde dos meus filhos. Eu sou a Sempre Virgem Maria, Mãe do Deus Vivo por quem nós vivemos, do Criador de todas as coisas, Senhor do céu e da terra. Eu desejo que um templo seja construído aqui, rapidamente; então, Eu poderei mostrar todo o meu amor, compaixão, socorro e proteção, porque Eu sou vossa piedosa Mãe e de todos os habitantes desta terra e de todos os outros que me amam, invocam e confiam em mim. Ouço todos os vossos lamentos e remédio todas as vossas misérias, aflições e dores. E para realizar o que a minha clemência pretende, vá ao palácio do Bispo do México e lhe diga que Eu manifesto o meu grande desejo, que aqui neste lugar seja construído um templo para mim. Tu dirás exatamente tudo que viste, admiraste e ouviste. Tem a certeza que ficarei muito agradecida e te recompensarei. Porque eu te farei muito feliz e digno da minha recompensa, por causa do esforço e fadiga que terás para cumprir o que eu te ordeno e confio. Observa, tu ouviste minha ordem, meu humilde filho, vai e coloca todo teu esforço.”

               Neste ponto ele inclinou-se diante Dela e disse: “Minha Senhora, Eu estou indo cumprir Tua ordem, agora me despeço de Ti, Teu humilde servo”.

               Descendo a montanha, foi direto pela estrada, até a Cidade do México. Sem perder tempo, foi ao palácio do Bispo, que chegara recentemente e se chamava Frei Juan de Zumarraga, um religioso franciscano. Pediu para ver o Bispo e esperou bastante tempo. Quando foi admitido, ajoelhou-se e disse ao Bispo a mensagem da Senhora do Céu, bem como tudo que havia visto, escutado e admirado. Porém, após ouvir toda a conversa, o Bispo incrédulo disse-lhe: “Volte depois, meu filho, e eu lhe ouvirei com muito prazer. Eu examinarei tudo e pensarei no motivo pelo qual você veio”.

A segunda aparição

               Triste por não ter conseguido que a mensagem da Senhora fosse atendida, Juan Diego voltou à montanha no mesmo dia. Nossa Senhora estava no mesmo lugar e diante dEla Juan Diego se prostrou novamente, dizendo: “Senhora, a Caçulinha de minhas filhas, minha Menina, eu fui onde me mandaste para levar tua mensagem, como me havias instruído. Ele recebeu-me benevolentemente e ouviu-me atentamente, mas quando respondeu, pareceu-me não acreditar. Ele disse: «Volte depois, meu filho e eu o ouvirei com muito prazer. Examinarei o desejo que você trouxe, da parte da Senhora». Entendo pelo seu modo de falar, que não acredita em mim e que seja invenção da minha parte, o Teu desejo de construção de um templo neste lugar para Ti. E que isso não é Tua ordem. Por isso eu, encarecidamente Te peço, Senhora e minha Criança, que instrua a alguém mais importante, bem conhecido, respeitado e estimado para que acreditem. Porque eu não sou ninguém, sou um barbantinho, uma escadinha de mão, o fim da cauda, uma folha. E Tu, minha Criança, a minha filhinha caçula, minha Senhora, envias-me a um lugar onde eu nunca estive! Por favor, perdoa o grande pesar e aborrecimento causado, minha Senhora e meu Tudo.”

               A Virgem Santíssima respondeu: “Escuta, meu filho caçula, deves entender que eu tenho vários servos e mensageiros, aos quais eu posso encarregar de levar a mensagem e executarem o meu desejo, mas eu quero que tu mesmo o faças. Eu fervorosamente imploro, meu caçula, e com severidade eu ordeno que voltes novamente amanhã ao Bispo. Tu vais em meu nome e faze saber meu desejo: que ele inicie a construção do templo como Eu pedi. E novamente dize que eu, pessoalmente, a Sempre Virgem Maria, Mãe de Deus Vivo, te ordenei.”

               Juan Diego respondeu: “Senhora, minha Criança, não deixes que eu Te cause aflição. Alegremente e de bom grado eu irei cumprir Tua ordem. De nenhuma maneira irei falhar e não será penoso o caminho. Irei realizar Teu desejo, mas acho que não serei ouvido, ou se for, não acreditarão. Amanhã ao entardecer, trarei o resultado da Tua mensagem com a resposta do Bispo. Descansa neste meio tempo”.

               Ele, então, foi para sua casa. No dia seguinte, domingo, antes do amanhecer, ele deixou sua casa e foi direto ao Tlatilolco, para ser instruído em coisas divinas, e em seguida estar presente a tempo para ver o Bispo. Por volta das 10 horas, estando em cima da hora, após participar da Missa e o povo ter dispersado, ele apressadamente se foi. Pontualmente, Juan Diego foi ao palácio do Bispo. Mal chegou, ansioso já estava para tentar vê-lo. E novamente com muita dificuldade, o Bispo estava à sua frente. Ajoelhou-se diante de seus pés, entristecidamente e chorando, expôs a ordem de Nossa Senhora do Céu, e que, por Deus, acreditasse em sua mensagem, de que o desejo da Imaculada de erguer um templo onde Ela queria, fosse realizado. O Bispo, para assegurar-se, fez várias perguntas, onde ele A tinha visto e como Ela era. E ele descreveu perfeitamente em detalhes ao Bispo. Apesar da precisa descrição de Sua imagem, e tudo que ele tinha visto e admirado, que em tudo refletia ser a Sempre Virgem Santíssima Mãe do Salvador, Nosso Senhor Jesus Cristo, o Bispo não deu crédito e disse que somente pela sua súplica, não atenderia o seu pedido; que aliás, um sinal era necessário. Só então acreditaria, ser ele enviado pela verdadeira Senhora do Céu. Após ouvir o Bispo, disse Juan Diego: “Meu senhor, escuta! Qual deve ser o sinal que o senhor quer? Para eu pedir a Senhora do Céu que me enviou aqui”.

               O Bispo, vendo que ele ratificava tudo sem duvidar, nem retratar nada, o despediu. Imediatamente, ordenou algumas pessoas de sua casa, e de inteira confiança, para segui-lo e olhar onde ele ia, a quem ele via e falava. E assim foi feito. Juan Diego veio direto pela estrada. Aqueles que o seguiam, após cruzarem o barranco perto da ponte do Tepeyacac, perderam-no de vista. Eles procuraram por todos os lugares, mas não puderam mais vê-lo. Retornaram com muita raiva, não somente porque estavam aborrecidos, mas também por ficarem impedidos do objetivo. E o que eles informaram ao Bispo, o influenciou a não acreditar em Juan Diego. Eles lhe disseram que foi enganado. Juan Diego apenas forjou o que veio dizer, e a sua mensagem e pedido não passava simplesmente de um sonho. Eles então arquitetaram um plano, que se ele de alguma forma voltasse, eles o prenderiam e o puniriam com severidade e de tal forma que ele jamais mentiria ou enganaria novamente.

A terceira aparição

               Entretanto, Juan Diego estava com a Virgem Santíssima, contando-lhe a resposta que trazia do senhor Bispo. A Senhora, após ouvir, disse-lhe: “Muito bem, meu querido filhinho, retornarás aqui amanhã, então levarás ao Bispo o sinal por ele pedido. Com isso ele irá acreditar em ti, e a este respeito, ele não mais duvidará nem desconfiará de ti, e sabe, meu querido filhinho, eu te recompensarei pelo teu cuidado, esforço e fadiga gastos em meu favor. Vai agora. Espero por ti aqui amanhã.”

               No outro dia, segunda-feira, quando Juan Diego teria que levar um sinal pelo qual então acreditariam, ele não pôde ir porque, ao chegar em casa, seu tio chamado Juan Bernardino, estava doente e em estado grave. Primeiro foi chamar um médico que o auxiliou, mas era tarde, e o estado de seu tio era muito grave. Por toda a noite seu tio pediu que, ao amanhecer, ele fosse ao Tlatilolco e chamasse um sacerdote, para prepará-lo e ouvi-lo em confissão, porque certamente sua hora havia chegado, pois não mais levantaria ou melhoraria de sua enfermidade.

A quarta aparição

               Na terça-feira, antes do amanhecer, Juan Diego ia de sua casa ao Tlatilolco para chamar o sacerdote, e ao aproximar-se da estrada que liga a ladeira ao topo do Tepeyacac, em direção ao oeste onde estava acostumado a passar, considerou que precisava se apressar em chamar o sacerdote, evitando ser atrasado pela Senhora, que certamente o pararia no alto da montanha. Então, contornou a montanha, deu várias voltas, mas, ele A viu descer do topo da montanha e estava olhando na direção onde eles anteriormente se encontraram. Ela se aproximou dele pelo outro lado da montanha e disse:“O que há, meu caçula? Onde você está indo?”

               Ele se inclinou diante dela e a saudou dizendo: “Minha Criança, a mais meiga de minhas filhas, senhora, Deus permita que estejas contente. Como estás nesta manhã? Estás bem de saúde? Senhora e minha Criança. Vou te causar um pesar. Sabe, minha Criança, um de Teus servos está muito doente, meu tio. Ele contraiu uma peste, e está perto de morrer. Eu estou indo depressa à Tua casa no México para chamar um de Teus sacerdotes, querido pelo Nosso Senhor, para ouvir sua confissão e absolvê-lo, porque desde que nós nascemos, aguardamos o trabalho de nossa morte. De forma que, se eu for, retornarei aqui brevemente, então levarei Tua mensagem. Senhora e minha Criança, perdoa-me, sê paciente comigo. Eu não Te enganarei, minha Caçula. Amanhã eu voltarei o mais rápido possível.” Depois de ouvir toda a conversa de Juan Diego, a Santíssima Virgem respondeu: “Escuta-me e entende bem, meu caçula, nada deve te amedrontar ou te afligir. Não deixes teu coração perturbado. Não temas esta ou qualquer outra enfermidade, ou angústia. Eu não estou aqui? Quem é tua Mãe? Não estás debaixo de minha proteção? Eu não sou tua saúde? Não estás feliz com o meu abraço? O que mais podes querer? Não temas nem te perturbes com qualquer outra coisa. Não te aflijas por esta enfermidade de teu tio, por causa disso, ele não morrerá agora. Tem a certeza de que ele já está curado.”

               Quando Juan Diego ouviu estas palavras da Senhora do Céu, ele ficou enormemente consolado. Estava feliz. Prometeu que, quanto antes, estaria na presença do Bispo, para levar o sinal ou prova, a fim de que ele cresse. A Senhora do Céu ordenou que subisse ao topo da montanha, onde eles anteriormente haviam se encontrado. Ela lhe disse: “Sobe, meu caçula, ao topo da montanha; lá onde me viste e te dei a ordem, encontrarás diferentes flores. Corta-as, junta-as, então volta aqui e traze-as em minha presença.”

               Imediatamente Juan Diego subiu a montanha, e quando atingiu o topo, ele espantou-se pela variedade de raras rosas de Castilha que haviam brotado bem antes do tempo, porque, estando fora da época, deveriam estar congeladas. Elas estavam muito fragrantes e cobertas com o orvalho da noite, assemelhando-se a pérolas preciosas. Imediatamente ele começou a cortá-las. Recolheu todas e colocou-as em seu manto. O topo da montanha era um lugar impossível de nascer qualquer tipo de flor, porque havia vários penhascos, cardos, espinhos e ervas daninhas. Ocasionalmente as ervas cresceriam, mas era mês de dezembro, na qual toda vegetação é destruída pelo frio. Ele voltou imediatamente e entregou as diferentes rosas que havia cortado para a Senhora do Céu, que ao vê-las, tocou-as com suas mãos e de novo colocou-as de volta no manto, dizendo: “Meu caçula, esta variedade de rosas é a prova e sinal que levarás ao Bispo. Tu irás dizer, em meu nome, que nelas ele verá o meu desejo e que deverá realizá-lo. Tu és meu embaixador, muito digno de confiança. Rigorosamente eu ordeno que apenas diante da presença do Bispo desenroles o manto e descubras o que estás carregando. Tu contarás tudo direito: que eu te ordenei a subir ao topo da montanha, e cortar estas flores, e tudo que viste e admiraste; então, tu podes induzir ao Bispo dar a sua ajuda, com o objetivo de que um templo seja construído e erguido como eu tenho pedido.”

               Depois que a Senhora do Céu deu seu aviso, ele se pôs a caminho pela estrada que dava diretamente ao México. Estava feliz e seguro de seu sucesso, carregando com grande carinho e cuidado o que continha dentro de seu manto, de tal forma que nada poderia escapar de suas mãos, a não ser a maravilhosa fragrância das variadas e belas flores. No palácio do Bispo, os serventes tentaram ver o que Juan Diego carregava.

               Com cuidado, ele descobriu o manto que escondia e eles puderam ver algumas flores; ao verem que eram rosas fora de época, ficaram impressionados, ainda mais por verem-nas frescas, tão fragrantes e belas. Estenderam a mão para as rosas, mas, ao tentar pegá-las, elas pareciam pintadas ou estampadas ou costuradas no tecido. Ao relatarem esse fato ao Bispo, ele compreendeu que Juan Diego carregava a prova desejada. Ao ser admitido na presença do Bispo, Juan Diego contou o que havia visto e feito, renovando a mensagem de Nossa Senhora que pedia a construção de uma igreja no monte das aparições. Então, desdobrou seu manto, onde estavam as rosas; quando elas caíram ao chão, apareceu subitamente o desenho da preciosa imagem de Nossa Senhora, como ela é vista até hoje no templo de Tepeyac, chamada Nossa Senhora de Guadalupe. O Santuário de Guadalupe em honra a Nossa Senhora foi erguido no topo do monte Tepeyac, como ela havia pedido. A Imagem de Nossa Senhora na tilma de Juan Diego é miraculosa, sobrenatural, não feita por mãos humanas. Uma tela que adquiriu incorruptibilidade, uma obra de Deus. Para a surpresa de todos, depois de inúmeros exames e intensas pesquisas, uma comissão de oculistas, químicos, optometristas, confirmaram que nos olhos de Nossa Senhora na imagem refletem a fisionomia de Juan Diego e de várias pessoas que estavam com ele na entrega da imagem ao Bispo, como uma fotografia daquele momento. Na íris dos olhos da Virgem num espaço de apenas 2 milímetros, aumentado 2.500 vezes, vê-se nitidamente 13 pessoas presentes. No outro olho da Virgem vê-se a mesma imagem.

 

CONVOCAÇÃO DO CONCÍLIO DE TRENTO – CONTRA REFORMA

 

221º - Paulo III - 1534 - 1549   

1540: O Papa Paulo III confirmou a ordem da Companhia de Jesus.

27 de julho de 1549: São Francisco Xavier, SJ, chega ao Japão e desembarca em Kagoshima, em 15 de agosto.

1551: A primeira diocese do Brasil é criada com um Bispo português, na Bahia.

               Papa Paulo III (Canino, 29 de fevereiro de 1468 - Roma, 10 de novembro de 1549), nascido Alessandro Farnese, foi chefe da Igreja Católica e governante dos Estados Papais de 13 de outubro de 1534 até a sua morte em 1549. Ele chegou ao Trono Papal em uma época após o saque de Roma em 1527 e repleto de incertezas na Igreja Católica após a Reforma Protestante. Seu Pontificado iniciou a Contra-Reforma com o Concílio de Trento em 1545, bem como as Guerras da religião com as campanhas militares do Imperador Carlos V contra os protestantes na Alemanha. Ele reconheceu novas ordens e sociedades religiosas católicas, como os jesuítas, os Barnabitas e a Congregação do Oratório. Seus esforços foram distraídos pelo nepotismo para promover o poder e a sorte de sua família, incluindo seu filho ilegítimo Pier Luigi Farnese. Paulo III foi um Patrono significativo de artistas, incluindo Michelangelo, e é para ele que Nicolau Copérnico dedicou seu tratado heliocêntrico.

               O quarto Papa durante o período da Reforma Protestante, Paulo III tornou-se o primeiro a tomar medidas ativas de reforma em resposta ao protestantismo. Logo após sua elevação, em 2 de junho de 1536, Paulo III convocou um conselho geral para se reunir em Mântua, em maio seguinte; mas a oposição dos Príncipes protestantes e a recusa do duque de Mântua em assumir a responsabilidade de manter a ordem frustraram o projeto. Paulo III adiou primeiro por um ano e depois descartou todo o projeto. Em 1536, Paulo III convidou um comitê de nove prelados eminentes, distinguidos tanto pela erudição quanto pela piedade, para relatar sobre a reforma e reconstrução da Igreja. Em 1537, eles produziram o célebre Consilium de emendenda ecclesia, expondo abusos graves na Cúria Romana, na administração da igreja e no culto público; e propondo propostas ousadas destinadas a abolir tais abusos. O relatório foi amplamente impresso, e o Papa ficou sério quando assumiu o problema da reforma. Ele percebeu claramente que o imperador Carlos V não descansaria até que os problemas fossem resolvidos com seriedade. Mas para os protestantes o relatório parecia longe de ser completo; Martinho Lutero teve sua edição (1538) precedida por uma vinheta mostrando os Cardeais limpando o estábulo augiano da igreja romana com rabo de raposa em vez de vassouras. No final, nenhum resultado foi seguido das recomendações do comitê. Como consequência da extensa campanha contra a "idolatria" na Inglaterra, culminando com o desmantelamento do Santuário de St. Thomas Becket em Canterbury, o Papa excomungou Henrique VIII em 17 de dezembro de 1538 e emitiu um interdito.

               Nessa época, surgiram complicações familiares. Para adquirir seu neto Ottavio Farnese com o ducado de Camerino, Paul o arrancou à força do Duque de Urbino (1540). Ele também sofreu uma guerra virtual com seus próprios súditos e vassalos pela imposição de impostos onerosos. Perugia, renunciando à sua obediência, foi sitiada pelo filho de Paul, Pier Luigi, e perdeu sua liberdade inteiramente em sua rendição. Os burgueses de Colonna foram devidamente vencidos e Ascanio foi banido (1541). Depois disso, o tempo parecia maduro para aniquilar a heresia. Em 1540, a Igreja reconheceu oficialmente a nova sociedade formada por Inácio de Loyola, que se tornou a Companhia de Jesus. Em 1542, uma segunda etapa do processo de Contra-Reforma foi marcada pela instituição, ou reorganização, da Congregação do Santo Ofício da Inquisição.

               Por outro lado, o Imperador insistia em que Roma enviasse seus planos para uma recuperação pacífica dos protestantes alemães. Consequentemente, o Papa despachou Giovanni Morone (ainda não Cardeal) como núncio para Hagenau e Worms em 1540; enquanto em 1541, o Cardeal Gasparo Contarini participou dos procedimentos de ajuste na Conferência de Regensburg. Foi Contarini quem propôs a famosa fórmula "somente pela fé somos justificados", que não substituiu, no entanto, a doutrina católica romana das boas obras. Em Roma, essa definição foi rejeitada no consistório de 27 de maio, e Lutero declarou que só poderia aceitá-lo, desde que os opositores admitissem que essa fórmula constituísse uma mudança de doutrina. No entanto, mesmo depois que a Conferência de Regensburg se mostrou infrutífera, o Imperador insistiu em um conselho ainda maior, com o resultado final sendo o Conselho de Trento, que foi finalmente convocado em 15 de março de 1545, sob a Bula Laetare Hierusalem. Enquanto isso, após a paz de Crespy (setembro de 1544), o Imperador Carlos V (1519-1556) começou a reprimir o protestantismo à força. Na pendência da Dieta de Worms, em 1545, o Imperador concluiu um pacto de ação conjunta com o Cardeal Alessandro Farnese, legado Papal, com Paulo III concordando em ajudar na guerra projetada contra os Príncipes e propriedades protestantes alemãs. Essa imediata aquiescência provavelmente se baseou em motivos pessoais: como o Imperador estava preocupado na Alemanha, o momento parecia oportuno para o Papa adquirir para seu filho Pier Luigi os ducados de Parma e Placência. Embora estes pertencessem aos estados Papais Paulo III planejava superar a relutância dos Cardeais trocando esses ducados Papais pelos domínios menos valiosos de Camerino e Nepi. O Imperador concordou, acolhendo a perspectiva de 12 mil soldados de infantaria, 500 de cavalaria e fundos consideráveis ​​do Papa.

               Na Alemanha, a campanha começou no oeste, onde o Arcebispo de Colônia Hermann de Wied se converteu ao protestantismo em 1542. O Imperador Carlos começou uma guerra aberta contra os Príncipes, propriedades e cidades protestantes aliadas na Liga Schmalkaldic. Hermann foi excomungado em 16 de abril de 1546 e foi obrigado pelo Imperador a abdicar em fevereiro de 1547. No final de 1546, Carlos V havia subjugado o sul da Alemanha. A vitória na Batalha de Mühlberg, em 24 de abril de 1547, estabeleceu sua soberania imperial em toda a Alemanha, e os dois líderes da Liga foram capturados. O Imperador declarou o Interino de Augsburgo com um compromisso magnânimo com os cismáticos derrotados. Embora o Imperador tenha subjugado os exércitos protestantes alemães, ele falhou em apoiar as ambições territoriais do Papa por seu filho Pier Luigi, e as relações entre eles esfriaram. A situação chegou a uma ruptura total quando o vice-regente Imperial Ferrante Gonzaga expulsou à força Pier Luigi. Em 1547, o filho do Papa foi assassinado em Placência, e Paulo III colocou parte da culpa no Imperador. No mesmo ano, porém, e após a morte de Francisco I da França (1515-1547) privou o Papa de um possível aliado, o estresse das circunstâncias o levou a aceitar as medidas Eclesiásticas no ínterim do Imperador.

Com referência à herança do Príncipe assassinado, cuja restituição exigia Paulo III ostensivamente em nome da Igreja, o desígnio do Papa foi frustrado pelo Imperador, que se recusou a render Piacenza, e pelo herdeiro de Pier Luigi em Parma, Ottavio Farnese. Em consequência de uma briga violenta neste relato com o Cardeal Farnese, Paulo III, com oitenta e um anos, ficou tão estressado que sucumbiu, morrendo em 10 de novembro de 1549. Paulo III mostrou-se incapaz de suprimir a Reforma Protestante, embora tenha sido durante seu Pontificado que a fundação foi lançada para a Contra-Reforma. Decretou a segunda e última excomunhão de Henrique VIII da Inglaterra em dezembro de 1538. Seus esforços em Parma levaram à Guerra de Parma dois anos após sua morte.  Concedeu a Inquisição em Portugal a D. João III. Lançou as bases da Contra-Reforma.

 

222º - Julio III - 1550 - 1555

               O Papa Júlio III (10 de setembro de 1487 - 23 de março de 1555), nascido Giovanni Maria Ciocchi del Monte, foi chefe da Igreja Católica e governante dos Estados Papais de 7 de fevereiro de 1550 à sua morte em 1555. Término do Concilio de Trento. A "contra reforma" já deflagrada por Leão X toma impulso a partir daqui. Deu continuidade ao Concílio de Trento e se opôs radicalmente às teses luteranas. Nomeado Bispo da Palestrina em 1543, representou o Papa Paulo III no Concílio de Trento e tornou-se seu sucessor ao fim da primeira parte do conclave que durou três meses. Ao se consagrar como Papa, reabriu o concílio (1551-1552) e confirmou o estatuto dos jesuítas, aos quais confiou (1552) o Colégio Romano e o Colégio Alemão, destinado a acolher os seminaristas dos países alemães atingidos pela heresia protestante. Ainda durante o concílio entrou em luta contra Otávio Farnese, aliado do rei da França, Henrique II, para reaver Parma (1551). Porém, com o acordo entre França e os protestantes da Alemanha e a aliança entre Henrique II e os turcos (1552), resolveu firmar a paz com Farnese, cedendo-lhe Parma, e encerrou o concílio. Preocupado com a consolidação do anglicanismo, cisma surgido no Pontificado de Clemente VII (1523-1534), procurou influenciar Maria Tudor (1555) em favor do catolicismo. Celebrou o 10º Jubileu (1550) e, embora reconhecido como nepotista, também foi um grande mecenas: fez construir a famosa Villa Giulia, de 1551 a 1553, obra de Ammannati e de Vignola.

 

223º - Marcelo II - 1555

               Papa da Igreja Cristã Romana nascido em Montepulciano, Siena, Marcello Cervini, eleito Papa em 10 de abril de 1555 como substituto de Júlio III, foi o último que conservou o nome de batismo. Famoso por sua cultura humanista, tornou-se preceptor de Alexandre Farnese, sobrinho do Papa Paulo III, e dessa forma conseguiu exercer notável influência nos assuntos Eclesiásticos. Ordenado Sacerdote, foi eleito Bispo de Nicastro e Cardeal (1539). Foi nomeado (1543) para exercer a função de legado junto ao Imperador Carlos V e foi primeiro legado (1545) no Concílio de Trento. Durante o Pontificado de Júlio III, foi nomeado bibliotecário apostólico e reorganizou totalmente a Biblioteca Vaticana, promovendo também pesquisas históricas e arqueológicas. Sempre mostrou-se preocupado com os russos e mongóis. Capaz e experiente, todos aprovaram sua escolha, mas infelizmente, morreu em 1º de maio do mesmo ano, depois de apenas 22 dias de Pontificado. Mesmo assim foi considerado uma das mais nobres figuras da história do Papado e deixou na cúria um sinal de justiça e austeridade. Morreu repentinamente em Roma, e foi sucedido por Paulo IV. Foi em seu Pontificado que Pierluigi di Palestrina compôs a famosa Missa do Papa Marcelo. Missa Papae Marcelli ou Missa do Papa Marcelo é uma missa composta por Giovanni Pierluigi da Palestrina em homenagem ao Papa Marcelo II. É a missa mais conhecida e mais executada de Palestrina. Frequentemente, é ensinada em cursos de música. Foi tradicionalmente cantada em todas as missas de coroações Papais até a coroação de Paulo VI, em 1963.

 

223 . 1 - Aparição de Nossa Senhora em Kazan – Rússia

               Nossa Senhora de Kazan, celebrada em dois diferentes dias, sendo em 8 de julho pela Igreja Católica Apostólica Romana e no dia 04 de novembro pela Santa Igreja Ortodoxa, é considerada por muitos como a Padroeira do povo russo. O ícone de Nossa Senhora de Kazan, em estilo grego-bizantino, teria sido pintado, segundo os especialistas, em Constantinopla, no século XIII. A obra apresenta a imagem de meio corpo da Virgem Maria carregando o Menino Jesus, que se encontra quase de pé, numa atitude de benção para com Sua mãe, para quem ele ergue a mão direita. O ícone encontra-se recoberto com uma lâmina de prata que cobre a figura e as vestimentas, deixando visíveis apenas os rostos da Mãe e do Filho. Sob a cobertura está o desenho cujas cores se conservam perfeitamente, o que se leva a considerá-lo não apenas como uma peça de altíssimo valor religioso, mas também uma verdadeira obra de arte. A lâmina que recobre a imagem data do século XVII e contém incrustações de diamantes, esmeraldas, rubis, safiras e pérolas, a maior parte dos quais foram acumuladas por diversos doadores que, deste modo, quiseram expressar sua devoção à Sagrada Imagem.

               No dia 1 de outubro de 1552, festa da “Proteção da Virgem”, o exército do Czar Ivan, o Terrível, assaltou as muralhas da cidade de Kazan, até então capital do Reino Tártaro. O czar, em ação de graças pela vitória obtida, ordena a construção de uma grande basílica em honra da Mãe de Deus, dedicando-a ao mistério da Anunciação. No ano de 1579, Kazan foi assolada por um violento incêndio, que destruiu metade da cidade. Enquanto a população se recuperava da tragédia, a Virgem aparece a uma menina de nove anos e manda-lhe escavar as ruínas, porque ali encontraria o Sagrado Ícone. No dia 8 de julho do mesmo ano, é encontrada entre as cinzas a imagem de Nossa Senhora de Kazan. Trasladada até a Catedral da Anunciação de Kazan, começa a ser objeto de grande devoção religiosa, sendo-lhe atribuídos inúmeros milagres. Ali permaneceu até por volta do ano de 1612, quando fora transportada para a cidade de Moscou. Em 1790, o Czar Pedro, o Grande, a invoca como “protetora e estandarte” na batalha de Poltava, contra Carlos XII, da Suécia. Após a vitória russa, o ícone é entronizado na Catedral de Moscou, sendo em seguida transferida para São Petersburgo e colocada num Santuário a ela especialmente dedicado. Na noite de 29 de junho de 1904, durante uma revolta popular, o ícone desapareceu junto a outros tesouros do Santuário. Após cerca de sessenta anos, reapareceu numa exposição de arte nos Estados Unidos. Em 1970, o “Centro Russo Católico de Nossa Senhora de Fátima” o compra. O ícone então prossegue sua caminhada: é entronizado na Capela Bizantina, em Fátima, Portugal, onde é venerada como sinal de unidade entre o ocidente católico e o oriente ortodoxo. No início de 1993, o Apostolado Mundial de Fátima transferiu a propriedade e o título de Nossa Senhora de Kazan para a Santa Sé, pertencendo então ao gabinete do Papa. Seguido de uma importante mudança em 2004, quando o Vaticano se despede do Ícone de Kazan e o reenvia para a Rússia.

 

224º - São Paulo IV - 1555 - 1559

               O Papa Paulo IV, CR (Capriglia Irpina, 28 de junho de 1476 – Roma, 18 de agosto de 1559), nascido Gian Pietro Carafa, foi chefe da Igreja Católica e governante dos Estados Papais de 23 de maio de 1555 a sua morte em 1559. Sua família era de Maddaloni, um ramo da nobre família Carafa (Caraffa) de Nápoles. Grande parte de sua educação ele obteve em Roma, na casa de seu tio, o brilhante Cardeal Oliviero Carafa.

               A qualidade excepcional desta instrução é evidente pelo fato de que Erasmo se correspondia com ele quando jovem, elogiando seu conhecimento das três línguas acadêmicas e uma vez convidando sua ajuda para traduzir para o latim as Escrituras Hebraicas e Gregas. O Cardeal Jacopo Sadoleto, o famoso humanista, o conheceu como colega na casa do Cardeal Carafa e testemunhou sua santidade e aprendizado. Durante este período de formação ele serviu sem culpa na corte corrupta de Alexandre VI como uma cameriere pontificio.

               Como Bispo, Carafa deu um exemplo edificante para aqueles tempos, vivendo e trabalhando zelosamente em sua Diocese de Chiete em Abruzzi (c. 1506/13). Para essa atividade ele acrescentou experiência valiosa no exterior como um enviado Papal e observador. Ele estava na Inglaterra como legado de Leão X a Henrique VIII para coletar o Óbulo de Pedro (1513-1514); então ele visitou Flandres (1515-17) e Espanha (1517-20). Em 1524, Clemente VII permitiu que ele renunciasse ao seu Bispado para que ele e Gaetano da Thiene de Vicenza pudessem cumprir o desejo de fundar uma congregação de clérigos regulares dedicados a restaurar o modo de vida apostólico. Da antiga Diocese de Chiete de Carafa (Lat., Teate) eles adquiriram o apelido de “Teatinos”. Em 1527, o saque de Roma pelas forças imperiais pôs fim à primeira casa romana das Teatinos. Fugindo para Veneza, estabeleceram outra casa, onde Carafa permaneceu até que Paulo III o chamou para Roma para torná-lo Cardeal, em 22 de dezembro de 1536. Em seus 19 anos como Cardeal, era consistentemente anti-espanhol e anti-Imperial. Ele se alinhou com o grupo de reforma na Cúria. Em 1550, Júlio III o nomeou um dos seis inquisidores do Santo Ofício.

               Papa da Reforma: Com a morte de Marcelo II (1555), o Cardeal Alessandro Farnese voltou toda a sua influência em favor de Carafa, então reitor do Sacro Colégio, e logo obteve os votos necessários para o napolitano de 79 anos. Carafa escolheu o nome Paulo em respeito ao seu benfeitor anterior de Farnese, Paulo III. Eleito como reformador, ele perdeu um pouco de seu ímpeto inicial e prestígio ao declarar uma guerra insensata contra os espanhóis, então de posse de grande parte da Itália. Ele não era de forma alguma um Júlio II, por mais que desejasse expulsar o estrangeiro do solo sagrado. Além disso, confiar a condução da guerra a seu intrigante e egoísta sobrinho Carlo era um erro irremediável. A família Carafa foi derrotada pelo Duque de Alva, que foi vice-rei de Nápoles; a guerra terminou com a generosa paz de Cave, em 12 de setembro de 1557. Depois de 1557, o idoso Papa se dedicou inteiramente à reforma da Igreja. Opondo métodos conciliares, ele não retomou o Concílio de Trento. Em vez disso, ele se baseou no estabelecimento de uma comissão à qual nomeou Cardeais bons e eruditos, principalmente homens que ele havia elevado. Ele lutou uma guerra intransigente contra a simonia e, eventualmente, desferiu um golpe decisivo no nepotismo, exilando seus próprios sobrinhos. Ele também insistiu que os Bispos residissem em suas casas e não gastassem seu tempo em Roma e em outros lugares, e ordenou a prisão de monges vadios em Roma.

               Seu zelo pela Inquisição era de conhecimento comum e o terror que provocou lhe valeu uma grande impopularidade. Mesmo durante sua guerra com a Espanha, ele participou de suas sessões. O número e os tipos de casos excederam, de longe, os de seus predecessores. Homens virtuosos, como o Cardeal Giovanni Morone, foram convocados por acusações frívolas. Além disso, um novo e mais rigoroso Index Librorum Prohibitorum foi promulgado e aplicado. Ele forçou os judeus a usar um distintivo e em 1555 estabeleceu o gueto em Roma. Apesar de sua vigilância contra a heresia, o protestantismo fez avanços ousados em todo o norte da Europa, muitas vezes auxiliado por considerações políticas. Além disso, as políticas de Paulo em relação às grandes potências da Europa eram geralmente míopes e muitas vezes arbitrárias e não adaptadas às realidades políticas do século XVI. Quando o Papa morreu, os romanos revoltaram-se, derrubaram suas estátuas e abriram as prisões da Inquisição, demonstrando seu alívio pelo término de seu governo severo e impopular. Embora o lado positivo de seu reinado tenha sido há muito obscurecido pela lembrança dos excessos da Inquisição, também foi uma época de importantes reformas. Uma boa semelhança do Pontífice, quase a única existente, é a estátua em seu túmulo, que Pio V havia construído em 1566 na capela Carafa de S. Maria sopra Minerva, em Roma. Embora idealizado, parece ter captado o espírito do aristocrata napolitano idoso, severo, fogoso e errático.

 

225º - Pio IV - 1559 - 1565

28 de abril de 1565: A Basílica Minore del Santo Niño é a primeira Igreja Católica Romana nas Filipinas.

               O Papa Pio IV (31 de março de 1499 - 9 de dezembro de 1565), nascido Giovanni Angelo Medici, foi chefe da Igreja Católica e governante dos Estados Papais de 25 de dezembro de 1559 à sua morte em 1565. Nascido em Milão. Reabriu novamente e finalizou o Concílio de Trento, cuja assembléia conciliar foi encerrada pelo Cardeal Morone, que teve papel importante no projeto de reforma desse terceiro período do Concílio, cabendo ao Papa aprovar todos os decretos conciliares, conferindo-lhes força de lei. Procedente de uma família humilde, mas mesmo não sendo membro da família Medici de Florença, adotou o mesmo brasão por ter se tornado protegido do Conde Medici de Florença e que lhe pediu que o usasse. Consagrado Pontífice prosseguiu com a reforma da Igreja e concluiu o concílio de Trento. O próprio Papa, em 13 de novembro de 1564 publicou a Professio fidei tridentina com uma profissão de fé relativa a todas as decisões dogmáticas do Concílio e uma promessa de obediência à Santa Sé. Durante seu Pontificado, São Carlos Borromeu, Arcebispo de Milão, capaz e piedoso, realizou muitas reformas na Igreja. Condenou a simonia, nome dado ao comércio de objetos sagrados, e politicamente também interveio para que fossem devolvidas as possessões do Piemonte a Emanuel Filiberto.

Encerramento do Concílio de Trento

               Em 18 de janeiro de 1562, o Concílio de Trento, suspenso pelo Papa Júlio III, foi convocado por Pio IV pela terceira e última vez. Grande habilidade e cautela foram necessárias para efetuar uma solução das questões diante dela, na medida em que as três principais nações participantes dela, embora em conflito com suas próprias demandas especiais, estavam preparadas para unir suas forças contra as demandas de Roma. Pio IV, no entanto, auxiliado pelo Cardeal Morone e Charles Borromeo, provou ser igual à emergência e, com uma administração criteriosa - e concessão - levou o conselho a um término satisfatório para os disputantes e favorável à autoridade Pontifícia. Suas definições e decretos foram confirmados por uma bula Papal (Benedictus Deus), datada de 26 de janeiro de 1564; e, embora tenham sido recebidos com certas limitações pela França e pela Espanha, o famoso Credo de Pio IV, ou Credo Trinentino, tornou-se uma expressão autorizada da fé católica. As manifestações mais marcantes de rigor durante seu Pontificado parecem ter sido mais solicitadas do que espontâneas, seu caráter pessoal inclinando à moderação e facilidade. Assim, um aviso, emitido em 1564, convocando Jeanne d'Albret, a Rainha de Navarra, antes da Inquisição sob acusação de calvinismo, foi retirada por ele em deferência ao protesto indignado de Carlos IX da França. No mesmo ano, ele publicou um touro concedendo o uso da taça aos leigos da Áustria e da Boêmia. Uma de suas paixões mais fortes parece ter sido a construção, que de certa forma esgotou seus recursos ao contribuir para o adorno de Roma (incluindo a nova Porta Pia e Via Pia, em homenagem a ele, e a extensão norte (Addizione) Rione de Roma, e no trabalho de restauração, montagem e fortificação em várias partes dos estados Eclesiásticos. Por outro lado, outros lamentaram a austera cultura romana durante seu papado.

Ante a ofensiva protestante, era da maior conveniência que os católicos tivessem à sua disposição, de maneira simplificada e concreta, uma formulação dos dogmas da Igreja Romana. E em suas últimas sessões, o Concilio de Trento expressou o desejo de que se incorporassem na profissão pública da Fé os dogmas católicos que os credos anteriores — Credo Apostólico, Niceno-constantinopolitano e Quicumque de Santo Atanásio — obviamente não tinham mencionado (sete sacramentos, transubstanciação, culto à Santíssima Virgem e aos Santos, primado romano…).

Como nos dias atuais proliferam erros doutrinários e confusão de espírito em ambientes católicos, pareceu-nos muito oportuno publicar abaixo a Professio fidei Tridentina (também conhecida como “Credo do Papa Pio IV”), promulgada na Bula Iniunctum nobis de SS Pío IV de13 de novembro de 1565, juntamente com a constituição In sacrosancta beati Petri, ambas em conformidade com uma reforma geral proveniente do Sacro Sínodo Tridentino.

Credo de S.S. Pio IV

(Profissão de fé tridentina)

Esta é a resposta de Deus aos protestantes e todos aqueles que ousaram erguer uma nova igreja, uma nova religião contrária a verdadeira e única Igreja da Terra.

Creio em um só Senhor Jesus Cristo, Filho Unigênito de Deus, nascido do Pai antes de todos os séculos; Que é Deus de Deus, Luz da Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro; É gerado, não criado; Consubstancial ao Pai, por quem foram feitas todas as coisas.

Ele, que por amor de nós homens e pela nossa salvação, desceu dos Céus. Encarnou-se por obra do Espírito Santo no seio da Virgem Maria, e se fez homem. Por nós foi crucificado; Padeceu sob o poder de Pôncio Pilatos e foi sepultado.

Ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras. Subiu aos Céus e está sentado à direita de Deus Pai. Pela segunda vez há de vir, com majestade, para julgar os vivos e os mortos. E seu reino não terá fim.

Creio no Espírito Santo, Senhor Vivificador, que procede do Pai e do Filho. Que, com o Pai e o Filho, é juntamente adorado e glorificado. Foi Ele quem falou pelos profetas.

Creio na Igreja, que é Una, Santa, Católica e Apostólica. Confesso um só Batismo para remissão dos pecados. E aguardo a ressurreição dos mortos e a vida eterna que há de vir. Amém.

Aceito e abraço firmemente as tradições apostólicas e eclesiásticas, bem como as demais observâncias e constituições da mesma Igreja.

Admito também a Sagrada Escritura naquele sentido em que é interpretada pela Santa Madre Igreja, a quem pertence julgar sobre o verdadeiro sentido e interpretação das Sagradas Escrituras. E jamais a aceitarei e interpretarei senão conforme o consenso unânime dos Padres.

Confesso também que são sete os verdadeiros e próprios sacramentos da Nova Lei, instituídos por Nosso Senhor Jesus Cristo para a salvação da humanidade, embora nem todos sejam necessários para todos.

São eles: Batismo, Confirmação, Eucaristia, Penitência, Extrema-Unção, Ordem e Matrimônio, os quais conferem a graça; Dentre eles, Batismo, Confirmação e Ordem não podem ser repetidos sem cometer sacrilégio.

Da mesma forma, aceito e admito os ritos da Igreja Católica, recebidos e aprovados para a administração solene de todos os supracitados sacramentos.

Abraço e recebo tudo o que foi definido e declarado no Concílio Tridentino sobre o pecado original e a justificação.

Confesso, outrossim, que na Missa se oferece a Deus um sacrifício verdadeiro, próprio e propiciatório pelos vivos e defuntos, e que no santo sacramento da Eucaristia estão verdadeira, real e substancialmente o Corpo e o Sangue, com a alma e a divindade, de Nosso Senhor Jesus Cristo, operando-se a conversão de toda a substância do pão no corpo e de toda a substância do vinho no sangue; conversão esta chamada pela Igreja de transubstanciação.

Confesso também que sob uma só espécie se recebe o Cristo todo inteiro e como verdadeiro sacramento.

Sustento sempre que há um Purgatório, e que as almas ali retidas podem ser socorridas pelos sufrágios dos fiéis; que os Santos, que reinam com Cristo, também devem ser invocados; que eles oferecem suas orações por nós, e que suas relíquias devem ser veneradas.

Firmemente declaro que se devem ter e conservar as imagens de Cristo, da sempre Virgem Mãe de Deus, como também as dos outros Santos, e a eles se devem honra e veneração.

Sustento que o poder de conceder indulgências foi deixado por Cristo à Igreja, e que o seu uso é muito salutar para os fiéis cristãos.

Reconheço a Santa Igreja Católica, Apostólica, Romana, como Mestra e Mãe de todas as Igrejas.

Prometo e Juro prestar verdadeira obediência ao Romano Pontífice, Sucessor de São Pedro, Príncipe dos Apóstolos e Vigário de Jesus Cristo.

Da mesma forma, aceito e confesso indubitavelmente tudo o mais que foi determinado, definido e declarado pelos sagrados cânones, pelos Concílios ecumênicos, especialmente pelo santo Concílio Tridentino [e pelo Concílio ecumênico Vaticano I e especialmente quanto ao primado e ao magistério infalível do romano Pontífice].

Condeno ao mesmo tempo, rejeito e anatematizo as doutrinas contrárias e todas as heresias condenadas, rejeitadas e anatematizadas pela Igreja.

Eu mesmo, [nome], prometo e juro, com o auxílio de Deus, conservar e professar, íntegra e imaculadamente, até o fim de minha vida, esta verdadeira fé católica, fora da qual não pode haver salvação, e que agora livremente professo.

E, no que depender de mim, cuidarei que seja mantida, ensinada e pregada a meus súditos ou àqueles cujo cuidado por ofício me foi confiado. Que para isto me ajudem Deus e estes santos Evangelhos! Amém.

 

 

226º - São Pio V - 1566 - 1572

O Papa Pio V determinou o formato da Oração do Rosário

A oração da Ave Maria completa foi eternizada neste Pontificado

               Antonio Miguel Ghislieri nasceu em 1504, em Bosco Marengo, na província de Alexandria, e, aos quatorze anos, já ingressara na congregação dos dominicanos. Depois que se ordenou Sacerdote, sua carreira atravessou todas as etapas de maneira surpreendente. Foi professor, prior de convento, superior provincial, inquisidor em Como e Bérgamo, Bispo de Sutri e Nepi, depois Cardeal, Bispo de Mondovi e, finalmente, Papa em 1566, tomando o nome de Pio V. A melhor definição para o seu governo é a palavra incômodo, aliás, como é o governo de todos os grandes reformadores dos costumes. Assim que assumiu, foi procurado, em Roma, por dezenas de parentes. Não deu "emprego" a nenhum, afirmando ainda, que um parente do Papa, se não estiver na miséria, "já está bastante rico". Dessa maneira, acabou com o nepotismo na Igreja, um mal que até hoje afeta as comunidades no âmbito político. Implantou, ainda, outras mudanças no campo pastoral, aprovadas no Concílio de Trento: a obrigação de residência para os Bispos, a clausura dos religiosos, o celibato e a santidade de vida dos Sacerdotes, as visitas pastorais dos Bispos, o incremento das missões e a censura das publicações, para que não contivessem material doutrinário não aprovado pela Igreja. Depois de conseguir a união dos países católicos, com a consequente vitória sobre os turcos muçulmanos invasores, e de ter decretado a excomunhão e deposição da própria Rainha da Inglaterra, Elisabeth I, o furacão se extinguiu. Papa Pio V morreu no dia primeiro de maio de 1572, sendo canonizado em 1712. Sua memória, antes venerada em 5 de maio, a partir da reforma do calendário litúrgico, passou a ser festejada nesta data, 30 de abril.

               A origem do Rosário está no costume, dos antigos monges, de fazer suas preces, contando-as com o uso dos dedos das mãos ou mediante pedrinhas, ossinhos, grãos. Na Idade Média (séculos X-XII) os fiéis costumavam rezar vários “Pai Nosso” ou várias “Ave-Maria” consecutivos, quando não podiam recitar os Salmos (em casos de analfabetismo ou de pouca cultura). Esta prática foi-se codificando e regulamentando aos poucos chegando a sua forma atual no século XVI sob o Papa S. Pio V, dominicano. Foi este Pontífice quem determinou tanto o número de “Pai-Nosso” e “Ave-Maria” como o teor dos mistérios que os devem acompanhar. S. Pio V atribuiu a eficácia dessa prece a vitória naval de Lepanto, que aos 7 de outubro de 1571 salvou de grande perigo a Cristandade ocidental. A devoção foi mais e mais favorecida pelos Papa seguintes, destacando-se Leão XIII, que determinou fosse o mês de outubro dedicado, em todas as paróquias, à recitação do Rosário. O Terço do Rosário é a arma mais poderosa contra Satanás, se transformando simbolicamente na corrente que vai prende-lo por mil anos, além, é claro, da proteção contra todos os males.

Como rezar o terço do Rosário

Os Mistérios:

Mistério Gozosos

Primeiro Mistério: Anunciação à Maria

Segundo Mistério: Visitação de Nossa Senhora a sua prima Isabel

Terceiro Mistério: Nascimento de Jesus

Quarto Mistério: Apresentação do Menino Jesus no Templo

Quinto Mistério: Perda e encontro do Menino Jesus no Templo

Mistério Luminosos

Primeiro Mistério: Batismo de Jesus no rio Jordão

Segundo Mistério: Auto-revelação de Jesus nas Bodas de Caná

Terceiro Mistério: Anúncio do Reino de Deus

Quarto Mistério: Transfiguração de Jesus

Quinto Mistério: Instituição da Eucaristia

Começar com o sinal da cruz.

Mistério Dolorosos

Primeiro Mistério: Agonia de Jesus no Horto

Segundo Mistério: Flagelação de Jesus

Terceiro Mistério: Coroação de Espinhos

Quarto Mistério: Jesus carregando a cruz no caminho do Calvário

Quinto Mistério: Crucifixão e morte de Jesus

Mistério Gloriosos

Primeiro Mistério: Ressurreição de Jesus

Segundo Mistério: Ascensão de Jesus ao Céu

Terceiro Mistério: Vinda do Espírito Santo sobre os Apóstolos

Quarto Mistério: Assunção de Maria

Quinto Mistério: Coroação de Maria no Céu

 

INCÍCIO DO ROSÁRIO:

Inicia-se fazendo o sinal da cruz e dizendo: Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém.

- Vinde Espírito Santo, enchei os corações dos vossos fiéis e acendei neles o fogo do vosso amor. Enviai Senhor o vosso Espírito e tudo será criado, e renovareis a face da terra.

Segurando o crucifixo, rezar o Credo dos Apóstolos:

"Creio em um só Deus, Pai Todo-Poderoso, Criador do céu e da terra, de todas as coisas visíveis e invisíveis. Creio em um só Senhor, Jesus Cristo, Filho Unigênito de Deus, nascido do Pai antes de todos os séculos. Deus de Deus, luz da luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado, não criado, consubstancial ao Pai. Por Ele todas as coisas foram feitas. E por nós, homens, e para nossa salvação, desceu dos céus e se encarnou pelo Espírito Santo no seio da Virgem Maria e se fez homem. Também por nós foi crucificado sob Pôncio Pilatos, padeceu e foi sepultado. Ressuscitou ao terceiro dia, conforme as escrituras, e subiu aos céus, onde está sentado à direita do Pai. E de novo há de vir, em sua glória, para julgar os vivos e os mortos; e o seu reino não terá fim. Creio no Espírito Santo, Senhor que dá a vida, e procede do Pai e do Filho; e com o Pai e o Filho é adorado e glorificado; Ele que falou pelos profetas. Creio na Igreja, una, santa, católica e apostólica. Professo um só batismo para a remissão dos pecados e espero a ressurreição dos mortos e a vida do mundo que há de vir. Amém."

Na primeira conta, rezar um Pai-Nosso.

Pai nosso, que estais no céu, santificado seja o vosso nome; venha a nós o vosso reino; seja feita a vossa vontade, assim na terra como no céu. O pão nosso de cada dia nos dai hoje; e perdoai as nossas dívidas, assim como nós perdoamos nossos devedores; e não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do maligno. Amém.

Em cada uma das três contas seguintes, rezar uma Avé Maria.

Ave Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco; bendita sois vós entre as mulheres e bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus. Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós, pecadores, agora e na hora da nossa morte. Amém.

Na conta seguinte, rezar um “Glória ao Pai”.

Glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo, como era no princípio, agora e sempre. Amém.

Na conta grande, anunciar o Primeiro Mistério Gosozo: Anunciação a Maria.

Rezar um Pai Nosso.

Rezar a primeira dezena de Ave Maria

No final da década, Rezar o Glória ao Pai e a Jaculatória.

Glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo, como era no princípio agora e sempre. Amém.

Jaculatória: Oh! Meu Jesus, perdoai-nos, livrai-nos do fogo do Inferno, levai as almas todas para o Céu e socorrei as que mais precisarem.

Rogai por nós, Santa Mãe de Deus. Para que sejamos dignos das promessas de Cristo. Amém.

Repita este padrão para as restantes décadas, e continuando os demais mistérios gososos: Segundo Mistério: Visitação de Nossa Senhora a sua prima Isabel. Terceiro Mistério: Nascimento de Jesus. Quarto Mistério: Apresentação do Menino Jesus no Templo.

Pai Nosso -> 10 Ave Marias -> Glória -> Jaculatória.

Após as 5 dezenas, concluir com a Salve Rainha.

Salve, Rainha santa, mãe de misericórdia, nossa vida, nossa doçura e nossa esperança. A Vós bradamos, os degredados filhos de Eva. A Vós suspiramos, gemendo e chorando neste vale de lágrimas. Eia, pois, advogada nossa, esses Vossos olhos misericordiosos a nós volvei. E, depois deste desterro, nos mostrai Jesus, bendito fruto do Vosso ventre. Ó clemente, ó piedosa, ó doce Virgem Maria. Rogai por nós, Santa Mãe de Deus, para sermos dignos das promessas de Cristo.

Oração de encerramento:

Oremos: Ó Deus, cujo Filho Unigenito, com a sua vida, morte e ressurreição, nos alcançou o prêmio da vida eterna, concedei-nos, a nós que celebramos estes mistérios do santo rosário, imitar o que contêm e alcançar o que prometem. Por Cristo nosso Senhor. Amém.

Terminar com o sinal da cruz dizendo: Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém.

(Nos três terços seguintes para se completar o Santo Rosário, reza-se os Mistérios seguntes: Luminosos, Gloriosos e Dolorosos.

 

Completou-se também neste pontificado a oração da Ave Maria, segunda parte. Tanto a primeira parte como a segunda teve origem popular-eclesial inspirada pelo Espírito Santo. S. Bernardino de Senna em 1444, ao comentar a Ave Maria disse que ao final poderia acrescentar: “Santa Maria rogai por nós.”. Mas a fórmula atual foi divulgada no Breviário publicado em 1568, por ordem do Papa Pio V.

A oração da Ave Maria está nas escrituras: Ave Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco. (Lc 1,28) Bendita sois vós entre as mulheres, e bendito é o fruto do vosso ventre! (Lc 1,42), Jesus. Santa Maria, Mãe de Deus, (Lc 1: 43), rogai por nós, pecadores, agora e na hora de nossa morte. Amém!

MISSAL TRIDENTINO

               O Concílio de Trento serviu-se da paramentaria, da pintura, da escultura e da ourivesaria, para assegurar a unidade de fé e a disciplina eclesiástica, emanando dele decretos e diplomas onde transpareceu uma nova forma de ver a imagem sagrada. Neste Concílio, também se sentiu a necessidade de normalizar a liturgia da missa para eliminar os abusos cometidos na sua celebração, procedendo-se à reforma dos livros litúrgicos. No entanto, como o Concílio se arrastava há já longos anos, os padres conciliares decidiram, na última sessão, incumbir o Papa Pio IV dessa função. Contudo, foi Pio V que realizou tal incumbência, promulgando, em 14 de julho de 1570, através da bula Quo primum tempore, o novo Missal Romano. Foi, durante quatro séculos, considerado pelos Sacerdotes do rito latino como norma para a celebração do Sacrifício Eucarístico. É o livro litúrgico oficial da Igreja. Contém normas gerais sobre o cerimonial litúrgico, bem como as leituras e orações apropriadas para a Missa diária e das festas do ano litúrgico. O Missal Romano é obrigatório para toda a Igreja Latina. No período anterior ao Concílio de Trento pouco significado se deu à liturgia. Foi neste Concílio e com os Papas que o executaram (Papa Paulo III, Júlio III, Marcelo II e Pio IV) que se pôs fim aos abusos e se estabeleceram os fundamentos teológicos das ações litúrgicas, uniformizando a liturgia e centralizando toda a legislação na Cúria Romana.

               No início da Igreja Católica Romana, a Bíblia era o único livro usado na celebração da missa, podendo o Sacerdote improvisar nas orações. Mas, nos séculos V e VI foram surgindo um conjunto de textos escritos ao qual deram o nome de “Sacramentários” e segundo os quais o Sacerdote se orientava. Nos séculos XII e XIII, o Sacerdote celebrante criou os seus próprios textos, os “Missais Plenários”, que incluíam o livro das leituras e o das orações. Em 1570, após Concílio de Trento, o Papa Pio V publica o Missal ao qual se chamou, desde então, “Missal de S. Pio V”. Para que houvesse um culto divino digno muitos Pontífices romanos, entre eles, Clemente VIII, Urbano VIII, São Pio X, Bento XV, Pio XII e o Beato João XXIII (1958-1963), mostraram particular atenção à Sagrada Liturgia, para que esta se manifestasse de forma mais eficaz, definindo-a e conservando-a tanto em relação ao Sacrifício da Missa como ao Ofício Divino. São Pio V, utilizando o Concílio como espaço próprio de renovação e criação de normas, renovou o culto de toda a Igreja, cuidou da correção dos livros litúrgicos e da sua edição segundo “as normas instituídas pelos Padres”. No Missal Romano, lê-se: as missas de acordo com o tempo litúrgico (Advento, Natal, Quaresma, Tríduo Pascal, Tempo Pascal e Tempo Comum); o Rito da Missa (Ritos Iniciais, Liturgia da Palavra, Liturgia Eucarística (ofertório e prefácios), o Rito da Comunhão e os Ritos Finais); apêndice do Rito da Missa (Bênçãos Solenes e Orações sobre o povo. O missal distinguia-se no decorrer do calendário litúrgico pelo uso prático, isto é, um missal de serviço comum e serventia diária e pela aparência, num missal com capa de veludos, guarnições e fechos de prata. Estantes especiais e panos ricamente bordados envolviam os missais, valorizando-os e criando aparato, pois os missais estão destinados a figurar em cerimônias litúrgicas onde, em parceria com os paramentos, contribuíam para o brilho da liturgia. Relativamente às gravuras que compunham e abrilhantavam as páginas dos missais, podemos afirmar que, por exemplo, na Architipographia Plantiniana, de Balthasaris Moreti, à qual pertence o exemplar que se encontram no Museu Nacional de História Natural e da Ciência, em Lisboa, emprega-se um leque bastante limitado de gravuras para cada uma das dez passagens bíblicas, ou seja, as mesmas gravuras eram usadas em várias edições dos missais da tipografia.

 

MISSAL TRIDENTINO

               Este ritual foi regido pelo Espírito Santo, é perfeito e inalterável. Sua confecção foi o momento mais sublime da Igreja, criou-se uma joia inestimável para a salvação das almas.

 

PRIMEIRA PARTE: MISSA DOS CATECÚMENOS

 

O Sacerdote, ao pé do altar, diz alternadamente com o Ministro as Orações que se seguem.

S. Significa Sacerdote. R. Ministro ou povo.

De joelhos.

S. Em nome do Pai, † e do Filho, e do Espírito. Amém.

S. Subirei ao altar de Deus.

R. Do Deus que alegra a minha juventude.

Salmo (43, 1-5) – este salmo omite-se nas Missas de Defuntos e do Tempo da Paixão

S. Faze-me justiça, ó Deus, e pleiteia a minha causa contra uma nação ímpia; livra-me do homem enganador e iníquo.

R. Tu que és, ó Deus, a minha fortaleza, porque me repeliste? Por que me visto de luto por causa da opressão do inimigo?

S. Envia a Tua luz e a Tua verdade; estas me conduzirão e me levarão ao Teu santo monte ao lugar da tua habitação.

R. Então irei ao altar de Deus, do Deus que que a minha alegria e o meu prazer.

S. Ó Deus, Deus meu, com harpa te louvaei. Por que estás triste, minha alma? E por que me inquietas?

R. Espera em Deus, porque eu ainda O hei-de louvar, a Ele que é a minha salvação e o meu Deus.

S. Glória ao Pai, e ao Filho, e ao Espírito Santo.

R. Assim como era no princípio, seja agora e sempre, e por todos os séculos dos séculos. Amém.

S. Subirei ao Altar de Deus.

R. Do Deus que alegra a minha juventude.

S. O nosso † auxílio está no nome do Senhor.

R. Que fez o Céu e a Terra.

Com grande desejo de se purificar, o Sacerdote primeiramente, antes de se aproximar do altar, e depois os fiéis, acusam-se diante de Deus e dos Santos dos pecados que cometeram e pedem a Deus misericórdia.

O Sacerdote reza o Confiteor:

S. Eu me confesso a Deus todo poderoso, à bem-aventurada sempre Virgem Maria, ao bem aventurado São Miguel Arcanjo, ao bem aventurado São João Batista, aos Santos Apóstolos São Pedro e São Paulo, a todos os Santos e a vós, padre, porque pequei muitas vezes, por pensamentos, palavras e obras, (bate-se por três vezes no peito) por minha culpa, minha culpa, minha máxima culpa. Portanto rogo a bem aventurada Virgem Maria, ao bem aventurado São Miguel Arcanjo, ao bem aventurado São João Batista, aos santos Apóstolos São Pedro e São Paulo, a todos os santos e a vós, padre, que rogueis a Deus Nosso Senhor por mim.

O acólito e os fiéis, estes ao menos em espírito, pedem a Deus que aceite a confissão do Sacerdote.

R. Que Deus onipotente se amerceie de ti, que te perdoe os pecados e te conduza à vida eterna.

S. Amém.

O acólito e os fiéis, por sua vez, fazem a sua Confissão:

R. Eu pecador me confesso a Deus todo-poderoso, à bem-aventurada sempre Virgem Maria, ao bem-aventurado são Miguel Arcanjo, ao bem-aventurado são João Batista, aos santos apóstolos são Pedro e são Paulo, a todos os Santos e a vós, Padre, porque pequei muitas vezes, por pensamentos, palavras e obras, (bate-se por três vezes no peito) por minha culpa, minha culpa, minha máxima culpa. Portanto, rogo à bem-aventurada Virgem Maria, ao bem-aventurado são Miguel Arcanjo, ao bem-aventurado são João Batista, aos santos apóstolos são Pedro e são Paulo, a todos os Santos e a vós, Padre, que rogueis a Deus Nosso Senhor por mim.

O Sacerdote pede a Deus que aceite a confissão dos fiéis.

S. Que Deus onipotente se compadeça de vós, que vos perdoe os pecados e vos conduza à vida eterna.

R. Amém.

O Sacerdote pronuncia sobre si mesmo e sobre os fiéis a fórmula da absolvição:

S. Indulgência † absolvição, e remissão dos nossos pecados, conceda-nos o Senhor onipotente e misericordioso.

R. Amém.

Orações

Inclinam-se todos para a recitação dos versículos seguintes:

S. Ó Deus, voltando-Vos para nós, nos dareis a vida.

R. E o Vosso povo alegrar-se-á em Vós.

S. Mostrai-nos, Senhor, a Vossa misericórdia.

R. E dai-nos a Vossa salvação.

S. Ouvi, Senhor, a minha oração.

R. E fazei subir até Vós o meu clamor.

S. O Senhor seja convosco.

R. E com o vosso espírito.

Ao subir ao altar, o Sacerdote pede a Deus mais uma vez que o purifique de todos os pecados:

S. Oremos.

S. Lavai-nos, Senhor, de todo o pecado, a fim de merecermos penetrar de coração puro no Santo dos Santos. Por Jesus Cristo Nosso Senhor. Amém

O Sacerdote beija o altar que encerra as Relíquias dos Mártires e diz:

S. Nós vos suplicamos, Senhor, pelos méritos de vossos santos, (beijando o centro do altar) cujas relíquias aqui se encontram, e de todos os demais santos, vos digneis perdoar todos os nossos pecados. Amém.

Incensação do altar

Nas Missas solenes o Sacerdote deita incenso no turíbulo e benze-o ao mesmo tempo com as palavras seguintes: « Bendito sejas por Aquele em honra de Quem vais ser queimado. » Depois incensa o altar.

PRIMEIRA PARTE: ANTE-MISSA

(Missa dos Catecúmenos)

Oração e Instrução

Nós falamos a Deus e Deus nos fala.

Esta primeira parte da Missa prepara as nossas almas, pela Oração e pela Instrução, para o Sacrifício propriamente dito.

I. ORAÇÃO

Falamos a Deus por Jesus Cristo: Introito, Kyrie, Gloria e Oração.

Intróitus – Cântico de entrada

O Sacerdote vai para o lado da Epístola, e lê o Introito. Canto solene de entrada, o Intróito como que enuncia o tema geral da Missa ou solenidade do dia. Às primeiras palavras, todos se benzem, ao mesmo tempo que o celebrante.

De pé.

 1 – VER MISSA DO DIA

Kýrie, Eléison

O Kýrie é uma breve ladainha de procedência grega, uma tríplice invocação das três Pessoas Divinas. O Sacerdote, no meio do altar, diz, alternadamente com os assistentes:

S. Senhor, tende piedade de nós.

R. Senhor, tende piedade de nós.

S. Senhor, tende piedade de nós.

R. Cristo, tende piedade de nós.

S. Cristo, tende piedade de nós

R. Cristo, tende piedade de nós.

S. Senhor, tende piedade de nós.

R. Senhor, tende piedade de nós.

S. Senhor, tende piedade de nós.

Glória in Excélsis

O Glória in excelsis, que os gregos denominam a grande doxologia, é um cântico de louvor entretecido de aclamações e súplicas, dirigido à Santíssima Trindade. Abre com as palavras que os Anjos cantaram no nascimento do Salvador.

– Omite-se nas Missas de Defuntos, em todas do Tempo do Advento, da Septuagésima e da Quaresma e nas férias sem festa.

Glória a Deus nas alturas, e paz na terra aos homens de boa vontade. Nós Vos louvamos, Nós Vos bendizemos, Nós Vos adoramos e Nós Vos glorificamos. Nós Vos damos graças, por Vossa grande glória, Senhor Deus, Rei do céu, Deus Pai onipotente. Senhor, Filho Unigênito de Deus, Jesus Cristo. Senhor Deus, Cordeiro de Deus e Filho de Deus Pai. Vós que tirais os pecados do mundo, tende piedade de nós. Vós que tirais os pecados do mundo, ouvi a nossa prece. Vós que estais sentado à direita do Pai, tende piedade de nós. Porque só Vós sois Santo. Só Vós sois Senhor. Só Vós sois o Altíssimo, Jesus Cristo, Com o Espírito Santo, † na glória de Deus Pai. Amém.

GLORIA IN EXCÉLSIS DEO.

O Sacerdote, no meio do altar, volta-se para os fiéis e diz:

S. O Senhor seja convosco.

R. E com vosso espírito.

Coleta

O Sacerdote, diante do missal, recita a COLETA. Breve oração que resume e apresenta a Deus os votos de toda a assembléia, votos estes sugeridos pelo mistério ou solenidade do dia.

Orémus:

 2 – VER MISSA DO DIA

 O Sacerdote saúda a assembléia e depois acrescenta a Deus em resumo os votos e aspirações que a Santa Igreja nos sugere em razão da festa ou do mistério que celebramos. – Respondamos todos com um Amém cheio de confiança. Conclusão:

S. …por todos os séculos dos séculos.

R. Amém.

II. INSTRUÇÃO

Deus nos fala por Jesus Cristo: Epístola, Evangelho e Homilia.

Epístola – Lectio – Lição

Sentado.

No decorrer do ano litúrgico, a Igreja vai-nos lendo os mais belos passos dos Profetas e os princípios basilares da doutrina dos Apóstolos.

 3 – VER MISSA DO DIA

 – Nas Missas solenes, a Epístola é cantada pelo Subdiácono. Nas rezadas responde-se no fim.

R. Graças a Deus.

CÂNTICOS GRADUAIS

O Gradual compõe-se geralmente de alguns versículos dum Salmo que era outrora cantado por inteiro pelos cantores e pela assembléia. No Tempo Pascal, o Gradual é substituído por um Aleluia. – Aleluia é, em hebreu, uma espécie de interjeição de alegria. E de fato a melodia dos nossos Aleluias é uma explosão de júbilo, único modo que a alma, nesses momentos de dulcificante altura espiritual, encontra para se dirigir a Deus. Junta-se-lhe um versículo do Salmo. – Durante a Septuagésima e a Quaresma, o Aleluia é substituído pelo Tracto.

4 – VER MISSA DO DIA

O Evangelho do Mestre

Antes de ler ou cantar o Evangelho, o Sacerdote diz a oração « Munda cor meum » e pede a Deus que o abençoe. – Nas Missas solenes é o Diácono que canta o Evangelho. Recita o « Munda cor » e pede a benção ao Sacerdote. Nas Missas de Defuntos diz-se o « Munda cor », mas omite-se a benção.

S. Senhor onipotente, purificai o meu coração e os meus lábios, Vós que purificastes os lábios do Profeta Isaías com um carvão em brasa. E dignai-Vos por tal modo purificar-me com a Vossa misericórdia, que possa dignamente anunciar o Vosso Santo Evangelho. Por Jesus Cristo Nosso Senhor. Amém.

S. Senhor, abençoai-me.

S. Que o Senhor resida no meu coração e nos meus lábios, para que anuncie digna e convenientemente o Seu Evangelho. Amém.

A leitura ou o canto do Evangelho, que nos recorda sempre um episódio da vida ou um ponto de doutrina do Salvador, rodeia-se de certa solenidade. A assembléia conserva-se de pé, por veneração e respeito para com a palavra de Deus. Nas Missas solenes organiza-se uma pequena procissão. Incensa-se o Livro dos Evangelhos e acompanha-se com círios acesos. – Às primeiras palavras – Sequentia, etc. faz-se o sinal da cruz na testa, na boca e no peito.

No lado do Evangelho o Sacerdote diz: De pé.

S. O Senhor seja convosco

R. E com vosso espírito.

S. Sequência do santo Evangelho † segundo ….

R. Glória a Vós, Senhor.

5 – VER MISSA DO DIA

 No fim, responde-se:

R. Louvor a vós, ó Cristo!

Após a leitura, o Sacerdote beija o texto sagrado, dizendo:

S. Que pelas palavras do Evangelho nos sejam perdoados os pecados.

Segue-se a Homilia, ou explicação da Palavra de Deus.

Sentado.

Credo

De pé.

CREIO em um só Deus. Pai, todo poderoso, criador do Céu e da Terra, de todas as coisas visíveis e invisíveis. Creio em um só Senhor, Jesus Cristo, Filho unigênito de Deus. Nascido do Pai, antes de todos os séculos. Deus de Deus, luz da luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro. Gerado, não feito, consubstancial ao Pai, por meio de Quem foram feitas todas as coisas. Que por causa de nós, homens, e por causa de nossa salvação desceu dos Céus. (Todos se ajoelham) E SE ENCARNOU POR OBRA DO ESPÍRITO SANTO, EM MARIA VIRGEM, E SE FEZ HOMEM. Também por amor de nós foi crucificado, sob Pôncio Pilatos; padeceu e foi sepultado. Ressuscitou ao terceiro dia, conforme as Escrituras. Subiu aos Céus, onde está sentado à direita do Pai. Donde virá de novo, em sua glória, para julgar os vivos e os mortos e cujo reino não terá fim. Creio no Espírito Santo, Senhor que dá a vida, e procede do Pai e do Filho. Que com o Pai e com o Filho é igualmente adorado e glorificado: ele o que falou pelos profetas. Creio na Igreja, una, santa, católica e apostólica. Professo um só Batismo, para a remissão dos pecados. Espero a ressurreição dos mortos. E a vida † do século futuro. Amém.

SEGUNDA PARTE: SACRIFÍCIO DA MISSA

OFERTÓRIO, CONSAGRAÇÃO E COMUNHÃO

Nós nos damos a Deus e Deus se dá a nós.

I. OFERTÓRIO E CONSAGRAÇÃO

Nós nos damos a Deus por Jesus Cristo.

Ofertório: Preparação para o Sacrifício

Com o Ofertório, começa a segunda parte da Missa ou Sacrifício propriamente dito. Depois do Evangelho ou do Credo, o Sacerdote beija o altar e volta-se ao povo com esta saudação:

S. O Senhor seja convosco

R. E com vosso espírito.

Offertórium – Cântico do Ofertório:

Preparação da matéria do sacrifício: Pão e Vinho.

Segue-se em voz baixa.

 6 – VER MISSA DO DIA

O Sacerdote lê a Antífona do Ofertório, vestígio de um cântico que se executava outrora durante a procissão das oferendas. Esta procissão era constituída por todos os fiéis presentes, que levavam ao Sacerdote pão, vinho e outros dons, símbolos da oblação que fazia cada um de si mesmo. – Todas as orações do Ofertório exprimem este sentimento de oblação. Nas Missas dialogadas a assembléia pode recitar em português estas Antífonas.

Ofertório do pão e do vinho

O Sacerdote oferece o pão e coloca-o na patena. Coloquemo-nos também na patena, hóstias pequenas à beira da grande, ofereçamo-nos com ela ao Senhor. Ofereçamo-nos sim, e não retiremos dela, durante o dia, nenhuma partícula da nossa oblação.

Oferecimento do pão

Sentado.

S. Recebei, santo Pai, onipotente e eterno Deus, esta hóstia imaculada, que eu vosso indigno servo, vos ofereço, ó meu Deus, vivo e verdadeiro, por meus inumeráveis pecados, ofensas, e negligências, por todos os que circundam este altar, e por todos os fiéis vivos e falecidos, afim de que, a mim e a eles, este sacrifício aproveite para a salvação na vida eterna. Amém.

Bênção da água e mistura com o vinho

Misturando algumas gotas d’água com o vinho, rito que simboliza a união dos fiéis com Jesus Cristo, o Sacerdote reza:

S. Ó Deus, † que maravilhosamente criastes em sua dignidade a natureza humana e mais prodigiosamente ainda a restaurastes, concedei-nos, que pelo mistério desta água e deste vinho, sermos participantes da divindade daquele que se dignou revestir-se de nossa humanidade, Jesus Cristo, vosso Filho e Senhor Nosso, que sendo Deus convosco vive e reina em união com o Espírito Santo, por todos os séculos dos séculos. Amém.

Oferecimento do Cálice

No meio do altar, o sacerdote faz o oferecimento do cálice:

S. Nós vos oferecemos Senhor, o cálice da salvação, suplicando a vossa clemência. Que ele suba qual suave incenso à presença de vossa divina majestade, para salvação nossa e de todo o mundo. Amém.

Oferecimento dos fiéis

O Sacerdote, em nome de todos, pede que sejamos aceitos por Deus como são aceitas as nossas dádivas.

S. Em espírito de humildade e coração contrito, sejamos por vós acolhidos, Senhor. E assim se faça hoje este nosso sacrifício em vossa presença, de modo que vos seja agradável, ó Senhor Nosso Deus.

Invoca o Espírito Santo

O Sacerdote invoca a bênção do Espírito Santo.

S. Vinde, ó Santificador, onipotente e eterno Deus e, abençoai † este sacrifício preparado para glorificar o vosso santo nome.

Incensação

Nas missas solenes incensam-se as oferendas e o altar.

O Sacerdote benze o incenso, dizendo:

S. Pela intercessão do bem-aventurado Miguel Arcanjo, que está à direita do altar do incenso, e de todos os seus escolhidos, digne-se o Senhor abençoar este incenso e recebê-lo em suave odor. Por Cristo, Nosso Senhor. Amém.

O Sacerdote incensa as duas oferendas.

S. Suba, Senhor à Vossa presença, este incenso que abençoastes, e desça sobre nós a Vossa misericórdia.

Em seguida, incensa o Crucifixo e todo o altar.

S. Eleve-se, Senhor, a minha oração como incenso à Vossa presença, e elevem-se as minhas mãos como sacrifício vespertino. Ponde, Senhor, uma guarda à minha boca e uma porta aos meus lábios. Assim o meu coração não se inclinará para o mal, nem procurará pretextos para poder pecar.

O Sacerdote entrega o turíbulo ao diácono, e diz esta Oração:

S. Acenda, o Senhor, em nós, o fogo de seu amor e a chama da eterna caridade. Amém.

Lavabo – Ablução das mãos

O Sacerdote vai à direita do altar e lava as mãos, dizendo os seguintes versículos do Salmo 26:

S. Lavo as minhas mãos entre os inocentes, e me aproximo do vosso altar, ó Senhor. Para ouvir o cântico dos vossos louvores, e proclamar todas as vossas maravilhas. Eu amo, Senhor, a beleza da vossa casa, e o lugar onde reside a vossa glória. Não me deixeis, ó Deus, perder a minha alma com os ímpios, nem a minha vida com os sanguinários. Em suas mãos se encontram iniquidades, sua direita está cheia de dádivas. Eu porém, tenho andado na inocência. Livrai-me, pois, e tende piedade de mim. Meus pés estão firmes no caminho reto. Eu te bendigo, Senhor, nas assembléias dos justos.

Glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo. Assim como era no princípio, agora e sempre, por todos os séculos dos séculos, Amém.

Oferecimento à Santíssimo Trindade

Inclinado, ao meio do altar, o Sacerdote diz a Oração à Santíssima Trindade:

S. Recebei, ó Trindade Santíssima, esta oblação, que vos oferecemos em memória da Paixão, Ressurreição e Ascensão de Nosso Senhor Jesus Cristo, e em honra da bem-aventurada e sempre Virgem Maria, de são João Batista, dos Santos apóstolos Pedro e Paulo, e de todos os Santos; para que, a eles sirva de honra e a nós de salvação, e eles se dignem interceder no céu por nós que na terra celebramos sua memória. Pelo mesmo Cristo, Senhor Nosso. Amém.

Consagração: Realização do Sacrifício

Oráte, fratres – Rogai, irmãos

O Sacerdote volta-se para os fiéis e convida-os a que orem com ele para que Deus Se digne aceitar-lhes o sacrifício comum:

S. Orai irmãos, para que este sacrifício, que também é vosso, seja aceito e agradável a Deus Pai Onipotente.

R. Receba, o Senhor, de vossas mãos este sacrifício, para louvor e glória de seu nome, para nosso bem e de toda a sua santa Igreja.

S. Amém.

Secreta – Oração sobre as Oferendas

É a Oração propriamente dita da oblação e pode ser resumida num duplo pensamento: Senhor, que a nossa oferenda, unida ao Sacrifício de vosso Filho, Vos seja agradável e produza frutos para nós.

7 – VER MISSA DO DIA

CANON MISSAE

INTENÇÕES GERAIS ANTES DA CONSAGRAÇÃO

Oblação do Sacrifício

O Cânon constitui a parte central da Missa. Com o Prefácio, começa a solene oração sacerdotal da Igreja e oblação propriamente dita do Sacrifício. Curto diálogo introdutório entre o sacerdote e a assembléia desperta nas almas os sentimentos de ação de graças que convêm à celebração dos santos mistérios.

Praefatio – Prefácio

De pé.

S. por todos os séculos dos séculos.

R. Amém.

S. O Senhor seja convosco.

R. E com o vosso espírito.

S. Corações ao alto.

R. Temo-los para o Senhor

S. Demos graças ao Senhor, nosso Deus.

R. É digno e justo.

8 – VER MISSA DO DIA

Prefácio da Santíssima Trindade

Diz-se nas festas e nas Missas votivas da Santíssima Trindade; em todos os Domingos do ano, menos nas festas que tiverem próprio.

S. É verdadeiramente digno, justo, racional e salutar, que sempre e em toda a parte Vos rendamos graças, Senhor Santo, Pai onipotente e Deus eterno; Que sois, com o Vosso Filho Unigénito e com o Espírito Santo, um só Deus e um só Senhor, não na singularidade duma só pessoa, mas na Trindade duma só substância. Porque tudo aquilo que nos revelastes e cremos da Vossa glória, isso mesmo sentimos, sem diferença nem distinção, do Vosso Filho e do Espírito Santo, de maneira que, confessando a verdadeira e eterna Divindade, adoramos a propriedade nas Pessoas, a unidade na Essência e a igualdade na Majestade, a qual louvam os Anjos e os Arcanjos, os Querubins e os Serafins, que não cessam de cantar dizendo a uma só voz:

Sanctus

De joelhos.

Santo, Santo, Santo, é o Senhor Deus dos Exércitos. A Terra e o Céu estão cheios da Vossa glória. Hosana no mais alto dos Céus. Bendito O que vem em nome do Senhor. Hosana nas alturas!

Continuação do Cânon

I. Memento da Igreja

O Sacerdote, profundamente inclinado, beija o altar e continua a grande oração sacerdotal.

S. A vós, Pai clementíssimo, por Jesus Cristo vosso Filho e Senhor nosso, humildemente rogamos e pedimos aceiteis e abençoeis estes † dons, estas † dádivas, estas † santas oferendas ilibadas.

Oração por toda a Igreja, em especial pela hierarquia:

S. Nós Vo-los oferecemos, em primeiro lugar, pela vossa santa Igreja católica, à qual vos dignai conceder a paz, proteger, conservar na unidade e governar, através do mundo inteiro, e também pelo vosso servo o nosso Papa…, pelo nosso Bispo…, e por todos os (bispos) ortodoxos, aos quais incumbe a guarda da fé católica e apostólica.

II. Memento dos vivos

S. Lembrai-vos, Senhor, de vossos servos e servas N. e N., e de todos os que aqui estão presentes, cuja fé e devoção conheceis, e pelos quais vos oferecemos, ou eles vos oferecem, este sacrifício de louvor, por si e por todos os seus, pela redenção de suas almas, pela esperança de sua salvação e de sua conservação, e consagram suas dádivas a vós, o Deus eterno, vivo e verdadeiro.

III. Memento dos Santos

S. Unidos na mesma comunhão, veneramos primeiramente a memória da gloriosa e sempre Virgem Maria, Mãe de Deus e Senhor Nosso Jesus Cristo, e também de S. José, o Esposo da mesma Virgem, e dos vossos bem-aventurados Apóstolos e Mártires: Pedro e Paulo, André, Tiago, João e Tomé, Tiago, Filipe, Bartolomeu, Mateus, Simão e Tadeu, Lino, Cleto, Clemente, Xisto, Cornélio, Cipriano, Lourenço, Crisógono, João e Paulo, Cosme e Damião, e a de todos os vossos santos. Por seus méritos e preces, concedei-nos, sejamos sempre fortalecidos com o socorro de vossa proteção. Pelo mesmo Cristo, Senhor Nosso. Amém.

ORAÇÃO PELA ACEITAÇÃO DAS OFERENDAS

Unido à Igreja Militante e à Triunfante, o Sacerdote volta a atenção para as dádivas, e estendendo as mãos sobre elas, pede:

S. Por isso, vos rogamos, Senhor, aceiteis favoravelmente a homenagem de servidão que nós e toda a vossa Igreja vos prestamos, firmai os nossos dias em vossa paz, arrancai-nos da condenação eterna, e colocai-nos entre os vossos eleitos. Por Jesus Cristo, Senhor Nosso. Amém.

Pede o Sacerdote que as dádivas sejam aceitas por Deus, tornando-se o Corpo e o Sangue de Jesus, único Sacrifício agradável ao Pai.

S. Nós vos pedimos, ó Deus, que esta oferta seja por vós em tudo, aben†çoada, apro†ovada, ratifi†cada, digna e aceitável a vossos olhos, afim de que se torne para nós o Cor†po e o San†gue de Jesus Cristo, vosso diletíssimo Filho e Senhor Nosso.

CONSAGRAÇÃO

É esse o momento em que se realiza o Sacrifício. Sob as espécies do pão e do vinho aparece o Cristo glorioso, nossa Vítima. E como Sumo Sacerdote, Ele nos oferece ao Pai, em união com o seu Corpo e o seu Sangue. A separação das espécies indica a sua morte sangrenta na Cruz.

Consagração do Pão

S. Ele, na véspera de sua paixão, tomou o pão em suas santas e veneráveis mãos, e elevando os olhos ao céu para vós, ó Deus, seu Pai onipotente, dando-vos graças, ben†zeu-o, partiu-o e deu-o a seus discípulos, dizendo: Tomai e Comei Dele, Todos.

« ISTO É O MEU CORPO »

Consagração do Vinho

S. De igual modo, depois de haver ceado, tomando também este precioso cálice em suas santas e veneráveis mãos, e novamente dando-vos graças, ben†zeu-o e deu-o a seus discípulos, dizendo: Tomai e Bebei Dele Todos.

« ESTE É O CÁLICE DO MEU SANGUE, DO NOVO E ETERNO TESTAMENTO: MISTÉRIO DE FÉ: QUE SERÁ DERRAMADO POR VÓS E POR MUITOS PARA REMISSÃO DOS PECADOS. »

Todas as vezes que isto fizerdes, fazei-o em memória de mim.

OBLAÇÕES

O Sacerdote oferece a Deus já não mais pão e vinho, mas o Sacrifício de Cristo. É o verdadeiro Ofertório.

1. Em nome do povo, o Sacerdote apresenta a Deus a Vítima imaculada.

S. Por esta razão, Senhor, nós, vossos servos, com o vosso povo santo, lembrando-nos da bem-aventurada Paixão do mesmo Cristo, vosso Filho e Senhor Nosso, assim como de sua Ressurreição, saindo vitorioso do sepulcro, e de sua gloriosa Ascensão aos céus, oferecemos à vossa augusta Majestade, de vossos dons e dádivas, a Hóstia † pura, a Hóstia † santa, a Hóstia † imaculada, o Pão † santo da vida eterna, e o Cálice da salvação † perpétua.

2. Pede o Sacerdote a Deus que aceite o presente Sacrifício, como aceitou os dos Justos na antiga Lei: Abel, Abraão e Melquisedeque.

S. Sobre estes dons, vos pedimos digneis lançar um olhar favorável, e recebê-los benignamente, assim como recebeste as ofertas do justo Abel, vosso servo, o sacrifício de Abraão, pai de nossa fé, e o que vos ofereceu vosso sumo sacerdote Melquisedeque, Sacrifício santo, Hóstia imaculada.

Inclinando-se profundamente, o Sacerdote pede ao Anjo de Deus, leve a santa oblação ao altar do céu, onde o Cristo continua o seu Sacerdócio eterno, intercedendo por nós.

S. Suplicantes vos rogamos, ó Deus onipotente, que, pelas mãos de vosso santo Anjo, mandeis levar estas ofertas ao vosso Altar sublime, à presença de vossa divina Majestade, para que, todos os que, participando deste altar, recebermos o sacrossanto Cor†po, e San†gue de vosso Filho, sejamos repletos de toda a bênção celeste e da Graça.Pelo mesmo Jesus Cristo, Nosso Senhor. Amém.

INTENÇÕES GERAIS DEPOIS DA CONSAGRAÇÃO

Unamo-nos à Igreja Padecente. O Sacerdote interrompe as orações da Consagração para orar especialmente pelos Defuntos. Todos os Cristãos se acham unidos cada vez que é celebrado o Santo Sacrifício: os Santos do céu, os fiéis da terra e as almas do purgatório.

I. Memento dos Defuntos

S. Lembrai-vos, também, Senhor, de vossos servos e servas (NN. e NN.), que nos precederam, marcados com o sinal da fé, e agora descansam no sono da paz. A estes, Senhor, e a todos os mais que repousam em Jesus Cristo, nós vos pedimos, concedei o lugar do descanso, da luz e da paz. Pelo mesmo Jesus Cristo, Nosso Senhor. Amém

II. Memento dos Assistentes

O Sacerdote ora mais especialmente por si e pelos assistentes.

S. Também a nós, pecadores, vossos servos, que esperamos na vossa infinita misericórdia, dignai-vos conceder um lugar na comunidade de vossos santos Apóstolos e Mártires: João, Estevão, Matias, Barnabé, Inácio, Alexandre, Marcelino, Pedro, Felicidade, Perpétua, Águeda, Luzia, Inês, Cecília, Anastácia, e com todos os vossos Santos. Unidos a eles pedimos, vos digneis receber-nos, não conforme nossos méritos mas segundo a vossa misericórdia.Por Jesus Cristo Nosso Senhor. Amém.

Doxologia final – Conclusão do Cânon

S. Por Ele, ó Senhor, sempre criais, santi†ficais, vivi†ficais, aben†çoais, e nos concedeis todos estes bens. Por †Ele, com †Ele e †Nele, a Vós, Deus Pai † onipotente, na unidade do †Espírito Santo, toda a honra e toda a glória

Todo o Cânon foi dito em voz baixa. O Sacerdote consagra em nome de Jesus Cristo, mas o povo participa neste ato, declarando o seu assentimento:

S. Por todos os séculos dos séculos

R. Amém.

Pater Noster- Pai Nosso

De pé.

Os fiéis se uniram ao Sacerdote no Sacrifício eucarístico. Agora são convidados a tomarem parte do Sacramento do Corpo e Sangue do Salvador. Sacerdote e fiéis se preparam pela recitação do Pater Noster que, com o pão para cada dia, pede também o Pão para a Vida eterna.

OREMOS. Instruídos com estes preceitos salutares e com esta divina doutrina, ousamos dizer:

Pai nosso, que estais nos céus, santificado seja o Vosso nome, venha a nós o Vosso reino, seja feita a Vossa vontade, assim na terra como no céu. O pão nosso de cada dia nos dai hoje, e perdoai-nos as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores. E não nos deixeis cair em tentação,

R. Mas livrai-nos do mal.

De joelhos.

Continuação da última súplica e fração da Hóstia

O Sacerdote diz Amém em voz baixa, e continua:

S. Livrai-nos de todos os males, ó Pai, passados, presentes e futuros, e pela intercessão da bem-aventurada e gloriosa sempre Virgem Maria, dos vossos bem-aventurados apóstolos, Pedro, Paulo, André e todos os Santos, dai-nos propício a paz em nossos dias, para que, por vossa misericórdia, sejamos sempre livres do pecado, e preservados de toda a perturbação. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que, sendo Deus, convosco vive e reina na unidade do Espírito Santo,

S. Por todos os séculos dos séculos.

R. Amém

Fração da Hóstia

O rito da fração da Hóstia é também rito sacrifical: simboliza a separação do uso profano e a entrega à posse divina. É ainda símbolo da morte, pois o Sacrifício da Missa é também sacrifício de expiação como o foi o sacrifício de Jesus.

O Sacerdote faz três vezes o sinal da cruz sobre o Cálice com uma das partes da Hóstia que acaba de dividir em três e a mistura com o Preciosíssimo Sangue.

S. A paz † do Senhor † seja sempre con†vosco.

R. E com o vosso Espírito.

 II. COMUNHÃO

Deus se dá a nós por Jesus Cristo.

Tendo Deus aceito a dádiva da Igreja, dá-lhe em troca a dádiva divina que é Nosso Senhor Jesus Cristo, alimento de nossas almas e penhor da união eterna.

S. Que esta união e consagração do Corpo e do Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo aproveite para a vida eterna àqueles que dela participamos. Amém.

Agnus Dei

O Sacerdote inclina-se, pedindo o perdão de seus pecados.

Nas Missas de Requiem diz-se: Dona eis Requiem – dai-lhes o descanso, e na terceira vez: Requiem sempiternam – o descanso perpétuo, omitindo-se a Oração seguinte.

S. Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do mundo,

R. Tende piedade de nós.

S. Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do mundo,

R. Tende piedade de nós.

S. Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do mundo,

R. Dai-nos a paz.

Oração pela Paz

Inclinado, recita a oração seguinte, pela paz da Igreja.

S. Senhor Jesus Cristo, que dissestes aos vossos apóstolos: “Eu vos deixo a paz, eu vos dou a minha paz”: não olheis os meus pecados, mas para a fé da vossa Igreja; dai-lhe, a paz e a unidade, segundo a vossa misericórdia. Vós que sendo Deus, viveis e reinais, em união com o Espírito Santo, por todos os séculos dos séculos. Amém.

Preparação para a Comunhão

Inclinado sobre o altar, o Sacerdote recita as duas orações seguintes, como preparação imediata para a Comunhão:

S. Senhor Jesus Cristo, filho de Deus vivo, que por vontade do Pai, cooperando com o Espírito Santo, por vossa morte destes a vida ao mundo. Livrai-me, por este vosso sacrossanto Corpo e por vosso Sangue, de todos os meus pecados e de todos os males. E, fazei que eu observe sempre os vossos preceitos, e nunca me afaste de Vós, que, sendo Deus, viveis e reinais com Deus Pai e o Espírito Santo, por todos os séculos dos séculos. Amém.

Este vosso Corpo, Senhor Jesus Cristo, que eu, que sou indigno, ouso receber, não seja para mim causa de juízo e condenação, mas por vossa misericórdia, sirva de proteção e defesa à minha alma e ao meu corpo, e de remédio aos meus males. Vós, que sendo Deus, viveis e reinais com Deus Pai e o Espírito Santo, por todos os séculos dos séculos. Amém.

Comunhão do Sacerdote

O Sacerdote genuflecte e pegando depois na sagrada Hóstia, diz:

S. Receberei o Pão do céu e invocarei o nome do Senhor:

O Sacerdote bate três vezes no peito, repetindo de cada vez a profissão de fé do centurião do Evangelho:

Senhor, eu não sou digno, de que entreis em minha morada, mas dizei uma só palavra e a minha alma será salva.

Comunhão

Somente o Sacerdote que celebrou o Missal pode entregar a Hóstia.

Faz sobre si o sinal da cruz com a sagrada Hóstia, antes de a comungar:

S. O Corpo de Nosso Senhor Jesus Cristo † guarde a minha alma para a vida eterna. Amém.

Tendo comungado sob a espécie do pão, o Sacerdote rende ação de graças.

Que retribuirei ao Senhor por tudo o que me tem concedido? Tomarei o Cálice da salvação e invocarei o nome do Senhor. Invocarei o Senhor louvando-O, e ficarei livre de meus inimigos.

O Sacerdote, comungando o Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, diz:

O Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo † guarde a minha alma para a vida eterna. Amém.

Comunhão dos fiéis

É este o momento da Comunhão dos fiéis. Em resposta ao nosso Sacrifício, o Pai nos dá a sua mais preciosa dádiva, Nosso Senhor Jesus Cristo.

Os fiéis, ou o acólito por eles, recitam o Confiteor:

Eu pecador me confesso a Deus todo-poderoso, à bem-aventurada sempre Virgem Maria, ao bem-aventurado são Miguel Arcanjo, ao bem-aventurado são João Batista, aos santos apóstolos são Pedro e são Paulo, a todos os Santos e a vós, Padre, porque pequei muitas vezes, por pensamentos, palavras e obras, (bate-se por três vezes no peito) por minha culpa, minha culpa, minha máxima culpa. Portanto, rogo à bem-aventurada Virgem Maria, ao bem-aventurado são Miguel Arcanjo, ao bem-aventurado são João Batista, aos santos apóstolos são Pedro e são Paulo, a todos os Santos e a vós, Padre, que rogueis a Deus Nosso Senhor por mim.

Os fieis obrigatoriamente devem receber a Hóstia de Joelhos e na boca.

Voltando-se para os fiéis, o Sacerdote diz:

S. Que Deus onipotente se compadeça de vós, e perdoando os vossos pecados, vos conduza à vida eterna.

R. Amém.

S. Indulgência † absolvição, e remissão dos nossos pecados, conceda-nos o Senhor onipotente e misericordioso.

R. Amém.

O Sacerdote volta-se para o altar, genuflecte e voltando-se pra os assistentes ergue a Hóstia, dizendo:

S. Eis o Cordeiro de Deus; eis O que tira os pecados do mundo.

E em seguida, três vezes:

S. Senhor, eu não sou digno de que entreis em minha morada, mas dizei uma só palavra e a minha alma será salva.

Ao dar a cada fiel a Sagrada Comunhão, diz:

S. O Corpo e o Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo † guarde tua alma para a vida eterna. Amem.

Ação de Graças – Abluções

O Sacerdote purifica primeiro o cálice e depois os dedos, e toma as abluções. Enquanto isso vai dizendo:

Fazei Senhor, que com o espírito puro, conservemos o que a nossa boca recebeu. E, que desta dádiva temporal, nos venha remédio para a eternidade. Concedei, Senhor, que vosso Corpo e vosso Sangue que recebi, me absorvam intimamente, e fazei que, restabelecido por estes puros e santos Sacramentos, não fique em mim mancha alguma de culpa. Vós, que sendo Deus, viveis e reinais com Deus Pai e o Espírito Santo, por todos os séculos dos séculos. Amém.

Limpa o cálice e deixa-o, coberto, no meio do altar.

Antífona da Comunhão

O Sacerdote passa para o lado direito do altar, e recita a antífona da Comunhão.

9 – VER MISSA DO DIA

S. O Senhor seja convosco.

R. E com o vosso espírito.

Pós Comunhão

De pé.

Orémus:

10 – VER MISSA DO DIA

Conclusão:

S. Fazei Senhor, que com o espírito puro conservemos o que a nossa boca recebeu. E que desta dádiva temporal nos venha remédio para a eternidade. Concedei, Senhor, que Vosso Corpo e Vosso Sangue que recebi me absolvam intimamente e fazei que restabelecido por estes puros e santos Sacramentos, não fique em mim mancha alguma de culpa. Vós, que sendo Deus, viveis e reinais com Deus Pai e o Espírito Santo por todos os séculos dos séculos.

R. Amém.

Final da Missa

O Sacerdote volta ao meio do altar, beija-o, e, voltando-se para os fiéis saúda-os:

S. O Senhor seja convosco

R. E com o vosso espírito.

S. Ide, a Missa acabou.

R. Demos graças a Deus.

Voltando-se para o altar, recita a seguinte oração:

S. Seja-vos agradável, ó Trindade santa, a oferta de minha servidão, afim de que este sacrifício que, embora indigno aos olhos de vossa Majestade, vos ofereci, seja aceito por Vós, e por vossa misericórdia, seja propiciatório para mim e para todos aqueles por quem ofereci. Por Cristo Jesus Nosso Senhor. Amém.

De joelhos.

Benção do Sacerdote

Beija o altar, volta-se para a assistência, e dá a bênção, dizendo:

S. Abençoe-vos o Deus onipotente, Pai, e Filho, † e Espírito Santo.

R. Amém.

ÚLTIMO EVANGELHO

De pé.

O Sacerdote passa para o lado esquerdo do altar e recita, como último Evangelho, o princípio do Evangelho de São João:

S. O Senhor seja convosco.

R. E com o vosso espírito.

S. Início do santo Evangelho † segundo São João

R. Glória a Vós, Senhor.

No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus.Ele estava no princípio com Deus Todas as coisas foram feitas por Ele, e sem Ele nada do que foi feito se fez. Nele estava a vida, e a vida era a luz dos homens.E a luz resplandece nas trevas, e as trevas não a compreenderam. Houve um homem enviado de Deus, cujo nome era João Este veio como Testemunha para dar testemunho da luz, afim de que todos cressem por meio dele. Não era Ele a luz, mas veio para dar testemunho da luz. Ali estava a Luz verdadeira, a que ilumina a todo o homem que vem a este mundo Estava no mundo, e o mundo foi feito por Ele, e o mundo não O conheceu. Veio para o que era seu, e os seus não O receberam. Mas, a todos quantos O receberam, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus, aos que creem no seu Nome; Os quais não nasceram do sangue, nem do desejo da carne, nem da vontade do homem, mas nasceram de Deus. (Ajoelha-se) E O VERBO SE FEZ CARNE e habitou entre nós, e vimos a sua glória, glória própria do Filho Unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade.

R. Demos graças a Deus.

ORAÇÕES NO FIM DA MISSA

De joelhos.

De joelhos diante do altar, o Sacerdote diz com os fiéis as seguintes preces prescritas pelo Papa Leão XIII e por Pio XI enriquecidas de indulgências. Este último Papa mandou que se rezassem pela conversão da Rússia.

Ave Maria (três vezes)

Ave Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco, bendita sois Vós entre as mulheres e bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus. Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós pecadores, agora e na hora de nossa morte. Amém.

Salve Rainha

Salve Rainha, Mãe de misericórdia, vida, doçura e esperança nossa, salve! A Vós bradamos, os degredados filhos de Eva. A Vós suspiramos, gemendo e chorando neste vale de lágrimas. Eia, pois, advogada nossa, esses vossos olhos misericordiosos a nós volvei. E depois deste desterro, mostrai-nos Jesus, bendito fruto do vosso ventre. Ó clemente! Ó piedosa! Ó doce sempre Virgem Maria!

S. Rogai por nós, Santa Mãe de Deus

R. Para que sejamos dignos das promessas de Cristo

Oremos:

Deus, nosso refúgio e fortaleza, olhai propício para o povo que a Vós clama; e, pela intercessão da gloriosa e imaculada Virgem Maria, Mãe de Deus, de S. José, seu Esposo, dos vossos bem-aventurados Apóstolos S. Pedro e S. Paulo e de todos os Santos, ouvi misericordioso e benigno as preces que Vos dirigimos para a conversão dos pecadores, para a liberdade e exaltação da Santa Madre Igreja. Pelo mesmo Jesus Cristo Senhor Nosso.

R: Amém

São Miguel Arcanjo, defendei-nos no combate, cobri-nos com o vosso escudo contra os embustes e ciladas do demônio. Subjugue-o Deus, instantemente o pedimos. E vós, príncipe da milícia celeste, pelo divino poder, precipitai no inferno a Satanás e a todos os espíritos malignos que andam pelo mundo para perder as almas. Amém.

R: Amém

São Pio X pediu se ajuntasse três vezes a seguinte jaculatória:

S. Sacratíssimo Coração de Jesus

R. Tende piedade de nós.

 

226 . 1 - Santa Tereza D´Ávila

               Santa Teresa D'Ávila, também conhecida como Santa Teresa de Jesus nasceu em Ávila, na Espanha, em 28 de marco de 1515 e faleceu em Alba, também na Espanha, em 4 de outubro de 1582. Foi uma freira carmelita, mística e Santa católica do século XVI, importante por suas obras sobre a vida contemplativa e espiritual. Pedagoga de excelência no caminho da oração e da espiritualidade é padroeira dos professores por conta da sua maestria em lidar com as pessoas para auxiliá-las no caminho rumo a Deus. No dia 27 de setembro de 1970 o Papa Paulo VI reconheceu-lhe o título de Doutora da Igreja. Sua festa litúrgica é no dia 15 de outubro. Santa Teresa de Ávila é considerada um dos maiores gênios que a humanidade já produziu. Teresa de Cepeda y Ahumada nasceu no dia 28 de março de 1515, em uma nobre família de Ávila, na Espanha, filha de Alonso Sánchez de Cepeda e Beatriz de Ahumada. Teve educação esmerada e muito cuidada pelos pais. Gostava de ler histórias de Santos, chegando a fugir de casa com seu irmão para dar a vida por Cristo tentando evangelizar os mouros. Sua mãe faleceu quando Tereza tinha 14 anos. Então, seu pai a levou para estudar no Convento das Agostinianas de Ávila. Aos 20 anos, decidiu-se pela vida religiosa, apesar da resistência de seu pai. Acredita-se que ela tenha contraído malária, e a doença fez com que ela ficasse em casa por três anos. Durante esse longo período, para suportar as dores e o sofrimento da doença, a jovem Teresa se dedicou a ler algumas obras cristãs, como “O Terceiro Alfabeto Espiritual”, do padre espanhol Francisco de Osuna. O livro não era muito diferente de outras obras medievais espanholas, que falavam sobre a espiritualidade. O livro ensinava a fazer exercícios de contemplação interior, ou seja, técnicas que eram conhecidas na época como orações mentais. Na obra, também havia instruções para exames de consciência, avaliações e reflexões sobre os próprios atos. Seguindo essas práticas, a jovem noviça finalmente conseguiu se recuperar da doença. Assim, depois de três anos que ela havia interrompido seus estudos no convento, Teresa voltou ao carmelo para assumir o hábito.  

               Após 25 anos no Carmelo pede permissão ao provincial, padre Gregório Fernandez para fundar novas casas, com uma vida mais austera e com menos irmãs, visto que onde ela morava haviam mais de 200 freiras. Apesar da maioria ter ido contra, Santa Teresa continuou com sua missão fundando várias casas, com o apoio de dois frades carmelitas, o superior Antonio de Jesus de Heredia, e Juan de Yepes, (São João da Cruz). Conseguiu depois de muita luta a autorização de Roma para separar a ordem das carmelitas descalças, (por usarem roupas rasgadas e sandálias ao invés de sapatos e hábitos), das carmelitas calçadas, ordem a que pertenciam. Deixou para São João da Cruz a missão de continuar fundando novos conventos, escrevendo também a pedido de Santa Teresa, as regras para os mosteiros masculinos. Realizou uma grande reforma na Ordem das Carmelitas Descalças. Fundou vários conventos, (32 mosteiros, 17 femininos e 15 masculinos), com uma rígida forma de vida, trabalho e silêncio. Santa Teresa foi considerada muito inteligente, e deixou várias obras escritas, como o Livro da Vida, o Caminho da Perfeição, Moradas e Fundações entre outros. Com uma forte doutrina que dirige a alma até uma espiritualidade com Deus, no centro do Castelo Interior, com base na espiritualidade carmelita, que são os quatro degraus da oração: o recolhimento, a quietação, a união e o arrebatamento. Um anjo transpassou seu coração com uma seta de fogo, fato este que é comemorado pelo Carmelo com a festa da Transverberação do coração de Santa Teresa, no dia 27 de agosto. Tinha o dom de predizer o futuro e de ler as consciências das pessoas. Das obras de Santa Teresa D'Ávila, a grande doutora da Igreja, o "Caminho de Perfeição" é que mais pode auxiliar de forma prática aqueles que querem iniciar a vida de oração. A bibliografia de Teresa tem início com o "Livro da Vida", um registro autobiográfico, em que a santa revela os fenômenos místicos com que foi agraciada por Deus. Esta obra foi censurada pela Inquisição Espanhola, que não desejava que as carmelitas tivessem acesso a tais informações. Portanto, o "Caminho de Perfeição" era o primeiro escrito de Teresa que as monjas liam. Tomando por base os estudos históricos e a sua própria autobiografia, sabemos que Teresa D'Ávila nasceu em uma família de origem judaica que, porém, fazia questão de esconder sua conversão ao catolicismo. Seus pais eram virtuosos e sua mãe faleceu logo cedo. Ela gostava também de meditar sobre a vida eterna, com seu irmão Rodrigo. A ideia da eternidade entusiasmou de tal forma as duas crianças que elas decidiram fugir de Ávila e entregar-se aos mouros para serem degolados como mártires. Chegaram, porém, tão somente ao portão da cidade, onde foram encontrados pelo tio e levados de volta à casa paterna. Esse episódio mostra que ela teve uma infância acalentada por ideais religiosos. Teresa, no entanto, adquiriu de sua mãe o mau hábito de ler livros de romance. Com isso, ficou vaidosa e acabou se envolvendo em namoricos com um primo. Quando o pai descobriu, não titubeou, colocou-a num convento de agostinianas, o que lhe serviu de correção. No convento, conheceu uma monja que, instigando-a a récita do Santo Terço, lhe ensinou a rezar novamente e fez renascer nela o ardor perdido na adolescência, a ponto de Teresa considerar a possibilidade de entrar na vida religiosa. Todavia, a santa tinha certa aversão à ideia de ir definitivamente para o convento e ainda desejava casar-se. Decidiu-se pela vida religiosa quando raciocinou que seu desejo maior era ir para o céu e que o melhor modo de isso ocorrer era se tornando monja. O "Livro da Vida" havia sido censurado pela Inquisição, como já foi dito, pois o Santo Ofício não queria que as monjas tivessem conhecimento dos fenômenos místicos da Santa Madre, para não incentivá-las. Assim, o primeiro manuscrito do "Caminho de Perfeição" foi escrito para as primeiras doze monjas do Carmelo de São José, num estilo muito tranquilo, bonito, familiar e desenvolto, porque ela tinha certeza de que não sairia dali. Ela chamava o "Livro da Vida" de "o livro" e o "Caminho de Perfeição" de "livrinho". O Carmelo de São José "floresceu" em novas fundações. E Santa Teresa, prudente que era, entregou o livrinho para um frei dominicano seu amigo e que também era inquisidor. Ele censurou e melhorou o livro, de modo que Santa Teresa o reescreveu. Embora haja duas versões do livro, a mais comum é a chamada "oficial", pois foi revisada e reescrita pela própria santa. O livro pode ser dividido, grosso modo, em três partes. Nos capítulos 1 e 3, a santa dá a identidade das carmelitas, a finalidade do Carmelo São José. Depois ela fala sobre as virtudes necessárias para viver a vida de oração e, finalmente, a vida de oração propriamente dita, onde ela, mui livremente, comenta o Pai Nosso. Santa Teresa não se sentia poeta, nem achava que escrevia com o intelecto ou, para usar a palavra que ela usa, com o “entendimento”. Ela percebia que escrevia com o sentimento, com a alma e com o corpo. Sobre isto se costuma citar o texto de Teresa no qual ela diz que conhece uma pessoa que não sendo poeta, podia escrever versos (coplas) com muito sentimento e expressar bem seu penar. É claro que essa pessoa é ela, Teresa (Conferir: Libro de La Vida, 16,3). Sua inspiração poética vinha do amor que Teresa sentia por Deus. Era embriaguez e êxtases. Transe e ímpeto. Ela tinha um dom natural para a poesia, ou melhor, dito, para o poético. Por isso na sua poesia não mostra muita preocupação com aspetos formais ou acadêmicos. Isto vale também para a prosa. Seus textos são espontâneos, singelos, simples. Marcelino Menéndez y Pelayo (1856-1912) em seu conhecido e citado artigo “De la poesía mística”, escreveu que todos os místicos espanhóis são poetas, mesmo escrevendo em prosa. E que em Santa Teresa esta característica é mais forte que em outros. As estrofes que servem de cabeçalho aos poemas de Teresa, que se repetem durante o poema, são os de melhor qualidade poética. Especialmente porque ficam em nossa memória e os podemos repetir sempre. Por isso são também as partes mais famosas. O grande exemplo disto é "Vivo sin vivir en mi". Doutora Teresa igualmente aos outros místicos espanhóis escreveu parte de seu pensamento em poesia. Esta poesia carece de beleza formal, porém está cheia de um ímpeto amoroso que ninguém na Espanha conseguiu igualar.   Os motivos que a levam a escrever são motivos religiosos. Canções de natal, canções para as diferentes datas do ano litúrgico, "villancicos". Muitas vezes ela escreveu para animar suas irmãs freiras, ou para alegrá-las.A alegria, embora sempre sob um fundo de tristeza, era uma de suas características, e possivelmente, muitas de suas poesias, que eram letras de canções, tinham por finalidade passar para as outras freiras essa alegria. Lamentavelmente quase toda sua obra poética hoje está perdida. Oito anos antes de morrer, foi lhe revelado a hora de sua morte, aumentando mais ainda o seu amor a Deus e as orações. Santa Teresa morreu no dia 4 de outubro de 1582, com 67 anos. Depois de uma viagem para encontrar com a Duquesa Maria Henriques, ficou por três dias de cama, pois estava bem debilitada, e disse a Beata Ana de São Bartolomeu: "Finalmente, minha filha, chegou a hora da minha morte." E na hora de sua morte ela disse: "Oh, senhor, por fim chegou a hora de nos vermos face a face."  Foi sepultada em Alba de Tormes, onde estão suas relíquias. Depois de sua morte e até os dias de hoje, seu corpo exala um perfume de rosas, e se conserva intacto, (incorruptível). Seu coração conservado em um relicário, em Alba, na igreja das Carmelitas, tem uma profunda ferida, de quando foi marcado pelo anjo. Em 1622, quarenta anos depois de sua morte, Teresa foi canonizada por Gregório XV. Cinco anos antes, as Cortes Generales já haviam escolhido Teresa como padroeira da Espanha ao mesmo tempo em que a Universidade de Salamanca conferiu-lhe o diploma de Doctor ecclesiae. Este título, que significa "doutor da Igreja", é diferente da honraria Papal de "Doutor da Igreja", que é sempre conferido postumamente e que foi finalmente agraciado a Teresa pelo Papa Paulo VI em 27 de dezembro de 1970, a mesma data que Santa Catarina de Siena recebeu o título que fez das duas as primeiras doutoras da história da Igreja Católica.

O INFERNO, SEGUNDO SANTA TERESA D'ÁVILA

               "Estando um dia em oração, achei-me de repente, sem saber como e segundo me parece, toda metida no Inferno. Entendi que o Senhor queria que eu visse o lugar que os demônios lá me tinham preparado, e que eu havia merecido pelos meus pecados. Foi de brevíssima duração, mas, embora tivesse sido já há muitos anos, parece-me impossível esquecê-lo. A entrada (do Inferno) pareceu-me à maneira dum beco muito comprido e estreito, semelhante a um forno muito baixo, escuro e apertado. O chão pareceu-me de água com lodo muito sujo e de cheiro nauseabundo, cheio de lagartixas peçonhentas. No fundo, havia uma concavidade aberta numa parede, à maneira dum armário, onde me vi metida com muito aperto. Tudo isso, porém, eram deleites, em comparação com o que ali vi e senti. Senti um grande fogo na alma, que não entendo como se pode dizer e de que maneira ele é. As dores corporais são tão insuportáveis, que eu, nesta vida, apesar de já as ter sofrido tão intensamente, tudo isso é nada em comparação com o que ali senti. E segundo dizem os médicos, tive dos maiores sofrimentos que neste mundo se poderão padecer. Foi por terem-se me encolhido os nervos, ficando entrevada, além doutros tormentos diversos e muito variados, tendo sido alguns, como tenho dito, causados pelo Demônio. Pois tudo isso foi nada, em comparação com o que ali [no Inferno] vi e senti, sabendo que essas penas não mais haviam de ter fim. E no agonizar da alma: um aperto, uma sufocação, uma aflição tão sensível e com tão desesperado e aflitivo descontentamento, que eu não sei explicar. Porque o dizer que isso é uma sensação de ver arrancada a alma, é pouco, por assim parecer-nos que alguém põe termo à vida; mas ali é a própria alma que se despedaça continuamente, para sempre. O fato é que eu não sei como entender aquele fogo interior e aquele desespero, sobrepostos a tão gravíssimos tormentos e dores. Não percebia como assim tanto sofria, mas sentia-me a ser queimada e retalhada, ao que me parece; e digo que aqueles fogo e desespero interior são os mais dolorosos. Estando em tão pestilencial lugar, tão desesperada de toda a consolação, não havia como sentar-me ou deitar-me, não havia um sítio espaçoso, porque puseram-me nesta espécie de buraco feito na parede; porquanto estas paredes, que são espantosas à vista, apertam por si mesmas e tudo sufocam. Não há luz, pois tudo são trevas escuríssimas. Eu não entendo como pode ser isto, porque, não havendo luz, vê-se tudo o que à vista pode causar horror. Não quis o Senhor que eu, então, visse mais nada de todo o Inferno; porém, depois tive outra visão de coisas terríveis, sobre o castigo de alguns vícios. Quanto à vista, pareceu-me ainda muito mais espantoso, mas como não sentia o tormento, não me causara tanto horror como na visão anterior, em que o Senhor quis que eu verdadeiramente sentisse aquelas dores e aflições no espírito, como se o corpo também as estivesse a padecer. Não sei como foi isso, mas bem compreendi ser grande mercê, pois o Senhor quis apenas que eu sentisse, numa visão brevíssima, do que me tinha livrado as Suas infinitas Misericórdia e Justiça. Porque não é nada somente ouvir falar disso, nem por eu já ter meditado sobre esses tormentos - embora poucas vezes o fizesse, que só pelo caminho do temor não vai bem a alma -, nem sequer por os demônios atenazarem-me com vários suplícios que tenho padecido. Não, nada há como as penas infernais, porque se trata doutra coisa (imensamente pior). Enfim, são tão diferentes como a pintura o é da realidade; ou seja, o queimar-se aqui no mundo é muito pouco, em comparação com esse fogo de lá... E assim, não me recordo que tenha sofrido tribulações e dores, mesmo das maiores que na terra se podem padecer, que não passem de ninharias, comparativamente; pelo que julgo que, em grande parte, nos queixamos demasiado e sem razão. Portanto, volto a dizer que isso foi uma das maiores mercês que o Senhor me tem concedido, o que me tem aproveitado muitíssimo, tanto para perder o medo de todas as tribulações e provações desta vida, como para esforçar-me a suportá-las com paciência e resignação, dando por isso muitas graças ao Senhor, que me livrou assim, ao que agora me parece, de penas e sofrimentos imensamente maiores, tão horríveis e perpétuos. De então para cá, como digo, o pior deste mundo parece-me fácil e aprazível, em comparação com o dolorosíssimo momento que no Inferno eu vi e padeci. Tendo lido muitas vezes livros que dão algumas ideias aproximadas das penas do Inferno, espanta-me deveras como não as temia suficientemente, preocupando-me muito pouco com a sua verdadeira natureza e realidade. Deste modo, sinto imensa pena das almas que se podem condenar eternamente - dos protestantes em especial, porque já eram, pelo Batismo, membros da Igreja -, obtendo assim grande zelo de salvar almas, de tal modo me parece certo que, para livrar uma só alma de tão gravíssimos e eternos tormentos, padeceria muitas vidas e mortes de boa vontade. "

 

226 . 2 - Aparição de Nossa Senhora da Boa Saúde - Índia

               A Basílica de Nossa Senhora da Boa Saúde, também conhecida como Santuário de Nossa Senhora de Vailankanni, é um Santuário mariano localizado na pequena cidade de Velankanni em Tamil Nadu, no sul da Índia. A Basílica Católica Romana de Rito Latino é dedicada a Nossa Senhora da Boa Saúde. A devoção a Nossa Senhora da Boa Saúde de Velankanni remonta a meados do século XVI e é atribuída a três milagres distintos nos locais em torno da Basílica: A aparição da Bem-aventurada Maria e do Menino Jesus a um pastor adormecido, a cura de um vendedor de leitelho deficiente e o resgate de marinheiros portugueses de uma tempestade marítima mortal. Esses relatos são considerados conhecimentos orais, aparentemente sem nenhum registro escrito ou fontes comprovadas para apoiá-los. Inicialmente, apenas uma capela simples e modesta foi construída pelos marinheiros portugueses que desembarcaram em segurança. Mais de 500 anos depois, o festival e a celebração de nove dias ainda são observados e atraem quase 5 milhões de peregrinos a cada ano. O Santuário de Nossa Senhora de Vailankanni é também conhecido como "a Lourdes do Oriente" porque é um dos centros de peregrinação mais frequentados da Índia.

               A primeira aparição mariana teria ocorrido em maio de 1570, quando um pastor local estava entregando leite em uma casa próxima. No caminho ele conheceu uma linda mulher segurando uma criança, que pediu um pouco de leite para o pequeno. Depois de dar-lhe o leite, ele continuou seu caminho e, ao fazer a entrega, descobriu que a jarra agora estava completamente cheia de leite fresco. Um pequeno santuário foi construído próximo ao local onde o menino encontrou a mulher, local que passou a se chamar Matha Kulam, que significa Lago de Nossa Senhora.

               A segunda aparição mariana teria acontecido em 1597, não muito longe de Matha Kulam. Uma bela mulher com um menino nos braços apareceu a um menino aleijado vendendo leitelho. O menino pediu um pouco de leitelho e, depois que ele bebeu, a mulher pediu ao menino que vendia leitelho para visitar um senhor na cidade vizinha e pedir-lhe que construísse uma capela em sua homenagem naquele local. O menino saiu rapidamente e percebeu que não era mais coxo. Rapidamente foi construída uma pequena capela de palha em homenagem a Nossa Senhora da Saúde, chamada em Tamil de "Arokia Matha".

               O terceiro incidente ocorreu quando um navio português que navegava de Macau para o Sri Lanka foi apanhado por uma tempestade na baía de Bengala. Eles invocaram a ajuda da Santíssima Virgem com o título de "Estrela do Mar". A tempestade diminuiu e os 150 homens a bordo foram salvos. Era 8 de setembro, festa da Natividade de Maria. Em ação de graças, os marinheiros reconstruíram o Santuário de Nossa Senhora da Boa Saúde, e continuaram a aumentá-lo sempre que suas viagens os trouxeram para a área. O Santuário, que começou como uma capela de palha em meados do século XVI, tornou-se uma igreja paroquial em 1771, quando os católicos na Índia estavam sob perseguição dos holandeses. Mais tarde, em 1962, foi concedido um status especial de Basílica Menor pelo Papa João XXIII. O Santuário de Vailankanni foi elevado à categoria de 'Basílica Menor' e fundido com a Basílica de Santa Maria Maior em Roma em 3 de novembro de 1962 pelo Papa João XXIII.

 

INÍCIO DO CALENDÁRIO GREGORIANO

 

227º - Gregório XIII - 1572 – 1585

               Papa Gregório XIII (7 de janeiro de 1502 - 10 de abril de 1585), nascido Ugo Boncompagni, era o chefe da Igreja Católica e regente dos Estados Papais a partir de 13 de maio de 1572 até sua morte em 1585. Ele é mais conhecido por comissionamento e ser o homônimo do calendário gregoriano, que continua sendo o calendário civil internacionalmente aceito até hoje. Uma vez na presidência de São Pedro, as preocupações mundanas de Gregório XIII se tornaram secundárias e ele se dedicou à reforma da Igreja Católica. Ele se comprometeu a colocar em prática as recomendações do Concílio de Trento. Não permitiu exceções para os Cardeais à regra de que os Bispos deveriam residir em suas casas e designou um comitê para atualizar o Index Librorum Prohibitorum. Ele era o Patrono de uma edição nova e bastante aprimorada do Corpus juris canonici. Em uma época de considerável centralização do poder, Gregório XIII aboliu os Consistórios dos Cardeais, substituindo-os por faculdades e nomeando tarefas específicas para essas faculdades trabalharem. Ele era conhecido por ter uma feroz independência; alguns confidentes notaram que ele não aceitava intervenções nem buscava conselhos. O poder do Papado aumentou sob ele, enquanto a influência e o poder dos Cardeais diminuíram substancialmente. Também digno de nota é o estabelecimento das Carmelitas Descalças, uma ramificação da Ordem Carmelita, como uma unidade ou "província" distinta na primeira pelo decreto "Pia considere" de 22 de junho de 1580, terminando um período de grande dificuldade e permitindo que o primeiro se torne uma ordem religiosa significativa na Igreja Católica.

O Calendário Gregoriano

               O Papa Gregório XIII é mais conhecido por ter instituído o calendário depois de ter sido inicialmente criado pelo médico astrônomo Luigi Giglio e com a ajuda do padre astrônomo jesuíta Cristóvão Clávio, que fez as modificações finais. O motivo da reforma foi que a duração média do ano no Calendário juliano era muito longa - pois tratava todos os anos 365 dias, 6 horas de duração, enquanto os cálculos mostraram que a duração média real de um ano é um pouco menor (365 dias, 5 horas e 49 minutos). Como resultado, a data do equinócio vernal caiu lentamente (ao longo de 13 séculos) para 10 de março, enquanto o cálculo da data da Páscoa ainda segue a data tradicional de 21 de março. Isso foi verificado pelas observações de Clavius, e o novo calendário foi instituído quando Gregório decretou, pela bula Papal Inter gravíssimas de 24 de fevereiro de 1582, que o dia seguinte à quinta-feira, 4 de outubro de 1582, não seria sexta-feira, 5 de outubro, mas sexta-feira, 15 de outubro de 1582. O novo calendário substituiu devidamente o calendário juliano em uso desde 45 a.C., e desde então entrou em uso quase universal. Por causa do envolvimento de Gregório, o calendário juliano reformado passou a ser conhecido como calendário gregoriano. A transição foi amargamente contestada por grande parte da população, que temia que fosse uma tentativa dos proprietários de enganá-los com uma semana e meia de aluguel. No entanto, os países católicos da Espanha, Portugal, Polônia e Itália cumpriram. A França, alguns estados da República Holandesa e vários estados católicos na Alemanha e na Suíça (ambos os países foram divididos religiosamente) seguiram o exemplo em um ano ou dois, a Áustria e a Hungria seguiram em 1587. No entanto, mais de um século se passou antes que a Europa protestante aceitasse o novo calendário. A Dinamarca, os demais estados da República Holandesa e os estados protestantes do Sacro Império Romano-Germânico e Suíça, adotaram a reforma gregoriana em c.1700. Naquela época, o calendário registrava as estações em 11 dias. A Grã-Bretanha e suas colônias americanas adotaram o calendário reformado em 1752, onde quarta-feira, 2 de setembro de 1752, foi imediatamente seguida pela quinta-feira, 14 de setembro de 1752; a eles se juntou a última manifestação protestante, a Suécia, em 1 de março de 1753. O calendário gregoriano não foi aceito na cristandade oriental por várias centenas de anos, somente como calendário civil.

ERRO NO CALENDÁRIO GREGORIANO

               Os Evangelhos não foram escritos visando relatos cronísticos e biográficos, mas tão somente propagar o eco da pregação Apostólica da mensagem salvífica. Mas, as especulações de pesquisadores e até mesmo de falsos intelectuais surgem a todo o momento a indagar quando verdadeiramente teria nascido Jesus. Para estabelecer tão magna data, tomou-se por base Mt 2, 16, narrando a morte dos inocentes da Judeia, a mando de Herodes, fato que daria o nascimento de Jesus dois anos antes, contando-se que Herodes morreu no ano de 749/750 de Roma, que compreenderia quatro anos antes a.C., não d.C. A visitação dos magos ou sábios, estudiosos dos astros que entenderam o sinal luminoso como “aviso” do nascimento de um grande rei. Segundo Kleper, foi o resultado da conjugação dos planetas Júpiter e Saturno que teria acontecido em 747 de Roma, portanto, 7.a.C.

               O abade Diunysus Exiguus, chamado “o pequeno” calculou que Jesus iniciou sua vida pública no 15o ano do reinado de Tibério César, contando mais ou menos trinta anos de idade (Os textos sagrados assim não o mencionam), logo fixa que Jesus nascera no ano 753 de Roma, sendo o “ano 1” da era cristã.

               Mas, consideram os historiados que Herodes morreu no ano de 749/750 de Roma, ou seja 4 a 6 anos antes da era cristã, quando vigorava, no Império Romano e seus domínios o Calendário Juliano, dado em Roma no ano de 46 a.C. Calendário este que vigorou até o Pontificado de Gregório XII que acatou as orientações do astrônomo bávaro Chrtistoforus Clavius, publicando a bula Papal “Inter gravíssimas” editada em 24.02.1582 que foi imediatamente acatada pelo mundo católico, hoje, pelo resto do mundo.

               Acontece, todavia, que Christoforus aceitara o cálculo de Dionísio sob o ponto de vista que Herodes morrera em 749/750 de Roma, não objetando que equivaleria a 4, talvez 6 anos antes do nascimento de Jesus. Foi um cálculo precipitado, deixando de lado outros elementos fornecidos pelos Evangelhos. De fato, Herodes morreu quatro anos antes da data tida como o nascimento de Jesus, donde se vê que Jesus nascera, sim, em data de 6 anos antes do que é dito. Ninguém questionava tais cálculos, cabendo a Pio XII que pontificou entre 1939 à 1958, vir a público e afirmar que houve, sim, um erro de cálculo em Dionísio, e, assim, Jesus teria nascido seis anos antes da data fixada pelo Calendário Gregoriano.

Quanto ao dia do nascimento de Jesus: “Amigos, aqui, na noite do dia 25 das encênias, da Virgem nasceu Jesus Cristo, O Emanuel, o Verbo de Deus feito carne por amor do homem: Eu que vos falo.” (Encênias é a festa das luzes realizada sempre no final de cada ano Judaico, que corresponde ao mês de dezembro do calendário Gregoriano)

E completa: “Vinde sobre o feno. Ouvi: Estando a Mãe já perto do tempo de dar a luz, foi, por ordem de César Augusto, feito um edito pelo delegado Imperial Públio Sulpício Quirino, quando era governador da Palestina Sêncio Saturnino. O edito era: que se fizesse o recenseamento de todos os habitantes do Império. Aqueles que não fossem escravos deviam ir para os seus lugares de origem, para se inscreverem nos registros do Império. José, esposo da Mãe, era da estirpe de Davi, e de Davi era a Mãe. Obedecendo por isso ao edito, deixaram Nazaré para virem até Belém, berço da estirpe real.” (Maria Valtorta-Vol 1)

 

227 . 1 - Aparição de Nossa Senhora do Fetal – 1580 – Portugal – Batalha -Reguendo do Fetal

               A história começa com uma pastorinha que apascentava o seu rebanho pelas encostas áridas e ermas do Reguengo (Terra do Rei), num ano de grande e apertada estiagem, quando andava num dos cabeços, onde agora se situa o Santuário de Nossa Senhora do Fetal, cheia de fome e as suas ovelhinhas só com pele e osso, por não haver quaisquer verduras para comerem, encheu-se de tristeza e começou a chorar. Ao erguer do regaço o rosto magoado e com os olhos inundados de lágrimas, viu com surpresa no meio de um tufo de fetos, uma estranha Senhora que travou com ela o seguinte diálogo: "Porque choras tu minha menina?” 

-Tenho fome.

“Então vai pedir pão à tua mãe.”

- Já lhe pedi, mas ela não o tem.

Vai a tua casa, vai e diz-lhe que dê pão. Diz-lhe que foi uma mulher que te mandou, porque há pão lá em casa.”

               Obedecendo a pastorinha foi a casa, tendo então verificado que a arca se encontrava inexplicavelmente cheia de saboroso e fresco pão, que mais parecia ter sido feito por mãos de anjos do que por mão de hábil padeiro. Voltando ao local, onde a Senhora lhe tinha aparecido, já satisfeita e alegre, pôde voltar a dialogar, recebendo a seguinte mensagem: "Diz à gente do teu lugar que eu sou a Mãe de Deus e, quero que neste sítio seja edificada uma ermida para ser louvada e venerada.”

               Ao ser espalhada a fama do acontecimento, começaram a acorrer grandes multidões, que acharam naquele sítio, uma pequenina e Misteriosa Imagem de Nossa Senhora e, junto dela uma fonte miraculosa, em cujas águas começaram a alcançar Graças do Céu. Então, o povo começou a construção da ermita pedida por Maria, hoje denominada: Santuário de Nossa Senhora do Fetal. A Festa em Honra de Nossa Senhora do Fetal realiza-se no mês de Outubro.

 

227 . 2 - São Camilo de Léllis

               São Camilo de Léllis (Bucchianico, 25 de maio de 1550 — Roma, 14 de julho de 1614) foi um religioso italiano, fundador da Ordem dos Ministros dos Enfermos (Camilianos). É venerado como Santo da Igreja Católica e é considerado protetor dos enfermos e dos hospitais. Pertencente de uma nobre e tradicional família, Camilo de Léllis foi militar e pelo seu caráter, expulso da tropa. Viciado em jogo, levava uma vida profana e decadente. Perdeu todos os seus bens. No momento mais melancólico de sua vida, em uma situação de mendicância, Camilo foi tocado pela graça divina, arrependendo-se de todos os seus pecados, passando a dedicar sua vida a servir, por espírito de caridade, aos doentes pobres em hospitais. E diante de tanta dedicação, fundou a "Companhia dos Servidores dos Enfermos", conhecidos como Camilianos. E não é por menos que tornou-se patrono dos enfermos e dos hospitais.

               Seu sobrenome remonta à história da igreja, época do Bispo Teodoro de Léllis. Todavia, Camilo de Léllis fez a própria história e deixou sua fé e sua dedicação aos enfermos disseminadas por todo o mundo. São Camilo era italiano dos Abruzos, mais precisamente da localidade de Bucchianico. Em 1550, ano de seu nascimento, sua família carregava no sangue virtude, coragem e brio dos que lutaram nas Cruzadas. Seu nascimento coroou o casamento de tantos anos da senhora Camila, a mãe, que até os 60 anos de idade não tinha conseguido dar um herdeiro ao esposo João.

               Foi com 17 anos que Camilo alistou-se como voluntário no exército da República de Veneza. Naquela época, pôde conviver com o drama dos enfermos que agonizavam diante de várias doenças. Foi dessa época também que Camilo passou a viver com uma dolorosa úlcera no pé, que o acompanhou até o último dia de vida. Nesse período, também sofreu a perda do pai e sua vida enveredou-se para os prazeres mundanos, como o da jogatina.  A vida de Camilo mudou completamente. Sofreu diante da falta de condições financeiras e de saúde. Doente, não conseguiu local para internar-se, o que o fez partir para Roma, pedindo auxílio no Hospital Santiago, justamente para tratar da chaga no pé direito. Camilo não tinha dinheiro para pagar o tratamento e ofereceu-se para trabalhos de servente e de enfermeiro. Mal cicatrizada a ferida, Camilo, sem nenhum recurso financeiro, soube que o país recrutava voluntários para combater os turcos do Império Otomano, em frequente conflito com Veneza. E lá foi ele. Não parou tão cedo. Em 1573, quase restabelecido economicamente, Camilo, mais uma vez, rendeu-se aos prazeres mundanos e atirou-se aos jogos. Perdeu tudo, reduzido à miséria. Retornou a Nápoles e prometeu se fazer religioso franciscano. Um ano depois, Camilo esqueceu-se do voto que fizera de se tornar religioso franciscano e mergulhou novamente no jogo. O jogo e a bebida tornaram-se vícios em sua vida. Ficou novamente na miséria. Partiu para Veneza. Passou frio e fome. Não tinha onde morar, nem dormir. Em uma das derrotas no jogo, deu como pagamento a própria camisa. Depois de muito perambular, conseguiu abrigo no convento dos capuchinhos, momento em que lembrou do voto de tornar-se religioso. Converteu-se realmente.

               Camilo retornou ao Hospital Santiago, desta vez como mestre da casa. Apesar de doente, tratou dos enfermos como de si. Em 1581, com a saúde precária, decide tratar dos doentes gratuitamente. Na época, Camilo foi levado a agir assim diante da exploração, desonestidade e falta de escrúpulos dos médicos para com os doentes. Em 1582, Camilo teve a primeira inspiração de instituir uma companhia de homens piedosos que aceitassem, generosamente, a missão de socorrer os pobres enfermos, sem preocupação de recompensa. O Papa Sisto V aprovou os regulamentos da companhia em 18 de março de 1586. Aos 32 anos voltou aos estudos sob orientação de São Filipe Néri, sendo ordenado Sacerdote aos 34 anos. A sua companhia rapidamente se distinguiu pela caridade no tratamento de doentes, em 21 de setembro de 1591, o Papa Gregório XIV a reconheceu como ordem religiosa. Em 8 de dezembro de 1591, Camilo e seus companheiros fizeram a sua profissão de fé, incluindo um quarto voto de dedicação aos doentes, ainda que com risco de sua própria vida. Na guerra que logo em seguida houve na Hungria, os camilianos trabalharam como primeira unidade médica de campo, cuidando dos feridos. Não bastou a Camilo tomar consigo apenas bons enfermeiros e alguns até médicos, os doentes careciam também de assistência religiosa. É evidente que a alma bem cuidada dispõe melhor o corpo para suportar os sofrimentos e sobrepor-se à doença. Vale destacar que antes de ser Santo, Camilo não tinha qualquer ligação de fé no Senhor.

               Segundo relato de um companheiro, Camilo contemplava nos doentes, com tão sentida emoção, a pessoa de Cristo que, muitas vezes, quando lhes dava de comer, pensando serem outros cristos, chegava a pedir-lhes a graça e o perdão dos pecados. Mantinha-se diante deles com tanto respeito, como se estivesse realmente na presença do Senhor. De nada falava com mais frequência e com mais fervor do que da Santa caridade. O seu desejo era imprimi-la no coração de todos os homens". Muito doente, Camilo renunciou em 1607 ao cargo de Superior Geral de sua Ordem Religiosa. Faleceu em Roma aos 14 de julho de 1614. Sua festa é celebrada aos 14 de julho, data de sua morte. Nos primeiros dias de julho de 1614, já no seu leito de morte, recebeu a última comunhão e deixou as seguintes recomendações: "Observai bem as regras. Haja entre vós uma grande união e muito amor. Amai, e muito, a nossa Ordem, e dedicai-vos ao apostolado dos enfermos. Trabalhai com muita alegria nesta vinha do Senhor. Se Deus me levar para o Céu, vos hei de ajudar muito de lá. As perseguições que sofreu nossa obra vieram do ódio que o demônio tem ao ver quantas almas lhe escaparam pelas garras. E já que Deus se serviu de mim, vilíssimo pecador para fundar miraculosamente esta Ordem, Ele há de propagá-las para o bem de muitas almas pelo mundo inteiro. Meus padres e queridos irmãos: eu peço misericórdia a Deus e perdão ao padre Geral aqui presente e a todos vós, de todo mau exemplo que eu pudesse ter dado, talvez mais pela minha ignorância, do que pela má vontade. Enfim, eu vos concedo da parte de Deus, como vosso Pai, em nome da Santíssima Trindade e da bem-aventurada Virgem Maria, a vós aqui presentes, aos ausentes e aos futuros, mil bênçãos". Seu féretro foi marcado por muita comoção e acompanhado por uma multidão. Mas um milagre era visto naquele dia: enquanto preparavam o corpo de Camilo para o funeral, os médicos, estarrecidos, notaram que a chaga havia desaparecido. Em 1746, durante uma festa dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, o Papa Bento XIV, no dia 29 de junho, declara Santo o nome de Camilo de Lellis. Em 1886, o Papa Leão XIII declarou São Camilo, juntamente com São João de Deus, Celestes protetores de todos os enfermos e hospitais do mundo católico.

 

228º - Sisto V - 1585 - 1590

28 de setembro de 1586: Domenico Fontana terminou com sucesso a reconstrução do Obelisco do Vaticano em seu local atual na Praça de São Pedro. Aclamado como uma grande conquista técnica de seu tempo.

               Nascido na cidade italiana de Grottammare no dia 15 de dezembro de 1521, Felice Peretti vivenciou um momento de grandes novidades para a sociedade cristã europeia. O século XVI ofereceu grandes renovações ao homem na forma de encarar o mundo. A descoberta de um novo continente, os ideais da Renascença e o questionamento à Igreja Católica, tudo isso contribuiu para o teor de uma nova era. Felice Peretti conviveu com todos esses elementos, interagindo diretamente com eles. Como homem religioso, foi membro dos tribunais da Inquisição, atuando com determinação e severidade, o que o levou a ser conselheiro inquisitorial do Papa Pio IV em Veneza. Felice Peretti construiu sua reputação de religioso ativo e determinado, um inquisidor severo e defensor dos dogmas da Igreja. Foi um perseguidor implacável dos malfeitores, das prostitutas, dos menores ladrões e de outros grupos minoritários e fracos na sociedade. Seu perfil sério e determinado o tornou o preferido para suceder o Papa Gregório XIII. Via-se em Felice o salvador da Itália que havia sido invadida e ocupada por bandidos no Pontificado anterior. Assim, Felice Peretti foi eleito Papa no dia 24 de abril de 1585 e assumiu o nome de Sisto V. Não se preocupou apenas com o território italiano, mas também com a Inglaterra, onde tentou derrubar a rainha Isabel I. A Inglaterra abandonara a Igreja Católica desde o reinado de Henrique VIII. Este rompeu com o Papado de Roma para se tornar o líder máximo do cristianismo em seu país, desde então a Inglaterra se tornou Anglicana. Embora a própria filha de Henrique VIII, Lady Mary, tenha tentado reaver o catolicismo e empreendido uma grande perseguição aos chamados reformadores luteranos, ela não obteve êxito. A Inglaterra continuou independente em relação ao Papado romano e isto enfurecia muito o severo Papa Sisto V. Este tentou reunir as nações cristãs europeias para restabelecer o catolicismo na Inglaterra, seguindo um modelo das antigas Cruzadas, porém não foi bem sucedido. Sisto V percebeu que a condição da Inglaterra não era um interesse direto das demais nações. Ainda assim, Sisto V se esforçou para convencer o rei da Espanha, Felipe II, a iniciar uma guerra contra a Inglaterra. O Papa fez de tudo para demonstrar que havia razão para uma guerra. Felipe II recusou, inicialmente. Entretanto o rei espanhol resolveu enviar sua Armada em 1588 em um ataque contra a Inglaterra. A derrota espanhola foi massacrante e, por sorte, o próprio Papa Sisto V conseguiu sobreviver. Sisto viveria só dois anos mais, seu Papado foi, desde seu início, intolerante, severo e perseguidor de diferentes concepções religiosas ou de práticas que ferissem os ditos dogmas católicos. Sisto V mandou construir uma estátua em sua própria homenagem no Capitólio, pois sabia que sua reputação de religioso severo desagradava o povo e este não lhe prestaria homenagem após sua morte. Tão certo estava que sua estátua foi logo derrubada pelos romanos. Sisto V permaneceu apenas cinco anos como Supremo Pontífice da Igreja Católica, mas foi o suficiente para deixar seu nome marcado na história. Severo defensor dos ideais católicos, faleceu no dia 27 de agosto de 1590, aos 68 anos de idade.

 

229º - Urbano VII - 1590

               Urbano VII, nascido Giovanni Battista Castagna (Roma, 4 de agosto de 1521 – Roma, 27 de setembro de 1590), foi Papa da Igreja Católica de 15 de setembro de 1590 a 27 de setembro do mesmo ano. O seu Pontificado, que durou apenas doze dias, é o mais curto da história da Igreja Católica. Em 1590, o Cardeal Castagna participou do conclave que o elegeu Pontífice. É certo que a sua eleição para o Papado foi amplamente apoiada pela facção espanhola, dando continuidade a uma tradição que agora tendia a preferir representantes da nobreza curial em vez de membros de famílias romanas poderosas para a eleição ao trono de Pedro. Foi escolhido como sucessor de Sisto V em 15 de setembro de 1590, propondo-se desde o início como fiel executor dos decretos tridentinos e continuador da política de restauração inaugurada pelo seu antecessor. No dia 18 de setembro adoeceu com malária, o que o levou à morte pouco antes da meia-noite do dia 27 de setembro do mesmo mês da sua eleição, ainda antes de ter sido solenemente coroado. Após sua morte, um túmulo foi criado para ele na Basílica de São Pedro, no Vaticano, com uma oração fúnebre proferida por Pompeo Ugonio. Em 21 de setembro de 1606, seus restos mortais foram transferidos para a igreja romana de Santa Maria sopra Minerva, onde estava sediada a Confraternita dell'Annunziata, à qual o próprio Urbano VII, em suas disposições testamentárias, havia deixado 30.000 escudos de seu patrimônio pessoal.

 

230º - Gregório XIV - 1590 - 1591

               Papa da Igreja Católica Romana nascido em Somma Lombardo, Varese, a norte de Milão, na Lombardia italiana, Noccolô Sfondrati eleito Papa em 8 de dezembro, dois meses e meio após a morte de Urbano VII, adotou o nome de Gregório, que significa: o que vigia. Filho de um senador milanês, optou pela carreira eclesiástica e estudou teologia nas universidades de Perúgia e Pádua e, ordenado padre foi logo nomeado Bispo de Cremona em1560. Participou do Concílio de Trento (1561-1563) e tornou-se Cardeal de Santa Cecília (1583) sob Gregório XIII. Homem honesto e de natureza ascética, foi escolhido para suceder o Papa Urbano VII, mas em sua boa fé, foi enganado por conselheiros pouco competentes. Confirmou o direito de asilo nas embaixadas perto da Santa Sé, mas devido às suas consequências no campo jurídico durante pelo menos dois séculos, a bula promulgada por ele estendia o direito de asilo de forma tão ampla a ponto de suscitar a oposição da autoridade política. Em seu curto Pontificado destinou imensas somas à Liga Católica na França, apoiando a luta contra o rei Henrique IV, excomungado por ter entrado em acordo com os protestantes. Veio a falecer em Roma, apenas dez meses e oito dias após iniciar seu Papado e foi substituído por Inocêncio IX.

 

231º - Inocêncio IX - 1591

               Papa Igreja cristã Romana, nascido em Bolonha, Giovanni A. Facchinetti eleito em 3 de novembro de 1591, como sucessor de Gregório XIV, em cujo brevíssimo Pontificado conseguiu conter uma terrível epidemia de peste e combateu a criminalidade. Devido ao seu estado de saúde foi eleito propositalmente pelos Cardeais devido sua velhice e por suas simpatias com a Espanha. Um forte grupo antiespanhol havia-se formado no Sacro Colégio, que no entanto não ousava manifestar sua atitude. Para ganhar tempo, decidiram eleger ao trono de São Pedro um velho enfermo, enquanto se resolvia os problemas da política de seu predecessor em relação a França. Por sua decisão o dia 12/09 passou a ser dedicado a exaltar o doce nome de Maria para que não se duvidasse jamais que foi, sob sua inspiração, que se conseguiu o extraordinário triunfo das armas cristãs contra as tropas turcas que sitiavam, cruelmente, a cidade de Viena. Morreu subitamente em 30 de dezembro de 1591, em Roma.

 

232º - Clemente VIII - 1592 - 1605

               O Papa Clemente VIII (24 de fevereiro de 1536 - 3 de março de 1605), nascido Ippolito Aldobrandini, foi Papa da Igreja Católica e governante dos Estados Papais de 2 de fevereiro de 1592 até a sua morte em 1605. Nascido em Fano, Itália para uma importante família florentina, ele inicialmente se destacou como advogado canônico antes de ser Cardeal-Sacerdote em 1585. Em 1592, foi eleito Papa e recebeu o nome de Clemente. Durante seu Papado, ele efetuou a reconciliação de Henrique IV da França à fé católica e foi fundamental na criação de uma aliança de nações cristãs para se opor ao Império Otomano na chamada Guerra Longa. Ele também julgou com êxito uma amarga disputa entre dominicanos e jesuítas sobre a questão da graça eficaz e do livre arbítrio. Em 1600, presidiu um jubileu que viu muitas peregrinações a Roma. Ele teve pouca pena de seus oponentes, presidindo o julgamento e a execução de Giordano Bruno e implementar medidas estritas contra residentes judeus dos Estados Papais. Ele pode ter sido o primeiro Papa a beber café. Clemente VIII morreu aos 69 anos em 1605 e seus restos mortais agora estão na Basílica de Santa Maria Maior. Em novembro de 1592, ele publicou a Clementine Vulgate. Foi publicado com o Bull Cum Sacrorum (9 de novembro de 1592), que afirmava que todas as edições subsequentes devem ser equiparadas a esta, nenhuma palavra do texto pode ser alterada nem leituras variantes impressas na margem. Esta nova versão oficial da Vulgata, conhecida como Clementine Vulgate" ou Vulgata Sixto-Clementine, tornou-se a Bíblia oficial da Igreja Católica.

               Durante o jubileu de 1600, três milhões de peregrinos visitaram os lugares sagrados. O Sínodo de Brest foi realizado 1595 na República das Duas Nações, pelo qual uma grande parte do Ruthenian clero e as pessoas se reuniram para Roma. Clemente VIII canonizou o Jacinto de Cracóvia (17 de abril de 1594), Juliano de Cuenca (18 de outubro de 1594) e Raimundo de Penaforte (1601). Ele beatificou 205 indivíduos, 200 deles mártires de grupo; indivíduos notáveis ​​que ele nomeou como abençoado incluiu Carlos Borromeu.

               Em 1595, Clemente VIII iniciou uma aliança de potências cristãs europeias para participar da guerra com o Império Otomano, travado principalmente na Hungria, que ficaria conhecida como "Guerra Longa" e continuaria além da vida de Clemente. Facilitado pelo Papa, um tratado de aliança foi assinado em Praga pelo Imperador Rudolfo II e Sigismund Báthory da Transilvânia. Aarão, o Tirano, da Moldávia, e Michael, o Bravo da Valáquia, juntaram-se à aliança no final daquele ano. O próprio Clemente VIII prestou ao Imperador assistência valiosa em homens e dinheiro. Clemente VIII foi atingido pela gota e foi forçado a passar grande parte de sua vida posterior imobilizado na cama. De repente, ele ficou doente em 10 de fevereiro de 1605 e sua condição deteriorou-se rapidamente nas próximas semanas. Ele morreu em 3 de março de 1605, por volta da meia-noite, deixando uma reputação de prudência, munificência, crueldade e capacidade de negociar. Clemente foi enterrado na Basílica de São Pedro, e mais tarde o Papa Paulo V (1605–21) mandou construir um mausoléu na Capela Borghese de Santa Maria Maggiore, para onde os restos foram transferidos em 1646. Seu reinado é especialmente distinguido pelo número e beleza de suas medalhas. Clemente VIII fundou o Collegio Clementino para a educação dos filhos das classes mais ricas e aumentou o número de faculdades nacionais em Roma, abrindo o Pontifícia Universidade Escocesa para o treinamento de missionários na Escócia.

 

232 . 1 - Aparição de Nossa Senhora do Bom Sucesso – Quito -Equador

               A origem da Imagem de Nossa Senhora do Bom Sucesso foi assim: Era meia-noite no Mosteiro Real da Imaculada Conceição, de Quito, Equador, o silêncio foi rompido pelas doze badaladas do relógio que assinalaram o início do dia 2 de fevereiro de 1594. Pouco depois entrava na capela a jovem priora, Madre Mariana de Jesus Torres. Com o coração repleto de amarguras, vinha implorar ao Divino Redentor, por intercessão de sua Mãe Santíssima, a solução dos problemas que dificultavam a evangelização naquelas terras: maus exemplos dados por alguns Sacerdotes e religiosos indignos, injustificáveis desmandos das autoridades eclesiásticas e civis, tudo agravado por manifestações de desobediência no seu próprio convento. Prosternada com a fronte no duro piso de pedra, orava com fervor, quando uma doce voz interrompeu sua prece, chamando-a pelo nome:

Mariana, minha filha!

Levantou-se logo e viu diante de si uma belíssima Senhora, resplendente de luz, que sustinha no braço esquerdo o Menino Jesus e empunhava na mão direita um báculo de ouro, adornado de pedras preciosas.

— Formosa Senhora, quem sois e o que desejais? – perguntou ela, transbordante de felicidade.

Sou Maria do Bom Sucesso, a Rainha do Céu e da terra. Vim consolar teu coração aflito. Empunho no braço direito o báculo, pois quero eu mesma governar este meu mosteiro, como Priora e Madre.

               Durou cerca de duas horas o colóquio da humilde freira com a celestial Visitante. Quando esta Se retirou, apenas a bruxuleante luz da candeia iluminava a capela, mas Madre Mariana sentia-se tão fortalecida quanto desejosa de lutar e sofrer por amor a Nosso Senhor Jesus Cristo.

               E não lhe faltaram sofrimentos nem provações! Cinco anos depois, na madrugada de 16 de janeiro de 1599, apareceu-lhe de novo a Virgem Santíssima para reconfortá-la. Comunicou-lhe os desígnios de Deus sobre aquele mosteiro, fez proféticas revelações a respeito do futuro do Equador e das perseguições que ali sofreriam as comunidades religiosas, e acrescentou:

— Por isto quer meu Filho Santíssimo que mandes executar uma imagem minha, tal como me vês, e a disponhas sobre a estala da priora, para daí eu governar meu mosteiro. Colocarás em minha mão direita o báculo e as chaves da clausura, em sinal de propriedade e autoridade; na esquerda porás o Menino Jesus: primeiro, a fim de que os mortais entendam o quanto sou poderosa para aplacar a justiça divina e alcançar perdão para todo pecador que a mim recorra com coração contrito; em segundo lugar, para minhas filhas compreenderem que lhes mostro e apresento meu Filho Santíssimo como modelo de perfeição religiosa. Venham elas a mim, eu as conduzirei a Ele.

— Linda Senhora, vossa formosura me encanta. Oh, se me fosse dado deixar a desditosa terra e elevar-me convosco ao Céu! Mas permita-me dizer que nenhuma pessoa humana, mesmo a mais entendida na arte da escultura, poderá esculpir em madeira vossa encantadora imagem, tal como me pedis. Enviai para isto o meu Seráfico Pai, para ele executar essa obra em madeira seleta, tendo como oficiais os Anjos do Céu, pois eu não saberei me explicar, e menos ainda saberei informar vossa estatura.

— Nada te atemorize, minha filha – replicou a Virgem Santa –, atenderei ao teu pedido. Quanto à minha altura, mede-a tu mesma com o seráfico cordão que trazes à cintura.

— Formosa Senhora, minha Mãe querida, como me atreveria eu a tocar vossa fronte divina, quando nem os espíritos angélicos podem fazê- lo? Vós sois a Arca viva da Aliança entre os pobres mortais e Deus; e se Oza caiu morto só pelo fato de ter sustentado a Arca santa para evitar que ela tombasse ao solo (cf. II Sm 6, 6-7), quanto mais eu, pobre e débil mulher.

— Alegra-me teu humilde temor e vejo teu ardente amor à tua Mãe do Céu. Traze e põe em minha mão direita o teu cordão e toca em meus pés a outra extremidade.

Cheia de júbilo, amor e reverência, Madre Mariana fez o que lhe ordenava Maria Santíssima, e esta prosseguiu:

— Aí está, minha filha, a medida de tua Mãe do Céu. Entrega-a ao meu servo Francisco del Castillo, explicando-lhe minhas feições e minha postura; ele trabalhará exteriormente minha imagem, pois tem consciência delicada e observa com exatidão os mandamentos de Deus e da Igreja; nenhum outro escultor será digno desta graça. Ajuda-o com tuas orações e teu humilde sofrimento.

               Em outra aparição, na mesma hora das anteriores, isto é, pouco após as doze badaladas da meia-noite, a Virgem Mãe de Deus prenunciou uma época calamitosa para a Igreja no Equador, tempos nos quais quase não se encontraria inocência nas crianças, nem pudor nas mulheres, e acrescentou:

— Com isto sofrerão tuas sucessoras; elas aplacarão a ira divina, recorrendo a mim sob a invocação do Bom Sucesso, cuja imagem te peço e ordeno que mandes executar para consolo e sustento de meu mosteiro e dos fiéis daqueles tempos. Esta devoção será o para-raios colocado entre a justiça divina e o mundo prevaricador. Hoje mesmo, quando amanhecer, irás ter com o Bispo e lhe dirás que eu te pedi e mandei fazer esculpir minha imagem para ser colocada à testa de minha comunidade, a fim de tomar posse completa daquilo que a tantos títulos me pertence. Ele deverá consagrá-la com o óleo sagrado e pôr-lhe o nome de Maria do Bom Sucesso da Purificação ou Candelária.

E insistiu:

— Agora é preciso que mandes executar com toda presteza a minha santa imagem, tal qual me vês, e te apresses a colocá-la no local por mim indicado.

A humilde religiosa repetiu a mesma tímida objeção feita cinco anos antes:

— Bela Senhora e querida Mãe de minha alma, a insignificante formiguinha que tendes em vossa presença não poderá descrever a nenhum artista vossas belas feições, vossa formosura, nem vossa estatura; não tenho palavras para explicar, e não há na terra ninguém capaz de fazer a obra que me solicitais.

— Nada disto te preocupe, filha querida. A perfeição da obra corre por minha conta. Gabriel, Miguel e Rafael tomarão a seu cargo secretamente a fabricação de minha imagem. Deverás chamar Francisco del Castillo, que entende de arte, e dar-lhe uma sucinta descrição de minhas feições, exatamente como me viste, pois com esta finalidade apareci tantas vezes a ti.

— Quanto à minha estatura, traze o cordão que te cinge e mede-me sem temor, pois a uma Mãe como eu agrada a confiança respeitosa e humilde de suas filhas.

— Rainha do Céu e Mãe querida, eis aqui o cordão para vos medir. Quem o sustentará em vossa formosa fronte, ornada por essa linda coroa, com a qual vos coroou a Santíssima Trindade? Eu não me atrevo a fazê-lo, nem, aliás, conseguiria com minha pequena altura.

— Filha querida, põe na minha mão uma das pontas do cordão e eu o colocarei na minha fronte, enquanto tu encostarás a outra no meu pé direito.

               Nossa Senhora tomou então uma das extremidades do cordão e a encostou em sua fronte, deixando à enlevada monja o encargo de pôr a outra na ponta de seu pé direito. O cordão era um pouco curto, mas esticou-se milagrosamente, como elástico, até atingir a estatura da celestial Dama.

“Hoje mesmo, quando amanhecer, irás ter com o Bispo”, ordenara a Virgem Santíssima. Madre Mariana, porém, antevendo diversos obstáculos, ia adiando o cumprimento da ordem recebida. Doze dias depois, Ela lhe apareceu de novo, resplendente de luz como sempre, mas desta vez silenciosa e olhando-a com amável severidade. Depois de ouvir uma maternal advertência, seguida de explicações que desfizeram todos os seus temores, respondeu a religiosa: — Bela Senhora, justa é vossa repreensão. Peço-Vos perdão e misericórdia, e prometo emendar-me. Hoje mesmo falarei com o Bispo para dar início à execução de vossa imagem. De fato, nesse mesmo dia expôs a Dom Salvador de Ribera a ordem recebida da Rainha do Céu. Este ouviu com atenção o relato da santa priora, pôs à prova sua objetividade, por meio de muitas perguntas capciosas, e, por fim, deu inteira aprovação ao projeto; comprometeu-se inclusive a ajudar em tudo quanto fosse necessário à sua pronta realização. Apressou-se então Madre Mariana em contratar o escultor Francisco del Castillo. Disse-lhe ela: — Como o senhor é, antes de tudo, bom católico, e também hábil escultor, quero confiar-lhe uma obra muito especial, a ser executada com todo esmero: esculpir uma imagem da Virgem Maria, a qual deverá ter feições celestiais, semelhantes às de nossa Santíssima Mãe que está nos Céus em corpo e alma; dar-lhe-ei a medida, pois a estátua precisa ter a estatura exata de nossa celestial Rainha. Francisco del Castillo recebeu essa incumbência como uma insigne graça de Nossa Senhora e recusou categoricamente qualquer pagamento por seus serviços. Gastou vários dias procurando em Quito e nos arredores a melhor madeira, e logo pôs mãos à obra. Trabalhava com tanto amor, e sentia tamanha consolação, que não conseguia conter as lágrimas. Logo surgiram doadores para três importantes peças de ourivesaria: as chaves de prata, a coroa e o báculo. A pedido das freiras, o escultor fazia todo o serviço, não no seu ateliê, mas no coro alto do mosteiro.

               Marcara-se para o dia 2 de fevereiro de 1611 a solene bênção litúrgica da imagem sagrada. Três semanas antes desse prazo, faltava apenas um “pequeno” detalhe: dar ao rosto um colorido digno da face da Santa Virgem das Virgens. Decidiu o mestre del Castillo fazer uma pesquisa à procura das melhores tintas; partiu com esse objetivo, prometendo estar de volta no dia 16 de janeiro para executar a delicada operação, de longe a mais importante de sua obra. Grande era a expectativa das religiosas quando, no alvorecer do dia 16, dirigiam-se à capela para, como de costume, louvar Nossa Senhora com o cântico do Pequeno Ofício. Ao se aproximarem do coro alto, ouviram melodiosas harmonias que as deixaram cheias de emoção. Entraram pressurosas e – oh, maravilha! –, uma luz celeste inundava todo o recinto, no qual ressoavam arrebatadoras vozes de Anjos que cantavam o hino Salve Sancta Parens (Salve, Santa Mãe). Transbordantes de enlevo, contemplavam aquele celestial rosto, do qual partiam raios que iluminavam toda a igreja. Aureolada por essa vivíssima luz, a fisionomia da Santa imagem se mostrava majestosa, serena, doce, amável e atraente, como que convidando suas filhas a se achegarem com confiança e dar-lhe um filial abraço de júbilo e de boas-vindas. O semblante do Menino Jesus exprimia amor e ternura para com aquelas suas esposas tão estimadas por Ele e por sua Mãe. Nesse dia, todas progrediram na vida espiritual. Compreendendo melhor a própria vocação, amavam mais o seu Divino Esposo e se empenhavam no cumprimento exato da regra e dos deveres particulares. Na hora combinada, chegou Francisco de Castillo, feliz por ter encontrado tintas excelentes para dar o acabamento à obra escultural. Sem nada dizer-lhe do ocorrido, Madre Mariana e algumas outras monjas o acompanharam ao coro alto. Impossível descrever a surpresa e a emoção do piedoso artista.

— Madres, que vejo? Esta primorosa imagem não é obra minha! Não sei o que sente o meu coração, mas esta é uma obra angélica. Escultor algum, por mais hábil que seja, jamais poderá sequer imitar tanta perfeição e tão peregrina beleza!

               Isto dizendo, caiu de joelhos aos pés da Santa imagem do Bom Sucesso e desafogou seu coração, deixando jorrar dos olhos lágrimas em superabundância. Levantou-se em seguida e lavrou um documento, declarando sob juramento: primeiro, que aquela imagem do Bom Sucesso não era obra sua, mas dos Anjos, pois não era a escultura deixada por ele seis dias antes no coro superior do mosteiro; segundo, que em sua já longa vida de sessenta e sete anos, nunca havia visto, nem sequer na Espanha, cor de pele igual àquela. Não contente com isto, partiu sem tardança à procura do Bispo Dom Salvador de Ribera, ao qual fez um detalhado relato do acontecido, reafirmando que naquela imagem de Nossa Senhora do Bom Sucesso nada era obra de suas mãos: nem a escultura nem, muito menos ainda, a pintura e a cor da pele. Ficou, assim, bem documentado que a imagem de Nossa Senhora do Bom Sucesso foi de fato executada pelos Anjos. A Virgem do Bom Sucesso cumpriu à risca a promessa feita a Madre Mariana: “A perfeição da obra corre por minha conta. Gabriel, Miguel e Rafael tomarão a seu cargo secretamente a fabricação de minha imagem”.

Profecias sobre o trágico século XX

Quarta aparição - 20 de Janeiro de 1610

            “Porque te faço saber que, do término do século XIX até um pouco mais da metade do século XX, na hoje colônia e então República do Equador, extravasarão as paixões e haverá uma total corrupção de costumes por reinar Satanás nas seitas maçônicas, a qual visará principalmente a infância, a fim de manter com isto a corrupção geral.

            Ai dos meninos deste tempo! Dificilmente receberão o Sacramento do batismo, nem o da confirmação. O Sacramento da confissão, só enquanto permanecerem nas escolas católicas, que o Diabo porá todo empenho em destruir, valendo-se de pessoas autorizadas. O mesmo sucederá com a Sagrada Comunhão.

            Mas, ai! Quanto sinto ao te manifestar que haverá muitos e enormes sacrilégios, públicos e também ocultos, de profanações à sagrada Eucaristia! Muitas vezes, nessa época, os inimigos de Jesus Cristo, instigados pelo demônio, roubarão nas cidades as hóstias consagradas, com o único fim de profanar as eucarísticas espécies! Meu Filho santíssimo se verá jogado ao chão e pisado por pés imundos.

            Quanto ao Sacramento do matrimônio, que simboliza a união de Cristo com a Igreja, será atacado e profanado em toda a extensão da palavra. A maçonaria, que então reinará imporá leis iníquas com o objectivo de extinguir esse Sacramento, facilitando a todos o viverem mal, propagando-se a geração de filhos malnascidos, sem a bênção da Igreja. Irá decaindo rapidamente o espírito cristão, apagar-se-á a luz preciosa da fé até chegar a uma quase total e geral corrupção de costumes. Acrescidos ainda os efeitos da educação laica, isto será motivo para escassearem as vocações Sacerdotais e religiosas. O Sagrado Sacramento da ordem Sacerdotal será ridicularizado, oprimido e desprezado, porque neste sacramento se oprime e conspurca a Igreja de Deus, e a Deus mesmo, representado em seus Sacerdotes.

            O demônio procurará perseguir os ministros do Senhor de todos os modos, e trabalhará com cruel e sutil astúcia para desviá-los do espírito de sua vocação, corrompendo a muitos deles. Estes, que assim escandalizarão o povo cristão, farão recair sobre todos os Sacerdotes o ódio dos maus cristãos e dos inimigos da Igreja Católica Apostólica Romana. Com este aparente triunfo de Satanás, atrairão sofrimentos enormes aos bons pastores da Igreja, e à excelente maioria de bons Sacerdotes e ao Pastor supremo e Vigário de Cristo na terra, que, prisioneiro no Vaticano, derramará secretas e amargas lágrimas na presença de seu Deus e Senhor, pedindo luz, santidade e perfeição para todo o clero do universo, do qual é rei e pai.

            Ademais, nesses infelizes tempos haverá um luxo desenfreado que, por ser laço de pecado para os demais, conquistará inúmeras almas frívolas e as perderá. Quase não se encontrará inocência nas crianças, nem pudor nas mulheres, e, nessa suprema necessidade da Igreja, calar-se-á aquele a quem competia a tempo falar.”

Aparição de Nossa Senhora do bom sucesso a 2 de Fevereiro de 1634

A lamparina que se apaga

               Pronunciadas estas palavras, viu a lamparina que ardia diante de Jesus sacramentado, apagar-se, ficando o altar-mor inteiramente às escuras. Madre Mariana quis levantar-se, deixando a oração, para acender uma vela que substituísse a lamparina. Mas não pôde: estava completamente sem sentidos.

Primeiro significado: a propagação de heresias nos séculos XIX e XX

            “A lamparina que arde diante do altar e que viste apagar-se, possui muitos significados. O primeiro é que no fim do século XIX, avançando por grande parte do século XX, várias heresias se propagarão nestas terras, então, República livre. E com o domínio delas, apagar-se-á nas almas a luz preciosa da fé, pela quase total corrupção dos costumes. Nesse período haverá grandes calamidades físicas e morais, públicas e privadas.

            Segundo significado: O pequeno número de almas que conservará oculto o tesouro da fé e das virtudes sofrerá um cruel, indizível e prolongado martírio. Muitas delas descerão ao túmulo pela violência do sofrimento e serão contadas como mártires que se sacrificaram pela Igreja e pela Pátria.

            Para a libertação da escravidão destas heresias, aqueles a quem o amor misericordioso de meu Filho santíssimo destinará para esta restauração, necessitarão de grande força de vontade, constância, valor e muita confiança em Deus. Para por à prova esta fé e confiança dos justos, haverá ocasiões em que tudo parecerá perdido e paralisado. Será, então, o feliz princípio da restauração completa.

            Terceiro significado: a sensualidade que varrerá o mundo. O terceiro motivo pelo qual se apagou a lamparina é porque nesses tempos estará a atmosfera saturada do espírito de impureza, que a maneira de um mar imundo correrá pelas ruas, praças e logradouros públicos com uma liberdade assombrosa.

            Quase não haverá almas virgens no mundo. A delicada flor da virgindade, tímida e ameaçada de completa destruição, luzirá longe. Refugiando-se nos claustros, encontrará terreno adequado para crescer, desenvolver-se e viver sendo seu aroma o encanto de meu filho santíssimo e o pára-raios da ira divina. Sem a virgindade seria preciso, para purificar estas terras, que chovesse fogo do céu.

            O invejoso e pestífero demônio intentará, em sua maliciosa soberba, introduzir-se nestes jardins fechados dos claustros religiosos para fazer murchar esta formosa e delicada flor. Mas eu o enfrentarei e esmagarei sua cabeça sob meus pés. Mas, ai dor! Haverá almas incautas que, voluntariamente, se entregarão às suas garras. E outras, voltando para o mundo, serão instrumentos do Diabo para perder as almas.

            Quarto significado: a corrupção da inocência infantil. O quarto motivo da lamparina ter-se apagado é que a seita, havendo-se apoderado de todas as classes sociais, possuirá tanta subtileza para introduzir-se nos ambientes domésticos que perderá as crianças e o demônio se gloriará de alimentar com o requintado manjar dos corações dos meninos.

            Nesses tempos infaustos mal se encontrará a inocência infantil. Desta forma perder-se-ão as vocações para o Sacerdócio, e será uma verdadeira calamidade. Restarão as comunidades religiosas para sustentar a Igreja e trabalhar com valoroso, desinteressado empenho na salvação das almas. Porque nesse período a observância da regra resplandecerá nas comunidades, haverá Santos Ministros do altar, almas ocultas e belas, nas quais meu Filho Santíssimo e eu nos deleitaremos, considerando as excelentes flores e frutos da santidade heroica. Contra eles a impiedade fará dura guerra, cumulando-os de vitupérios, calúnias e vexações, para impedir-lhes o cumprimento do ministério. Mas eles, como firmíssimas colunas, permanecerão inabaláveis e enfrentarão a tudo com esse espírito de humildade e sacrifício com que serão revestidos, em virtude dos méritos infinitos de meu filho Santíssimo, que os ama como as fibras mais delicadas de seu santíssimo e terníssimo coração.”

A crise no clero

            “No clero secular haverá, nessa época, muito que desejar, porque os Sacerdotes se descuidarão do seu sagrado dever. Perdendo a bússola divina, desviar-se-ão do caminho traçado por Deus para o ministério Sacerdotal e apegar-se-ão ao dinheiro, em cuja obtenção porão demasiado empenho.

            E como esta Igreja padecerá nessa ocasião a noite escura da falta de um prelado e pai, que vele com amor paterno, com suavidade, fortaleza, tino e prudência, muitos Sacerdotes perderão seu espírito, pondo em grande perigo suas almas. Em sua mão será posta a balança do santuário.

            Ora com instância, clama sem cansar-te e chora com lágrimas amargas no segredo de teu coração, pedindo a nosso Pai celeste que, por amor ao coração eucarístico de meu Santíssimo Filho, pelo preciosíssimo sangue vertido com tanta generosidade e pelas profundas amarguras e dores de sua acerba paixão e morte, ele se compadeça de seus ministros e ponha termo quanto antes a tempos tão nefastos, enviando a esta Igreja o prelado que deverá restaurar o espírito de seus Sacerdotes.

            A esse filho meu muito querido, amamos meu Filho Santíssimo e eu com amor de predileção, pois o dotaremos de uma capacidade rara, de humildade de coração, de docilidade às divinas inspirações, de fortaleza para defender os direitos da Igreja e de um coração terno e compassivo, para que, qual outro Cristo, assista o grande e o pequeno, sem desprezar ao mais desafortunado que lhe peça luz e conselho em suas dúvidas e amarguras. E para que, com suavidade divina, guie as almas consagradas ao serviço de Deus nos claustros, sem tornar-lhes pesado o jugo do Senhor, que disse: “Meu jugo é suave e meu peso é leve”.

            Em sua mão será posta a balança do santuário para que tudo se faça com peso e medida e Deus seja glorificado.

            Para evitar que venha logo este prelado e pai, concorrerá a tibieza de todas as almas consagradas a Deus, no estado Sacerdotal e religioso. Esta, aliás, será a causa de o maldito Satanás apoderar-se destas terras, onde ele tudo obterá por meio de gente estrangeira e sem fé, tão numerosa que, como uma nuvem negra, toldará o límpido céu da então República consagrada ao Sacratíssimo Coração de meu divino Filho.

            Com essa gente entrarão todos os vícios, que atrairão, por sua vez, toda sorte de castigos, como a peste, a fome, disputas internas e com outras nações e a apostasia, causa da perdição de um considerável número de almas, almas tão caras a Jesus Cristo e a mim.

Para dissipar esta nuvem negra, que impede a Igreja de gozar o claro dia da liberdade, haverá uma guerra formidável e espantosa, na qual correrá sangue de nacionais e de estrangeiros, de Sacerdotes seculares e regulares e também de religiosas. Esta noite será horrorosíssima, porque, humanamente, o mal parecerá triunfante.

            Será chegada, então, a minha hora em que eu, de forma maravilhosa, destronarei o soberbo e maldito Satanás, calcando-o debaixo dos meus pés e acorrentando-o no abismo infernal. Assim a Igreja e a Pátria estarão, por fim, livres de sua cruel tirania.”

 

233º - Leão XI - 1605

               Papa Igreja Cristã Romana nascido em Florença, Alessandro de Médice foi eleito em 10 de abril de 1605 para suceder Clemente VIII, com o apoio francês, mas morreu depois de apenas 27 dias de pontificado. Dedicou-se ao ascetismo. Da poderosa família Médici, de Florença, era filho de Ottaviano e de Francesca Salviati e sobrinho-neto do Papa Leão X, foi embaixador do Grão-Duque de Toscana junto do Papa Pio V durante 15 anos em Roma (1569-1584), Bispo de Pistóia em 1573, Arcebispo de Florença (1574-1583) e nomeado Cardeal (1583), Arcebispo de Albano (1600) e de Palestrina (1602). Legado Pontifício (1596-1598) junto a Henrique IV da França, a serviço do Papa Clemente VIII, onde Maria de Médici reinava, contribuiu para a promulgação do édito de Nantes e foi o mediador da paz de Vervins (1598). Tinha uma profunda amizade com São Felipe Neri e, com a morte de Clemente VIII, foi eleito com apoio dos franceses e italianos e contra a vontade expressa do Rei Filipe III de Espanha. Morreu em 27 de abril de 1605, em Roma.

 

234º - Paulo V - 1605 - 1621

               Papa italiano da Igreja Católica Romana nascido em Roma, Camilo Borghese, eleito em 29 de maio de 1605 para suceder Leão XI graças a um acordo entre os partidos ligados à França e à Espanha, em cujo Papado condenou as teorias de Copérnico e vetou as obras de Galileu, mas cuidou muito do aspecto da cidade de Roma e concluiu a Basílica Vaticana. De família aristocrática proveniente de Siena, tornou-se um respeitado jurista e estimado diplomata. Professor de Direito, foi nomeado Cardeal (1596) e Vigário de Roma e, após a morte repentina de Leão XI foi eleito para sucedê-lo graças as suas qualidades de homem moderado e alheio a partidarismos. Consagrado defendeu intransigentemente os direitos da Santa Sé o que o levou a entrar em conflito com Veneza, que promulgara leis restritivas para a propriedade Eclesiástica. Realizou uma grande atividade política e diplomática para impor a autoridade do Papado, mas teve frustradas as suas esperanças de hegemonia sobre os Estados italianos (1607). Desenvolveu uma grande obra de evangelização no novo continente, na China, na Índia e na Etiópia, especialmente graças aos jesuítas. Na política externa, colecionou fracassos e sucessos. Por exemplo, não conseguiu impedir as lutas religiosas na Boêmia e na Hungria, porém, pôde comemorar a ascensão de Fernando II, rigidamente católico, ao trono imperial em 1619. Intelectual e cercado de intelectuais, embora tenha favorecido a Astronomia, pesando sobre ele a condenação das teorias científicas de Copérnico e Galileu, que, declarada pela Inquisição, teve o consentimento do Papa. Manteve relações com Miguel Romanoff da Rússia e adoeceu quando irrompeu na Europa a Guerra dos Trinta Anos. Em Roma, o Papa financiou a conclusão da Basílica de São Pedro e melhorou a Biblioteca do Vaticano. Ele restaurou o Aqua Traiana, um antigo aqueduto romano (em homenagem a ele Acqua Paola), levando água para os rioni localizados na margem direita do Tibre (Trastevere e Borgo) usando materiais de sua demolição do Fórum de Nerva. Ele sempre incentivou Guido Reni. Como muitos Papas da época, ele também era acusado de nepotismo e seu sobrinho Scipione Borghese exercia um poder enorme em seu nome, consolidando a ascensão da família Borghese. Paulo V também estabeleceu o Banco do Espírito Santo em 1605. Paulo V morreu em 28 de janeiro de 1621, depois de uma série de derrames por mais de três meses, no Palácio Quirinal.

 

234 . 1 - Aparição de Nossa Senhora de Siluva - Lituânia

               Nossa Senhora de Šiluva, também conhecida como Nossa Senhora dos Pinhais, é um dos títulos com que a Virgem Maria é invocada em Šiluva, Lituânia, desde suas aparições no ano de 1608. Um Santuário com o mesmo nome foi construído e é dedicado a ela. O ícone que a retrata é altamente venerado pelos lituanos e é frequentemente chamado de "o maior tesouro da Lituânia". O Papa Pio VI concedeu uma Coroação Canônica à venerada imagem em 8 de setembro de 1786. A cidade de Šiluva é um dos locais de peregrinação mais importantes da Lituânia, com sua tradição ancestral da Festa da Natividade da Virgem Maria, popularmente chamada de "Šilinės", também celebrada em 8 de setembro.

               A devoção mariana em Šiluva remonta quase ao início do cristianismo na Lituânia. O grão-duque Jogaila foi batizado católico em 1387 quando se casou com a Rainha da vizinha Polônia. Mais tarde, ele e seus sucessores trabalharam para difundir a fé cristã em seu território, que até então era pagão. Eles estabeleceram a hierarquia Eclesiástica, construíram igrejas e até ensinaram pessoalmente o catecismo aos seus súditos.

               O estabelecimento de uma igreja em Šiluva foi iniciativa de um nobre chamado Petras Gedgaudas que trabalhava a serviço de Vytautas, o Grande. Gedgaudas em 1457 alocou terras e outros recursos para um templo em homenagem a Nossa Senhora. Gedgaudas construiu uma igreja dedicada à Natividade da Bem-Aventurada Virgem Maria e aos Apóstolos São Pedro e São Bartolomeu. Enormes multidões de fiéis, mesmo da vizinha Prússia protestante, se reuniam neste local para celebrar a indulgente Festa da Natividade da Bem-Aventurada Virgem Maria. O ícone é pintado no estilo Nossa Senhora do Caminho e é semelhante à famosa Madonna Salus Populi Romani. Segundo a lenda, o ícone milagroso foi trazido de Roma para Siluva em 1457 como um presente ao nobre lituano Petras Gedgaudas.

               A nova igreja ganhou fama como Santuário mariano. Em 1532, a população nas proximidades de Šiluva tornou-se predominantemente calvinista. Nas décadas seguintes, muitas igrejas católicas foram confiscadas e fechadas. No entanto, enquanto a velha igreja estava aberta, as pessoas continuaram a assistir à festa anual até que finalmente a igreja foi fechada e acabou totalmente queimada. No século 16, um pastor luterano queixou-se de que membros de seu rebanho viajavam para Šiluva para assistir à indulgente festa católica da Natividade de Maria. Por volta do ano 1569, o único pároco remanescente, o Padre John Holubka, escondeu todos os objetos de valor e documentos da igreja em uma caixa de ferro que enterrou no terreno da igreja devastada. Os católicos posteriormente tentaram procedimentos legais contra os calvinistas, buscando recuperar a propriedade da igreja confiscada. O caso foi complicado pelo fato de que os documentos de propriedade católicos se perderam.

               Este problema foi resolvido no verão de 1608, quando algumas crianças cuidando de suas ovelhas em um campo a alguma distância de Šiluva relataram que viram uma bela mulher segurando um bebê, apareceu no mesmo lugar onde a igreja estava. Ela estava chorando amargamente. As crianças voltaram no dia seguinte acompanhadas por muitos de toda a aldeia e um ministro calvinista, e eles a viram também. Quando a notícia se espalhou, um velho cego que havia ajudado o padre a enterrar os tesouros da igreja original lembrou-se do local. Após a aparição, foram encontrados os documentos institucionais da Igreja Católica e, em 1622, foi ganho o caso relativo à restituição da propriedade católica. Uma pequena igreja de madeira, a Igreja da Natividade da Bem-Aventurada Virgem Maria, foi construída no local da igreja original, mas revelou-se pequena demais para os muitos peregrinos que a visitaram. Uma igreja muito maior foi construída em 1641. O Papa Pio VI confirmou a autenticidade da aparição de Nossa Senhora de Šiluva por um decreto Papal promulgado em 17 de agosto de 1775. A atual Basílica da Natividade da Bem-Aventurada Virgem Maria foi consagrada em 1786. O edifício é um dos melhores exemplos da arquitetura barroca tardia na Lituânia. O interior, desenhado pelo artista lituano Thomas Podgaiskis, foi preservado sem mudanças significativas por mais de dois séculos. Antes da Segunda Guerra Mundial, as procissões costumavam partir de todas as cidades lituanas, fazendo peregrinação a Šiluva. O dia 13 de cada mês é conhecido como “Dia de Maria”.

               A Capela da Aparição foi construída nos estilos Renascentista Egípcio e Gótico, apresentando a torre mais alta da Lituânia. Foi construído sobre a rocha onde a Mãe Santíssima estava. A própria rocha, que o peregrino faz questão de beijar, está sob o altar da capela.

Por sua devoção a Maria, o Papa Pio XI chamou a Lituânia de Terra Mariana (Terra de Maria). O Papa Pio VI aprovou devoções a Nossa Senhora de Šiluva e concedeu indulgências para elas. O Papa João Paulo II orou no Santuário na humilde aldeia lituana de Šiluva em 1993, dois anos depois que a nação báltica recuperou a independência. Bento XVI em 2006 abençoou novas coroas de ouro para uma imagem milagrosa de Maria e Jesus em Šiluva. Em 2008, ele enviou um legado Papal para participar das festividades em Šiluva para marcar o quarto centenário da aparição mariana.

               Nos Estados Unidos, a capela de Nossa Senhora de Siluva está localizada dentro da Basílica do Santuário Nacional da Imaculada Conceição em Washington, D.C. A comunidade lituana emigrada e refugiada nos Estados Unidos, sob a liderança do Bispo Vincent Brizgys, organizada em 1963 para o estabelecimento desta Capela de Siluva, que foi inaugurada em 1966. Ele exibe a arte de artistas lituanos no exílio naquela época, devido à ocupação soviética e à repressão da Lituânia durante e após a Segunda Guerra Mundial. Vytautus Kasuba baseou sua estátua de Nossa Senhora de Siluva com o Menino Jesus em relatos escritos de testemunhas de 1608. Os mosaicos de Vytautas Jonynas retratam a história religiosa e cultural da Lituânia em dois grandes painéis de mosaico nas paredes laterais da capela, um mostrando a imagem tradicional do Rūpintojėlis, e o segundo representando informações sobre o Príncipe e Santo, Casimiro.

               Mosaicos e vitrais de Albinas Elskus decoram o teto dourado com quatro imagens de Nossa Senhora das igrejas da Lituânia, o frontispício do altar com cruzes tradicionais lituanas à beira da estrada e a decoração do fundo do altar com aura azul e dourada sobre a estátua de Nossa Senhora de Siluva. No dia 16 de outubro de 2016, a comunidade americano-lituana comemorou o quinquagésimo aniversário da dedicação da Capela. Uma exposição sobre a história da capela e sua representação das tradições culturais e religiosas da Lituânia foi apresentada no Memorial Hall da Basílica de 1 ° de julho a 17 de outubro. Além da capela em Washington D.C., existem vários outros locais nos Estados Unidos dedicados a Nossa Senhora de Siluva. Isso inclui Santuários em Chicago, Illinois; e em Putnam, Connecticut; e em East St. Louis, Illinois.

               Há uma estátua de Nossa Senhora de Siluva fora da pequena igreja missionária em Rincon, Novo México. Há um Santuário de Nossa Senhora de Siluva na igreja paroquial de SS Peter and Paul em Elizabeth, New Jersey. O Santuário, dedicado em 29 de junho de 1958, é ricamente ornamentado com obras de arte e esculturas em madeira da Lituânia, e contém uma pintura que descreve a aparição e uma relíquia da pedra original na qual Nossa Senhora estava. Porque, inspirada pela aparição, a comunidade voltou à prática devota da sua religião, Nossa Senhora de Šiluva é invocada como a padroeira daqueles que perderam a fé e daqueles que rezam por eles.

 

235º - Gregório XV - 1621 - 1623 

               O Papa Gregório XV, nascido Alessandro Ludovisi (Bolonha, 9 de janeiro de 1554 — Roma, 8 de julho de 1623), foi eleito Papa em 9 de Fevereiro de 1621 e governou a Igreja Católica até a sua morte. Alessandro Ludovisi nasceu em Bolonha em 9 de janeiro de 1554 de Pompeo Ludovisi, o Conde de Samoggia (hoje Savigno na província de Bolonha) e de Camilla Bianchini. Ele foi o terceiro de sete filhos, foi educado no Roman College, administrado pela Companhia de Jesus em Roma, e depois foi para a Universidade de Bolonha para se formar em direito canônico e romano, que recebeu em 4 de junho de 1575. Seu início de carreira foi como jurista Papal em Roma, e não há evidências de que ele tenha sido ordenado ao Sacerdócio. Ele retornou a Roma em 1575 e serviu como referendo da Assinatura Apostólica de 1593 a 1596 e foi nomeado vice-Governador de Roma em 1597, cargo que manteve até 1598. Também atuou como auditor da Rota Romana Sagrada de 1599 a 1612.

               Em 12 de março de 1612, o Papa Paulo V o nomeou Arcebispo de Bolonha, pelo qual presumivelmente foi ordenado ao Sacerdócio e, em seguida, foi consagrado como Bispo em 1 de maio daquele ano na igreja de San Andrea al Quirinale, em Roma. Em agosto de 1616, o Papa o enviou como Núncio Apostólico ao Ducado de Sabóia, para mediar entre Carlos Emanuel I, Duque de Saboia e Filipe III da Espanha em sua disputa sobre o Marquês Gonzaga de Montferrat. Em 19 de setembro de 1616, o Papa Paulo V o elevou ao posto de Cardeal e o nomeou Cardeal Sacerdote na igreja titular de Santa Maria na Traspontina. Ludovisi permaneceu em sua sede episcopal em Bolonha até ir a Roma após a morte do Papa Paulo V para participar do conclave em que foi escolhido como Papa e selecionou o nome pontifício de "Gregório XV". Foi coroado em 14 de fevereiro de 1621 pelo protodiácono, Cardeal Andrea Baroni Peretti Montalto, e assumiu a posse da Arquibasílica de São João de Latrão em 14 de maio de 1621.

               No momento de sua eleição, principalmente pela influência do Cardeal Borghese, em sua idade avançada (ele tinha 67 anos) e com seu fraco estado de saúde, viu imediatamente que precisaria de um homem enérgico, no qual pudesse confiar, para auxiliá-lo no governo da Igreja. Seu sobrinho Ludovico Ludovisi, um jovem de 25 anos, parecia ser a pessoa certa e, sob o risco de ser acusado de nepotismo, criou-o Cardeal no terceiro dia de seu Pontificado. No mesmo dia, seu irmão mais novo, Orazio, foi nomeado Capitão geral da Igreja à frente do exército Papal. O futuro revelou que Gregório XV não ficou desapontado com o sobrinho. A Enciclopédia Católica permite que "Ludovico, é verdade, tenha promovido os interesses de sua família de todas as maneiras possíveis, mas ele também usou seus talentos brilhantes e sua grande influência para o bem-estar da Igreja, e foi sinceramente dedicado ao Papa". Gregório garantiu para os Ludovisi dois ducados, um para seu irmão Orazio, fez um Nobile Romano e Duque de Fiano Romano, 1621, e o outro, o Ducado de Zagarolo, comprado da família Colonna por seu sobrinho Ludovico Ludovisi em 1622. Um segundo sobrinho, Niccolò, foi feito Príncipe reinante de Piombino e senhor da Ilha de Elba em 1634, tendo se casado com a herdeira, em 30 de março de 1632.

               Gregório XV interferiu pouco na política européia, além de ajudar Fernando II, Sacro Imperador Romano e a Liga Católica contra os protestantes assim como Sigismundo III Vasa, rei de a República das Duas Nações, contra o Império Otomano. Sua Declaração contra Magos e Bruxas (Omnipotentis Dei, 20 de março de 1623) foi a última ordenança Papal contra a bruxaria. As punições anteriores foram reduzidas e a pena de morte foi limitada àqueles que "provaram ter entrado em acordo com o diabo e cometido homicídio com sua assistência". Ele era um teólogo erudito e manifestou um espírito de reforma. Como exemplo, sua bula Papal de 15 de novembro de 1621, Aeterni Patris Filius, regulamentou as eleições Papais, que a partir de agora seriam por escrutínio secreto; três métodos de eleição foram permitidos: por escrutínio, compromisso e quase inspiração. Em 6 de janeiro de 1622, ele estabeleceu a Congregação para a Propagação da Fé, o braço missionário da Santa Sé. Seu Pontificado foi marcado pelas canonizações de Teresa de Ávila, Francisco Xavier, Inácio de Loyola, Filipe Néri e Isidoro, o Lavrador. Ele também beatificou Pedro de Alcântara. Foi influente em trazer o artista bolonhesa Guercino para Roma, um marco no desenvolvimento do estilo barroco alto. Ele se sentou para seus bustos de retratos, um dos quais foi de Gian Lorenzo Bernini e Alessandro Algardi, cujo busto fica na Igreja de Santa Maria, em Vallicella.

               O Papa criou onze Cardeais em quatro consistórios que o levaram a elevar seu sobrinho Ludovico e seu primo Marcantonio Gozzadini como Cardeais; ele também elevou o conhecido Armand Jean Richelieu como Cardeal. Gregório XV também beatificou três indivíduos durante seu pontificado: Ambrose Sansedoni, de Siena, Alberto Magno, e Pedro de Alcântara. Ele sofria de cálculos renais há algum tempo e estava acamado de 16 de junho a 1 de julho de 1623, sofrendo de diarreia e um distúrbio estomacal que lhe causava grande desconforto. Sua condição piorou em 4 de julho, quando uma febre o enfraqueceu bastante, levando a receber o Viaticum em 5 de julho e a Extreme Unction em 6 de julho, antes de sucumbir à doença dois dias depois. O Papa Gregório XV morreu no Palácio Quirinal em 8 de julho de 1623. Ele foi enterrado na Igreja de Santo Inácio de Loyola, onde mais de 80 anos depois, os jesuítas ergueram um magnífico monumento seguindo o desejo do Cardeal Ludovico Ludovisi, que também foi homenageado.

 

236º - Urbano VIII - 1623 - 1644

               O Urbano VIII (Florença, 5 de abril de 1568 – Roma, 29 de julho de 1644) foi chefe da Igreja Católica e governante dos Estados Papais de 6 de agosto de 1623 até à data da sua morte. Ele expandiu o território Papal por força de armas e jogos políticos vantajosos, tendo também sido um Patrono proeminente das artes e um reformador das missões da Igreja. Ele nasceu Maffeo Barberini em abril de 1568 de Antonio Barberini, um nobre florentino, e Camilla Barbadoro. Seu pai morreu quando ele tinha apenas três anos de idade e sua mãe o levou para Roma, onde ele foi encarregado de seu tio, Francesco Barberini, um protonotário apostólico. Aos 16 anos, ele se tornou herdeiro de seu tio. Ele foi educado pela Companhia de Jesus ("jesuítas") e recebeu um doutorado em direito pela Universidade de Pisa em 1589. Em 1601, Barberini, através da influência de seu tio, conseguiu garantir a nomeação do Papa Clemente VIII como legado Papal na Corte do rei Henrique IV de França. Em 1604, o mesmo Papa o nomeou Arcebispo de Nazaré, um escritório associado ao de Bispo das dioceses suprimidas de Canne e Monteverde, com sua residência em Barletta. Com a morte de seu tio, ele herdou suas riquezas, com as quais comprou um Palácio em Roma, que transformou em uma luxuosa residência renascentista.

               Mais tarde, o Papa Paulo V também empregou Barberini em uma capacidade semelhante, depois elevando-o, em 1606, à ordem de Cardeal-Sacerdote, com a igreja titular de São Pedro em Montorio, e nomeando-o como legado Papal de Bolonha. Barberini era considerado alguém que poderia ser eleito Papa, embora houvesse pessoas como o Cardeal Ottavio Bandini que trabalhavam para evitá-lo. Apesar disso, entre os dias 29 e 30 de julho, os Cardeais iniciaram uma intensa série de negociações para testar os números sobre quem poderia emergir do conclave como Papa, com o Cardeal Ludovico Ludovisi descartando as chances de Barberini enquanto Barberini permanecesse um aliado próximo do Cardeal Scipione Caffarelli-Borghese, cuja facção Barberini apoiava. Ludovisi conversou com os Cardeais Farnese, Medici e Aldobrandini em 30 de julho sobre como assistir à eleição de Barberini. Os três apoiaram sua candidatura e garantiram o apoio de outros, o que levou à eleição de Barberini pouco mais de uma semana depois. Em 6 de agosto de 1623, no conclave Papal após a morte do Papa Gregório XV, Barberini foi escolhido como sucessor de Gregório XV e recebeu o nome Urbano VIII.

               O Papado de Urbano VIII cobriu 21 anos da Guerra dos Trinta Anos (1618-1648) e foi um evento marcante, mesmo para os padrões da época. Ele canonizou Isabel de Portugal, André Corsini e Conrado de Placência, e emitiu as bulas Papais de canonização para Inácio de Loyola (fundador da Companhia de Jesus, " jesuítas ") e Francisco Xavier (também jesuíta), que foram canonizados por seu antecessor, o Papa Gregório XV. Apesar de uma amizade e encorajamento precoces por seus ensinamentos, Urbano VIII foi responsável por convocar o cientista e astrônomo Galileu a Roma em 1633 para retratar seu trabalho.

               Urbano VIII se opôs ao heliocentrismo copernicano e ordenou o segundo julgamento de Galileu após a publicação do Diálogo sobre os dois principais sistemas mundiais, no qual o ponto de vista de Urbano é discutido pelo personagem "Simplicio". Urbano VIII praticou nepotismo em grande escala; vários membros de sua família foram enormemente enriquecidos por ele, de modo que pareceu aos contemporâneos como se ele estivesse estabelecendo uma dinastia Barberini. Ele elevou seu irmão Antonio Marcello Barberini (Antonio, o Velho) e depois seus sobrinhos Francesco Barberini e Antonio Barberini (Antonio, o Jovem) a Cardeal. Ele também concedeu a seu irmão, Taddeo Barberini, os títulos Príncipe de Palestrina, Gonfalonier da Igreja, Prefeito de Roma e Comandante de Sant'Angelo. Urbano VIII era um habilidoso escritor de versos latinos, e uma coleção de paráfrases das Escrituras, bem como hinos originais de sua composição, foram frequentemente reimpressos. A bula Papal de 1639, Commissum Nobis, protegeu a existência de missões jesuítas na América do Sul, proibindo a escravização de nativos que estavam nas reduções jesuítas. Ao mesmo tempo, Urbano VIII revogou o monopólio jesuíta do trabalho missionário na China e no Japão, abrindo esses países a missionários de outras ordens e sociedades missionárias. Emitiu uma bula Papal de 1624 que tornava o uso do tabaco em lugares sagrados punível por excomunhão. O Papa Bento XIII revogou a proibição cem anos depois.

               Urbano VIII canonizou cinco Santos durante seu Pontificado: Stephen Harding (1623), Isabel de Portugal e Conrado de Placência (1625), Pedro Nolasco (1628) e André Corsini (1629). O Papa também beatificou 68 indivíduos, incluindo os Mártires de Nagasaki (1627). Criou 74 Cardeais em oito consistórios ao longo de seu Pontificado, incluindo seus sobrinhos Francesco e Antonio, primo Lorenzo Magalotti e o irmão do Papa Antonio Marcello. Ele também criou Giovanni Battista Pamphili como Cardeal, com Pamphili se tornando seu sucessor imediato, o Papa Inocêncio X. O Papa também criou oito desses Cardeais que ele havia reservado em pectore. O envolvimento militar de Urbano VIII visava menos a restauração do catolicismo na Europa do que ajustar a balança de poder para favorecer sua própria independência na Itália. Em 1626, o ducado de Urbino foi incorporado aos domínios Papais e, em 1627, quando a linha masculina direta dos Gonzagas em Mântua foi extinta, ele favoreceu controversamente a sucessão do duque protestante Carlos de Nevers contra as reivindicações dos católicos. Ele também lançou as Guerras de Castro em 1641 contra Eduardo I Farnésio, Duque de Parma e Piacenza, a quem ele excomungou. Castro foi destruído e seu ducado incorporado nos Estados Papais. Urbano VIII foi o último Papa a estender o território Papal. Fortificou o Castelo franco Emilia na fronteira de Mantuan e encomendou Vincenzo Maculani para fortificar o Castelo Sant'Angelo em Roma. Urbano VIII também estabeleceu um arsenal no Vaticano, uma fábrica de armas em Tivoli e fortificou o porto de Civitavecchia.

               Patrono das artes Urbano VIII e sua família apadrinharam a arte em grande escala. Ele gastou vastas somas trazendo polímatas como Athanasius Kircher para Roma e financiando várias obras substanciais do escultor e arquiteto Bernini, de quem ele já havia encomendado Boy com um dragão por volta de 1617 e que foi particularmente favorecido durante o reinado de Urbano VIII. Além de vários bustos retratados de Urbano, encomendou Bernini para trabalhar no Palácio da família em Roma, no Palazzo Barberini, no Colégio de Propaganda Fide, na Fontana del Tritone na Piazza Barberini, no baldacchino e cathedra na Basílica de São Pedro e outras estruturas importantes da cidade. Inúmeros membros da família de Barberini também tiveram sua semelhança apanhada em pedra por Bernini, como seus irmãos Carlo e Antonio. Urbano também reconstruiu a Igreja de Santa Bibiana e a Igreja de San Sebastiano al Palatino, no Monte Palatino. Os Barberini patrocinavam pintores como Nicolas Poussin e Claude Lorrain. Uma das obras mais elogiosas em sua celebração de seu reinado é a enorme Alegoria da Divina Providência pintada por Pietro da Cortona no teto do grande salão do Palazzo Barberini. Uma consequência desses esforços militares e artísticos foi um aumento maciço da dívida Papal. Urbano VIII herdou uma dívida de 16 milhões de escudos e, em 1635, aumentou para 28 milhões. Diz-se que a morte de Urbano VIII em 29 de julho de 1644 foi apressada por desgosto com o resultado das Guerras de Castro. Por causa dos custos incorridos pela cidade de Roma para financiar esta guerra, Urbano VIII tornou-se imensamente impopular com seus súditos. Em sua morte, o busto de Urbano VIII, que ficava ao lado do Palácio dos Conservadores no Monte Capitolino, foi rapidamente destruído por uma multidão enfurecida, e apenas um padre de pensamento rápido salvou a escultura do falecido Papa pertencente aos jesuítas de um semelhante destino. Após sua morte, maquinações internacionais e domésticas fizeram com que o conclave Papal não elegesse o Cardeal Giulio Cesare Sacchetti, que estava intimamente associado a alguns membros da família Barberini. Em vez disso, elegeu o Cardeal Giovanni Battista Pamphili, que adotou o nome de Inocêncio X, como seu sucessor no conclave de 1644.

 

236 . 1 - São Vivente de Paulo

               Vicente de Paulo nasceu em Pouy, perto da cidade de Dax, no sul da França, aos 24 de abril de 1581; foi batizado no mesmo dia de seu nascimento. Era o terceiro filho do casal João de Paulo (Jean de Paul) e Bertranda de Moras (Bertrande de Moras). Seus pais eram agricultores e muito religiosos. Todos os seis filhos receberam o ensino religioso de sua mãe. Seus dois irmãos mais velhos ajudavam os pais na lavoura e Vicente cuidava de ovelhas e de porcos. Desde pequeno, demonstrava muita inteligência e grande religiosidade. Em frente à sua casa, em um pé de carvalho, havia um buraco; ele colocou lá uma pequena imagem da Santíssima Virgem, a quem diariamente ajoelhava e fazia uma oração. Conduzia os animais para melhores pastagens, onde ficava a vigiá-los. Aos domingos ia à aldeia, com seus pais, para assistir à missa e frequentar o catecismo.

               O Sr. Vigário aconselhou a seu pai para colocar o garoto Vicente em uma escola; via nele um grande futuro, devido à sua inteligência. O pai, que era ambicioso, colocou-o em um colégio religioso, desejando que fosse padre e se tornasse o arrimo da família. Foi matriculado em um colégio de padres Franciscanos, na cidade de Dax, onde ele fez os estudos básicos. Para seguir a carreira sacerdotal fez os estudos teológicos na Universidade de Toulouse. Foi ordenado Sacerdote em 23 de setembro de 1600. Continuou os estudos por mais 4 anos, recebendo o título de Doutor em Teologia. Uma viúva que gostava de ouvir as suas pregações, ciente de que ele era pobre, deixou-lhe sua herança, pequena propriedade e determinada importância em dinheiro, que estava com um comerciante em Marselha. Ele foi atrás do devedor; encontrando-o recebeu grande parte do dinheiro; ia regressar de navio, por ser mais rápido e mais barato. Na viagem o barco foi aprisionado por barcos de piratas e levado para a Tunísia. Em Túnis foi vendido como escravo, para um pescador, depois para um químico; com a morte deste, ele passou pra um seu sobrinho, que vendeu-o para um fazendeiro (um renegado) que antes era católico, e que com medo da escravidão, adotara a religião muçulmana. Ele tinha três esposas; uma era muçulmana e, ouvindo os cânticos do escravo, sensibilizou-se, e quis saber o significado do que ele cantava. Ela, ciente da história, censurou o marido por ter abandonado uma religião tão bonita. O patrão de Vicente, arrependido, propôs ao escravo fugirem para a França. Esta fuga só foi realizada 10 meses depois. Em um pequeno barco, atravessaram o Mar Mediterrâneo e foram dar na costa francesa, em Aigues-Mortes e de lá foram para Avinhão. Naquela cidade encontraram o Vice-Legado do Papa. Vicente voltou a exercer o ministério de padre e o renegado abjurou publicamente e voltou para a Igreja Católica. Padre Vicente e o renegado ficaram residindo em casa do Vice-Legado. Tendo ele de viajar a Roma, levou os dois em sua companhia. Padre Vicente aproveitou a estadia naquela cidade e freqüentou a Universidade, formando-se em Direito Canônico. O renegado pediu para ser admitido em um mosteiro e tornou-se monge.

               Tendo o Papa de mandar um documento sigiloso para o Rei da França, padre Vicente foi o escolhido. Pelos serviços prestados, o Rei indicou-o como Capelão da Rainha. Seu serviço era distribuir esmolas para os pobres que rodeavam o Palácio e visitar os doentes do Hospital da Caridade, em nome da Rainha. Padre Vicente não gostava do ambiente do Palácio e passou a morar em uma pensão, no mesmo quarto com um juiz. Certo dia amanhecera doente; o empregado da farmácia que foi atendê-lo, precisando de um copo, foi apanhar em um armário, e viu lá um dinheiro, que era do juiz, e ficou com ele. Na volta, o juiz, não encontrando seu dinheiro, quis que padre Vicente o devolvesse; como ele não sabia do acontecido, o juiz colocou-o para fora do quarto e coluniou-o de ladrão. São Vicente de Paulo fica conhecendo o padre Bérulle, que mais tarde foi nomeado Cardeal e ele indicou-o para Vigário de Clichy, subúrbio de Paris. Na paróquia pobre, a maioria dos habitantes era de horticultores. Padre Vicente se deu bem com eles; as missas eram bem participadas e instituiu a comunhão geral nos primeiros domingos o mês. Criou a Confraria do Rosário, para todos os dias visitarem os doentes. Padre Vicente, atendendo ao seu diretor, padre Bérulle, deixou a paróquia e foi ser preceptor dos filhos do general das Galeras. Foi residir no Palácio dos Gondi, família rica e da alta nobreza. Eles tinham grandes propriedades e padre Vicente, em companhia da senhora De Gondi, visitava uma das propriedades; foi chamado para atender um agonizante e ouvir sua confissão. O doente disse à senhora De Gondi, que, se não fosse a presença do Sacerdote, iria morrer em grandes faltas e ia permanecer no fogo eterno. Padre Vicente percebeu que o povo do campo estava abandonado e na missa dominical concitou o povo a fazer a confissão geral. Teve que arranjar outros padres para ajudá-lo nas confissões, tantos eram os que queriam confessar-se. Padre Vicente esteve morando com a família Gondi cinco anos. Depois de ir para outra paróquia, atendendo a um chamado do padre Bérulle, padre Vicente voltou para morar em casa dos Gondi, onde ficou mais 8 anos. Com o auxílio da senhora de Gondi, fundou a Congregação da Missão em 1625 e a Confraria da Caridade em 1617. A primeira cuida da evangelização dos camponeses e a segunda dá assistência espiritual e corporal aos pobres. Em Follevile, fundou uma Confraria de Caridade para homens, em 1620. A Congregação da Missão surgiu espontaneamente. Padre Vicente conseguiu alguns colegas para pregar aos camponeses; exigia deles a simplicidade nas pregações, para o povo entender, e rapidamente seu grupo foi aumentando. No princípio, alugaram uma casa para sua moradia. Com o aumento mudaram para um velho Colégio. O número aumentava. Um cônego que dirigia um leprosário sem doentes ofereceu em doação os prédios do leprosário para residência dos padres. A instituição demorou de 1625 até 12 de janeiro de 1633, quando recebeu a Bula do Papa Urbano VIII, reconhecendo a Congregação. Padre Vicente sempre se preocupou com as crianças enjeitadas e abandonadas, com os velhos e os pobres e doentes. Durante sua vida criou grandes obras, que até hoje estão prestando serviços à humanidade. A primeira irmã de caridade foi uma camponesa de nome Margarida Naseau. Com colaboração de Santa Luisa de Marilac, ele estabeleceu a Companhia das Irmãs da Caridade. Começaram 4 camponesas, hoje são milhares. Isto se deu em 29 de novembro de 1633. Padre Vicente criou tantas obras, que em pouco tempo não é possível enumerar. Padre Vicente tinha quase 80 anos quando faleceu, dia 27 de setembro de 1660. Em 16 de junho de 1737, foi canonizado pelo Papa Clemente XII, e, em 12 de maio de 1885, foi declarado Patrono de todas as obras de caridade da Igreja Católica, por Leão XIII. Seu corpo repousa na Capela da Casa-Mãe, São Lázaro, em Paris, incorruptível.

 

237º - Inocêncio X - 1644 - 1655

               Papa Inocêncio X, nascido Giambattista Pamphili, ou Pamphilj (Roma, 6 de maio de 1574 — Roma, 7 de janeiro de 1655) foi Papa de 15 de setembro de 1644 até a data da sua morte. Nascido em Roma, da uma família de Gubbio, na Úmbria, que havia chegado a Roma durante o Pontificado do Papa Inocêncio IX, Pamphili foi treinado como advogado e formado no Collegio Romano. Ele seguiu um curso honorífico convencional, seguindo seu tio Girolamo Pamphili como auditor da Rota e, como ele, alcançando a posição de Cardeal-Sacerdote de Santo Eusébio, em 1629. Antes de se tornar Papa, Pamphili serviu como diplomata Papal em Nápoles, França e Espanha. Inocêncio X foi um dos Pontífices mais politicamente espertos da época, aumentando muito o poder temporal da Santa Sé. Os principais eventos políticos nos quais ele esteve envolvido incluem a Guerra Civil Inglesa, conflitos com oficiais da igreja francesa por questões de fraude financeira e hostilidades com o Ducado de Parma relacionadas à Primeira Guerra de Castro. Em termos de eventos teológicos, Inocêncio X emitiu uma bula Papal condenando as crenças do jansenismo. Inocêncio X iniciou seu Papado já aos 70 anos de idade e foi coroado em uma imensa festa. Na época, os embaixadores espanhóis e franceses rivalizavam em disputas de prestígio. Para agradar o novo Papa, esbanjaram nas festividades. Mas quem o novo Papa privilegiou mesmo foi o seu próprio irmão, forneceu a ele muita influência política e religiosa. Olimpia Maidalchini, sua cunhada, se aproveitou da situação e foi ela quem efetivamente se apropriou da liderança política e religiosa proporcionada pelo Papa. O Supremo Pontífice era reconhecido como grande estadista já desde antes de sua ascensão. Como Papa, Inocêncio X protestou contra determinadas cláusulas do Tratado de Vestfália que colocou um fim na famosa Guerra dos Trinta Anos ocorrida nos estados germânicos. Todavia, o tratado sancionava o princípio que obrigava os súditos a adotar a mesma religião que o Príncipe professava. As consequências disso poderiam ser catastróficas para a Igreja Católica, o que forçou uma aguda intervenção do Papa na questão. Todo o temor se justifica pelo crescimento do protestantismo na Europa desde Martinho Lutero. Na Inglaterra, Henrique VIII já havia rompido com a Igreja Católica e estabelecido uma nova doutrina. Durante o Papado de Inocêncio X quem liderava a Inglaterra era o puritano fanático Oliver Cromwell, responsável por decapitar o rei Carlos I e por devastar a Irlanda católica no ano de 1653. No cenário internacional do cristianismo católico, a Bélgica e a França também eram um problema. Crescia em popularidade a obra de Cornélio Jansen que questionava a Igreja e apresentava modernizações do cristianismo. Inocêncio X interveio também nesta questão declarando hereges todos os seguidores do chamado jansenismo. Mas nem só de problemas políticos internacionais se fez o Papado de Inocêncio X. O Supremo Pontífice de Roma foi responsável pelo embelezamento de Roma e pela promoção de vários artistas através do mecenato. Confiou ao pintor espanhol Diego Velázquez a confecção de seu mais famoso retrato. Por sinal, esta obra tornou-se símbolo de uma nova geração de pintores e grande representante de um estilo artístico altamente apurado em sua perfeição e em seu detalhismo. Inocêncio X faleceu no dia 14 de janeiro de 1655. Seu funeral foi bastante oposto a sua coroação como Papa. Seus próprios parentes, os mesmos que tanto ajudou durante o Papado, não quiseram gastar com homenagens e celebrações. Só muitos anos mais tarde, um filho de seu sobrinho que o homenageou construindo um sepulcro na igreja de Santa Inês.

 

237 . 1 - Aparição de Nossa Senhora de Coromoto – Venezuela

               No ano de 1652, Nossa Senhora de Coromoto apareceu aos índios do mesmo nome. Foi declarada Padroeira da Venezuela pelo Episcopado venezuelano no dia primeiro de maio de 1942. O Papa Pio XII a declarou "Celeste e Principal Padroeira de toda a República da Venezuela" no dia 7 de outubro de 1944. O Santuário Nacional está construído no local da aparição, perto da cidade de Guanaguanare. O Papa João Paulo II, em fevereiro de 1996, abençoou pessoalmente este Santuário. Entre os índios que habitavam a região de Guanaguanare, havia um grupo conhecido como "Coromotos". Quando chegaram os colonizadores espanhóis, os Coromotos se embrenharam na selva, montanhas e vales situados a noroeste da cidade de Guanare, nas fontes e margens dos rios Tucupido e Anos. Os Coromotos moraram muito tempo nesses lugares distantes e sua memória foi sendo perdida, até que chegou o momento de sua conversão, graças a poderosa mediação da Santíssima Virgem.

               Um espanhol honrado e bom cristão, chamado Juan Sánchez, possuía as férteis terras de Soropo, situadas a quatro ou cinco léguas de Ganare. A ele se uniram para trabalhar a terra e tratar do gado dois colonizadores: Juan Sibrián e Bartolomé ánchez. Descansando de uma longa viagem em certo dia, do ano de 1651, o Cacique dos Coromotos, acompanhado de sua mulher e filhos, eis que lhes aparece uma formosíssima Senhora de incomparável beleza, que trazia em seus braços um preciosíssimo Menino, caminhando sobre as cristalinas águas da corrente. Maravilhados, contemplam a majestosa Dama; esta lhes sorri amorosamente e fala ao Cacique em sua própria língua, dizendo-lhe que ali fora procurar água para colocar sobre a cabeça e assim poder subir aos céus. Estas palavras foram ditas com tal unção e força que comoveram o coração do Cacique. Ele se dispôs a cumprir os desejos de tão encantadora Senhora.

               No mês de novembro do citado ano, Juan Sánchez passava perto daquela região seguindo a estrada denominada "Cauro", quando ia em viagem para El Tocuyo. A certa altura, encontra o chefe dos Coromotos, que lhe conta que uma belíssima Mulher, com uma criancinha formosa havia-lhe aparecido pedindo-lhe que fosse ao local onde moravam os brancos para buscar água para molhar sua cabeça, antes de ir para o céu. E acrescentou o Cacique que tanto ele como todos os de sua tribo estavam dispostos a atender os desejos de tão excelsa senhora. Juan Sánchez, gratamente surpreendido pelo relato do índio, disse-lhe que estava indo de viagem para um povoado chamado El Tocuyo. A oito dias estaria de volta. Quando retornou, Juan Sánchez juntou-se aos Coromotos. Toda tribo partiu com o espanhol. Seguindo as indicações de Juan Sánchez, a caravana se deteve no ângulo formado pela confluência dos rios Tucupido e Guanaguanare, num lugar que foi chamado de Coromoto. Juan Sánchez foi imediatamente à vila do Espírito Santo de Guanaguanare e avisou as autoridades sobre o ocorrido. Os alcaides Dom Baltazar Rivero De Losada e Dom Salvador Serrada Centeno, que governavam a Vila, dispuseram que os índios permanecessem em Coromoto e ofereceram-lhes Juan Sánchez para demarcar terras para seus trabalhos e para doutriná-los nos rudimentos da religião cristã. O abnegado espanhol cumpriu sua missão cuidadosamente, fazendo de tudo para tornar feliz a permanência dos índios naquela região.

               Os indígenas construíram seus ranchos, receberam as terras e, contentes, ouviam as explicações doutrinárias que lhes dava o espanhol, ajudado por sua esposa e os outros dois companheiros. Este trabalho apostólico foi sendo coroado de êxito. Pouco a pouco os índios iam sendo batizados. O Cacique, a princípio, assistia com gosto às instruções, mas começou a se desgostar e a sentir falta de seus bosques. Não mais frequentou as reuniões promovidas por Juan, não quis mais aprender a doutrina cristã e se recusou a ser batizado. No dia 8 de setembro de 1652, Juan Sánchez convidou os índios que trabalhavam em Soropo para assistirem a alguns atos religiosos que haviam sido preparados. O Cacique Coromoto recusou este convite. Ainda assim, seus companheiros honraram com humildes preces a Virgem. Isso deixou o Cacique enraivecido que fugiu para Coromoto.

               A cabana do Cacique era a maior entre todas as choças indígenas, mas era pequena e pobre em comparação às casas dos espanhóis. Naquela noite se encontravam na cabana uma irmã do Cacique, chamada Isabel e seu filho, de doze anos e outras duas índias. O Cacique Coromoto chegou muito triste e calado. Imediatamente deitou-se na esteira. Vendo o seu estado, ninguém lhe dirigiu a palavra. Passou-se um longo tempo de silêncio. O Cacique tentava dormir, mas dentro de sua memória não saía aquela Senhora. Contudo, outros pensamentos turvavam seu triste e melancólico caráter: seu orgulho humilhado pela obediência e sua desenfreada liberdade, clamava por uma completa emancipação; certa raiva interna e inexplicável lhe pintava o batismo e a vida dos brancos como insuportáveis. Em poucos minutos, a Virgem Santíssima apareceu na cabana do Cacique, em meio a invisíveis legiões de anjos que formavam seu cortejo. Dela saíam raios de luz que inundaram a choça. Segundo o testemunho da índia Isabel a luz era tão potente que parecia a luz do sol ao meio-dia. Mas não cansava a visão daqueles que a contemplavam tão grande maravilha. O Cacique reconheceu a mesma bela mulher que, meses antes, contemplara sobre as águas. O índio pensava, provavelmente, que a Senhora viera reprovar seu comportamento. Passados alguns segundos, o Cacique rompeu o silêncio e dirigindo-se à Senhora disse enfurecido: Até quando irás me perseguir?" Estas palavras impensadas e desrespeitosas mortificaram a esposa do Cacique, que o consolou: "Não fales assim com a bela mulher. Não tenhas tanto mal em teu coração". O Cacique, encolerizou-se e não pôde mais suportar a presença da Divina Senhora que permanecia à porta dirigindo-lhe um olhar tão terno e carinhoso, capaz de comover o coração mais duro. Desesperado, o Cacique saca de um arco com uma flecha e chegando ao auge de sua loucura ameaça matá-la. Nesse instante, a Excelsa Senhora entra na choça, sorridente e serena, aproxima-se dele que lança o arco contra o chão. O Cacique tenta abraçar a Senhora que desaparece, deixando a cabana iluminada apenas pela luz do fogão.

               Fora de si e mudo de terror, ele ficou alguns minutos imóvel, com os braços estendidos e entrelaçados, na mesma posição em que estavam quando tentara agarrar a Virgem. Ele tinha uma mão aberta e a outra fechada, que apertava o máximo. Ele sentia que a bela mulher a havia fechado. Cheio de temor, o índio disse à sua mulher: "Aqui a tenho!". As mulheres disseram em coro: "Mostre-nos". O Cacique abriu a sua mão e os quatro indígenas reconheceram ser aquela uma imagem e acreditaram que era a "Bela Mulher". Quando o índio abriu a mão, a pequena imagem lançou raios luminosos que causaram grande esplendor. O Cacique começou a suar frio. Com a mesma fúria de antes, envolve a milagrosa imagem em uma folha e a esconde no teto de palha de sua casa dizendo: "Aí tu te queimarás, para que me deixes". O indiozinho, que interiormente desaprovava a torpe conduta do tio, prestou bem atenção no esconderijo da imagem e resolveu avisar Juan Sánchez sobre o que ocorrera. Escapou da casa por volta da meia-noite em direção a Soropo, enfrentando com coragem todos os riscos. Ao chegar, todos dormiam. Ele sentou-se à beira da porta e esperou o amanhecer. A esposa de Juan Sánchez, ao abrir a porta de sua casa na madrugada do domingo, surpreendeu-se ao ver o menino. Ele contou-lhe tudo que havia acontecido. A mulher chamou o marido. Juan sorriu e não deu crédito ao relato do indiozinho, que repetiu sua história veementemente: "Podem ir a Coromoto agora mesmo e vocês irão comprovar o que digo".

               Bartolomé Sánchez, Juan Sibrián, Juan Sánchez e o indiozinho se puseram sem demora a caminho de Coromoto. Quando chegaram perto do povoado os três espanhóis se esconderam a três quadras da casa. O menino se encarregou de ir à choça do tio apanhar a imagem. Felizmente, o Cacique e as duas mulheres estavam fora da casa. Sem que ninguém o visse, o menino entrou na casa. Com o coração em júbilo pegou a imagem e a levou para Juan que, ao recebê-la, sentiu profunda emoção. Na imagem reconhecera a efígie de Maria Santíssima, a Mãe de Deus. Com muito respeito a colocou em um relicário de prata que costumava carregar. Retornando à sua casa em Soropo, Juan Sánchez colocou a pequena imagem, que já começava a ser chamada de Nossa Senhora de Coromoto, em um altarzinho, alumiando-a com uma vela de cera escura. Esta humilde luminária ardeu dia e noite, sem consumir-se desde as doze horas da noite de domingo até à tarde de terça-feira. Este fato foi declarado milagroso, pois o pedaço de vela deveria arder, no máximo, uma meia hora. Terça-feira, à tarde, Juan Sánchez foi à Vila de Guanaguanare (Guanare) onde revelou ao Padre Dom Diego Lozano, tudo quanto sabia sobre a imagem. Mas este não lhe deu crédito, dizendo que aquela estampa deveria ser obra de algum viajante. Juan Sánchez, sem se lastimar por isso, regressou feliz a Soropo, pois comprara o necessário para manter uma lamparina acesa diante da imagem, que ficou em sua casa até primeiro de fevereiro, um ano e quatro meses.

               No dia 9 de setembro, domingo, o Cacique resolveu ir aos montes com alguns índios. Mal entrou no bosque foi mordido por uma cobra. Vendo-se mortalmente ferido e reconhecendo no acontecimento um castigo do céu pela sua péssima conduta com relação à Senhora, começou a se arrepender, pedindo em altos gritos que lhe administrassem o Batismo. A casa de Juan Sánchez se transformou num pequeno santuário. Para aí acorreu toda a população de Guanare atraída pelos milagres, graças e favores que eram alcançados por intercessão de Nossa Senhora de Coromoto. No dia primeiro de fevereiro de 1654 a imagem foi trasladada solenemente para a igreja de Guanare por ordem do pároco Diego de Lozano. A devoção popular foi crescendo espantosamente até a coroação Pontifícia em 1952. A força histórica do fato coromotano repousa principalmente no testemunho do povo. Uma tradição jamais interrompida. Na década dos anos 20, houve um evidente ressurgir do movimento coromotano, mas não se pode dizer que tenha sido o ressurgir de algo morto, pois desde sua aparição até os nossos dias, o povo da Venezuela jamais deixou de peregrinar a Guanare para honrar sua padroeira. Atualmente pode-se afirmar que não existe um só templo católico venezuelano que não possua uma imagem de Nossa Senhora de Coromoto, sempre amada e homenageada pelos fiéis.

 

238º - Alexandre VII - 1655 – 1667

               Papa Alexandre VII, nascido Fabio Chigi (Siena, 13 de fevereiro de 1599 — Roma, 22 de maio de 1667), foi Papa da Igreja Católica de 7 de abril de 1655 até sua morte. Ele começou sua carreira como um legado vice- Papal e ocupou vários cargos diplomáticos na Santa Sé. Foi ordenado Sacerdote em 1634 e tornou-se Bispo de Nardo em 1635. Mais tarde foi transferido em 1652 e tornou-se Bispo de Ímola. O Papa Inocêncio X o tornou Secretário de Estado em 1651 e, em 1652, foi nomeado Cardeal. No início de seu papado, Alexandre, que era visto como antinepotista na época de sua eleição, viveu simplesmente. Mais tarde no entanto, ele deu emprego a seus parentes, que eventualmente assumiram o governo. Sua administração trabalhou para apoiar os jesuítas. No entanto, as relações de seu governo com a França foram tensas devido a seus atritos com diplomatas franceses. Alexandre estava interessado em arquitetura e apoiou vários projetos urbanos em Roma, além de construir muitas escolas na Europa, como a escola internacional Vittoria, MFG, Clef e Colégio. Ele também escreveu poesia e apoiou artistas apadrinhados que expandiram a decoração das igrejas. Seus escritos teológicos incluíam discussões sobre heliocentrismo e a Imaculada Conceição. O Chigi de Sienna estava entre as mais ilustres e poderosas famílias italianas. Na Roma dos tempos da Renascença, um ancestral de Alexandre VII era conhecido como o “Magnífico”. O futuro pai do Papa, Flavio Chigi, sobrinho do Papa Paulo V, embora não tão próspero quanto seus antepassados, deu a seu filho um treinamento adequado. Este último deveu muito também à sua mãe, uma mulher de singular poder e habilidade na formação da juventude. A juventude de Fábio foi marcada por um mal-estar contínuo, consequente a um ataque de apoplexia na infância. Incapaz de frequentar a escola, ele foi ensinado primeiro por sua mãe e, mais tarde, por tutores habilidosos, e mostrou notável precocidade e amor pela leitura. Em seu vigésimo sétimo ano, ele obteve os doutorados de filosofia, direito e teologia na Universidade de Sienna, e em dezembro de 1626, entrou em sua carreira Eclesiástica em Roma. Em 1627 foi nomeado pelo Vice-Legado Urbano VIII de Ferrara, e serviu cinco anos sob os Cardeais Sacchetti e Pallotta, cujos elogios conquistaram para ele o importante cargo de Inquisidor de Malta, junto com a consagração episcopal. Em 1639 foi promovido à nunciatura de Colônia; e em 1644 foi feito enviado extraordinário de Inocêncio X à conferência de Münster, na que postou energicamente defensor dos interesses Papais durante as negociações que conduziram, em 1648, à Paz de Vestfália. Inocêncio X o chamou para Roma em 1651 para ser seu Secretário de Estado, e em fevereiro de 1652, fez dele Cardeal. No conclave de 1655, famoso por sua duração de oitenta dias, e pelo choque de interesses nacionais e faccionais, o Cardeal Chigi foi eleito por unanimidade Papa. A escolha foi considerada providencial, numa época em que os religiosos estavam sendo forçados a perceber as consequências deploráveis, morais e financeiras do nepotismo, era necessário um Papa que governaria sem a ajuda de parentes. Durante um ano, as esperanças da cristandade pareciam ser realizadas. Alexandre proibiu seus parentes de vir a Roma. Sua própria santidade de vida, severidade da moral e aversão ao luxo tornaram mais resplandecentes suas virtudes e talentos. Mas no consistório de 24 de abril de 1656, influenciado por aqueles que temiam a fraqueza de uma corte Papal insustentada por laços de interesse da família, ele propôs trazer seu irmão e sobrinhos para ajudá-lo. Com o advento deles veio uma mudança marcante no modo de vida do Pontífice. A administração foi dada em grande parte nas mãos de seus parentes, e abusos nepóticos vieram a pesar mais do que nunca sobre o Papado. Os esforços dos Chigi para enriquecer a família foram considerados indulgentemente pelo Papa; mas, sempre piedoso e devoto, ele estava longe de ter uma participação nos excessos de seus sobrinhos amantes do luxo. Seu fardo para ser aliviado, passou a maior parte de seu tempo em atividades literárias e na sociedade dos eruditos; mas os amigos a quem ele favorecia eram aqueles que poderiam ser mais confiáveis como conselheiros.

               O Pontificado de Alexandre VII foi obscurecido por contínuas dificuldades com o jovem e mal aconselhado Luís XIV da França, cujos representantes eram uma constante fonte de aborrecimento para o Papa. O primeiro-ministro francês, Cardeal Mazarin, não perdoou o legado que se opôs resolutamente a ele nas conferências de Munster e Osnabrück, ou do Secretário de Estado Papal que ficou no caminho de sua política anti-romana. Durante o conclave, ele havia sido amargamente hostil a Chigi, mas no final foi obrigado a aceitar sua eleição como um compromisso. No entanto, ele impediu Luís XIV de enviar a habitual embaixada de obediência a Alexandre VII e, enquanto ele vivia, impediu a nomeação de um embaixador francês em Roma, enquanto os assuntos diplomáticos eram conduzidos por Cardeais protetores, geralmente inimigos pessoais do Papa. Em 1662, o igualmente hostil duque de Crequi tornou-se embaixador. Por seu abuso arbitrário do tradicional direito de asilo concedido aos distritos de embaixada em Roma, ele precipitou uma briga entre a França e o Papado, que resultou na perda temporária do Palácio do Papa de Avinhão e sua aceitação forçada do humilhante tratado de Pisa em 1664. Encorajados por esses triunfos, os jansenistas franceses, que reconheceram em Alexandre um velho inimigo, tornaram-se insolentemente assertivos, afirmando que as proposições condenadas em 1653 não seriam encontradas no “Augustinus” de Cornélio Jansen. Alexandre VII, que como conselheiro de Inocêncio X defendeu vigorosamente a condenação, confirmou-a em 1665 pela Bula “Ad Sacram” declarando que se aplicava ao supracitado trabalho de Jansen e ao próprio significado pretendido por ele; também enviou à França seu famoso “formulário”, a ser assinado por todo o Clero como um meio de detectar e extirpar o jansenismo. Seu reinado é memorável nos anais da teologia moral para a condenação de várias proposições errôneas. O Cardeal Hergenröther elogia sua moderação nas controvérsias dogmáticas acaloradas do período. Durante o seu reinado ocorreu a conversão da rainha Cristina da Suécia, que, após a sua abdicação, veio residir em Roma, onde no dia de Natal de 1655, foi confirmada pelo Papa, em quem encontrou um generoso amigo e benfeitor. Ajudou os venezianos a combater os turcos que haviam conquistado uma posição em Creta, e obteve em troca a restauração dos jesuítas, exilados em Veneza desde 1606. As relações inimigas entre Espanha e Portugal ocasionadas pela independência desta última (1640) foi uma fonte de julgamentos graves para Alexandre, como para outros Papas antes e depois dele. Alexandre VII fez muito para embelezar Roma. Casas foram niveladas para dar lugar a ruas mais retas e amplas praças, o Collegio Romano. As decorações da igreja de Sta. Maria del Popolo, igreja titular de mais de um dos Cardeais Chigi, a Scala Régia, a Cátedra de São Pedro na Basílica Vaticana e a grande colunata anterior ao edifício, fala tanto a genialidade de Bernini quanto a munificência de seu patrono Papal. Ele também foi um patrono da aprendizagem, modernizou a Universidade Romana, conhecida como Sapienza, e enriqueceu-a com uma magnífica biblioteca. Também fez extensas adições à Biblioteca do Vaticano. Sua tumba de Bernini é um dos mais belos monumentos de São Pedro.

 

238 . 1 - Aparição de Nossa Senhora à Maria de Jesus de Ágreda.

              Maria de Jesus de Ágreda, nascida Maria Coronel y Arana (Ágreda, 2 de abril de 1602 – Ágreda, 24 de maio de 1665), foi uma religiosa abadessa de Ágreda, cidade situada na província espanhola de Sória, tendo nascido e falecido nessa mesma localidade. Além de monja da Ordem da Imaculada Conceição, foi também uma importante escritora mística, e uma relevante figura na catequização dos indígenas na América Espanhola. Maria Coronel y Arana nome de batismo da Venerável Madre Maria de Jesus de Ágreda, nasceu no dia 2 de abril de 1602, na cidade de Ágreda em Sória. Sendo fruto do casamento de Francisco Coronel e Catalina de Arana, uma família de fidalgos, que tiveram onze filhos, no qual quatro deles sobreviveram: José, Francisco, Gerónima e María, que se tornará a futura Venerável Maria de Jesus de Ágreda. Desde muito pequena apresentou uma afeição pela religião e aos doze anos de idade se interessou em ingressar na vida religiosa. Diante das tentativas de entrar para o convento de Santa Ana de Carmelitas Descalças de Tarazona, sua família decidiu transformar sua casa em um convento. Segundo relatos, sua mãe Catalina de Arana, após receber um pedido divino, funda em sua casa o Convento de La Purísima Concepción, no qual toda sua família ingressa na religião. Em 1620, aos 18 anos, acompanhada de sua mãe e sua irmã, a monja toma seu hábito e se torna irmã Maria de Jesus, iniciando sua vida religiosa no convento de Ágreda, ao mesmo tempo que seu pai e seus irmãos passam a fazer parte de La Orden Primeira Franciscana do convento de San Antonio de Nalda.

               No início de sua vida religiosa, ainda em 1620, a monja presenciou momentos de êxtase, acompanhados de visões celestiais, que promoveram a fama de Santa milagrosa, uma vez que a população se reunia para assistir os momentos sobrenaturais. Em 1625, com apenas vinte três anos, a abadessa levitou diante dos olhos de sua mãe e irmã, protagonizando uma experiência mística. Sua vida diária era marcada por severos regimes, como perpétuo jejum, jejuava três dias na semana, reduzido o seu sustento muitas vezes a pão e água, que segundo relatos, a teriam provocado enfermidades, assim como penitências, como carregar uma cruz pesada durante um certo tempo e vigílias. Aos vinte cinco anos de idade, a irmã Maria de Jesus, por correspondência assinada e enviada pelo Papa, foi nomeada abadessa de Ágreda. Ao longo de sua vida a abadessa se destacou pela forte espiritualidade, marcada por penitências, fenômenos de bilocação e momentos de êxtases, segundo relatos participou da evangelização de indígenas da América, e se tornou uma importante escritora, que se pautava na religiosidade, e na espiritualidade barroca do século XVI e XVII. Sua obra a Mística Cidade de Deus, é uma biografia da Virgem Maria, que contempla a história da Virgem Santíssima. A vida da abadessa contempla aspectos interessantes, como a capacidade de bilocação (ato de estar em dois lugares diferentes ao mesmo tempo), que segundo relatos, a partir desse fenômeno, a monja evangelizou os indígenas na América espanhola, conforme relatos, os indígenas afirmavam que tinha recebido a visita da “Dama Azul”, que os tinha instruído para o batismo e para vida religiosa. Sua suposta bilocação foi investigada pela Inquisição. Outro aspecto notável, é a correspondência com Felipe IV, por vinte e dois anos, assim como o seu suposto papel como conselheira do monarca em assuntos políticos. A Venerável Maria de Jesus faleceu no dia 24 de maio de 1665, aos 63 anos, acometida por enfermidades, como fortes dores de cabeça e dificuldades respiratórias. Em 1673, iniciou-se o seu processo de beatificação, tendo chegado a ser declarada Venerável pelo Papa Clemente X. Após quatrocentos anos de sua morte, o seu corpo permanece incorrupto e encontra-se exposto na Igreja do convento de Ágreda.

               Entre os anos de 1643 a 1665, a monja manteve uma contínua troca de correspondência como Rei Felipe IV da Espanha, que em 1643 a caminho da Catalunha, visitou a abadessa no convento de Ágreda, iniciando uma relação epistolar que duraria o resto de suas vidas, tornando-se segundo relatos, uma conselheira do rei nos assuntos políticos. Assim, como manteve correspondência com outros membros da família real, como Isabel de Borbón, Baltasar Carlos, Mariana de Áustria, Don Juan José, bem como, membros da elite e da nobreza. Manteve também correspondência com Francisco de Borja, futuro Papa Clemente IX. A fecunda relação epistolar com Felipe IV, concedeu mais de seiscentas cartas, que constituem uma fonte histórica para o conhecimento da política espanhola do século XVII. As cartas contemplam conteúdos importantes como, a exposição dos pensamentos do monarca sobre a política interna e externa do reino, expõe uma reflexão das virtudes de um Príncipe, e a concepção de governo de Estado, assim, como as relações com seus ministros, conselheiros e mesmo com seus súditos. O monarca relata o comportamento do reino frente às potências europeias no tempo de paz e de guerra, bem como sua confiança na vontade divina, que sustentava a monarquia hispânica, conforme o providencialismo. As cartas são interrompidas com a morte da Venerável Maria de Jesus em 24 de maio de 1665.

Retrato da Maria de Jesus na catequização dos indígenas na América

               Durante suas bilocações, Maria de Jesus atuava no trabalho de evangelização dos índios. Alguns biógrafos contam que depois de catequizados, ela pedia para que os indígenas se dirigissem aos franciscanos para assim serem batizados. Um superior da Ordem Franciscana comunicou às autoridades religiosas que uma freira espanhola estava evangelizando os índios sem sair do convento em Ágreda, e que ela entendia os nativos assim como eles a entendiam também. As autoridades rapidamente quiseram especular o grandioso caso. A primeira investigação ocorreu em abril de 1629 e vários religiosos confirmaram o batismo de índios que antes foram perfeitamente catequizados por Maria de Jesus. Em 1630, o padre franciscano F. Alonso Benavides, viajou até a Espanha para comunicar a Ordem Franciscana o evento que estava acontecendo. Benavides encontrou com o P. Bernardino de Sena, general da Ordem, que o contou que já tinha sido noticiado, por outros religiosos, dos acontecimentos. No final de 1630, ordenaram Maria de Ágreda a relatar o caso ao padre Alonso Benavides, a abadessa confirmou firmemente que estava envolvida na catequização dos indígenas da América por meio da bilocação. Em 1631, a Inquisição se interessou pelo caso da freira. Portanto, em 1635, inquisidores tomaram testemunhos de alguns religiosos sobre o assunto, o que os levou, em 1649, a interrogar Maria de Jesus, porém, não encontraram razões suficientes para abrirem um processo contra ela.

Sua obra: “Cidade mística de Deus”

               Dentre todas as atividades que Maria de Jesus Ágreda desempenhou ao longo de sua vida, uma função de grande relevância foi a de escritora. Além das correspondências com Felipe IV, que permeou longo período da vida da abadessa, Maria de Jesus também escreveu a obra “Cidade Mística de Deus”

               O trabalho se trata de uma biografia da Virgem Maria, que segundo a freira, a própria Nossa Senhora revelava a ela os fatos a serem escritos. A obra está dividida em três partes na qual a primeira trata dos primeiros 15 anos de Maria, desde seu nascimento até o nascimento de Jesus. O segundo trata toda a vida de Cristo até sua morte e ressurreição. O terceiro é sobre o resto da vida da Virgem até sua morte e elevação aos céus. Maria de Jesus escreveu “Cidade mística de Deus” a primeira vez entre 1637 e 1643. Em 1655, a freira começou a escrever a obra novamente após ter ocorrido um acidente com os escritos anteriores, terminando em 1660. Durante sua vida o livro não foi publicado, pois a abadessa queria evitar problemas com a Inquisição, após cinco anos de sua morte, em 1670, a primeira edição foi publicada em Madri. O livro ocasionou grande impacto na sociedade do século XVII e XVIII. Em 1672, acusadores a denunciaram para Inquisição, e assim se iniciou um debate entre teólogos da Europa, consequentemente, o trabalho teve grande popularização. “Cidade mística de Deus” contribuiu muito para a fama e devoção de Maria de Jesus Ágreda diante ao mundo. Entre 1670 e 1965, a obra teve mais de 220 edições. O livro foi entregue à imprensa com a aprovação da Ordem Franciscana que também teve papel na sua divulgação.

               Duas passagem do Livro foram muito criticadas por teólogos, até mesmo por membros da Igreja, no que se refere na página 1228 onde Ágreda faz o seguinte comentário: “Era tão diligente, vigilante e oficiosa a prudentíssima Maria com o governo de sua família à Santa Igreja.” A outra passagem está na página 925 que diz: “Dividiu (o pão) com suas sagradas mãos, e se comungou a si mesmo em primeiro lugar.”

               Na primeira passagem criticam dizendo que o governo da Igreja não é de Maria, entendendo os críticos que o texto estava mencionando isto, que é contrário a doutrina da Igreja. Mas o texto não está dizendo que ela governa, mas sim que governa sua família em prol da Igreja e não diretamente a Igreja. Aquele acento à esquerda na letra “à”, significa “para a Igreja”, indica uma direção. Lembremos que Maria é a Sede da Sabedoria e Esposa da Igreja, e como Esposa eterna governa indiretamente a Igreja, com suas intervenções e pedidos no Céu, diretamente com o Criador.

               Na segunda passagem criticam dizendo que Jesus sendo Deus não poderia comungar a si mesmo, e com isso se esquecem do dogma referente as duas características que compõem Jesus Cristo, sendo verdadeiramente homem e Deus. Portanto quem comungou foi o homem Jesus, e também para mostrar aos futuros Sacerdotes nesta primeira Ceia Eucarística, que eles devem se comungar primeiro.

               Com tristeza tivemos críticos que até proibiram a circulação deste livro, sem nem ao menos fazerem uma reflexão sobre a vida desta Santa. O corpo incorrupto dela, já deveria fazer calar tais doutores difíceis. A incorruptibilidade do corpo após a morte é como se Deus estivesse dizendo: “Eis aí minha serva, acreditem nela.”  

 

238 . 2 - Aparição de Nossa Senhora de Laus

               Nossa Senhora de Laus (em francês: Notre-Dame du Laus) ou Refúgio dos Pecadores denota aparições marianas ocorridas entre 1664 e 1718 em Saint-Étienne-le-Laus, França, a Benoite Rencurel, uma jovem pastora. Foram aprovadas pela Santa Sé em 5 de maio de 2008. Situado em Dauphiné, no sul da França, no sopé dos Alpes, a sudeste de Gap, fica o vale de Laus. Seu nome significa "lago" no dialeto local, já que antes havia um no fundo da bacia. Em 1666, a aldeia tinha vinte famílias espalhadas em pequenas cabanas. Os habitantes construíram uma capela dedicada à Anunciação, Notre-Dame de Bon Rencontre (Nossa Senhora do Bom Encontro, ou seja, a Anunciação).

               Benoite nasceu em 16 de setembro de 1647, na extrema pobreza na aldeia de St Etienne d'Avancon. Seu pai morreu quando ela tinha apenas sete anos. Quando Benoite tinha doze anos, ela começou a trabalhar como pastora de ovelhas. Em maio de 1664, Benoite, de dezessete anos, viu uma aparição de São Maurício, um mártir do século III que foi muito homenageado em Laus. Era perto de uma capela próxima, então em ruínas, dedicada a São Maurício. Ele a avisou que se ela permanecesse naquela área, os guardas locais iriam levar seu rebanho se o encontrassem lá. São Maurício disse à pastorinha para ir ao Vale dos Fornos, acima de Saint-Étienne, onde ela iria ver a Mãe de Deus.

               Em 16 de maio, Benoite levou suas ovelhas para o Vale dos Fornos. Ela chegou a uma gruta, quando Maria, segurando o menino Jesus em seus braços, apareceu a ela. Sua oferta de compartilhar o pão duro que carregava fez a bela senhora sorrir, mas ela saiu sem dizer uma palavra. Por um período de cerca de quatro meses, a Senhora voltou todos os dias e Benoite a ouviu falar. Outros não conseguiram ouvir o que Maria disse. Em 29 de agosto, a Senhora disse a Benoite que seu nome era Maria.

               A Senhora instruiu Benoite a ir para Laus de sua própria aldeia próxima e procurá-la lá, "onde você sentirá um perfume muito bom". Benoite foi até Laus e encontrou uma velha capela dedicada a Notre Dame de Bonne Rencontre e, enquanto o cheiro do lindo perfume estava lá, a capela estava em mau estado. “É meu desejo que uma nova capela seja construída aqui em homenagem ao meu filho amado. Será um lugar de conversão para numerosos pecadores e irei aparecer aqui muitas vezes ", disse a bela senhora. Ela disse a Benoite que o óleo da lâmpada do Santuário faria milagres com os enfermos se eles recebessem a unção com fé em sua intercessão.

               Nossa Senhora de Laus pediu aos pecadores que fizessem penitência, uma capela de adoração eucarística a ser construída para que Jesus pudesse converter os pecadores, e uma casa para os padres ser construída para que pudessem administrar os Sacramentos aos pecadores. No centro da mensagem dada a Benoite está uma conversão de almas que visa trazer a plena reconciliação consigo mesmo, com os outros e com Deus. Alguns dos Santos que tiveram uma devoção particular a Nossa Senhora de Laus incluem Santo Eugênio de Mazenod (1782-1861), fundador dos Oblatos de Maria Imaculada; e São Pedro Juliano Eymard (1811–1868), fundador dos Padres e Servos do Santíssimo Sacramento. Quando São Pedro Juliano tinha onze anos, fez uma peregrinação de sessenta quilômetros a pé para rezar durante nove dias no Santuário enquanto se preparava para a primeira comunhão. Mais tarde, ele escreveu: "Foi lá que conheci e amei Maria pela primeira vez". Em 5 de maio de 2008, o Bispo Jean-Michel de Falco Leandri, Bispo de Gap, anunciou o reconhecimento das aparições pela Santa Sé como Nossa Senhora de Laus, Refúgio dos Pecadores.

 

239º - Clemente IX - 1667 - 1669

               Papa Clemente IX, nascido Giulio Rospigliosi, (Pistoia, 28 de janeiro de 1600 — Roma, 9 de dezembro de 1669) foi Papa e líder mundial da Igreja Católica de 20 de junho de 1667 até a sua morte. Nada de extraordinário ocorreu durante a curta administração de Clemente IX além do ajuste temporário das disputas entre a Santa Sé e os prelados da Igreja Gallican que se recusaram a participar da condenação dos escritos de Jansen. Ele foi mediador durante a paz de Aachen em 1668, nas guerras de sucessão entre França, Espanha, Inglaterra e Holanda. Ele era popular com o povo de Roma, não tanto por sua erudição e aplicação nos negócios, como por sua extrema caridade e sua afabilidade para com grandes e pequenos. Ele aumentou a boa vontade de seus súditos comprando o monopolista que havia garantido o "macinato", ou privilégio de vender grãos, e como seu antecessor havia coletado o dinheiro para esse fim, Clemente IX teve o decreto publicado em nome de Alexandre VII. Dois dias por semana, ele ocupava um confessionário na igreja de São Pedro e ouvia qualquer um que desejasse confessar a ele. Frequentemente visitava os hospitais e era generoso em esmola para os pobres. Em uma época de nepotismo, ele fez pouco ou nada para avançar ou enriquecer sua família. Em sua aversão à notoriedade, ele se recusou a permitir que seu nome fosse colocado nos prédios erguidos durante seu reinado. Clemente IX confirmou o culto de Margarida de Sabóia em 9 de outubro de 1669. Ele também beatificou Rosa de Lima em 15 de abril de 1668. Em 28 de abril de 1668, canonizou Maria Madalena de Pazzi e Pedro de Alcântara. Clemente IX morreu em Roma, supostamente de coração partido, em 9 de dezembro de 1669. Seu sucessor, o Papa Clemente X, construiu para ele uma tumba ornamentada na Basílica de Santa Maria Maior.

 

240º - Clemente X - 1670 - 1676

               Nascido em Roma, Elilio Altieri, eleito em 11 de maio de 1670 como sucessor de Clemente IX, foi eleito inesperadamente aos 80 anos e celebrou o 15º Jubileu (1675). Descendente de uma antiga e tradicional família romana, foi educado em um colégio de Roma e doutorou-se em jurisprudência. Foi nomeado para uma nunciatura na Polônia em 1623 e ordenou-se padre no ano seguinte. Depois de outros cargos foi novamente nomeado núncio em Nápoli em1637 e posteriormente na Polônia. Voltou à Roma (1654) e três anos depois foi nomeado pelo Papa Alessandro VII, Segretario della Congregazione dei Vescovi e dei Regolari e depois em 1669 foi nomeado Cardeal pelo Papa Clemente IX, de quem era amigo pessoal. Eleito Papa e apesar de uma vida virtuosa, a idade avançada dificultava sua atuação na administração da Igreja. Interveio na eleição do rei da Polônia, obtendo a nomeação de João Sobieski, muito prestigiado por suas convicções cristãs e por haver derrotado os turcos na batalha de Chaezim. Morreu com 86 anos de idade em 22 de julho de1676, em Roma, e foi sucedido por Inocêncio XI. Canonizou diversos Santos entre eles Ghaeteno de Thiene, Francesco Borgia e Rosa de Lima, a primeira Santa da América latina.

 

241º - Inocêncio XI - 1676 - 1689

               O Papa Inocêncio XI, nascido Benedetto Giulio Odescalchi (19 de maio de 1611 — Roma, 12 de agosto de 1689) foi eleito no dia 21 de setembro de 1676. Ficou conhecido como exemplo de humildade e humanidade, e, a nível de política, pela oposição a Luís XIV da França e pelo cognome de "Salvador da Hungria", por ter apoiado a reconquista da Europa Central e Oriental, então ocupada pelos turcos otomanos. Governou a Igreja Católica por 22 anos, até a sua morte em 1689. Em 1683, o exército turco cercava Viena e o Papa mobilizou os Príncipes alemães e o Rei polaco para socorrem aquele cidade, bem como mais tarde auxiliarem a libertação da ocupação turca da Hungria. A coligação de reinos católicos (Liga Santa dos Balcãs) organizada pelo Papa derrotou os turcos na Batalha de Viena em 12 de setembro de 1683, às portas de Viena. A coligação reuniu 170 000 homens, provenientes dos estados alemães, do Sacro Império, da nobreza italiana, e de polacos guiados pelo valor do seu próprio rei, Jan III Sobieski que triunfou, sem precedentes, sobre as forças turcas que contavam com mais de 300 000 soldados, e que vinham de incendiar e derramar sangue de civis nos estados do mar Negro e dos Balcãs, bem como nas cidades de Buda e de Pest, na Hungria. A França não formava parte da coligação, porque se tinha comprometido com os turcos do Império Otomano, a sustentá-lo logisticamente, em armas e economicamente sem lhe importar as consequências da ameaça turca para o resto da Europa. Isso valeu a Luís XIV, o roi soleil, o epíteto de "le roi maure" (o rei mouro). Após ganhar a batalha de Viena, a Liga Santa levou a cabo a tomada da Hungria, na qual as cidades de Buda e de Pest foram reconquistadas em 1686. Ao mesmo tempo, os venezianos puseram em marcha uma expedição à Grécia, que conquistou o Peloponeso. Durante o ataque de Veneza de 1687 sobre a cidade de Atenas (ocupada pelos otomanos), os otomanos converteram o Partenon num paiol de munições. Um morteiro veneziano atingiu o Partenon, detonando a pólvora armazenada no seu interior destruindo-o parcialmente. A derrota turca e o triunfo da coligação católica-ortodoxa foi devida às incessantes exortações de Inocêncio XI para que os estados alemães e o rei da Polônia Jan III Sobieski se apressassem a ajudar Viena. Após este rotundo triunfo Inocêncio XI não teve nenhuma reserva para induzir os Príncipes cristãos a que completassem a expulsão dos turcos do resto da Europa, contribuindo financeiramente para tal. Teve a satisfação de sobreviver à captura de Belgrado, em 6 de setembro de 1688. Constantinopla seria recuperada pela última vez em 1697. Após uma causa difícil pela sua canonização, iniciada em 1741 por Bento XIV, e que gerou considerável controvérsia ao longo dos anos, foi beatificado em 7 de outubro de 1956 por Pio XII. Inocêncio XI tem sido considerado como um dos mais importantes Papas do século XVII, conhecido pela sua Santidade, piedade, firmeza e educação. Seu dia festivo é 12 de agosto.

 

242º - Alexandre VIII - 1689 - 1691

               O Papa Alexandre VIII nascido Pietro Vito Ottoboni (Veneza, 22 de abril de 1610 — Roma, 1 de fevereiro de 1691). Foi Papa de 6 de outubro de 1689 até o dia da sua morte. Foi eleito Papa após intervenção do então Rei francês Luís XIV, tendo chegado a um acordo com esse rei acerca da liberdade galicana. Alexandre VIII ajudou sua Veneza natal, através de generosos subsídios na guerra contra os turcos, e também enviou sete galés e 2 mil de infantaria para a campanha na Albânia. Em 1690, ele condenou as doutrinas do chamado pecado filosófico, ensinado nas escolas jesuítas. Ele também realizou três consistórios que viram quatorze novos Cardeais elevados. Alexandre VIII confirmou o culto de Cunegunda da Polônia em 11 de junho de 1690, que serviu de beatificação. Em 16 de outubro de 1690, ele canonizou vários Santos: SS. Pascoal Bailão, Lorenzo Giustiniani, João de Sahagún, João de Deus e João de Capistrano. Foi moderado no governo do Estado Pontifício, diminuiu os impostos e fez concessões aos agricultores, e foi também responsável pela ampliação da Biblioteca Vaticana. Alexandre VIII morreu em 1 de fevereiro de 1691. Sua grandiosa tumba em São Pedro foi encomendada por seu neto, Cardeal Pietro Ottoboni, e projetada pelo conde Arrigo di San Martino. O baixo-relevo na base e as figuras laterais foram esculpidas por Angelo de Rossi, enquanto a estátua de bronze do Papa foi lançada por Giuseppe Bertosi.

 

243º - Inocêncio XII - 1691 - 1700

               Papa Igreja cristã Romana nascido em Spinazzola, Bari, Antonio Pignatelli, eleito em 15 de julho de 1691 como sucessor de Alexandre VIII, em cujo Pontificado procurou com atos oficiais combater o nepotismo, o que lhe trouxe numerosas e perigosas antipatias. Descendente de uma família de Príncipes napolitanos, foi nomeado sucessivamente núncio na Toscana, na Polônia e em Viena, Bispo de Lecce (1672), Cardeal e Bispo de Faenza (1681), Arcebispo de Nápoles (1687) e, quatro anos depois (1691), sucedeu o Papa Alexandre VIII, após um longo conclave. Condenou o nepotismo com a bula Romanum decet pontificem em 1692 que vetava aos futuros pontífices a concessão de bens e cargos da Igreja aos próprios parentes, ocupou-se do aprimoramento do Clero e resolveu a divisão existente entre o Papado e a coroa francesa. Obteve em 1693 de Luís XIV a renúncia às proposições galicanas da histórica Declaração dos Quatro Artigos (1682) e a retratação dos Bispos responsáveis pelos artigos galicanos, em troca o Papa reconheceu os Bispos do Rei. Obrigou os párocos a usarem a batina todos os dias e a fazerem os exercícios espirituais. Inocêncio XII já estava gravemente doente em 25 de dezembro de 1699 com gota (uma doença reumática) e, portanto, não pôde assistir à abertura solene da Porta Santa na Basílica de São Pedro para marcar o início do Jubileu de 1700, daí o Cardeal Emmanuel-Théodose de La Tour d'Auvergne representou o Pontífice na celebração solene. No Domingo de Páscoa de 1700, o Pontífice gravemente doente deu uma bênção da sua varanda às grandes multidões no exterior do Palácio do Quirinal. Apesar de sua doença, nomeou três novos Cardeais em junho de 1700. Morreu em 27 de setembro de 1700, em Roma.

 

244º - Clemente XI - 1700 - 1721

               Nascido em Urbino, Giovanni Francesco Albani, eleito Papa em 8 de dezembro de 1700, sucedendo Inocêncio XII, o primeiro Papa do século XVIII. Cultor e protetor das artes, enriqueceu com antigos códices orientais a Biblioteca Vaticana, secretário dos Breves (1687), foi nomeado Cardeal-diácono pelo Papa Alexandre VIII (1690) e ordenado Sacerdote (1700), no mesmo ano em que tornou-se Papa. Apesar de ter uma vida de piedade e oração, seu Pontificado foi bastante conturbado durante a guerra de sucessão ao trono na Espanha em 1708, procurou manter uma difícil posição de neutralidade. A guerra terminou com os tratados de Utrecht, Rastadt e Baden (1712-1714), que conferiram à Europa uma disposição territorial favorável para o Papado. Após uma dura luta jurisdicional com Vítor Amadeu II, de Sabóia, que recebera o título de Rei da Sicília em decorrência da paz de Utrecht, lançou a interdição sobre a ilha. Combateu dura e decididamente o jansenismo, que progredira muito na França, com a bula Vineam Domini (1705) e depois com a Unigenitus (1713), em que eram condenadas as 101 proposições do livro do jansenista Quesnel, e que constitui um documento fundamental da controvérsia. O jansenismo era uma doutrina pregada por Jansênio (1585-1638), teólogo holandês e Bispo de Ypres, sobre a graça, a predestinação e a capacidade moral do homem, e adotada na abadia de Port-Royal por várias correntes espirituais com tendência ao rigorismo moral. Clemente XI era um Patrono das artes e da ciência. Ele também foi um grande benfeitor da Biblioteca do Vaticano; seu interesse pela arqueologia é creditado por salvar grande parte da antiguidade de Roma. Ele autorizou expedições que conseguiram redescobrir vários escritos cristãos antigos e autorizou escavações das catacumbas romanas. Clemente XI confirmou o culto de Ceslas Odrowaz (27 de agosto de 1712), Jakov Varingez (29 de dezembro de 1700), João de Perugia (11 de setembro de 1704), Peregrine Laziosi (11 de setembro de 1702), Pedro de Sassoferrato (11 de setembro de 1704), Buonfiglio Monaldi (1 de dezembro de 1717), Papa Gregório X (8 de julho de 1713) e Humbeline de Jully (1703). Ele beatificou formalmente um número de indivíduos: Alexis Falconieri, Bartholomew degli Amidei e Benedict Dellantella (1 de dezembro de 1717) e John Francis Régis (24 de maio de 1716).

               Canonizou André Avelino, Catarina de Bolonha, Félix de Cantalice e Papa Pio V em 22 de maio de 1712, Humildade em 27 de janeiro de 1720, Sancha de Portugal em 10 de maio de 1705, Teresa de Portugal em 20 de maio de 1705, Estevão de Obazine em 1701 e Peregrino Laziosi em 1702. Clemente XI criou um total de 70 Cardeais em 15 consistórios. Notavelmente, um Cardeal de sua própria criação foi Michelangelo dei Conti, que se tornou seu sucessor imediato, futuro Papa Inocêncio XIII. Outra decisão importante de Clemente XI foi em relação à controvérsia dos ritos chineses: os missionários jesuítas foram proibidos de participar de honras pagas a Confúcio ou aos ancestrais dos Imperadores da China, que Clemente XI identificou como "idólatras e bárbaros" e acomodar a linguagem cristã às idéias pagãs sob o argumento de conciliar os pagãos. Clemente XI morreu em Roma em 19 de março de 1721 às 12h45 e foi enterrado na calçada da Basílica de São Pedro, em vez de em uma tumba ornamentada como as de seus antecessores.

 

244 . 1 - Aparição de Nossa Senhora Aparecida – Portugal – Balugães

               O Santuário de Nossa Senhora Aparecida (ou Santuário da Aparecida) é um Santuário mariano localizado em Balugães, freguesia situada no concelho de Barcelos, no norte de Portugal. Trata-se de um local de peregrinação cristã e devoção católica, enraizada nas aparições de Nossa Senhora ao pastor João Alves em 1702 – tratando-se, assim, das primeiras aparições marianas oficialmente reconhecidas pela igreja católica em Portugal. Todos os anos, a 15 de agosto, acorrem em peregrinação a este templo milhares de fiéis, principalmente das cerca de 30 paróquias circundantes de Balugães. As origens do Santuário datam ao ano de 1702 e às aparições de Nossa Senhora um jovem pastor chamado João Alves. Cumprindo a vontade expressa por Nossa Senhora nas aparições, André Alves, pai do vidente João e pedreiro de profissão, ergueu naquele local, por volta de 1704, uma pequena ermida em homenagem à Nossa Senhora Aparecida, contando com as esmolas oferecidas pelos populares para tal empreendimento.

              Nesta primitiva ermida, colocou-se uma pequena imagem de Nossa Senhora com cerca de dois palmos, mandada fazer por uma devota bracarense. À medida que as aparições ganhavam popularidade junto dos devotos da região, e com um crescente número de peregrinos a rumar à ermida, cresceram também as esmolas. Nesta altura, uma barcelense por nome Dona Antónia, julgando que a imagem era muito pequena, mandou fazer no Porto outra imagem de madeira esculpida, ricamente estofada, com quatro palmos de altura, a qual foi colocada a 1 de novembro de 1704 na mesma ermida. Espalhando-se a fama das aparições e relatos de milagres subsequentes atribuídos a Senhora Aparecida, estes chegaram à atenção do Arcebispo Primaz de Braga, D. Rodrigo de Moura Teles que, examinando pessoalmente os factos ocorridos, atestou a veracidade dos mesmos, tendo nomeado João Alves como Ermitão da Senhora Aparecida, título que surge no assento de óbito do mesmo, falecido a 25 de setembro de 1710, em Balugães, e sepultado no interior da ermida.

               Nesta mesma visita, os devotos pediram a construção de um templo maior, que foi mandado edificar pelo mesmo D. Rodrigo de Moura Teles, utilizando para tal as esmolas dos devotos e muita pedra recolhida pelos mesmos. Em 1712, Frei Agostinho de Santa Maria, religioso do convento de Évora e, mais tarde, do Convento da Boa Hora em Lisboa, dá a conhecer as aparições no tomo quarto da sua obra "Santuário Mariano". Chegando notícia das aparições à corte do rei D. Pedro II, este mandou fazer uma coroa de prata para a imagem da Senhora Aparecida. A construção do templo iniciou em 1707 e conclui-se em 1720. Em 1927, o templo tornou-se a igreja paroquial de Balugães. A 9 de maio de 1962, constituiu-se a Confraria de Nossa Senhora Aparecida.

               Segundo a Igreja Católica, datam de agosto de 1702 várias aparições de Nossa Senhora a João Alves, também conhecido como "João Mudo", um simples pastor nascido por volta de outubro de 1682, conforme o seu registo de batismo, datado de 7 de outubro de 1682. Na altura com dezanove anos, João Alves é descrito como um "cândido e simples moço" que "não sabia benzer-se nem rezar o Padre Nosso". Nas Memórias Paroquiais de 1758, o pároco de Balugães descreve-o como tendo sido mudo, ou pouco inteligível. Segundo relatos da época, a primeira aparição teria acontecido no topo de um penedo no monte de Castro de Balugães "numa tarde cálida de Agosto", enquanto o jovem João guardava o seu rebanho. No momento da aparição, João curou-se da sua mudez e tornou-se inteligível. Nesta primeira manifestação, a Senhora pediu-lhe que João mandasse a seu pai, André Alves, erguer naquele local uma ermida. Não acreditando nas palavras do seu simples filho por não o julgar capaz e merecedor de tal manifestação, André Alves não lhe deu crédito.

               Desolado, João recorre novamente à Senhor Aparecida, que o consola, garantindo que teria sucesso nesta sua embaixada. Pouco depois, estando André Alves a trabalhar numa obra, veio o seu filho João carregando um cântaro com água ao ombro. Ao atravessar uma ponte muito alta, João caiu aparatosamente, porém sem se magoar. Espantosamente, no decorrer desta queda, o dito cântaro continuou assente no ombro de João, sem ter vertido uma única gota de água. Assistindo o seu pai e muitos outros presentes a este estupendo acontecimento, e recordando-se do pedido do seu filho, dirigiu-se com o mesmo ao local da aparição, tendo experenciado um "celestial e milagroso" cheiro, exalado do penedo sobre o qual a Senhora teria aparecido. Inspirado por tal acontecimento, André Alves iniciou a construção de uma pequena ermida, com esmolas que se pediram para este empreendimento. Curado do seu mutismo, João foi nomeado Ermitão de Nossa Senhora Aparecida por Rodrigo de Moura Teles, cargo que exerceu até à sua morte em 1710. O complexo do Santuário é composto pela capela erguida no local das aparições e pelo templo inaugurado em 1720, que hoje serve de igreja paroquial de Balugães, estando este situado em frente da capela. O altar-Mor da igreja paroquial, com a Imagem da Senhora da Abadia, revestido a talha, sofreu obras de restauro em meados da década de 1980. No monte, em plano superior ao adro do Santuário, encontra-se a estátua de João Alves.

 

244. 2 - Prodígio de Nossa Senhora Aparecida – Brasil

               Em 1717 três pescadores, após frustrada tentativa de apanhar peixes no rio Paraíba do Sul perto de Guaratinguetá (SP), colheram em suas redes o corpo de uma estátua de Maria SS. e, depois, a cabeça da mesma. A este fato se seguiu farta pescaria, que surpreendeu os três homens. Tendo limpado e recomposto a imagem, expuseram-na à veneração dos fiéis em casas de família. Verificaram-se, porém, alguns portentos, que chamaram a atenção do Pe. José Alves Vilela, pároco de Guaratinguetá. Este então decidiu construir para a Santa Mãe uma capela capaz de satisfazer ao crescente número de devotos da Virgem.

               Tal capela foi substituída por outra maior no morro dos Coqueiros em 1745, morro que tomou o nome de “Aparecida” (hoje cidade de Aparecida do Norte). Em 1846 foi iniciada a construção de templo mais vasto, que ainda hoje subsiste. No ano de 1980 foi concluída monumental Basílica, alvo de peregrinações numerosas durante o ano inteiro. Em 1930 o Brasil foi solenemente consagrado a Nossa Senhora Aparecida pelo Cardeal D. Sebastião Leme na presença do Sr. Presidente da República e de numerosas autoridades religiosas, civis e militares. Os acontecimentos de fins de 1995 chamaram a atenção para Maria Santíssima tal como é venerada em Aparecida do Norte (SP) e no Brasil inteiro na qualidade de Padroeira do nosso país. Sabe-se que tal devoção se deve a uma pesca surpreendente cercada de fatos extraordinárias, que suscitaram a piedade dos fiéis da região de Guaratinguetá e, posteriormente, a da população de todo o Brasil. Em 1930 a Virgem Santíssima foi proclamada Padroeira do Brasil sob o título de Nossa Senhora da Conceição Aparecida (ou Nossa Senhora Imaculada em sua Conceição e Aparecida nas águas do rio Paraíba do Sul). Já que versões diversas correm sobre o desenrolar dessas aparições e os atos subsequentes, apresentaremos, a seguir, a genuína história dos eventos registrados.

APARIÇÃO E AS PRIMEIRAS MANIFESTAÇÕES POPULARES

               Em princípios do séc. XVIII lutas, por vezes sangrentas, agitavam os exploradores dos veios de ouro em Minas Gerais. Em março de 1717, embarcou em Lisboa, com destino ao Rio, Dom Pedro de Almeida e Portugal, Conde de Assumar, que vinha substituir Dom Braz Balthasar da Silveira no governo da Capitania de São Paulo e Minas. Chegando ao Rio em junho de 1717, o Conde de Assumar mostrou-se logo interessado em conhecer a situação da sua capitania. Seguiu, pois, em agosto para São Paulo, sede do governo respectivo, do qual tomou posse aos 4 de setembro do mesmo ano. Em vista, porém, dos tumultos registrados em Minas por motivo das minas de ouro. Dom Pedro de Almeida e Portugal resolveu dirigir-se ao local das desordens. Partiu, portanto, de São Paulo aos 25 ou 26 de setembro de 1717, deixando como substituto nessa cidade Manoel Bueno da Fonseca, oficial de grande patente. Após cerca de 17 dias de viagem, isto é, aos 11 ou 12 de outubro de 1717, chegava o Conde de Assumar, com sua comitiva, à região de Guaratinguetá. Entre os acontecimentos faustosos que então se deram relatam os manuscritos da época o seguinte:

               A Câmara da Vila notificou então os pescadores que apresentassem todo o peixe que pudessem haver para o dito governador. Entre muitos, foram pescar em suas canoas Domingos Martins Garcia, João Alves e Felipe Pedroso e, principiando a lançar suas redes no porto de José Corrêa leite, continuaram até o porto de Itaguassú, grande distância, sem tirar peixe algum. E lançando neste porto João Alves a sua rede, de rasto tirou o corpo da Senhora, sem cabeça, e, lançando mais abaixo outra vez a rede, tirou a cabeça de mesma Senhora, não se sabendo nunca quem ali a lançasse. E, continuando a pescaria, não tendo até então peixe algum, dali por diante foi tão copiosa em poucos lances que, receosos de naufragarem pelo muito peixe que tinham nas canoas, ele e os companheiros se retiraram a suas moradas, admirados deste sucesso. Eis o que referem os documentos mais antigos em torno do aparecimento da Virgem. A título de ilustração, pode-se acrescentar que o porto de José Corrêa Leite, donde partiram os três mencionados pescadores, se achava à margem esquerda do rio Paraíba no bairro Tetequera (município de Pindamonhangaba). A imagem encontrada media 38 cm de altura e apresentava cor bronzeada. Impressionados pelo fenômeno, principalmente pela pesca portentosa que se seguiu à descoberta da estátua, os três mencionados pescadores limparam com grande cuidado a imagem, e verificaram que representava Nossa Senhora da Conceição, que o povo sem demora passou a chamar “Senhora Aparecida”. Felipe Pedroso conservou a imagem em sua casa durante vários anos; por fim, resolveu dá-la a seu filho Atanásio, que morava em Itaguassú, porto onde se dera o encontro da estátua. Atanásio, movido então pela sua fé, ergueu um pequeno oratório, onde depositou a venerável efígie; aí começou o povo da vizinhança a reunir-se aos sábados à noite, a fim de rezar o Santo rosário e praticar as suas devoções. Certa vez, durante uma dessas práticas aconteceu que, embora a noite estivesse muito calma, de repente se apagaram as velas que alumiavam a imagem da Senhora. Os fiéis, querendo reacendê-las, verificaram com surpresa que elas por si, sem intervenção de alguém, se reacenderam. Foi este o primeiro prodígio registrado em torno da Senhora Aparecida. O mesmo portento se repetiu em outras ocasiões, chegando a notícia ao conhecimento do pároco de Guaratinguetá, Pe. José Alves Vilela. O Sacerdote decidiu então construir para a estátua uma capelinha mais ampla, capaz de satisfazer ao crescente número dos devotos da Virgem, a qual ia multiplicando graças a benefícios sobre os fiéis. Em breve, também essa capelinha se tornou pequena demais. Foi preciso pensar em nova construção em lugar mais elevado que a margem do rio. Escolhido o morro dos Coqueiros, o mais vistoso e acessível dos que margeiam o Paraíba, começou-se ali em 1743 a edificação de novo santuário, com a provisão do bispo do Rio de Janeiro, Dom Frei João da Cruz; aos 26 de julho de 1745, a obra terminada foi devidamente benta, dando lugar à celebração da primeira Missa. Doravante o morro e suas cercanias tomaram o nome de “Aparecida”, designação até hoje conservada. “Aparecida do Norte” é designação popular, pois a cidade fica a sudeste do Estado de São Paulo. Entre os milagres que muito provocavam o fervor do povo, conta-se o do escravo, ocorrido por volta de 1790 e famoso nos tempos subsequentes. Segundo a versão mais abalizada, as correntes se soltaram das mãos do escravo, quando este implorava a proteção de Nossa Senhora Aparecida diante da respectiva imagem. Eis como o refere o Pe. Claro Francisco de Vasconcelos pelo ano de 1838: “Um escravo fugitivo, que estava sendo conduzido de volta à fazenda pelo seu patrão, ao passar pela Capela, pediu para fazer oração diante da Imagem. Enquanto o escravo estava em oração, caiu repentinamente a corrente, deixando intato o colar que prendia seu pescoço. A corrente se encontra até hoje pendente da parede do mesmo Santuário como testemunho e lembrança de que Maria Santíssima tem suprema autoridade para desatar as prisões dos pecadores arrependidos. Aquele senhor, tocado pelo milagre, ofereceu a Nossa Senhora o preço dele e o levou para casa com uma pessoa livre, a fim de amar e estimar aquele seu escravo como pessoa protegida pela soberana Mãe de Deus” (relato extraído da obra de Júlio J. Brustoloni, A Mensagem da Senhora Aparecida, Ed. Santuário, Aparecida, SP, 1994).

               O Santuário de Aparecida e a paróquia da cidade, onde situa-se a primeira Basílica, são conduzidas e geridas pelos Sacerdotes de congregação dos Redentoristas. Foi o Papa Pio XI que proclamou Nossa Senhora Aparecida como Padroeira do Brasil. O grande e Santo Papa Pio X foi quem autorizou e abençoou, desde o Vaticano, a coroação da Imagem como sendo de Nossa Senhora, em 04/09/1904. Comprovando que não foi acaso ter sido escolhido o dia 13 para a abolição da escravatura, a coroa de Nossa Senhora foi doada pela Princesa Isabel. Anteriormente, ano da abolição 1988, foi inaugurada a 1ª Basílica em Aparecida; (hoje, transformada na Matriz da Paróquia). A atual Basílica, Santuário Nacional de Aparecida, foi concluída em 1984, após 29 anos de construção. No subsolo encontramos a Sala dos Milagres, com milhares de testemunhas e agradecimentos por graças alcançadas.Na Basílica de Aparecida é possível receber até setenta mil pessoas. Em todo o mundo apenas a Basílica de São Pedro, em Roma, é maior. A festa em honra a Nossa Senhora Aparecida, feriado nacional, acontece em 12 de outubro. O comparecimento médio anual situa-se próximo a 250.000 pessoas, apenas no dia da festa. Durante o ano todo o total estimado fica próximo a 4 milhões de romeiros. Dois Papas já estiveram em Aparecida: João Paulo II em junho de 1980 e Bento XVI em maio de 2007.

 

244. 3 - Nossa Senhora desatadora dos nós

               Nossa Senhora Desatadora dos Nós é um dos títulos que os fiéis deram à Virgem Maria com toda fé e carinho. Este título em especial originou-se na Alemanha, por volta do ano 1700. Naquele tempo, o pároco da capela de St. Peter, na cidade de Augsburg, encomendou um quadro de Nossa Senhora ao pintor Johann Schmittdner. O pintor era um cristão fervoroso e conhecedor das escrituras. Por isso, antes de pintar o quadro, ele foi buscar inspiração nas palavras de Santo Irineu, Bispo de Lyon, que viveu no Século III. Ele encontrou um texto chave, que diz: “Eva atou o nó da desgraça para o gênero humano, Maria por sua obediência o desatou.”

               Por causa dessas palavras inspiradas de Santo Irineu, Johann Schmittdner concebeu um quadro onde Nossa Senhora é representada como a Imaculada Conceição e aparece entre o céu e a terra. Acima dela, o Espírito Santo derrama suas luzes. Em sua cabeça tem 12 estrelas, lembrando o texto de Apocalipse da Mulher vestida de Sol. Do lado esquerdo da Virgem um anjo aparece e entrega-lhe uma fita com nós grandes e pequenos, separados e juntos. Estes nós simbolizam o pecado original e nossos pecados cotidianos. Esses pecados nos causam problemas, nos levam para longe de Deus e nos impedem que a graça de Deus frutifique em nossas vidas. Do lado direito das mãos de Maria, a fita aparece sem nós e desce lisa até às mãos de outro anjo, mostrando que Maria está desatando os nós. Simboliza a vida nova mergulhada em Deus e na sua misericórdia e o poder libertador das mãos de Maria.

               A pintura em madeira tem 1,1 metro de largura por 1,82 metros de altura, na parte debaixo da Virgem Maria, há um anjo, um homem e um cachorro dirigindo-se a uma igreja. Este simbolismo parece ser uma referência ao livro de Tobias (6,13). No Livro, através da oração, do jejum, da ajuda do Arcanjo Rafael e do poder de Deus, Tobias liberta Sara de uma maldição e casa-se com ela. Depois volta à casa de seu pai com um remédio que o Anjo Rafael lhe mandara fazer e o pai fica curado. Os pés da Virgem estão pisando numa serpente (Como diz em Genesis), sobre uma meia lua (Ap 12, e como na pintura miraculosa vinda do Céu expressa na imagem de Nossa Senhora de Guadalupe). E assim é a imagem de Nossa Senhora Desatadora dos Nós, rica de mensagens, simbolismos e profundidade teológica. Com toda certeza este quadro foi inspirado pelo Espírito Santo, visto a força sobrenatural que ele exerce nas pessoas. Desde que o quadro foi colocado na capela de Augsburg, Nossa Senhora é invocada como a Mãe que desata os nós do pecado e dos problemas que nos prendem. O quadro está lá até hoje e a capela é cuidada pelos jesuítas.

               O belíssimo quadro de Nossa Senhora rapidamente se tornou objeto de devoção e culto primeiramente em Augsburg. Logo, notícias de graças sobre graças recebidas através da oração à Nossa Senhora Desatadora dos Nós se espalhou pelo mundo. E onde quer que se leve a devoção, as graças acontecem. Nossa Senhora desata os nós da vida das pessoas, trazendo liberdade, realização e felicidade. São milhares de graças alcançadas através desta oração poderosa. O dia de Nossa Senhora Desatadora dos Nós é comemorada sempre em 15 de Agosto.

Oração a Nossa Senhora Desatadora dos Nós:

               Virgem Maria, Mãe do belo amor, Mãe que jamais deixa de vir em socorro a um filho aflito, Mãe cujas mãos não param nunca de servir seus amados filhos, pois são movidas pelo amor divino e a imensa misericórdia que existem em teu coração, volta o teu olhar compassivo sobre mim e vê o emaranhado de nós que há em minha vida.  Tu bem conheces o meu desespero, a minha dor e o quanto estou amarrado por causa destes nós.  Maria, Mãe que Deus encarregou de desatar os nós da vida dos seus filhos, confio hoje a fita da minha vida em tuas mãos. Ninguém, nem mesmo o maligno poderá tirá-la do teu precioso amparo. Em tuas mãos não há nó que não poderá ser desfeito.  Mãe poderosa, por tua graça e teu poder intercessor junto a Teu Filho e Meu Libertador, Jesus, recebe hoje em tuas mãos este nó.........  Peço-te que o desates para a glória de Deus, e por todo o sempre.  Vós sois a minha esperança.  Ó Senhora minha, sois a minha única consolação dada por Deus, a fortaleza das minhas débeis forças, a riqueza das minhas misérias, a liberdade, com Cristo, das minhas cadeias.  Ouve minha súplica.  Guarda-me, guia-me, protege-me, ó seguro refúgio! Maria, Desatadora dos Nós, roga por mim.

Novena de Nossa Senhora Desatadora dos nós:

Rezar todos os dias

1- Faça o sinal da cruz;

2- Faça o Ato de Contrição e reflita sobre seus pecados: “Meu Deus, eu me arrependo, de todo o coração, de vos Ter ofendido, porque sois tão bom e amável. Prometo, com a ajuda da vossa graça, nunca mais pecar. Meu Jesus, misericórdia!”

3- Reze o Terço (as três primeiras dezenas);

4- Faça a meditação de cada dia da novena;

5- Complete as duas dezenas finais do Terço;

6- Termine com a oração à Maria Desatadora.

1º Dia- Santa Mãe querida, Maria santíssima, que desata os nós que sufocam os teus filhos, estende tuas mãos de misericórdia para mim. Entrego-Te hoje este nó [colocar a intenção] e todas as consequências negativas que ele provoca em minha vida. Dou-te este nó, que me atormenta e me faz infeliz e tanto me impede de unir-me mais a ti e a teu Filho Jesus, meu Salvador. Recorro a ti, Maria Desatadora de Nós, pois confio e sei que nunca desprezas o filho pecador que vem pedir-te auxílio. Eu creio que tu podes desatar esse nó pois tudo te é concedido por Jesus. Eu creio que tu queres desatar o nó porque és minha Mãe. Eu creio que tu o farás porque me amas com eterno amor. Obrigado, Mãe querida.

2º Dia- Maria, Mãe amada, dispensadora de todas as graças, volto a ti meu coração, hoje, reconhecendo-me pecador e necessitado do teu auxílio. Muitas vezes, chego a perder as graças que me concedes por causa do meu pecado de egoísmo, de orgulho, rancor e falta de generosidade e humildade. Recorro a ti, hoje, Maria Desatadora dos Nós, a fim de pedir para mim a teu filho Jesus um coração puro, despojado, humilde e confiante. Viverei o dia de hoje praticando essas virtudes e ofertarei como sinal do meu amor por ti. Entrego em tuas mãos este nó [colocar a intenção], que me impede de refletir a glória de Deus.

3º Dia- Mãe Medianeira, Rainha do Céu, em cujas mãos se encontram as riquezas do Rei, volta os teus olhos misericordiosos para mim hoje. Confio nas tuas mãos santas este nó da minha vida, e todo o rancor, o ressentimento que ele me causa. Peço-te perdão, e a Deus Pai, pelo meu pecado. Ajuda-me, agora, a perdoar todas as pessoas que, consciente ou inconscientemente, provocaram esse nó. Dá-me também a graça de perdoar a mim mesmo por ter provocado esse nó. Só assim poderás desatá-lo. Diante de ti, Mãe querida, e em nome de teu Filho Jesus, meu Salvador, a quem tantas ofensas foram feitas, tendo sido concedido o perdão, eu perdoo agora essas pessoas e perdoo a mim mesmo para sempre. Obrigado, Maria Desatadora dos Nós, por desatar o nó do rancor em meu coração e o nó que agora te apresento. Amém.

4º Dia- Santa Mãe querida, generosa para com todos os que te procuram, tem piedade de mim. Confio em tuas mãos este nó que rouba a paz do meu coração, que paralisa a minha alma e impede-me de caminhar até o meu Senhor e servi-lo com a minha vida. Desata este nó da minha vida, Mãe, e pede a Jesus pela cura da minha fé paralítica, que se deixa abater pelas pedras do caminho. Caminhando contigo, Mãe querida, que eu veja essas pedras como amigas, que eu não murmure mais e aprenda a dar graças sem cessar e sorrir confiante no teu poder.

5º Dia- Mãe Desatadora dos Nós, generosa e compassiva, venho a Ti, hoje, para renovar a entrega deste nó [colocar a intenção] em minha vida e te pedir a sabedoria divina para agir sob a luz do Espírito Santo neste emaranhado de problemas. Nunca ninguém te viu irada. Ao contrário, tão repassada de doçuras eram tuas palavras, que se reconhecia o Espírito Santo em tua boca. Tira de mim a amargura, a cólera, o ódio que esse nó me causou. Dá-me, ó Mãe querida, da tua doçura, da tua sabedoria, refletindo tudo em silêncio, no coração. E como estiveste em Pentecostes, roga a Jesus para que eu receba um novo sopro do Espírito Santo neste momento em minha vida. Espírito Santo, vem sobre mim!

6º Dia- Rainha de Misericórdia, confio a ti este nó da minha vida e rogo-te dar-me um coração de espera enquanto o desatas. Ensina-me a perseverar na palavra viva de Jesus, na Eucaristia, no sacramento da confissão. Enfim, fica comigo e prepara o meu coração para festejar com os anjos esta graça a mim já concedida. Amém. Aleluia!

7º Dia- Mãe Puríssima, venho a ti, hoje, para suplicar que desates este nó da minha vida e me livres das ciladas do Mal. Deus te concedeu grande poder sobre todos os demônios. Renuncio a todos eles, hoje, a toda ligação que tive com eles e proclamo Jesus como meu único Senhor e Salvador. Maria Desatadora dos Nós, esmaga a cabeça do maligno na minha vida e destrói as armadilhas que eles me fizeram provocando esse nó. Obrigado, Mãe querida. Sangue Preciosíssimo de Jesus, liberta-me!

8º Dia- Virgem Mãe de Deus, rica em misericórdia, tem piedade de teu filho e desata este nó na minha vida. Preciso de tua visita em minha vida, como visitaste Isabel. Traz-me Jesus, traz-me o Espírito Santo. Ensina-me a praticar as virtudes da coragem, da alegria, da humildade, da fé, e como Isabel, ficar cheio do Espírito Santo. Faz-me estremecer de alegria em teu seio, Maria. Consagro-te como minha Mãe, minha Rainha, minha amiga. Dou-te o meu coração e tudo o que me pertence (minha casa, minha família, meus bens exteriores e interiores). Sou teu para sempre. Coloca em mim o teu coração, para que eu possa fazer tudo o que Jesus me disser.

9 º Dia- Maria Santíssima, advogada nossa, Desatadora dos Nós, venho hoje para agradecer-te por desatares este nó na minha vida. Tu bem conheces os sofrimentos que ele me causa. Obrigado por vires, Mãe, com teus longos dedos de misericórdia, secar as lágrimas dos meus olhos, acolher-me em teus braços e me fazeres recebedor de mais uma graça divina.

Maria Desatadora dos Nós, Mãe querida, a ti agradeço por desatares os nós da minha vida. Cobre-me com teu manto de amor, guarda-me na tua proteção, ilumina-me com tua paz! Amém.

Súplica à Nossa Senhora Desatadora dos Nós

               Santa Maria Mãe de Deus, Tu que, como mulher e mãe, respondeste a Deus: “Que se faça a Tua vontade”, contagie-nos dessa força, a força da Tua Fé e de Teu Amor. Maria, eu venho a Ti, cheia de dor, chorando meu sofrimento nos braços de uma Mãe que sempre escuta, que tudo suporta, que tudo crê.

               Creia, minha Mãe, creia em minha dor e em minhas angústias; o que não faria uma mãe por seu filho; o que não farias Tu, Maria, minha Mãe, para mim? Eu te peço somente para me escutares, que minhas súplicas cheguem a Ti, e Tu as leve até o Filho Bem Amado e que intercedas por mim. Que eu também possa dizer: “Sim, Senhor, que se faça a Tua vontade”. Dá-me, Maria, a capacidade de aceitar os desígnios que o Senhor tem para comigo.

               Maria, guia-me, protege-me, desata o emaranhado de meus problemas. Somente Tu liberta, somente Tu desatas, somente Tu e Teu Filho podem me libertar da opressão com que vivo, da qual estou consciente que somente nós, homens, somos os que tropeçamos no caminhar do dia a dia, e somos os que nos enredamos nos laços do orgulho, da soberba, da incompreensão, da falta de caridade e solidariedade. Por isso, recorro a Ti, Maria, minha Mãe, para que me livres e desates os nós que me impedem de ser feliz e estar mais juntos de Ti e de Teu Filho. Para que, com a oração perseverante, dobremos os nossos duros corações e possamos elevar-nos a um mundo mais generoso.

Maria, escuta minhas preces.

Amém.

 

245º - Inocêncio XIII - 1721 - 1724

               Inocêncio XIII, nascido Michelangelo Conti, (Roma, 13 de maio de 1655 — Roma, 7 de março de 1724) foi Papa entre 8 de maio de 1721 e a data da sua morte. O Papa Inocêncio XIII era orientado para a reforma e impôs novos padrões de frugalidade, abolindo gastos excessivos. Ele tomou medidas para finalmente acabar com a prática do nepotismo, emitindo um decreto que proibia seus sucessores de conceder terras, escritórios ou renda a quaisquer parentes - algo contra o qual muitos Cardeais esperavam quando se tornassem Papa e beneficiassem suas famílias. Em 1721, sua alta reputação de habilidade, aprendizado, pureza e uma disposição amável garantiram sua eleição para suceder Clemente XI como Papa Inocente XIII. Seu Pontificado foi próspero, mas comparativamente sem intercorrências. Ele realizou dois consistórios que viram três novos Cardeais elevados em 16 de junho de 1721 e 16 de julho de 1721. A controvérsia dos ritos chineses que começou sob seu antecessor continuou durante seu reinado. Inocente XIII proibiu os jesuítas de prosseguir com sua missão na China e ordenou que nenhum novo membro fosse recebido na ordem. Essa indicação de suas simpatias encorajou alguns Bispos franceses a se aproximarem dele com um pedido de retirada da bula Unigenitus, pela qual o jansenismo havia sido condenado; o pedido, no entanto, foi negado categoricamente. O Papa também ajudou os venezianos em suas lutas e também ajudou Malta em suas lutas contra os turcos. Inocêncio XIII, como seu antecessor, mostrou muito favor a Jaime Francisco Eduardo Stuart, o "Velho Pretendente" ao trono britânico e o apoiou liberalmente. O primo do Papa, Francesco Maria Conti, de Siena, tornou-se camareiro da pequena corte de James no Palácio romano de Muti. Inocêncio XIII beatificou três indivíduos durante seu Pontificado: João Nepomuceno (31 de maio de 1721), Dalmazio Moner (13 de agosto de 1721) e Andrea dei Conti (11 de dezembro de 1723). Em 1722, ele nomeou Santo Isidoro de Sevilha como Doutor da Igreja. Inocêncio XIII adoeceu em 1724, atormentado por uma hérnia da qual não falava com ninguém além de seu criado. Em um ponto, ele explodiu e causou inflamação e febre. Inocêncio XIII pediu os últimos ritos, fez sua profissão de fé e morreu em 7 de março de 1724, aos 68 anos de idade, enterrado nas grutas da Basílica de São Pedro.

 

246º - Bento XIII - 1724 - 1730

               Bento XIII, O.P. nascido Pietro Francesco Orsini (Gravina in Puglia, 2 de Fevereiro de 1649 — Roma, 21 de Fevereiro de 1730) foi Papa de 29 de maio de 1724 até a data da sua morte. Teve como parentes alguns Papas, por parte de pai: Papa Estêvão III, Papa Paulo I, Papa Celestino III e Papa Nicolau III e por parte de mãe: Papa Pio II e Papa Pio III. Foi frade dominicano. Não era um homem de assuntos mundanos, e se esforsava para manter seu estilo de vida monástico. Tentou acabar com o estilo de vida decadente do Sacerdócio italiano e do Cardinalato. Ele também aboliu a loteria em Roma e nos Estados Papais, que serviu apenas para lucrar com os estados vizinhos que mantinham a loteria pública. Homem apaixonado por todo o ascetismo e celebrações religiosas, construiu vários hospitais, mas, segundo o Cardeal Lambertini (mais tarde Papa Bento XIV) "não tinha ideia de como governar". Em 1727, ele inaugurou a famosa Escadaria Espanhola e fundou a Universidade de Camerino. Em 1728, a intervenção de Bento estabeleceu uma controvérsia, a respeito das relíquias de Santo Agostinho, que irrompeu em Pavia, Itália. Ele finalmente confirmou a autenticidade dos ossos de Agostinho, que havia sido descoberta em 1695 na Basílica San Pietro, em Ciel d'Oro. (Stone, Harold Samuel (2002). "Ossos de Agostinho: Uma Micro-História", pp. 90-93. O governo dos Estados Papais foi efetivamente mantido no lugar de Bento XIII pelo Cardeal Niccolò Coscia, que fora Secretário do Papa quando ele era Arcebispo de Benevento e que cometeu uma longa série de abusos financeiros em seu próprio benefício, causando a ruína do Tesouro Papal. Coscia e seus associados isolaram efetivamente Bento de outros consultores. Nas relações externas, ele lutou com João V de Portugal e os jansenistas na França. Bento XIII beatificou Bernardino de Feltre em 1728, Pedro Fourier em 20 de janeiro de 1730, Hyacintha de Mariscotti em 1 de setembro de 1726, Fiel de Sigmaringa em 24 de março de 1729, Vicente de Paulo em 13 de agosto de 1729 e John del Prado em 24 de janeiro. Através do processo de Canonização equipolenta, Bento XIII canonizou o Papa Gregório VII em 24 de maio de 1728. Conferiu Santidade a Inês de Montepulciano em 1726, Luís de Gonzaga em 31 de dezembro de 1726, Boris de Kiev em 1724, Francisco Solano em 27 de março de 1726, Gleb em 1724, Tiago das Marchas e Toríbio de Mongrovejo em 10 de dezembro de 1726, João Nepomuceno em 19 de março de 1729, João da Cruz e Peregrino Laziosi em 27 de dezembro de 1726, Margarida de Cortona em 16 de maio de 1728 e Serapion de Argel em 14 de abril de 1728. O Papa nomeou Pedro Crisólogo como Doutor da Igreja em 1729. Bento XIII foi subitamente atacado por uma febre repentina, do qual morreu em 21 de fevereiro de 1730 aos 81 anos. Sua morte foi tornada pública ao povo no dia seguinte.

 

 247º - Clemente XII - 1730 - 1740

               Clemente XII, nascido Lorenzo Corsini (Florença, 7 de abril de 1652 — Roma, 6 de fevereiro de 1740) foi Papa de 12 de julho de 1730 até a data da sua morte. Chegara aos 79 anos de idade e ficou cego aos 81, mas era robusto. Seus primeiros movimentos como Papa Clemente XII foi restaurar as finanças Papais. Ele exigiu a restituição dos Ministros que abusaram da confiança de seu antecessor. O principal culpado, o Cardeal Niccolò Coscia, foi pesadamente multado e condenado a dez anos de prisão. As finanças Papais também foram melhoradas com o reavivamento da loteria pública, que havia sido reprimida pela severa moralidade de Bento XIII. Logo, despejou no tesouro de Clemente XII uma quantia anual de quase meio milhão de escudos, permitindo-lhe empreender os extensos programas de construção dos quais ele é lembrado primordialmente, mas que ele nunca foi capaz de ver. Um concurso para a majestosa fachada do Arquibasílica de São João de Latrão foi vencido pelo arquiteto Alessandro Galilei. A fachada que ele projetou é talvez mais palaciana do que eclesiástica, concluída em 1735. Clemente XII ergueu naquela Basílica antiga uma magnífica capela dedicada a seu parente do século XIV, Santo André Corsini. Ele restaurou o Arco de Constantino e construiu o Palácio governamental da Consulta no Quirinal. Comprou do Cardeal Alessandro Albani por 60 mil escudos uma famosa coleção de estátuas, inscrições etc. e a adicionou à galeria do Capitólio. Ele pavimentou as ruas de Roma e as estradas que conduziam à cidade e ampliou o Corso. Começou o triunfante Barroco Fontana di Trevi, um dos ornamentos notáveis de Roma. Sob seu reinado, um porto foi construído em Ancona, com uma estrada que dava fácil acesso ao interior. Drenou os pântanos da malária do Chiana perto do Lago Trasimeno. Politicamente, no entanto, este não foi um Papado de sucesso entre as potências seculares da Europa. Quando a tentativa das forças Papais de dominar a antiga República independente de San Marinho fracassou. Ele também foi rejeitado nas reivindicações Papais sobre os ducados de Parma e Piacenza. Em agosto de 1730, ele autorizou Vítor Amadeu II da Sardenha a realizar um casamento morganático com Anna Canalis di Cumiana. Victor Amadeus II posteriormente abdicou de seu trono, causando grande agitação em Savoy.

               Em assuntos eclesiásticos, ele emitiu “In eminenti apostolatus”, o primeiro decreto Papal contra os maçons em 28 de abril de 1738. Premeditando a seita maçônica como futura dominadora dos altos cargos Eclesiásticos. Canonizou São Vicente de Paulo e prosseguiu com vigor contra os jansenistas franceses. Ele fez campanha pela reunião das igrejas romana e ortodoxa, recebeu o Patriarca da igreja copta e persuadiu o Patriarca armênio a remover o anátema contra o Concílio de Calcedónia e o Papa Leão I (440–461). Ele enviou Joseph Simeon Assemani ao Oriente com o duplo objetivo de continuar sua busca por manuscritos e presidir como legado de um conselho nacional de maronitas. Embora ele fosse cego e obrigado a se deitar, de onde dava audiências e negócios de Estado, cercou-se de oficiais capazes, muitos deles parentes de Corsini, mas pouco fez por sua família, exceto para comprar e ampliar a propriedade. Palácio construído em Trastevere para o Riarii, e agora conhecido como o Palazzo Corsini (a sede da Regia Accademia dei Lincei). Em 1754, seu sobrinho, o Cardeal Neri Corsini, fundou ali a famosa Biblioteca Corsini. Clemente XII criou 35 Cardeais em quinze consistórios mantidos ao longo de seu Pontificado. O primeiro indivíduo que ele criou Cardeal foi seu sobrinho Neri Maria Corsini, enquanto ele também elevou seu futuro sucessor, Carlo della Torre di Rezzonico (Papa Clemente XIII), ao Cardinalado.

               O Papa nomeou cinco novos Santos durante seu reinado, sendo o mais notável Vicente de Paulo. Ele também beatificou outros oito, incluindo seu antecessor, o Papa Bento XI. Clemente XII morreu em 6 de fevereiro de 1740 às 09h30 devido a complicações da gota. Seus restos mortais foram transferidos para sua tumba na Arquibasílica de São João de Latrão em 20 de julho de 1742.

 

248º - Bento XIV - 1740 - 1758  

               Papa Bento XIV, nascido Prospero Lorenzo Lambertini (Bologna, 31 de março de 1675 — Roma, 3 de maio de 1758), foi Papa de 17 de agosto de 1740 até sua morte. Foi eleito com 50 votos entre 51 votantes do longuíssimo conclave de 1740. Talvez um dos melhores eruditos a se sentar no Trono Papal, mas muitas vezes esquecido, ele promoveu o aprendizado científico, as artes barrocas, o revigoramento do tomismo e o estudo da forma humana. Firmemente comprometido em cumprir os decretos do Concílio de Trento e os autênticos ensinamentos católicos, Bento XIV removeu as alterações feitas anteriormente no Breviário, procurou pacificamente reverter o crescente secularismo nos tribunais europeus, revigorou as cerimônias com grande pompa e, ao longo de sua vida e seu reinado, publicou numerosos tratados teológicos e Eclesiásticos. Ao governar os Estados Papais, ele reduziu a tributação de alguns produtos, mas também aumentou os impostos sobre outros; incentivou a agricultura e apoiou o livre comércio nos Estados Papais. Estudioso, criou os Museus Sagrados e Profanos, agora parte do atual Museu do Vaticano. Bento XIV, em certa medida, pode ser considerado um polímata devido a seus numerosos estudos de literatura antiga, à publicação de livros e documentos Eclesiásticos, ao seu interesse no estudo do corpo humano e à sua devoção à arte e à teologia.

               O papado de Bento XIV começou em um momento de grandes dificuldades, alimentado pelo anticlericalismo e causado principalmente pelas disputas entre governantes católicos e o Papado sobre as demandas governamentais de nomear Bispos, em vez de deixar a nomeação para a Igreja. Ele conseguiu superar a maioria desses problemas - as disputas da Santa Sé com o Reino de Nápoles, Sardenha, Espanha, Veneza e Áustria foram resolvidas. A constituição apostólica Pastoralis Romani Pontificis, que foi a revisão de Bento XIV da anatematização tradicional de Coena Domini, foi promulgada em 30 de março de 1741. Nela, Bento XIV excomungou novamente todos os membros das seitas protestantes, incluindo luteranos, calvinistas, seguidores de Zuinglio e Huguenotes. Ele ordenou que os conselhos ecumênicos não fossem recorridos pelos oponentes das decisões Papais. Bento XIV, no entanto, ecoando as palavras do Papa Gelásio I, proibiu universalmente a prática de mulheres servindo o Sacerdote no altar, observando que a prática havia se espalhado para certos ritos orientais. Bento XIV sofria de problemas renais há anos. Sua saúde piorou em 1758 e, após uma batalha contra a gota, ele morreu em 3 de maio de 1758, aos 83 anos. Suas palavras finais para aqueles que o cercavam no leito de morte foram: "Deixo você nas mãos de Deus". Após seu funeral, ele foi enterrado na Basílica de São Pedro e um grande catafalco foi erguido em sua homenagem.

 

248 . 1 - Santo Afonso de Ligório

               Afonso Maria de Ligório, C.Ss.R., nascido Afonso Maria Antônio João Francisco Cosme Damião Miguel Ângelo Gaspar de Ligório, foi um Bispo católico italiano que se destacou como escritor espiritual, filósofo escolástico e teólogo. Nascido numa família nobre de Nápoles, Ligório teve uma brilhante carreira em direito antes de ser ordenado padre. Depois disso, fundou uma ordem religiosa, a Congregação do Santíssimo Redentor (chamados "redentoristas") dedicada ao trabalho entre os pobres. Em 1762, foi nomeado Bispo de Santa Ágata dos Godos. Afonso foi um escritor prolífico, publicando nove edições de sua "Teologia Moral" ainda em vida, além de outras obras devocionais e ascetas, assim com muitas cartas. Entre suas obras mais famosas estão "As Glórias de Maria" e "O Caminho da Cruz", esta última utilizada ainda hoje em muitas paróquias durante os serviços religiosos da Quaresma. Afonso foi canonizado em 1839 pelo Papa Gregório XVI. Em 1871, Pio IX proclamou-o Doutor da Igreja (Doctor Zelantissimus). Um dos autores católicos mais lidos, é também o Santo padroeiro dos confessores.

               Afonso de Ligório nasceu em Marianella, perto de Nápoles, que na época era território do Reino de Nápoles. Era o primogênito de sete irmãos nascidos numa família nobre. Dois dias depois de seu nascimento foi batizado na Igreja de Nossa Senhora a Virgem como "Afonso Maria Antônio João Cosme Damião Miguel Gaspard de' Liguori". Aos 12 anos entra para a faculdade de direito onde se forma com 16 anos. Terminou os estudos universitários alcançando o doutorado nos direitos civil e canônico e começou a exercer a profissão de advogado. Porém, pensava em deixar a profissão e escreveu, numa de suas cartas: "Amigo, nossa profissão é muito cheia de dificuldades e perigos; levamos uma vida infeliz e corremos o risco de morrermos infelizes. No meu caso, vou largar esta carreira, que não me serve; pois desejo assegurar a salvação da minha alma". Aos vinte e sete, depois de perder um importante caso—o primeiro nos oito anos advogando—Afonso finalmente se resolveu e abandonou a carreira.

               Em 1723, depois de um longo processo vocacional, Afonso decidiu se oferecer como noviço no Oratório de São Filipe Néri com a intenção de tornar-se padre. Seu pai tentou o quanto pode dissuadi-lo, mas depois de dois meses (e com a permissão de seu confessor oratoriano), os dois chegaram num acordo: ele estudaria para o Sacerdócio como um oratoriano, mas vivendo em sua casa. Ele foi ordenado em 21 de dezembro de 1726, aos trinta anos de idade, e passou seus primeiros anos de Sacerdócio entre os jovens mendigos e marginalizados de Nápoles. Para dar-lhes um propósito, criou as "Capelas Noturnas", que eram gerenciadas por eles próprios e que rapidamente tornaram-se centros de oração, pregação, atividades comunitárias e educação. Quando morreu, havia 72 funcionando, com mais de 10000 participantes ativos. Ajudava no sucesso da empreitada o fato de seus sermões serem muito efetivos na conversão dos que já haviam abandonado a crença católica.

               Afonso sofreu de escrúpulos quando adulto e sentia constantemente uma culpa até mesmo sobre as pequenas falhas relacionadas ao pecado. Mais do que isso, Santo Afonso via muitas vezes esses escrúpulos como uma bênção, como quando escreveu: "Escrúpulos são úteis no início da conversão... eles limpam a alma e, ao mesmo tempo, a tornam mais cuidadosa". Em 1729, Afonso saiu da casa de sua família e mudou-se para o Instituto Chinês em Nápoles. Foi ali que se iniciou a sua experiência missionária nas regiões interiores do Reino de Nápoles, onde encontrou pessoas que eram muito mais pobres e abandonadas do que qualquer jovem de rua de Nápoles.

               Em 9 de novembro de 1732, Afonso fundou a "Congregação do Santíssimo Redentor" depois que a irmã Maria Celeste Crostarosa contou-lhe que lhe havia sido revelado que ele era o escolhido de Deus para este trabalho. O objetivo da Congregação era ensinar e pregar nas favelas das cidades maiores e em regiões empobrecidas. Além disso, os redentoristas se dedicavam a combater o jansenismo, uma heresia que, por seu excessivo rigor moral, impedia muitos católicos de receberem a Eucaristia. O próprio Afonso dedicou-se de corpo e alma à nova missão e, para ajudá-lo, irmã Maria Celeste fundou simultaneamente a ordem das irmãs redentoristas, tendo como diretor espiritual Afonso Maria. Afonso foi consagrado Bispo de Santa Ágata dos Godos em 1762. Ele tentou recusar a nomeação, alegando que sua idade e saúde não permitiriam que fizesse um bom trabalho. Durante seu Episcopado, escreveu sermões, livros e artigos para encorajar a devoção ao Santíssimo Sacramento e à Virgem Maria. Em 1775, recebeu permissão para se aposentar e foi viver numa comunidade redentorista em Pagani, onde morreu em 1 de agosto de 1787. Ele foi beatificado em 15 de setembro de 1816 pelo Papa Pio VII e Canonizado em 26 de maio de 1839 pelo Papa Gregório XVI. Papa Pio XII declarou-o Santo padroeiro dos confessores e moralistas em 26 de abril de 1950 e escreveu a encíclica Haurietis Aquas sobre ele.

               Afonso era um artista proficiente e seus pais contrataram vários mestres para treiná-lo na música, pintura, poesia e na literatura. E ele colocou toda sua criatividade literária e artística a serviço da missão cristã e pedia o mesmo de todos os que se juntavam à sua congregação. Sua biografia diz que, em seus últimos anos, Afonso gostava de ir até o teatro local, que na época gozava de péssima reputação. Depois de ser ordenado, sempre que ia a algum recital, Afonso tirava os óculos e sentava-se bem no fundo, simplesmente ouvindo a música sem prestar atenção a mais nada. Ele escreveu 111 obras sobre espiritualidade e teologia. As 21 500 edições de suas obras, traduzidas para 72 línguas, comprovam que Afonso é, de fato, um dos mais lidos autores católicos. A oração e seu poder, o amor, o seu relacionamento pessoal com Cristo e sua experiência em primeira-mão sobre as obras pastorais fizeram de Afonso um dos grandes mestres da vida espiritual. Sua obra musical mais conhecida é um hino natalino chamado "Quanno Nascetti Ninno", traduzido depois para o italiano pelo Papa Pio IX como "Tu scendi dalle stelle" ("Do Céu Estrelado Viestes").

               No campo da mariologia, Afonso escreveu "As Glórias de Maria", "Devoção Mariana", "Orações à Mãe Divina", "Canções Espirituais", "A Verdadeira Esposa de Cristo", "As Visitas ao Santíssimo Sacramento e à Virgem Maria" e muitas outras. Sua doutrina, de natureza majoritariamente pastoral, redescobriu, integrou e defendeu a mariologia de Santo Agostinho e Santo Ambrósio (ambos Doutores da Igreja como Afonso) e de outros Padres da Igreja; ela representava uma defesa intelectual da mariologia no século XVIII, a época do Iluminismo, contra o frio racionalismo que combatia o entusiasmo mariano de maneira inflamada.

               A maior contribuição de Afonso para a Igreja Católica foi no campo da teologia moral com sua "Teologia Moral". Esta obra nasceu da experiência pastoral de Afonso, de sua habilidade em responder às questões práticas enfrentadas pelos fieis e de seu contato com os problemas do dia-a-dia. Ele era contra o legalismo estéril e o rigorismo estrito. De acordo com Afonso, estes eram caminhos contrários ao Evangelho pois "tal rigor jamais foi ensinado ou praticado pela Igreja". Seu sistema de teologia moral se destaca pela prudência, evitando tanto o relaxamento quanto o rigor excessivo. Geralmente é atribuída a Afonso a posição de equiprobabilista, que evitava tanto o rigorismo jansenista quanto o laxismo e o simples probabilismo. Um mestre da teologia moral, Pio IX declarou-o Doutor da Igreja em 1871. Os redentoristas fundaram a Academia Alfonsiana para o estudo avançado da teologia moral católica inspirados por Santo Afonso. A Academia oferece licenciaturas e doutorados na disciplina.

 

248 . 2 - Aparição de Nossa Senhora da Ortiga - Portugal

               Nossa Senhora da Ortiga é uma das designações atribuídas à Santíssima Virgem Maria após a aparição que ocorreu no século XVIII a uma pastorinha muda, no lugar da Ortiga, na freguesia de Fátima, em Portugal. De acordo com a tradição, a Virgem Maria apareceu por volta do ano de 1758 – no lugar onde atualmente se ergue o Santuário de Nossa Senhora da Ortiga – a uma pastorinha que andava a guardar o seu rebanho e a quem pediu uma ovelhinha. A menina, que era muda de nascença, sentiu a sua língua soltar-se e respondeu à Senhora que não Lhe daria a ovelha sem a permissão do seu pai que morava no Casal de Santa Maria. Então, a menina foi a correr para contar ao pai o pedido da Senhora, o qual se encheu de espanto e de alegria por ver a filha conseguir falar e logo lhe ordenou que fizesse tudo o que a Senhora pedisse. A pastorinha regressou ao local da aparição para falar à Mãe de Deus que, em resposta, lhe pediu que fosse construída uma capela naquele lugar e onde prometeu que haveria de conceder muitas graças. Tendo ido o pai da menina ao local por esta indicado, encontrou uma imagem da Virgem Maria sobre uma pedra entre urtigas (ou ortigas) e que levou consigo para o Casal de Santa Maria, mas a imagem desapareceu dali para ser vista novamente no local original entre as urtigas. Foi construída uma pequena capela no local da aparição de Nossa Senhora, a qual, depois, foi ampliada dando lugar a um Santuário.

 

249º - Clemente XIII - 1758 - 1769

               Papa Igreja cristã Romana, nascido em Veneza, Carlo Rezzonico, eleito Papa em 16 de julho de 1758 para suceder Bento XIV, demonstrou, ao contrário deste, grande rigidez e combateu a difusão das idéias iluministas e enfrentou um período caracterizado pelo anticlericalismo difundido nos Estados europeus. Foi governador de Rieti e posteriormente de Fano, indicado Cardeal-diácono por Clemente XII, foi nomeado Bispo de Pádua (1743). Seu Pontificado se caracterizou pelo Iluminismo e, entre outras atitudes, condenou abertamente a Encyclopédie. Era amigo dos jesuítas e procurou defendê-los das perseguições, acusados de crimes que não haviam cometido, por Portugal, França e Espanha. Praticamente todo o seu Pontificado foi ocupado pela questão da abolição da Companhia de Jesus, requerida por muitos países. Os jesuítas já haviam sido expulsos de Portugal em 1758, da França (1764), da Espanha (1767), dos outros Estados regidos pela dinastia de Bourbon, mas o Papa recusou-se a aderir ao pedido de supressão da Ordem. Por essa posição os governantes cristãos da Europa exigiram sua renúncia, ameaçando fundar suas próprias igrejas.

               Nasceu em Veneza e era filho do Barão Giovani Battista della Torre-Rezzonico e de Vitória Barbarigo. No início do Pontificado, Clemente XIII escreveu cartas aos soberanos da Europa, empenhados na guerra dos Sete Anos (1756-1763). O novo Papa conseguiu extinguir a velha animosidade entre a sua cidade natal Florença, e a sede do Papado, Roma. Socorreu o povo na carestia de 1764, acolhendo quatorze mil pessoas. Obrigou os latifundiários dos Estados Pontifícios a plantarem em suas terras. Mandou velar nos museus as obras artísticas consideradas por alguns de realismo exagerado. Coibiu abusos de copistas inescrupulosos, que se serviam dos Arquivos romanos. Reprovou em 1764, o livro em que João Nicolau de Hontheim (Johann Nikolaus von Hontheim), escondido atrás do pseudônimo de Justinus Febronius, atacava a soberania do Papa. A negação de toda a religião, pregada sob a capa de racionalismo por Voltaire, Rousseau e outros, desencadeou a perseguição aos batalhadores da Igreja, os Jesuítas. Em Portugal o Marquês de Pombal implicou-os num atentado contra o rei Dom José; mandou queimar o Padre Gabriel Malagrida (velho de 72 anos) e expulsou os demais, também do Brasil, onde eram os únicos mestres e a base da instrução. Perseguiam-nos na França o ministro Choiseul e a marquesa de Pompadour; na Espanha o conde de Aranda; no reino de Nápoles o ministro Bernardo Tanucci; no ducado de Parma o chanceler Guillaume du Tillot. Até os cavaleiros de Malta, em sua maioria portugueses, rejeitavam os Jesuítas, apenas defendidos pelo Papa, através da bula Apostolicum pascendi múnus. Pressionado por este enorme conflito, convocou uma congregação Cardinalícia para discutir a questão, mas morreu misteriosa e repentinamente. Morreu em 2 de feverei-ro de 1769, em Roma.

 

250º - Clemente XIV - 1769 - 1774

               Papa Igreja cristã Romana, nascido em Sant’Arcangelo di Romagna, Forlì, hoje Rimini, Giobanni Vincenzo Ganganelli, eleito em 4 de junho de 1769 para suceder Clemente XIII. Estabeleceu relações com os reinos católicos e dissolveu a Companhia de Jesus. Frade da Ordem dos menores conventuais, professor de teologia, foi convocado pelo Papa Bento XIV, para dirigir o Colégio São Boaventura em 1740, em Roma. Tornou-se consultor do Santo Ofício (1746) e foi nomeado Cardeal por Clemente XIII (1759), a quem sucederia dez anos depois. Diante do problema da Ordem dos Jesuítas, não resolvido por seu predecessor e temendo um novo cisma na Igreja, que já perdera a Inglaterra e parte da Alemanha, julgou conveniente para os interesses da Igreja dar seu consentimento ao pedido feito por tantos Estados católicos e, com a bula Dominus ac Redemptor noster, dissolveu a Companhia de Jesus (1773), satisfazendo a Espanha, Portugal e França. Seu gesto foi severamente julgado pelo colégio Cardinalício e ainda hoje é discutido pelos historiadores, que o consideram governado por simpatias pelo jansenismo e fruto de pressões políticas da França e da Espanha. Pelo menos não culpou os jesuítas de crimes ou heresias e os seguidores de Santo Inácio de Loyola obedeceram ao Papa. Também deve-se a ele o início da secagem dos Pauis Pontinos e a fundação do Museu Clementino que por causa do trabalho de seu sucessor Pio VI, passou a se chamar Museu Pio-Clementino. Morreu em 22 de setembro de 1774, em Roma.

 

251º - Pio VI - 1775 - 1799

               Papa Pio VI, nascido Giovanni Angelico Braschi, (Cesena, 25 de dezembro de 1717 – Valença, 29 de agosto de 1799) foi Papa de 15 de fevereiro de 1775 até a sua morte. Pio VI convocou e iniciou o ano do jubileu de 1775. Os atos anteriores de Pio VI deram uma promessa justa de governo reformista e abordaram o problema da corrupção nos Estados Papais. Embora ele fosse geralmente benevolente, Pio VI às vezes mostrava discriminação. Ele nomeou seu tio Giovanni Carlo Bandi como Bispo de Ímola em 1752 e depois como membro da Cúria Romana, Cardeal no consistório em 29 de maio de 1775, mas não ofereceu nenhum outro membro de sua família. Ele repreendeu o Príncipe Potenziani, governador de Roma, por não ter lidado adequadamente com a corrupção na cidade, nomeou um conselho de Cardeais para remediar o estado das finanças e aliviar a pressão dos impostos, chamado a prestar contas a Nicolò Bischi pelo gasto de fundos destinado à compra de grãos, reduziu os desembolsos anuais ao negar pensões de muitas pessoas proeminentes e adotou um sistema de recompensa para incentivar a agricultura.

               Após sua eleição, Pio VI ordenou a libertação de Lorenzo Ricci, Superior Geral da Companhia de Jesus, que foi mantido prisioneiro no Castel Sant'Angelo, mas o general morreu antes da chegada do decreto de libertação. Talvez seja devido a Pio VI, que os jesuítas conseguiram escapar à dissolução na Rutênia Branca e na Silésia. Em 1792, o Papa considerou o restabelecimento universal da Companhia de Jesus como um baluarte contra as idéias da Revolução Francesa, mas isso não aconteceu.

               Além de enfrentar a insatisfação com essa política de temporização, Pio VI encontrou protestos práticos tendendo à limitação da autoridade Papal. João Nicolau de Hontheim, escrevendo sob o pseudônimo de "Febronius", o principal expoente literário alemão das ideias galicanas das igrejas católicas nacionais, foi ele próprio induzido (não sem escândalo) a retratar publicamente suas posições; mas foram adotados na Áustria. Lá as reformas sociais e Eclesiásticas que haviam sido empreendidas pelo Imperador José II e seu ministro Kaunitz, como uma maneira de influenciar as nomeações dentro da hierarquia católica, tocou a supremacia de Roma quase que, na esperança de permanecer com eles, Pio VI adotou o curso excepcional de visitar Viena pessoalmente. Ele deixou Roma em 27 de fevereiro de 1782 e, embora magnificamente recebido pelo Imperador, sua missão provou ser um fiasco; alguns anos depois, ele conseguiu coibir os Arcebispos alemães que, em 1786, no congresso de Ems, mostraram uma tendência à independência.

               No Reino de Nápoles, as dificuldades que exigiam certas concessões em homenagem à feudal foram levantadas pelo ministro liberal Tanucci, e surgiram desentendimentos mais sérios com Leopoldo II, mais tarde Imperador, e Scipione de 'Ricci, Bispo de Pistoia e Prato, sobre as questões da reforma na Toscana. A bula Papal Auctorem fidei, emitida em 28 de agosto de 1794, é uma condenação dos atos e tendências galicanos e jansenistas do Sínodo de Pistoia (1786). Em 17 de agosto de 1775, o Papa Pio VI promulgou com um decreto Papal a autenticidade de Nossa Senhora de Šiluva. Pio VI viu o desenvolvimento da Igreja Católica nos Estados Unidos da América. Ele libertou o Clero americano da jurisdição do Vigário Apostólico na Inglaterra e ergueu a primeira Sé Episcopal Americana, a Diocese de Baltimore em novembro de 1789.

               Pio VI elevou 73 cardeais em 23 consistórios. Não canonizou nenhum Santo, mas beatificou um total de 39 indivíduos, entre os quais Lourenço de Brindisi e Amato Ronconi.O Papa também estabeleceu as finanças dos Estados Pontifícios em bases muito mais firmes. Pio é mais lembrado em conexão com a expansão do Museu Pio-Clementina, que foi iniciado por sugestão de seu antecessor Clemente XIV; e com uma tentativa de drenar os pântanos pontinos, mas Pio VI conseguiu drenar com sucesso os pântanos perto de Citta della Pieve, Perugia e Spoleto. Ele também restaurou a Via Appia. Pio VI também aprofundou e expandiu os portos de Terracina e Porto d'Anizo, um importante centro do comércio Pontifício. Pio foi um grande Patrono das artes e humanidades; ele também adicionou uma nova sacristia à Basílica de São Pedro.

               No início da Revolução Francesa, em 1789, Pio VI testemunhou a repressão da antiga igreja galicana, bem como o confisco de bens Pontifícios e Eclesiásticos na França. Também viu uma efígie queimada pelos parisienses no Palais Royal. Ele viu os eventos como um sinal de oposição à ordem social ordenada por Deus e também a considerou uma conspiração contra a igreja. O Papa condenou a Declaração dos Direitos do Homem e a Constituição Civil do Clero e apoiou uma liga contra a revolução. Ele emitiu dois resumos - Quod aliquantum (1791) e Caritas (1791) - condenar as reformas Eclesiásticas propostas pela revolução. O que os revolucionários realmente tentaram foi substituir as religiões históricas por uma “religião de Estado”, com suas próprias pretensões teológicas, funcionários, elites e privilégios, visando assegurar que os cidadãos se submetessem à lei não apenas no comportamento externo, mas inclusive na consciência e no coração. A lei é que seria “deus”. Os Estados Gerais convocados por Luís XVI em 1789 se dividiam em três ordens: o Clero, a nobreza e o “terceiro estado”. O Clero não era um obstáculo para a política inicial de reformas. Os padres apoiavam as medidas propostas pelo terceiro estado para implantar a separação de poderes, a reunião frequente dos Estados Gerais, a sua supremacia na determinação dos impostos, o reconhecimento das liberdades individuais etc. Mas esse apoio às reformas não era mediante ações radicais: só um quarto dos membros do Clero queria a ruptura da ordem vigente e a revolução democrática, enquanto a maioria dos padres defendia uma reforma paulatina e sem ruptura traumática. Apesar dessa atitude de moderação, a tomada da Bastilha em 14 de julho em 1789 e a posterior abolição dos privilégios feudais não foram fatos particularmente alarmantes para os Bispos e Sacerdotes, que estavam mais preocupados com os resultados da reforma constitucional iniciada por uma nova assembleia. A “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” promulgou a liberdade religiosa, reservando ao Estado o poder de determinar quando as opiniões em matéria de credo eram incompatíveis com a lei. Ou seja as leis humanas deveriam estar acima das Leis de Deus.

Esta liberdade teórica, no entanto, teve escassa duração real. Em 12 de julho de 1790, estabeleceu-se a chamada “Igreja constitucional”, que, na prática, imposta por um rápido processo de fundamentalismo estatista, se tornou o único “credo” aceito pelas autoridades. Essa “igreja” tinha organização e funcionamento próprio, decidido pelo Estado. Os Sacerdotes católicos foram pressionados a jurar fidelidade às novas normas estatais em matéria de religião e a se desligarem da obediência ao seu Bispo e a Roma. Apesar da determinação do Papa Pio VI e da rebelião dos Bispos perante a pressão estatal (só quatro cederam à nova ordem), muitos presbíteros, em especial no centro do país, se uniram à “igreja laica” e viraram comissários políticos do Estado em matéria religiosa. A criação desta “igreja” foi celebrada no Campo de Marte, com os oficiantes ataviados em vestes tricolores francesas. O laicismo legalizado pelo Estado gera nas pessoas uma aceitação natural de outras crenças contrárias à católica, e portanto altamente perniciosa para as almas. Os Sacerdotes que se mantiveram católicos foram perseguidos, impedidos de celebrar Sacramentos e de pregar e, a partir de 18 de março de 1793, se fossem presos em solo francês, deviam ser executados em menos de 24 horas. Muitos tiveram a pena de morte comutada por um destino tão pavoroso quanto, nas infectas e tristemente célebres prisões da Guiana Francesa.

               Ao mesmo tempo, foi cortada a comunicação entre os católicos franceses e o Papa, cujas cartas e documentos não podiam ser divulgados no país sem a aprovação prévia dos órgãos legislativos. A Igreja católica sofreu uma das piores perseguições da história. As crianças não podiam receber o batismo, nem a comunidade podia celebrar a Eucaristia. Só se conseguia oficiar algum Sacramento na clandestinidade. Na Bretanha, região que registrou o maior número de Sacerdotes contrários à nova “igreja” cismática, os fiéis se reuniam em barcas, longe da costa, ou no interior dos bosques. Aqueles que participavam dessas “reuniões ilegais” corriam o risco ser condenados à morte como inimigos do Estado. Na região bretã foram assassinados cerca de 120.000 católicos por motivos estritamente religiosos: tratava-se de mais de 15% da população. Enquanto isso, as autoridades revolucionárias determinavam por decreto, sob os impulsos de Robespierre, a existência do “Ser Supremo” e a imortalidade da alma, instaurando a celebração de “festivais do Ser Supremo” a partir de 1794. Antes disso já tinham sido criados templos à “deusa Razão”, usando-se para tanto as igrejas e sinagogas. Em todo momento, o povo era induzido a ligar a sua consciência a uma série de normas políticas e morais ao gosto do poder.

               O ano de 1791 marcou o fim das relações diplomáticas com a França e o núncio Papal. Antonio Dugnani foi convocado para Roma como resultado. Uma das razões para a brecha foi a apreensão pelos revolucionários do Comtat Venaissin, encerrando 516 anos de domínio Papal em Avignon. O rei Luís XVI da França foi executado por guilhotina em 21 de janeiro de 1793.

               Em 1796, as tropas republicanas francesas sob o comando de Napoleão Bonaparte invadiram a Itália e derrotaram as tropas Papais. Os franceses ocuparam Ancona e Loreto. Pio VI processou a paz que foi concedida em Tolentino em 19 de fevereiro de 1797; mas em 28 de dezembro de 1797, em uma revolta atribuída pelas forças Papais a alguns revolucionários italianos e franceses, o popular general de brigada Mathurin-Léonard Duphot, que havia ido a Roma com José Bonaparte como parte da embaixada francesa, foi morto e um novo pretexto foi fornecido para invasão. O general Berthier marchou para Roma, entrou sem oposição em 10 de fevereiro de 1798 e, proclamando uma República Romana, exigiu do Papa a renúncia à sua autoridade temporal. Após sua recusa, Pio foi feito prisioneiro e, em 20 de fevereiro, foi escoltado do Vaticano a Siena e daí até a Certosa, perto de Florença. A declaração de guerra francesa contra a Toscana levou à sua remoção (ele foi escoltado pelo espanhol Pedro Gómez Labrador, marquês de Labrador) por Parma, Placência, Turim e Grenoble até a cidadela de Valence, a principal cidade de Drôme, onde morreu seis semanas após sua chegada, em 29 de agosto de 1799. O corpo de Pio VI foi embalsamado, mas não foi enterrado até 30 de janeiro de 1800, depois que Napoleão viu vantagem política em enterrar o Papa falecido nos esforços para trazer a Igreja Católica de volta à França. Sua comitiva insistiu por algum tempo que seus despojos fossem enterrados em Roma, depois atrás das linhas austríacas. Eles também impediram um Bispo constitucional de presidir o enterro, como exigiam as leis da França, de modo que nenhum serviço funerário era realizado. Este retorno do conflito de posse foi resolvido pela Concordata de 1801. O corpo de Pio VI foi removido de Valence em 24 de dezembro de 1801 e enterrado em Roma, em 19 de fevereiro de 1802, quando Pio VI recebeu um funeral católico, com a presença do Papa Pio VII, seu sucessor. Por decreto do Papa Pio XII, em 1949, os restos de Pio VI foram transferidos para a Capela da Madona, abaixo de São Pedro, nas grutas do Vaticano. Seus restos mortais foram colocados em um antigo sarcófago de mármore.

 

INÍCIO DA REVOLUÇÃO FRANCESA – 1789 - 1799

 

251 . 1 - Aparição de Nossa Senhora de Lavang

               Logo após o decreto, grupos de católicos fugiram para as montanhas a fim de escapar da perseguição. Muitos se estabeleceram na região de Quang Tri (zona da antiga fronteira entre o Vietnã do Norte e o do Sul). Mas nem em seus refúgios nas montanhas, os fiéis católicos tiveram trégua, pois lá chegavam os assassinos do governo do Rei Canh Thinh. Além desses perigos, os católicos padeciam de frio e fome, muitas enfermidades, como a malária, além do ataque de animais selvagens. Apesar de tudo, os católicos resistiam e em pequenos grupos se reuniam para rezar o Rosário. Contudo a vida não lhes era fácil. Foi em meio a essas provações que se operou a primeira aparição de Nossa Senhora, bem neste local isolado entre as montanhas e perto de uma árvore chamada banyan (muito conhecida naquela região). De uma maneira diferente de outras aparições de Nossa Senhora, em que Ela se faz ver a apenas alguns videntes, neste caso Ela apareceu a todos os presentes. A Virgem Imaculada apresentava-se majestosa, belamente vestida, tendo o Menino Jesus nos braços e escoltada por dois Anjos. Chamou a atenção dos católicos o fato de Ela portar uma longa capa aos ombros. As pessoas reconheceram a Senhora como A Nossa Bendita Mãe. A Mãe de Deus, primeiramente, disse aos presentes que pegassem as folhas de uma árvore chamada Lavang (súplica), as fervessem e tomassem como chá, pois assim eles ficariam curados de suas doenças. Depois, revelou que ela prometia atender as orações das pessoas que fossem rezar naquele local.  Isto aconteceu numa área de ervas perto da grande figueira indiana onde rezavam os refugiados. Todos os presentes testemunharam o milagre.

               Desde o tempo em que a Senhora de Lavang apareceu pela primeira vez, aumentou o número daqueles que iam rezar no local, mesmo com o perigo de novas perseguições; e o povo que se refugiava aí erigiu uma pequena e simples capela em sua honra em meio à selva e tornou-se o ponto de referência dos católicos na localidade. Depois da primeira aparição, a bendita Mãe continuou a aparecer ao povo neste mesmo lugar, várias vezes, ao longo de um período de quase cem anos de perseguição religiosa. Ela aparecia animando-os a não esmorecerem, devido à atroz perseguição pagã, que continuava mesmo nos lugares onde a França dominava. Nos campos pertencentes àqueles que se tinham convertido ao catolicismo, os pagãos colocavam fogo e queimavam suas casas. Os fiéis eram golpeados, humilhados e dispersos das aldeias católicas. Entre muitos grupos de católicos vietnamitas que foram queimados vivos por causa da sua fé, estava um grupo de 30 pessoas que foram apanhadas quando saíam do seu esconderijo na floresta de Lavang. A seu pedido foram levadas para a pequena capela de Lavang e forma aí imolados. Durante os anos seguintes, o seu nome espalhou-se a outros lugares. Apesar da sua localização isolada nas altas montanhas, grupos de pessoas continuaram a encontrar maneira de penetrar na floresta profunda e perigosa para prestar culto à Senhora de Lavang.

               Mas com a consolidação da colonização francesa, as perseguições cruentas diminuíram. Assim, os católicos puderam construir uma igreja no local das aparições. Em 1886, o Bispo Gaspar mandou construir uma igreja em honra de Nossa Senhora de Lavang. Por causa da sua difícil localização e pela falta de recursos financeiros, levou 15 anos a completar-se a sua construção. Foi inaugurada por D. Gaspar numa cerimônia solene em que participaram mais de 12 000 pessoas e durou de 6 a 8 de Agosto de 1901. O Bispo proclamou a Senhora de Lavang a protetora dos católicos vietnamitas. Em 1928 foi construída uma igreja maior para albergar o número crescente de peregrinos. A história da Senhora de Lavang continua a ganhar importância à medida que são validados os pedidos das pessoas cujas orações foram atendidas. Em Abril de 1961, a Conferência do Bispos Vietnamitas selecionou a Santa igreja de Lavang como o Centro Sagrado Mariano Nacional. Em Agosto de 1962, o Papa João XXIII elevou a igreja de Lavang a Basílica.

               A Destruição do Santuário: Entretanto, com o advento do regime comunista, as perseguições anti-católicas recrudesceram. Do norte do país, cerca de 600.000 católicos tiveram que fugir para o sul. O Santuário, que se localizava no Sul, mas próximo à fronteira, não foi poupado. No Sul do Vietnã, os católicos resistiam heroicamente ao comunismo, mas por uma sequência de traições também o Vietnã do Sul acabou caindo sob o jugo comunista. E em 1972 o Santuário foi destruído pelos marxistas, durante a guerra do Vietnã. Em 19 de Junho de 1988, o Papa João Paulo II na cerimônia de canonização dos 117 mártires vietnamitas, pública e repetidamente reconheceu a importância e significado da Senhora de Lavang, e expressou o desejo da reconstrução da Basílica para comemorar os 200 anos de aniversário da primeira aparição da Senhora de Lavang em Agosto de 1998.

 

252º - Pio VII - 1800 - 1823

               Papa Pio VII O.S.B. (Cesena, 14 de agosto de 1742 – Vaticano, 20 de agosto de 1823), nascido como Barnaba Niccolò Maria Luigi Chiaramonti, foi Papa de 14 de março de 1800 até a data da sua morte. Era Monge Beneditino, tendo tomado o nome de Dom Gregório Chiaramonti. Um dos primeiros atos de Pio VII foi nomear o Clérigo menor Ercole Consalvi, que havia desempenhado tão habilmente o cargo de Secretário do recente conclave, no Colégio de Cardeais e no escritório do Cardeal Secretário de Estado. Consalvi partiu imediatamente para a França, onde conseguiu negociar a Concordata de 1801 com o Primeiro Cônsul Napoleão. Embora não tenha efetivado um retorno à antiga ordem cristã, o tratado forneceu certas garantias civis à Igreja, reconhecendo "a religião católica, apostólica e romana" como a da "maioria dos cidadãos franceses". Os principais termos da concordata entre a França e o Papa incluem: Uma proclamação de que "o catolicismo era a religião da grande maioria dos franceses", mas não era a religião oficial, mantendo a liberdade religiosa, em particular no que diz respeito aos protestantes:  O Papa tinha o direito de depor Bispos; O estado pagaria salários Clericais e o Clero prestou juramento de lealdade ao estado; A igreja desistiu de todas as reivindicações para terras da igreja que foram tomadas após 1790; O domingo foi restabelecido como um "festival", a partir do domingo de Páscoa, em 18 de abril de 1802.

               Como Papa, ele seguiu uma política de cooperação com a República e o Império estabelecidos pela França. Ele esteve presente na coroação de Napoleão I em 1804. Até participou do Bloqueio Continental da Grã-Bretanha na França, sob as objeções de seu Secretário de Estado Consalvi, que foi forçado a renunciar. Apesar disso, a França ocupou e anexou os Estados Papais em 1809 e tomou Pio VII como prisioneiro, exilando-o para Savona. Em 15 de novembro de 1809, Pio VII consagrou a igreja em La Voglina, Valenza Po, Piemonte, com a intenção de que a vila de La Voglina se tornasse sua base espiritual enquanto estava no exílio. Infelizmente, sua residência teve vida curta quando Napoleão tomou conhecimento de suas intenções de estabelecer uma base permanente e logo foi exilado na França. Apesar disso, o Papa continuou a se referir a Napoleão como "meu querido filho", mas acrescentou que ele era "um filho um pouco teimoso, mas um filho ainda". Esse exílio só terminou quando Pio VII assinou a Concordata de Fontainebleau em 1813. Um resultado desse novo tratado foi a libertação dos Cardeais exilados, incluindo Consalvi, que, ao se reintegrar ao séquito Papal, persuadiu Pio VII a revogar as concessões que ele tinha feito nele. Pio VII começou as revogações em março de 1814, o que levou as autoridades francesas a prenderem muitos dos prelados opostos. Seu confinamento, no entanto, durou apenas uma questão de semanas, quando Napoleão abdicou em 11 de abril daquele ano. Assim que Pio VII retornou a Roma, ele imediatamente reviveu a Inquisição e o Índice de Livros Condenados. A prisão de Pio VII veio de fato com um lado positivo para ele. Deu-lhe uma aura que o reconheceu como um mártir vivo, de modo que, quando ele voltou a Roma em maio de 1814, foi recebido com mais calor pelos italianos, como herói.

               Desde o momento de sua eleição como Papa até a queda de Napoleão em 1815, o reinado de Pio VII foi completamente retomado no trato com a França. Ele e o Imperador estavam continuamente em conflito, muitas vezes envolvendo os desejos do líder militar francês de concessões às suas demandas. Pio VII queria sua própria libertação do exílio, bem como o retorno dos Estados Papais e, mais tarde, a libertação dos 13 "Cardeais Negros", ou seja, os Cardeais, incluindo Consalvi, que desprezaram o casamento de Napoleão com a Princesa Marie Louise, acreditando que seu casamento anterior ainda era válido e havia sido exilado e empobrecido em consequência de sua posição juntamente com vários prelados, padres, monges, freiras e outros apoiadores exilados ou presos.

               Em 7 de março de 1801, Pio VII publicou o breve "Catholicae fidei" que aprovava a existência da Companhia de Jesus na Rússia e nomeou seu primeiro superior geral como Franciszek Kareu. Este foi o primeiro passo na restauração da ordem. Em 31 de julho de 1814, ele assinou a bula Papal Sollicitudo omnium ecclesiarum, que restaurou universalmente a Companhia de Jesus. Ele nomeou Tadeusz Brzozowski como Superior Geral da ordem.

               Pio VII aderiu à declaração do Congresso de Viena de 1815, representada pelo Cardeal Secretário de Estado Ercole Consalvi, e pediu a supressão do tráfico de escravos. Isso se aplicava principalmente a lugares como Espanha e Portugal, onde a escravidão era economicamente muito importante. O Papa escreveu uma carta ao rei Luís XVIII da França de 20 de setembro de 1814 e ao Rei João VI de Portugal em 1823 para incentivar o fim da escravidão. Ele condenou o tráfico de escravos e definiu a venda de pessoas como uma injustiça à dignidade da pessoa humana. Em sua carta ao Rei de Portugal, ele escreveu: "o Papa lamenta que esse comércio de negros, que ele acreditava ter cessado, ainda seja exercido em algumas regiões e de maneira ainda mais cruel.” Ele implora e implora ao rei de Portugal para implementar toda a sua autoridade e sabedoria para extirpar essa vergonha profana e abominável. Sob o domínio napoleônico, o gueto romano judeu havia sido abolido e os judeus eram livres para viver e se mudar para onde quisessem. Após a restauração do domínio Papal, Pio VII restabeleceu o confinamento de judeus no gueto, mantendo as portas fechadas à noite. Pio VII emitiu uma encíclica "Diu satis" para defender um retorno aos valores do Evangelho e universalizou a festa de Nossa Senhora das Dores em 15 de setembro. Ele condenou a Maçonaria e o movimento dos Carbonari na encíclica Ecclesiam a Jesu Christo em 1821. Pio VII afirmou que os maçons deveriam ser excomungados e os vinculava aos Carbonari, um grupo revolucionário anticlerical na Itália. Todos os membros dos Carbonari também foram excomungados. Pio VII era multilíngue e sabia falar italiano, francês, inglês e latim. Era um homem de cultura e tentou revigorar Roma com escavações arqueológicas em Ostia, que revelavam ruínas e ícones desde os tempos antigos. Ele também teve paredes e outros edifícios reconstruídos e restaurou o Arco de Tito. Ordenou a construção de fontes e praças e ergueu o obelisco no Monte Pinciano. O Papa também garantiu que Roma fosse um lugar para artistas e artistas importantes da época, como Antonio Canova e Peter von Cornelius. Ele também enriqueceu a Biblioteca do Vaticano com numerosos manuscritos e livros. Foi Pio VII quem adotou a bandeira amarela e branca da Santa Sé como resposta à invasão napoleônica de 1808. Ao longo de seu Pontificado, Pio VII canonizou um total de cinco Santos. Em 24 de maio de 1807, Pio VII canonizou Angela Merici, Benedito, o Mouro, Colette Boylet, Francisco Caracciolo e Hyacintha Mariscotti. Beatificou um total de 27 indivíduos, incluindo José Oriol, Berardo dei Marsi, José Maria Tomasi e Crispim de Viterbo. Pio VII criou 99 Cardeais em dezenove consistórios, incluindo figuras Eclesiais notáveis da época, como Ercole Consalvi, Bartolomeo Pacca e Carlo Odescalchi. O Papa também nomeou seus dois sucessores imediatos como Cardeais: Annibale della Genga e Francesco Saverio Castiglioni. Em 15 de agosto de 1811 - a Festa da Assunção - está registrado que o Papa celebrou a missa e foi dito que entrou em transe e começou a levitar de uma maneira que o atraiu para o altar. Esse episódio em particular despertou grande espanto e admiração entre os atendentes, que incluíam os soldados franceses que o vigiavam, incrédulos com o que ocorrera.

               Em 3 de junho de 1816, Pio VII condenou as obras de melquita Bispo Germanos Adam. Os escritos de Adam apoiavam o conciliarismo, a visão de que a autoridade dos conselhos ecumênicos era maior que a do Papado. Em 1822, Pio VII completou 80 anos e sua saúde estava visivelmente em declínio. Em 6 de julho de 1823, ele fraturou o quadril em uma queda nos aposentos Papais e ficou acamado a partir daquele momento. Nas últimas semanas, ele frequentemente perdia a consciência e murmurava os nomes das cidades para as quais fora transportado pelas forças francesas. Com o Cardeal Secretário de Estado Ercole Consalvi ao seu lado, Pio VII sucumbiu ao seu ferimento em 20 de agosto às 5 da manhã. Ele foi enterrado brevemente nas grutas do Vaticano, mas depois foi enterrado em um monumento na Basílica de São Pedro após seu funeral em 25 de agosto.

 

252 . 1 - Santa Anna Catarina Emmerich

               A Beata Anna Catarina Emmerich (Coesfeld, 8 de setembro de 1774 – Dülmen, 9 de fevereiro de 1824) foi uma freira agostiniana, mística, visionária e arrebatada, beatificada pelo Papa João Paulo II em 3 de outubro de 2004. Nasceu em Flamschen, uma comunidade agrícola em Coesfeld, na diocese de Münster, Vestfália, Alemanha, e morreu aos 49 anos em Dülmen, onde era freira. Emmerich é notável por suas visões sobre a vida e a paixão de Jesus Cristo, cuja reputação é revelada a ela pela Bem-aventurada Virgem Maria sob êxtase religioso. Durante seus anos acamados, várias figuras conhecidas foram inspiradas a visitá-la. O poeta Clemens Brentano a entrevistou longamente e escreveu dois livros com base nas anotações de suas visões. A autenticidade dos escritos de Brentano foi questionada e os críticos caracterizaram os livros como "elaborações conscientes de um poeta" e "fraude bem-intencionada" de Brentano. Esta Santa foi deliberadamente criticada, obscurecida e negligenciada pela Maçonaria Eclesiástica, visto que em uma de suas visões, delata as ações anti cristãs desta seita e seus membros. Emmerich foi beatificada em 3 de outubro de 2004 pelo Papa João Paulo II. No entanto, o Vaticano concentrou-se em sua própria piedade pessoal e não nos escritos religiosos associados a Clemens Brentano.

                Os seus pais foram os pobres camponeses Bernard Emmerich e Anne Hiller. Em 13 de novembro de 1802, aos 28 anos, foi aceita no Convento de Agnentenberg, em Dülmen. Durante a infância, relatos afirmam que tinha constante visões de Jesus, Maria, e de Santos, aos quais entregava coroas de flores no dia de comemoração em nome deles. Afirma-se também que tinha a capacidade de identificar lugares sacros e pagãos, assim como identificar ervas medicinais que ninguém conhecia antes, mesmos traços que foram identificados em outras personalidades que manifestaram "dons divinos", como Santa Sibyllina de Pavia. Em relatos, descreve que as visões eram tão comuns para ela, que acreditava que toda criança tinha a mesma experiência, e todos simplesmente ficavam calados; por isso, também permanecia em silêncio para que não achassem que estava se vangloriando.

               Durante toda a vida, Anna Emmerich ajudava os pobres e enfermos com tudo o que possuía, dividindo o pouco que conseguia em sua pobreza, e por vezes não lhe restava nada nem para o próprio sustento, tendo que ser ajudada pela mãe e amigos; porém, mesmo assim, não deixava de dividir tudo que ganhava com os que mais necessitavam. E quando não os encontrava, rezava para que Deus os revelasse. Também tinha visões com almas presas no Purgatório, e por muitas vezes rezou por essas almas e era acordada por elas no meio da noite, pedindo-lhe que rezasse por elas. Aos 24 anos, em 1798, Anne teve uma visão na Igreja dos Jesuítas, em Coesfeld, na qual ela vislumbrava Jesus Cristo com uma coroa de espinhos e outra de rosas em cada mão, pedindo a ela que escolhesse, decidindo-se Anne pela de espinhos e enterrando na própria cabeça. Desde então, passou a receber estigmas, que ocultava de todos usando lenços envoltos na testa.

               O livro, que escreveu os relatos da freira de 1819 até a morte, em 1824, foi publicado por Clemens Bretano produzindo quarenta volumes, em que se encontram detalhes das visões e meditações da própria Anna Emmerich. Em 1833, Bretano publicou a primeira edição de A Dolorosa Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo de acordo com as Meditações de Anna Catarina Emmerich. Então, Betrano preparou um segundo livro, A Vida da Abençoada Virgem Maria das Visões de Anna Caterina Emmerich, que foi publicado postumamente, em 1852, em Munique, pois Bretano faleceu em 1842. Outro Sacerdote católico, o Padre Karl Schmoger, editou os manuscritos restantes de Bretano e publicou os três volumes de A Vida de Nosso Senhor entre os anos de 1858 e 1880. Nos anos seguintes, publicou uma versão ilustrada do último livro e uma biografia de Anna Emmerich. Um dos livros, dedicado às visões da vida Virgem Maria, contém descrições da cidade de Éfeso, que ainda não foi completamente escavada, e relatos que ajudaram arqueólogos a localizar a Casa da Virgem Maria. O Papa João XXIII tornou permanente a declaração de que a casa encontrada é um Local Sagrado. Posteriormente, os Papas Paulo VI, João Paulo II e Bento XVI visitaram o local e trataram-no como um Santuário para a fé católica.

              Ela igualmente recebeu inúmeras visões das crises futuras na Igreja protagonizadas pela maçonaria. Nelas, ela descreve homens de avental, destruindo a Igreja com a colher de pedreiro. Os teólogos acreditam que, durante a vida, Anna Emmerich recebeu mais visões divinas do que qualquer outro Santo. O livro A Dolorosa Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo consiste em meditações da freira sobre visões de acontecimentos descritos nos Evangelhos concernentes à paixão de Cristo. Afirma-se que o mais chocante no relato das visões é a riqueza de detalhes com que Anna Emmerich descreve os sofrimentos, os ferimentos, as humilhações, as torturas, o açoitamento e a crucificação a que Jesus Cristo é submetido, conforme relatam os Evangelhos do Novo Testamento.

               Parte do filme A Paixão de Cristo, dirigido pelo também católico Mel Gibson, foi inspirado nessas visões de Anna Emmerich, em passagens descritas no mesmo livro já referido, A Dolorosa Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo. Anna Catarina passou a ficar cada vez mais fraca durante o verão de 1823. Ela morreu em 9 de fevereiro de 1824 em Dülmen e foi enterrada no cemitério nos arredores da cidade, com um grande número de pessoas participando de seu funeral. Seu túmulo foi reaberto duas vezes nas semanas após o funeral, devido a um boato de que seu corpo havia sido roubado, mas o caixão e o corpo foram encontrados intactos. Em fevereiro de 1975, os restos mortais de Emmerich foram transferidos para a Igreja da Santa Cruz em Dülmen, onde descansam hoje.

Visão das ações maléficas da Maçonaria Eclesiástica

“Vi a Igreja de S. Pedro. Uma multidão de homens estava tentando derrubá-la, enquanto outros a reconstruíam constantemente. Linhas conectavam estes homens com os outros e outros através do mundo inteiro. Impressionei-me com a perfeita sintonia deles.”

“Os demolidores, na sua maioria apóstatas e membros de diferentes seitas, quebravam todas as peças e trabalhavam segundo regras e instruções. Eles vestiam aventais brancos amarrados com fitas azuis. Neles haviam bolsos e tinham colheres de pedreiro presos à cintura. A vestimenta dos outros era variada.”

“Havia, entre os demolidores, homens distintos vestindo uniformes e crucifixos. Eles não punham a mão na massa, mas marcavam sobre as paredes com a colher, indicando onde e como devem ser derrubadas. Para o meu horror, vi entre eles, Sacerdotes Católicos. Quando os trabalhadores não sabiam como continuar, eles procuravam alguém certo do seu partido. Este tinha um livro grande que parecia conter todo o plano do edifício e a maneira de destruí-lo. Marcava exatamente as partes a serem atacadas com a colher, e logo elas vinham abaixo. Trabalhavam silenciosamente e com confiança, porém, astutamente, furtivamente e cuidadosamente. Vi o Papa rezando, cercado por falsos amigos que frequentemente faziam o oposto daquilo que ele ordenava...”

‘Eu vejo o Santo Padre em grande angústia. Ele mora em um palácio diferente do que ele tinha antes e só admite um número limitado de amigos perto dele. Temo que o Santo Padre sofra muitas outras provações antes de morrer. Vejo que a falsa igreja das trevas está fazendo progresso e vejo a tremenda influência que tem sobre as pessoas.’ (10 de agosto de 1820)

‘Então eu vi que tudo que pertencia ao protestantismo estava gradualmente ganhando supremacia, e a religião católica caiu numa completa decadência. A maioria dos Sacerdotes era atraída pelas sedutoras, mas falsas, doutrinas dos jovens professores, e todos eles contribuíam para o trabalho de destruição. Naqueles dias, a Fé cairá em níveis muito baixos, e será preservada somente em alguns lugares, em algumas poucas casas de lavradores e em algumas poucas famílias que Deus protegeu dos desastres e guerras.”

“Vi que muitos padres haviam se envolvido em idéias que eram perigosas para a igreja. Eles estavam construindo uma grande, estranha e extravagante igreja’.

“Tudo estava para ser nela admitido, no intuito de estar unido e ter direitos iguais: evangélicos, católicos e seitas de toda denominação. Assim deveria ser a nova igreja... Mas Deus tinha outros planos.” (22 de abril de 1823)

“Vi a relação entre dois Papas. Vi quão funestas seriam as consequências desta falsificação da Igreja. Vi-a crescer, vi os heréticos de todas as condições vir à cidade (Roma). Vi aumentar a tibieza do clero local, vi fazer-se uma grande escuridão. Então a visão cresceu por todos lados. Vi por todo o mundo comunidades católicas oprimidas, vexadas, presas e privadas de liberdade. Vi muitas igrejas fechadas. Vi grandes misérias produzir-se por todas as partes. Vi guerras e sangue vertida. Vi o povo selvagem e ignorante intervir com violência, mas isso não durou muito tempo. Vi de novo a visão na qual a Igreja de São Pedro era minada, seguindo um plano feito pela seita secreta, ao mesmo tempo que era deteriorada pelas tempestades. Mas vi também chegar ajuda quando o sofrimento alcançou o seu colmo. Vi de novo a Santíssima Virgem estender o seu manto sobre a Igreja. Vi um Papa que era gentil, mas ao mesmo tempo muito firme. Vi uma grande renovação, e a Igreja ascendeu muito alto”.

“Vi a Igreja terrestre, é dizer, a sociedade dos fieis sobre a terra, o exército de Cristo no seu estado de passo sobre a terra, completamente obscurecida e desolada”.

“Vós, Sacerdotes, que não vos moveis! Estais dormidos e o redil arde por todos os lados! Não fazeis nada! Como chorareis por isso um dia! Si tivésseis rezado só um Pater! Vejo tantos traidores! Não suportam que se diga: “Isto está mal”. Tudo está bem aos seus olhos com tal de que possam glorificar-se com o mundo!”

“Vi as carências e a decadência do Sacerdócio, assim como as suas causas. Vi os castigos que se preparam”.

“Os servidores da Igreja são tão lassos! Já não fazem uso da força que possuem no Sacerdócio”.

 “Eles terão que dar conta de todo o amor, todas as consolações, todas as exortações, todas as instruções referentes aos deveres da religião, que eles não nos dão; de todas as bênçãos que não distribuem, apesar de que a força da mão de Jesus esteja sobre ele, por tudo o que não fazem à semelhança de Jesus”.

“... para uma infinidade de pessoas que tinham boa vontade, o acesso às fontes da graça do Coração de Jesus encontrava-se impedido e fechado pela supressão dos exercícios de devoção, pelo feche e a profanação das Igrejas”.

“Tive uma visão concernente às faltas de incontáveis pastores e à omissão de todos os seus deveres para com o rebanho”.

“Vi muitos Bispos bons e piedosos, mas estavam mudos e débeis, e o mau partido muitas vezes empregava a força”.

“Tudo isto me fez conhecer que a recitação da genealogia de Nosso Senhor diante do Santíssimo Sacramento, na festa do Corpus Christi, leva consigo um grande e profundo mistério. Conheci, por este meio, que, tal como entre os antepassados de Jesus Cristo, segundo a carne, muitos não foram santos —tendo sido inclusivamente pecadores—; não deixaram de ser, no entanto, degraus da escada de Jacob pelos quais Deus desceu até à humanidade. Do mesmo modo, também os Bispos indignos permanecem capazes de consagrar o Santíssimo Sacramento e de conferir o Sacerdócio com todos os poderes que lhe estão associados”.

“Vi numa cidade uma reunião de eclesiásticos, de laicos e de mulheres, os quais estavam sentados juntos, a comer e a divertir-se com coisas frívolas, e por cima deles uma nuvem escura que desembocava numa planície submergida nas trevas. No meio desta névoa vi a Satanás sentado numa forma horrível, e à volta dele estavam tantos acompanhantes como pessoas na reunião que tinha lugar em baixo. Todos estes maus espíritos estavam continuamente em movimento e ocupados em empurrar esta reunião de pessoas para o mal. Eles falam-lhes ao ouvido e atuavam sobre eles de todas as maneiras possíveis. Estas pessoas estavam num estado de excitação sensual muito perigosa e ocupados em conversas ociosas e provocantes. Os Eclesiásticos eram desses que têm como principio: “É preciso viver e deixar viver. Na nossa época não se deve estar de parte nem ser um misantropo: devemos alegrar-nos com os que se alegram.”

“Ele [Satanás] falava do seu direito. Como essa linguagem me surpreendia muito, foi-me explicado que ele realmente adquiria um direito positivo quando uma pessoa batizada, que tinha recebido por Jesus Cristo o poder de vencer-lhe, pelo contrario, se entregava a ele pelo pecado livre o voluntario”.

“Vejo uma quantidade de Eclesiásticos castigados por excomunhão, que não parecem inquietar-se, nem sequer sabê-lo. E, não obstante, são excomungados quando tomam parte nessas empresas, quando entram em associações e se aderem a opiniões sobre as quais pesa o anátema. Vejo estes homens rodeados de uma nuvem como se fosse um muro de separação. Por isto se vê quanto Deus tem em conta os decretos, as ordens e as defesas do Chefe da Igreja e os mantêm em vigor inclusivamente quando os homens não se importam com aquilo, o renegam ou se riem.” 

 

253º - Leão XII - 1823 - 1829  

               Leão XII, nascido Annibale Francesco Clemente Melchiore Girolamo Nicola della Genga (Genga, perto de Ancona, 22 de Agosto de 1760 — Roma, 10 de Fevereiro de 1829). Foi Papa de 28 de setembro de 1823 até a data da sua morte. Nascido numa família da nobreza que já tinha vários Papas, era filho do Conde Fábio della Genga e da Condessa Maria Luisa Periberti di Fabriano. Leão XII estava com problemas de saúde desde o momento de sua eleição ao Papado. Ele era um governante profundamente conservador, que aplicou muitas leis controversas, incluindo uma proibindo os judeus de possuir propriedades. As finanças Papais também eram ruins, embora ele reduzisse os impostos. Como resultado, o reinado de Leão XII foi impopular e provocou amplo descontentamento nos Estados Papais. Em 5 de fevereiro de 1829, depois de uma audiência privada com o novo Secretário de Estado Cardeal, Tommaso Bernetti, ficou subitamente doente e parecia saber que seu fim estava próximo. Em 8 de fevereiro, pediu e recebeu o Viaticum e foi ungido. Em 9 de fevereiro, ele caiu na inconsciência e, na manhã seguinte, morreu. Foi enterrado em um monumento dele na Basílica de São Pedro em 15 de fevereiro de 1829. Seus restos mortais foram transferidos e enterrados diante do altar do Papa Leão I em 5 de dezembro de 1830. Leão XII é considerado um homem de caráter nobre, apaixonado por ordem e eficiência, mas que não possuía uma visão dos desenvolvimentos temporais de seu tempo. Seu governo era impopular em Roma e nos Estados Papais, e por várias medidas de seu reinado ele diminuiu muito para seus sucessores as chances de resolver os novos problemas que enfrentariam.

 

254º - Pio VIII - 1829 - 1830

               Papa da Igreja cristã Romana nascido em Cingoli, Macerata, perto de Ancona, Francesco Saveiro Castiglioni, eleito em 5 de abril de 1829 sucessor de Leão XII, aos sessenta e oito anos de idade. Pertencente a uma família de nobres estudou na escola jesuíta de Osimo, e leis canônicas em Bolonha e Roma e tornou-se grande conhecedor de numismática e literatura bíblica. Em Roma associou-se com o mestre Devoti, e foi seu assistente na compilação de suas Instituiões (1792), e seu Vigário geral quando o mestre foi nomeado Bispo de Anagni. Foi nomeado em 1800 Bispo de Montalto, quando foi encarcerado por Napoleão em Pavía e Mantua, e logo depois de Cesena, por Pío VII. Foi nomeado Cardeal (1816) e Bispo de Frascati e Gran Penitenziere (1821) e, em seguida, prefeito da Congregazione dell’Indice. De mentalidade aberta, o seu curto Pontificado de vinte messes foi marcado por acontecimentos notáveis. Por exemplo, foi aprovada na Inglaterra a Lei de Emancipação Católica (1829), mediante a qual os católicos podiam ocupar cargos públicos e postos nos parlamentos, e publicou Litteris altero abhinc (1830) a respeito do matrimônio. Apoiou a revolução pela independência belga que levou ao surgimento da moderna Monarquia européia da Bélgica. Tratou com o Sultão, em favor dos armênios, iniciou o correio Vaticano e deu impulso às missões. Morreu em Roma, e foi sucedido por Gregório XVI. No final de seu Papado a França e a Itália mergulhavam em profunda onda de violência.

 

254 . 1 - Aparição de Nossa Senhora à Catherine Laboré: Nossa Senhora das Graças

               A mística francesa Catherine Laborè (Fain-lès-Moutiers, 2 de maio de 1806 – Paris, 31 de dezembro de 1876), fundadora da devoção da Medalha Milagrosa. Pode-se dizer, que as aparições da Medalha Milagrosa em 1830, abriram um ciclo de grandes manifestações marianas que prosseguiu em La Salete (1846), em Lourdes (1858), e ter culminado em Fátima em 1917. Quando Catarina tinha nove anos sua mãe faleceu. Desolada, a menina subiu em um móvel que havia na casa, abraçou uma imagem de Nossa Senhora e, chorando pediu à Virgem que substituísse a mãe que acabava de perder: “Desde agora, sereis vós a minha Mãe!”

               Catarina teve um sonho a princípio misterioso por volta dos 18 anos de idade. Sonhou que estava na Igrejinha da Fain-les Moutier, e a Missa estava sendo celebrada por um sacerdote idoso, com um olhar que muito a impresionava. No fim da celebração o sacerdote a chamou, mas temerosa, hesitou em se aproximar. E o velho sacerdote lhe disse: “Minha filha, agora tu foges de mim, mas um dia me procurarás. Deus tem seus desígnios sobre ti, nunca te esqueças disso.” Somente algum tempo depois, viu um quadro de São Vicente de Paulo na residência das Filhas da Caridade de Châtillon-sur-Seine, aonde fora estudar, reconheceu então o sacerdote do sonho.

               Ao completar 23 anos de idade, conseguiu autorização paterna para ingressar na Congregação das Filhas da Caridade. Três meses depois foi transferida para outra casa da Congregação, na Rue du Bac, em Paris. Na semana seguinte, Catarina teve uma visão sobrenatural: “O coração de São Vicente me apareceu três vezes de modo diferente, três dias seguidos: claro, cor de carne, o que anunciava paz, calma, inocência e união. Depois o vi vermelho cor de fogo, o que devia inflamar a caridade nos corações. Parecia-me que toda a comunidade devia se renovar e se estender até os confins do mundo. Por fim o vi vermelho negro, o que me punha a tristeza no coração, vinham-me tristezas que eu tinha dificuldade de superar. Não sabia porque, nem como, essa tristeza se relacionava com a mudança de governo.”

               Durante todo o tempo de seu noviciado ela tinha o privilégio de ver Nosso Senhor no Santíssimo Sacramento. Numa destas visões em 6 de julho de 1830: “Nosso Senhor me apareceu como um Rei, com a cruz sobre o peito no Santíssimo Sacramento. Foi durante a Santa Missa no momento do Evangelho. Pareceu-me que a cruz escorregava para os pés de Nosso Senhor. Pareceu-me que Nosso Senhor era despojado de todo os seus ornamentos. Tudo caiu por terra. Foi então que tive os mais negros e tristes pensamentos de que o Rei da Terra seria perdido e despojado de suas vestes reais.”

               Na noite de 18 para 19 de julho de 1830, festa de São Vicente de Paula, viu seu anjo da guarda na forma de um menino. Ela diz: “Havia-nos distribuído um pedaço do roquete de linho de São Vivente. Eu cortei a metade e a engoli, e adormeci com o pensamento de que São Vicente me obteria a graça de ver a Santíssima Virgem. Afinal, às onze e meia da noite ouvi me chamarem pelo nome: “Irmã Labouré! Irmã Labouré!” Acordando, olhei para o lado de onde vinha a voz, que era do lado da passagem. Corro a cortina e vejo um menino vestido de branco, de mais ou menos quatro a conco anos, e ele me diz: “Levantai-vos logo e vinde à Capela, a Santíssima Virgem vos espera.”

               Vesti-me depressa e me dirigi para o lado do menino, que tinha ficado de pé, sem avançar além da cabeceira de minha cama. Ele me segui, ou melhor, eu o segui com ele sempre a minha esquerda, levando claridade pelos lugares onde passava. Por todos os lugares onde passávamos as luzes estavam acesas, o que me espantava muito. Porém, muito mais surpresa fiquei quando entrei na Capela, a porta se abriu mal o menino a tocava com a ponta do dedo. Mas a minha surpresa foi ainda maior quando vi todas as velas e castiçais acesos, o que me fazia lembrar a missa da meia noite.

               Entretanto, não via a Santíssima Virgem. O menino me conduzia ao presbitério, ao lado da cadeira de braços do Sr. Diretor. Ali me pus de joelhos e o menino permaneceu de pé todo o tempo. Por fim chegou a hora, o menino me advertiu: “Eis a Santíssima Virgem.” Ouvi então, um ruído, como um frufru de vestido de seda que tinha do lado da tribuna, junto ao quadro de São José, e que pousava sobre os degraus do altar, do lado do Evangelho, sobre uma cadeira semelhante à de Sant`Ana. Então olhando para a Santíssima Virgem, dei um salto para unto dela, pus-me de joelhos sobre os degraus do altar, com as mãos apoiadas sobre os joelhos da Santíssima Virgem. Ali se passou o mais doce momento de minha vida. Não me seria possível dizer tudo o que senti. Ela ma disse como eu devia me conduzir em relação ao meu diretor espiritual, e várias coisas que não devo dizer; a maneira de me conduzir em meus sofrimentos, vir lançar-me ao pé do altar (e me mostrava com a mão esquerda o pé do altar) e ali abrir o meu coração. Ali receberia todas as consolações de que tivesse necessidade. Então eu lhe perguntei o que significavam todas as coisas que eu tinha visto, e Ela me explicou tudo.”

               O colóquio com Nossa Senhora prolongou-se por uma hora e meia. Noutro manuscrito a Santa revelou parte do que ouviu da Santíssima Virgem: “Minha filha, o bom Deus quer encarregar-vos de uma missão. Tereis muito que sofrer, mas superareis esses sofrimentos, pensando que o fareis para a Glória do bom Deus. Sereis contraditada. Mas tereis graça. Não temais. Dizei tudo a vosso confessor com confiança e simplicidade. Rende confiança, não temais.”

”Os tempos serão maus. Os males virão precipitar-se sobre a França. O trono será derrubado. O mundo inteiro será transformado por males de toda ordem. Mas vinde ao pé deste altar. Aqui as graças serão derramadas sobre todas as pessoas grandes ou pequenas, que as pedirem com confiança e fervor.”

“Minha filha, eu gosto de derramar graças sobre a comunidade em particular. Eu gosto muito dela, felizmente. Sofro, porém, porque há grandes abusos em matéria de regularidade. As regras não são observadas. Há grande relaxamento nas duas comunidades. Dizei-o àquele que está encarregado de vós, ainda que ele não seja superior. Ele será encarregado de uma maneira particular da comunidade. Ele deve fazer tudo o que lhe for possível para repor a regra em vigor. Dizei-lhe de minha parte, que vigie sobre as más leituras, as perdas de tempo e as visitas.”

“Conhecereis minha visita e a proteção de Deus e a de São Vicente, sobre as duas comunidades. Tende confiança. Não percais a coragem. Eu estarei convosco. Mas não se dará o mesmo com outras comunidades. Haverá vítimas para o Clero de Paris, haverá vítimas: Monsenhor, o Arcebispo morrerá.”

”Minha filha, a Cruz será desprezada e derrubada por terra. O sangue correrá. Abrir-se-á de novo o lado de Nosso Senhor. As ruas estarão cheias de sangue. Monsenhor o Arcebispo será despojado de suas vestes. Minha filha o mundo todo estará na tristeza.” A estas palavras, pensei quando isso se daria, e compreendi muito bem: quarenta anos.

A MEDALHA MILAGROSA

               Quatro meses depois, no dia 27 de novembro de 1830, outra aparição de Nossa Senhora. Diz a Santa: “Vi a Santíssima Virgem à altura do quadro de São José. A Santíssima Virgem, de estatura média, estava de pé, vestida de branco, com um vestido de seda branco-aurora... com um véu branco que lhe cobria a cabeça e descia de cada lado até em baixo. Sob o véu, vi os cabelos lisos repartidos ao meio e por cima uma renda de mais ou menos três centímetros de altura, sem granzido, isto é, apoiada ligeiramente sobre os cabelos. O rosto bastante descoberto, bem descoberto mesmo, aos pés apoiados sobre uma esfera, quer dizer, uma metade de esfera... tendo uma esfera de ouro nas mãos que representava o globo. Ela tinha as mãos elevadas à altura do cinto de uma maneira muito natural, os olhos elevados para o Céu... seu rosto era magnificamente belo. Eu não saberia descrevê-lo... E depois, de repente, percebi anéis nos dedos revestidos de pedras, mais belas umas que as outras, umas maiores e outras menores, que despediam raios mais belos uns que os outros. Partiam das pedras maiores os mais belos, sempre alargando para baixo, o que enchia poda a parte de baixo. Eu não via mais os seus pés. Nesse momento em que estava a contemplá-la, a Santísssima Virgem baixou os olhos, olhando-me. Uma voz se fez ouvir, e me disse estas palavras: “A esfera que vedes representa o mundo inteiro, particularmente a França, e cada pessoa em particular.”

               Diz a Santa: “Aqui eu não sei exprimir o que senti e o que vi, a beleza e o fulgor, os raios tão belos. É o símbolo das graças que derramo sobre as pessoas que as pedem, fazendo-me compreender quanto era agradável rezar à Santíssima Virgem e quanto ela era generosa para com as pessoas que rezam a ela, que alegria ela sente concedendo-as. Formou-se um quadro em torno da Santíssima Virgem, um pouco oval, onde havia no alto estas palavras: “Ó Maria concebida sem pecado, rogai por nós que recorremos a Vós.” Escritas em letras de ouro. A inscrição em semicírculo, começava a altura da mão direita, passava por cima da cabeça e acabava na altura da mão esquerda. Então uma voz se fez ouvir e me disse: “Fazei cunhar uma medalha com este modelo. Todas as pessoas que a usarem receberão grandes graças, trazendo-a ao pescoço. As graças serão abundantes para as pessoas que a usarem com confiança.”

               No mês seguinte a Virgem aparece de novo à Santa Catarina exatamente como avia vista anteriormente, segurando o globo de ouro, encimado por uma pequena cruz também de ouro, e dos anéis que jorravam os mesmos raios de luz desigual. Diz a Santa: “Dizer-vos o que entendi no momento em que a Santíssima Virgem oferecia o globo a Nosso Senhor é impossível transmitir. Como eu estivesse ocupada em contemplar a Santíssima Virgem, uma voz se fez ouvir no fundo de meu coração, e me disse: “Estes raios são o símbolo das graças que a Santíssima Virgem obtém para as pessoas que as pedem. Estas pedras das quais nada sai, são as graças que os homens se esquecem de me pedir.”

A conversão do Judeu Afonso Ratisbonne

               Em janeiro de 1842, uma conversão espetacular chamaria ainda mais atenções sobre a Medalha Milagrosa. Afonso era Judeu de religião, embora não praticante. Nutria pela Igreja Católica entranhado ódio, sobretudo pelo ressentimento que toda sua família conservava pela conversão ao catolicismo do primogênito Teodoro. Afonso dizia que não pretendia mudar de religião, mas que se um dia viesse a mudar, far-se-ia protestante, jamais católico. Na cidade eterna, Ratisbonne visitou seu amigo protestante Gustavo, o qual apresentou seu irmão Barão Teodoro de Bussières, convertido recentemente ao catolicismo, que era amigo do Padre Teodoro Ratisbonne. Essas duas circunstâncias o tornavam extremamente antipático aos olhos de Afonso.

               Só na véspera de sua partida este se resolveu cumprir um dever social que lhe era penoso: foi deixar um cartão de visitas na casa do Barão como despedida. Afonso pretendia deixar discretamente o cartão e partir sem mais. O criado italiano do Barão, porém, não entendeu seu francês e o fez entrar no salão, indo chamar o dono da casa. Este foi cumprimentar o jovem judeu e logo com ele estabeleceu relações cordiais, procurando atraí-lo para a fé católica. Pediu a Afonso que adiasse sua partida para assistir uma cerimônia na Basílica de São Pedro. Com relutância conseguiu convencê-lo, e ainda pediu para que Ratisbonne aceitasse uma Medalha Milagrosa e prometesse copiar uma oração muito bonita à Nossa Senhora: o Lembai-vos...

               O judeu não cabia em si de raiva pelo atrevimento do Barão em lhe fazer essas propostas, mas resolveu tomar tudo com moderação. E, 18 de aneiro faleceu um amigo íntimo do Barão de Bussières, o Conde de La Ferromays, antigo Embaixador da França junto a Santa Sé e homem de grande virtude e piedade. Na véspera de sua morte repentina, La Ferranays conversara com Bussières sobre Ratisbonne e rezara cem vezes a oração Lembrai-vos, por sua conversão, a pedido de Bussières. No dia 20 por volta do meio dia, o Barão de Bussières foi a Igreja de Sant`Andrea delle Fratte para tratar das solenidades exéquias do falecido, a realizar-se no dia seguinte. Acompanhava-o Ratisbonne de mau humor, fazendo críticas violentas contra a Igreja e zombando das coisas católicas. Quando chegaram a Igreja, o Barão pediu licença por alguns minutos na sacristia, para tratar do assunto que o levara até ali, e Afonso se pôs a percorrer uma das naves laterais, impedido de passar para o outro lado da Igreja, pelos preparativos que estavam sendo feitos devido a morte do Conde. Quando, minutos depois, o Barão retornou em busca de Afonso, não o encontrou onde o havia deixado. Após muito procurar, foi dar com ele no outro lado da Igreja, ajoelhado junto a um altar e soluçando. Ali já não estava um judeu, mas um convertido que ardentemente desejava o Batismo.

               Diz Ratisbonne: “Eu estava havia pouco na Igreja, quando de repente senti-me dominado por uma inquietação inexplicável. Levantei os olhos, todo o edifício havia desaparecido à minha vista, uma só capela tinha, por assim dizer, concentrado toda a luz, e, no meio desse esplendor apareceu, de pé, sobre o altar, grandiosa, brilhante, cheia de majestade e de doçura a Virgem Maria, tal como está na minha Medalha, uma força irresistível atraiu-me para ela. A Virgem fez-me um sinal com a mão para que eu me ajoelhasse e pareceu-me dizer: muito bem! Ela não me disse nada, mas eu compreendi tudo.”

               O Papa Gregório XVI quis conhecer o jovem convertido e recebeu-o paternamente. Ordenou um inquérito minucioso e concluiu-se que se tratava de um milagre autêntico. Ratisbonne quis entrar na Companhia de Jesus sendo ordenado sacerdote em 1847. Depois deixou a Companhia de Jesus e foi juntar-se com seu irmão Teodoro, fundando a Congregação dos Missionários de Nossa Senhora de Sion, dedicada a conversão dos judeus. Os dois irmãos faleceram no ano de 1884, com fama de excepcionais virtudes.

               Lembremos de que o corpo da Santa Catarina Labouré está incorruptível até os dias de hoje, um aval inquestionável vindo de Deus sobre esta humilde serva do Senhor.

 

255º - Gregorio XVI - 1831 - 1846

                Gregório XVI, nascido Bartolomeu Alberto Cappellari (Belluno, 18 de Setembro de 1765 – Roma, 1 de Junho de 1846). Foi Papa de 2 de fevereiro de 1831 até a data da sua morte. Era Monge Camaldulense, com o nome de Dom Mauro Cappellari OSB Cam. Elevado a Cardeal em 1825 e logo nomeado para redigir a concordata que salvaguardasse os interesses dos católicos da Bélgica contra os protestantes neerlandeses. Eleito inesperadamente Papa após um conclave de 64 dias, assistiu a diversas invasões e revoluções nos Estados Papais. Foi um generoso Patrono das artes. Fortemente conservador e tradicionalista, ele se opôs às reformas democráticas e modernizadoras nos Estados Papais e em toda a Europa, vendo-as como frentes do esquerdismo revolucionário. Contra essas tendências, Gregório XVI procurou fortalecer a autoridade política e religiosa do Papado. A revolução de 1830, que derrubou a Casa de Bourbon, acabara de infligir um duro golpe ao partido monarquista católico na França. Quase o primeiro ato do novo governo francês foi apoderar-se de Ancona, jogando assim a Itália, e particularmente os Estados Papais, em um estado de confusão e revolta política. No curso da luta que se seguiu, foi necessário mais de uma vez convocar tropas austríacas para combater os republicanos de camisa vermelha envolvidos em uma campanha de guerrilha. A administração conservadora dos Estados Papais adiou as reformas prometidas após uma série de atentados e tentativas de assassinato. Gregório XVI e o Cardeal Lambruschini se opuseram a inovações tecnológicas básicas, como iluminação a gás e ferrovias, acreditando que promoveriam o comércio e aumentariam o poder da burguesia, levando a demandas por reformas liberais que minariam o poder monárquico do Papa sobre Itália. De fato, Gregório XVI proibiu as ferrovias nos Estados Papais, chamando-as de "caminho para o inferno ". As insurreições em Viterbo em 1836, em várias partes das Legações em 1840, em Ravenna em 1843 e em Rimini em 1845, foram seguidas de execuções por atacado e sentenças draconianas de trabalho duro e exílio, nos Estados sob o controle das autoridades. Gregório XVI fez grandes gastos com obras defensivas, arquitetônicas e de engenharia, tendo um monumento ao Papa Leão XII construído por Giuseppe Fabris em 1837. Ele também prestou apoio a estudiosos como Angelo Mai, Giuseppe Mezzofanti e Gaetano Moroni. Essa generosidade, no entanto, enfraqueceu significativamente as finanças dos Estados Papais. Em 1839, Gregório XVI emitiu uma carta apostólica contra o comércio de escravos do Atlântico, In supremo apostolatus. Gregório XVI canonizou Verônica Giuliani, uma mística italiana da segunda ordem dos Franciscanos. Verônica Giuliani escreveu muito: cartas, relações autobiográficas, poesias. A fonte principal para reconstruir o seu pensamento é, no entanto, o seu Diário, iniciado em 1693: são 22 mil páginas manuscritas, que abrangem 34 anos de vida em clausura. A escritura flui espontânea e contínua, não existem riscos ou correções, nenhum sinal de interrupção ou distribuição do material em capítulos ou partes de acordo com um padrão predeterminado. Verônica não desejava compor uma obra literária; na verdade, foi obrigada a colocar por escrito suas experiências pelo Padre Jerônimo Bastos, religioso das Filipinas, de acordo com o Bispo diocesano Antonio Eustachi.

               Durante seu reinado, cinco Santos foram canonizados (principalmente Afonso de Ligório), trinta e três servos de Deus foram declarados abençoados (incluindo o agostiniano Simão de Cássia), e muitas novas ordens religiosas foram fundadas ou apoiadas, e a devoção dos fiéis a Maria, a mãe de Jesus aumentou tanto na vida privada como pública. Também aprovou e abençoou a Medalha Milagrosa. Gregório XVI morreu em 1 de junho de 1846 às 09h15 aos 80 anos. Após seu funeral, ele foi enterrado na Basílica de São Pedro.

 

256º - Pio IX - 1846 - 1878

               Pio IX, nascido Giovanni Maria Mastai-Ferretti (Senigália, 13 de maio de 1792 – Roma, 7 de fevereiro de 1878), foi Papa entre 16 de junho de 1846 e 7 de fevereiro de 1878. É o segundo Pontificado mais longo da história depois de São Pedro. Foi beatificado em 3 de setembro de 2000, pelo Papa João Paulo II. Foi o primeiro Papa da história a ser fotografado. Seu Papado ficou marcado pela destituição dos chamados Estados Eclesiásticos, pois Pio IX comandava o Trono de Roma quando os revoltosos empreendiam o Risorgimento, que levou à unificação da Itália como Estado Nacional, comandado pelo rei Vittorio Emanuele II. Neste Pontificado fundada a Associação das Filhas de Maria em 20/06/1847 por Santa Catarina Labouré, a quem Nossa Senhora transmitiu a Medalha Milagrosa. Também Instituído o Dogma da Imaculada Conceição em 1854, e o Dogma da Infalibilidade do Papa. Apesar de ser considerado no início como um liberal, o seu Pontificado passou a ser considerado como uma mudança no sentido do conservadorismo por seus críticos. Pio IX iniciou uma campanha contra o que chamou de falso liberalismo. Na encíclica Quanta Cura de 8 de dezembro de 1864, condenou dezesseis proposições que contrariavam a visão católica na época.

               Esta encíclica foi acompanhada pelo famoso Syllabus errorum, que condenava as ideologias do panteísmo, naturalismo, racionalismo, indiferentismo, socialismo, comunismo, franco-maçonaria, judaísmo, Igrejas dadas como cristãs a tentar explicar a Bíblia e vários outras formas de liberalismo religioso tidos por incompatíveis com a religião católica. Também surgiu nesta época dois livros altamente preocupantes: Em 1857 foi publicado um livro ocultista chamado “O Livro dos espíritos”, de Allan Kardec. Espiritismo não é uma religião, não tem Igreja, nem Templo, qualquer lugar pode ser usado para os contatos extraterrenos. Se trata de uma seita necromancista na busca de informações dos mortos, mas que na verdade é uma seita que promove as teorias mentirosas dos demônios. A reencarnação que eles defendem tanto, surgiu justamente com invocações nos rituais de Bruxos e Feiticeiros antigos, hoje chamados graciosamente de Médiuns. Lembrando que Deus condena a necromancia em todos os seus aspectos, e quem não obedece o Senhor, perde o Senhor. Em 1859 é lançado por Charles Darwin o Livro “A evolução das espécies”, que descredencia Deus como criador de tudo que existe. Para estes infelizes, tudo o que existe surgiu do nada sem um Criador. Tal teoria ateísta se transformou com o tempo na maior seita da humanidade. É de longe a que mais leva almas para o Inferno. A cavalgada do primeiro Cavaleiro apocalíptico, da apostasia, se intensifica nesta época.

               Antes, em 8 de janeiro de 1857, já havia feito a condenação dos escritos filosófico-teológicos de Günther e em muitas ocasiões insistiu em que se deveria seguir a filosofia e a teologia de São Tomás de Aquino. Durante toda sua vida foi muito devoto da Virgem Maria. Em 1849, quando se encontrava no exílio, em Gaeta, consultou o ponto de vista dos Bispos da Igreja a respeito da Imaculada Conceição enviando-lhes cartas, e em 8 de dezembro de 1854, na presença de mais de duzentos Bispos proclamou o dogma da Imaculada Conceição da Virgem Maria como sendo um dogma de fé da Igreja através da encíclica Ineffabilis Deus. Promoveu a devoção ao Sagrado Coração e em 23 de setembro de 1856 estendeu esta festividade a todo o mundo católico, e em 16 de junho de 1875 consagrou o mundo ao Sagrado Coração de Jesus. Promoveu a vida interna da Igreja por meio de muitas normas litúrgicas e reformas monásticas e um elevado número de beatificações e canonizações, sem precedentes para a época. Em 29 de junho de 1869 publicou a Bula Aeterni Patris com a qual convocou o Concílio Vaticano I, cuja cerimônia de abertura contou com a presença de setecentos Bispos no dia 8 de dezembro de 1869. Na quarta sessão solene do concílio, em 18 de julho de 1870, a infalibilidade Papal foi declarada um dogma de fé. Em 29 de setembro de 1850 restabeleceu a hierarquia católica na Inglaterra erigindo a Arquidiocese de Westminster com as sedes sufragâneas de Beverley, Birmingham, Clifton, Hexham, Liverpool, Newport e Menevia, Northampton, Nottingham, Plymouth, Salford, Shrewsbury e Southwark. Este ato provocou uma ampla comoção por parte de ingleses intolerantes, fomentada pelo Premier Russel e pelo London Times que quase resultou em perseguição aberta contra os católicos na Inglaterra. Em 4 de março de 1853 restabeleceu a hierarquia católica na Holanda, erigindo a Arquidiocese de Utrecht e as sedes sufragâneas de Haarlem, Bois-le-Duc, Roermond e Breda. Foi em seu Pontificado que houve o cisma ente o Papado e o Império do Brasil. Pio IX estabeleceu uma série de documentos condenando as novas ideias, entre elas a Maçonaria. No Brasil havia, instituição herdada da monarquia portuguesa, o chamado padroado. Ele determinava que qualquer determinação da Santa Sé, no Brasil, somente seria válida com a autorização do Imperador. Uma delas foi a proibição de casamento entre católicos e maçons. D. Pedro II não assinou e gerou problemas na atuação dos padres brasileiros. Os Bispos D. Vital e Macedo Costa seguiram as determinações do Papa e gerou uma crise do País com o Vaticano. Os Bispos foram presos e condenados à prisão. O caso somente foi resolvido quando o império mandou um diplomata a Roma.

Fim dos Estados Papais - Estabelecimento da República Romana

               O ano de 1848 foi muito agitado na Europa, tendo-se iniciado com revoltas na Sicília. A 14 de Março, a desordem pública forçou Pio IX a conceder uma constituição e um parlamento. O Rei Carlos Alberto da Sardenha declara guerra à Áustria nove dias depois. O levantamento popular continuou e um dos ministros que tinham sido nomeados pelo Papa para tentar agradar aos revolucionários, o liberal moderado Conde Pellegrino Rossi, foi assassinado em 15 de Novembro, nas escadas do Parlamento.

               O Papa foi cercado por uma multidão no Quirinal exigindo uma República. Algumas pessoas chegaram a disparar armas para o ar fazendo com que uma bala perdida entrasse pela janela do gabinete do Secretário do Papa, atingido-o. Um canhão até foi apontado na direção dos portões do palácio, e o Papa conseguiu escapar disfarçado de pároco. O Reino de Nápoles dominava, ficando a cidade de Roma nas mãos dos revoltosos. Só em 12 de Abril de 1850 retornaria a Roma, após intervenção diplomática da França e da Áustria. Crê-se que Pio IX tenha regressado afetado por esta violência e convertido para o lado conservador. Os revolucionários ainda estavam no terreno e a manutenção dos Estados Papais, sujeita à pressão de nacionalistas como Victor Emanuel II da Itália só se conseguiu com a ajuda de tropas francesas e austríacas.

Unificação italiana - Papa Pio IX deflagrou a questão romana

               Em 1858, Napoleão III e o Conde de Cavour declaram em conjunto guerra à Áustria. Na sequência da Batalha de Magenta (4 de Julho de 1859) as forças da Áustria retiram-se dos Estados Papais, precipitando assim a sua queda. Em Fevereiro de 1860, Victor Emanuel reclama a Umbria e a região das Marches; ao serem recusadas, toma-as pela força. Ao derrotar o exército Papal em 18 de Setembro, em Castelfidardo, e em 30 de Setembro em Ancona, Victor Emanuel toma todos os territórios Papais exceto Roma. Em Setembro de 1870 cerca Roma, tornando-a capital da nova Itália unificada. Concede a Pio a "Lei das Garantias" (15 de Maio de 1871) que dá ao Papa direitos de soberania, uma quantia anual fixa e a extraterritorialidade dos Palácios Papais de Roma. Pio IX nunca aceitou a oferta oficialmente, mantendo a pretensão sobre os territórios conquistados. Embora não tenha sido preso ou impedido de viajar à sua vontade, declarava-se prisioneiro no Vaticano. Além disso, proibiu os católicos italianos de votar nas eleições do novo reino italiano. Essa incômoda questão de disputas entre o Estado e a Igreja fica conhecida com o nome de Questão Romana e só termina em 1929, quando Benito Mussolini assinou com o Papa Pio XI a Concordata de São João Latrão.

 

256 . 1 - São João Bosco

               João Melchior Bosco, mais conhecido como Dom Bosco (Castelnuovo Don Bosco, 16 de agosto de 1815 — Turim, 31 de janeiro de 1888) foi um Sacerdote católico italiano, fundador da Pia Sociedade São Francisco de Sales e proclamado Santo em 1934. Aclamado por João Paulo II como o "Pai e Mestre da Juventude", é o Padroeiro da capital federal do Brasil, Brasília. Seguidor da espiritualidade e filosofia de Francisco de Sales, Dom Bosco era um fervoroso devoto de Maria Auxiliadora.

               Mais tarde, dedicou seus trabalhos a Sales, quando fundou os Salesianos, com sede em Turim. Juntamente com Maria Domenica Mazzarello, fundou o Instituto das Filhas de Maria Auxiliadora, uma Congregação religiosa de freiras dedicada ao cuidado e educação de meninas pobres. Ele ensinou São Domingos Sávio, de quem escreveu uma biografia que ajudou o menino a ser canonizado. Em 18 de abril de 1869, um ano após a construção da Basílica de Maria Auxiliadora em Turim, estabeleceu a Associação de Maria Auxiliadora (ADMA), conectando-a a compromissos facilmente cumpridos pela maioria das pessoas, com a espiritualidade e a comunidade, missão da Congregação Salesiana. A ADMA foi fundada para promover a veneração do Santíssimo Sacramento e Maria Auxiliadora. Em 1876, Dom Bosco fundou um movimento de leigos, a Associação de Cooperadores Salesianos, com a mesma missão educativa para os pobres. Em 1875, ele começou a publicar o Boletim Salesiano. O Boletim permaneceu em publicação contínua e atualmente é publicado em 50 edições diferentes e em 30 idiomas. Dom Bosco estabeleceu uma rede de organizações e centros para continuar seu trabalho. Após sua beatificação em 1929, ele foi canonizado como Santo na Igreja Católica Romana pelo Papa Pio XI em 1934. Sendo Padroeiro dos jovens e dos estudantes, é Patrono da juventude.

               Giovanni Bosco nasceu na noite de 16 de agosto de 1815 no vilarejo nas colinas de Becchi, Itália. Ele era o filho mais novo de Francesco Bosco (1784-1817) e Margherita Occhiena. Ele tinha dois irmãos mais velhos, Antonio e Giuseppe (1813-1862). Os Boscos de Becchi eram agricultores da Família Mogliana. João Bosco nasceu em uma época de grande escassez e fome no interior do Piemonte, após a devastação causada pelas guerras napoleônicas e pela seca em 1817. Quando ele tinha pouco mais de dois anos, seu pai Francesco morreu, deixando o apoio de três meninos para sua mãe, Margherita. Ela teve um forte papel na formação e na personalidade de Bosco, e foi uma das primeiras defensoras dos ideais de seu filho. Em 1825, quando tinha nove anos, Bosco teve o primeiro de uma série de sonhos que desempenhariam um papel influente em sua perspectiva e trabalho. Este primeiro sonho "deixou uma impressão profunda nele pelo resto da vida", segundo suas próprias memórias. Aparentemente, Bosco viu uma multidão de meninos muito pobres que brincavam e blasfemavam, e um homem que "aparecia com roupas nobres, de porte masculino e imponente". O homem disse-lhe: "Você terá que conquistar esses seus amigos não com socos, mas com gentileza e bondade. Portanto, comece agora mesmo a mostrar-lhes que o pecado é feio e a virtude bela". João Bosco, aos dez anos de idade, no oratório festivo, começou a observar a atitude de seus colegas de classe e, em todas as lutas, era o árbitro. Os meninos mais velhos tinham medo dele porque João Bosco conhecia seus pontos fortes e fracos. Quando os artistas que viajavam se apresentaram em um banquete local nas colinas próximas, João observou e estudou os truques dos malabaristas e os segredos dos acrobatas. Em seguida, ele mostrava suas habilidades como malabarista, mágico e acrobata, com orações antes e depois da apresentação. O dinheiro que ele precisava para preparar todos os shows foi retirado da venda dos pássaros que caçava e o dinheiro que sua mãe lhe deu porque ela confiava nele. A pobreza impediu qualquer tentativa séria de educação. Os primeiros anos de João foram gastos como pastor e ele recebeu sua primeira instrução de um pároco. Pensa-se que suas experiências de infância o inspiraram a se tornar um padre. Na época, ser padre era geralmente visto como uma profissão para as classes privilegiadas, e não para os agricultores, embora não fosse desconhecido. Alguns biógrafos retratam seu irmão mais velho Antonio como o principal obstáculo para a ambição de Bosco estudar, quando o irmão protestou que João era apenas "um agricultor como nós!"

               Numa manhã fria de fevereiro de 1827, João deixou sua casa e foi procurar emprego como criado de fazenda. Aos 12 anos, ele achou a vida em casa insuportável por causa das brigas contínuas com Antonio. Ter que enfrentar a vida sozinho em uma idade tão jovem pode ter desenvolvido suas simpatias posteriores para ajudar meninos abandonados. Depois de implorar sem sucesso pelo trabalho, Bosco acabou na fazenda de vinhos de Louis Moglia. Embora Bosco pudesse estudar sozinho, ele não pôde frequentar a escola por mais dois anos. Em 1830, ele conheceu José Cafasso, um jovem padre que identificou algum talento natural e apoiou sua primeira escola. Em 1835, Bosco entrou no seminário de Chieri, próximo à Igreja da Immacolata Conceição. Em 1841, após seis anos de estudo, ele foi ordenado Sacerdote na véspera do domingo da Trindade pelo Arcebispo Franzoni, de Turim.

               Fez a sua primeira comunhão em 1826. Em 1828 começou a estudar e aos dezesseis anos passa a frequentar a escola de Castelnuovo D'Asti. Em 30 de outubro de 1835, quando completou vinte anos, ingressou no Seminário de Chieri, sendo ordenado Sacerdote em 5 de junho de 1841, pelo Bispo Luigi Fransoni. Após a ordenação, transfere-se para Turim. Naquela época, a cidade de Turim tinha uma população de 117 000 habitantes. Ele refletia os efeitos da industrialização e da urbanização: numerosas famílias pobres viviam nas favelas da cidade, tendo vindo do campo em busca de uma vida melhor. Ao visitar as prisões, Dom Bosco ficou perturbado ao ver tantos meninos de 12 a 18 anos de idade. Ele estava determinado a encontrar um meio de impedir que terminassem assim. Devido ao crescimento populacional e à migração para a cidade, Bosco considerou os métodos tradicionais do ministério paroquial ineficientes. Ele decidiu que era necessário tentar outra forma de apostolado, e começou a encontrar os meninos onde eles trabalhavam e se reuniam em lojas e mercados. Eles eram pavimentadores, cortadores de pedra, pedreiros, rebocadores que vinham de lugares distantes, recordou em suas breves memórias. O Oratório não era simplesmente uma instituição de caridade e suas atividades não se limitavam aos domingos. Para Dom Bosco, tornou-se sua ocupação permanente. Ele procurou emprego para os desempregados. Alguns dos meninos não dormiam outros dormiam embaixo de pontes ou em dormitórios públicos sombrios. Por duas vezes, ele tentou fornecer acomodações em sua casa. A primeira vez que roubaram os cobertores; no segundo em que esvaziaram o palheiro. Ele não desistiu. Em maio de 1847, ele abrigou um menino de Valencia, em um dos três quartos que estava alugando nas favelas de Valdocco, onde morava com a mãe. Ele e "Mamma Margherita" começaram a acolher órfãos. Os meninos abrigados por Dom Bosco eram 36 em 1852, 115 em 1854, 470 em 1860 e 600 em 1861, 800 é o máximo mais tarde. Bosco e seu oratório se mudaram pela cidade por vários anos; ele foi expulso de vários lugares em sucessão. Depois de apenas dois meses com sede na igreja de St. Martin, todo o bairro expressou sua irritação com o barulho vindo dos meninos brincando. Uma queixa formal foi apresentada contra eles no município. Também circulavam boatos de que as reuniões conduzidas pelo padre com seus filhos eram perigosas; sua recreação poderia ser transformada em uma revolução contra o governo. O grupo foi despejado.

               No contexto da revolução industrial na Itália, havia grande contingente de jovens sem família nas grandes cidades. Desde 1809, em Milão, a igreja católica mantinha um tipo de obra assistencial para jovens denominada oratório, que se ocupava de lazer, educação e catequese. O primeiro oratório de Turim foi fundado em 1841, pelo padre Giovanni Cochi. Influenciado por essas iniciativas, Dom Bosco funda em 8 de dezembro de 1841 um oratório em Turim, quando atende e ensina o jovem Bartolomeo Garelli na sacristia da Igreja de São Francisco de Assis. Em 8 de dezembro de 1844, esse oratório passa a denominar-se 'Oratório de São Francisco de Sales, sendo a primeira casa Salesiana, e em 12 de abril de 1846 passou a ter sua sede definitiva numa propriedade de Francisco Pinardi, no bairro turinense de Valdocco.

               O cenário político do Piemonte e em toda Itália era de caráter revolucionário, com inúmeros conflitos entre o Estado em formação e a Igreja Católica, durante todo o período do Risorgimento. Seus biógrafos registram sua amizade com políticos como Camilo de Cavour e Humberto Ratazzi, pessoas influentes como a Marquesa Barolo, a amizade direta com o Papa Pio IX e com o Papa Leão XIII. Localmente, o Arcebispo de Turim que ordenou São João Bosco, Dom Luigi Fransoni esteve tanto no exílio como preso, tendo recusado os últimos Sacramentos ao Ministro Santa Rosa e por isso tendo sido repreendido pelo Rei Vítor Emanuel. Seu sucessor, Dom Lorenzo Gastaldi, teve uma longa disputa com São João Bosco, que resultou num processo canônico. A paz entre ambos só se fez mediante decisão de Leão XIII. As relações com políticos italianos e com Papas, de forma muito direta, teriam dado a João Bosco uma posição política que parecia, sobretudo ao Bispo Gastaldi, ameaçar a ordem hierárquica da Igreja.

               Bosco pensava em organizar uma associação religiosa, contudo, o contexto político da unificação da Itália, a disputa pela separação entre Estado e Igreja, não estimulavam a criação de uma ordem religiosa nos moldes tradicionais. O ministro Umberto Ratazzi lhe sugeriu organizar uma sociedade de cidadãos que se dedicasse às atividades educativas realizadas pelos oratórios em moldes civis. Bosco propõe a Sociedade de São Francisco de Sales, que seria vista como uma associação de cidadãos aos olhos do Estado e como uma associação de religiosos perante a Igreja. Após consultar o Papa Pio IX, Bosco recebeu de seus companheiros padres, seminaristas e leigos a adesão à Sociedade de São Francisco de Sales em 18 de dezembro de 1859 e em 14 de março de 1862, os primeiros salesianos fizeram os votos religiosos de castidade, pobreza e obediência. A partir de 1863, além dos oratórios, os salesianos passam a se dedicar também aos colégios e escolas católicas para meninos e jovens. Com a separação entre Estado e igreja, há forte demanda por escolas católicas, fazendo com que esse tipo de instituição se dissemine rapidamente. As regras da Sociedade, chamadas de Constituições, foram aprovadas pela igreja em 1874. Em sua morte, em 1888, a Sociedade contava com 768 membros, com 26 casas fundadas nas Américas e 38 na Europa.

               Em 1861, na cidade italiana de Mornese, Maria Domingas Mazzarello convida sua amiga Petronilla para juntas organizarem uma oficina de costura para meninas. Em 1863 a oficina começa a acolher meninas órfãs. O seu trabalho é supervisionado pelo Padre Domingos Pestarino, que havia se associado aos Salesianos. Com o auxílio de Pestarino, Bosco propõe às jovens que se organizem como uma congregação religiosa, com o nome de Filhas de Maria Auxiliadora e em 5 de agosto de 1872 as primeiras salesianas fazem seus votos. Maria Mazzarello foi a primeira superiora da congregação.

               De início, a proposta da Sociedade de São Francisco de Sales incluía, padres, irmãos e leigos externos, porém essa forma de organização não foi aprovada pela igreja católica, que queria apenas padres e irmãos, como nas demais congregações. Sendo assim, Bosco propôs a associação leiga dos Salesianos Cooperadores, que foi aprovada em 1876 pelo Papa Pio IX. O objetivo era o mesmo da Sociedade de São Francisco de Sales, a saber: o trabalho educativo e catequético junto aos meninos e aos jovens. Em sua forma de associação, tornou-se uma sociedade mista, com homens e mulheres leigos.

Sonhos proféticos de João Bosco

               Há controvérsia se seriam sonhos, visões ou premonições. O próprio São João Bosco parece que não sabia muito bem como lidar com esses eventos. Por fim, decidiu dar-lhes atenção, pois muitas vezes eram sonhos de caráter premonitório, que o avisavam sobre a morte iminente de algum aluno ou salesiano. Era seu costume contar o sonho a seu confessor ou diretor espiritual antes de contá-lo aos demais. Com relação aos sonhos de São João Bosco, o (beato) Papa Pio IX, ordenou-lhe que consignasse tudo por escrito, em seu sentido literal e de forma detalhada, para maior estímulo dos filhos da Congregação Salesiana.

               A biografia de João Bosco elenca inúmeros sonhos, desde o primeiro, ainda na infância, quando se vê brigando com outros meninos e um homem – de acordo com os símbolos do sonho, Jesus Cristo — se aproxima e lhe diz para educar não com pancadas, mas com mansidão e caridade.

               Bosco morreu em 31 de janeiro de 1888. Seu funeral foi assistido por milhares de pessoas. Logo depois, houve uma demanda popular para que ele fosse canonizado. A Arquidiocese de Turim investigou e testemunhas foram chamadas para determinar se Bosco era digno de ser declarado Santo. Os Salesianos, Filhas e Cooperadores deram testemunhos de apoio. Mas muitos se lembraram das controvérsias de Bosco na década de 1870 com o Arcebispo Gastaldi e alguns outros da hierarquia da Igreja que o consideravam um canhão solto e um "negociante de rodas". No processo de canonização, ouviram-se testemunhos de como ele percorreu Gastaldi para ordenar alguns de seus homens e sobre a falta de preparação acadêmica e decoro Eclesiástico. Desenhos políticos a partir da década de 1860 e depois o mostrou sacudindo dinheiro dos bolsos de velhinhas ou indo para a América com o mesmo objetivo. Esses desenhos não foram esquecidos. Os opositores de Bosco, incluindo alguns Cardeais, estavam em posição de bloquear sua canonização. Por volta de 1925, muitos salesianos temiam que tivessem sucesso. O Papa Pio XI conhecia Dom Bosco e impulsionou a causa. Pio XI beatificou Bosco em 2 de junho de 1929 num domingo de Páscoa (1 de abril) de 1934, quando recebeu o título de "Pai e Mestre da Juventude". Seu corpo permanece incorrupto desde o dia de sua morte, exatamente igual quando morreu em 1888. Este é um milagre do Céu, testificando seu Santo na terra.

               Tendo participado do período do Risorgimento e se relacionado com seus atores principais, Dom Bosco acabou por participar, indiretamente, da resolução do último aspecto que aquele movimento deixou em aberto para o século XX: a Questão Romana. O momento da beatificação de Dom Bosco (1929) coincide com a Concordata de São João de Latrão, celebrada entre Benito Mussolini e o Cardeal Pietro Gasparri, com a aprovação do Papa Pio XI. A coincidência não é gratuita, mas representa naquele momento, uma expressão de nacionalismo italiano, com Mussolini, que estudara um ano no colégio salesiano de Faenza, elogiando Dom Bosco e com Pio XI pondo fim ao poder temporal da Igreja, permitindo a final unificação da Itália e considerando Mussolini um "homem da Providência". Na canonização de Dom Bosco em (1934) o contexto será bem outro. Descontente com os rumos do fascismo e do nazismo, Pio XI escreverá duas encíclicas, uma em alemão e outra em italiano, condenando ambas as ideologias. O uso político da popularidade e italianidade de Dom Bosco e dos salesianos é recorrente na Itália. Em 2005, o então primeiro-ministro Silvio Berlusconi visitou o Instituto Salesiano Santo Ambrósio, em Milão, onde foi aluno, para recordar que aprendera com Dom Bosco que "é preciso estar de acordo com todos".

               No fundo da Basílica de Maria Auxiliadora em Turim, procurada por Dom Bosco, está a pintura que representa o famoso "Sonho das duas colunas", considerado profético sobre o futuro da Igreja. O sonho, contado pelo futuro Santo na noite de 30 de maio de 1862, descreve uma terrível batalha no mar, desencadeada por uma multidão de barcos contra um único navio grande, que simbolizaria a Igreja Católica. O navio, atingido repetidamente, é liderado pelo Papa para ancorar, seguro e vitorioso, entre duas colunas altas que emergiram do mar. Este último representaria o primeiro, a Eucaristia, simbolizada por um grande anfitrião com a palavra "Salus credentium", o segundo Maria, simbolizada por uma estátua da Imaculada com a inscrição "Auxilium Christianorum". Na noite de 13 de setembro de 1953, o abençoado Cardeal Schuster, então Arcebispo de Milão, que estava em Turim como o Legado Papal no Congresso Eucarístico Nacional, dedicou uma parte significativa de sua homilia a esse sonho durante o solene fechamento Pontifício.

               Para os propósitos da beatificação, a Igreja Católica considera um milagre necessário: no caso de Dom Bosco, ele considerou curas milagrosas de Teresa Callegari e Provina Negro. Em Castel San Giovanni, na província de Piacenza, Teresa Callegari, de 23 anos, em novembro de 1918, adoeceu com pneumonia de origem gripal. Hospitalizada, ela se recuperou de uma pneumonia, mas, durante sua convalescença, adoeceu com poliartrite infecciosa rebelde a cada tratamento. A patologia tornou-se crônica e, em 1921, também devido a complicações, a mulher não podia mais comer e os médicos se desesperavam em salvá-la. A conselho de um amigo, ele iniciou uma novena a Dom Bosco, repetida em julho do mesmo ano. Em 16 de julho, oitavo dia da novena, a situação se deteriorou ainda mais e pensou-se que a jovem estava prestes a morrer. Este último, no entanto, às 4 da manhã do dia 17, como relatou mais tarde, teria visto Dom Bosco avançando em direção à sua cama de hospital, ordenando que ela se levantasse: saiu da cama sem sentir nenhum desconforto e, ao ver a imagem do padre, ela correu gritando para os outros pacientes incrédulos No dia seguinte, os médicos, incluindo o Dr. Miotto, verificaram a recuperação, que foi confirmada durante o processo apostólico também pelos médicos Ghisolfi e Fermi e, posteriormente, pelos médicos Chiays, Sympa e Stampa. O processo de beatificação durou até 1929, ano em que, em 19 de março, a Igreja declarou milagrosa que a cura, instantânea, completa e definitiva, não parecesse cientificamente explicável. Nesta ocasião, a cura da irmã Provina Negro, pertencente à congregação das Filhas de Maria Auxiliadora, também foi declarada um milagre: sua súbita recuperação de uma forma grave de úlcera estomacal foi examinada paralelamente à de Teresa Callegari e atribuída à intercessão de Dom Bosco.

Visão do Inferno segundo Dom Bosco

               O inferno é um lugar destinado pela justiça divina para punir com suplícios eternos os que morrem em pecado mortal. A primeira pena que os condenados sofrem no inferno é a pena dos sentidos, que são atormentados por um fogo que queima horrivelmente, sem nunca diminuir de intensidade. Fogo nos olhos, fogo na boca, fogo em todas as partes. Cada sentido sofre a própria pena.

Os olhos: Sofrem pela fumaça e pelas trevas e são aterrados pela vista dos demônios e dos outros condenados.

Os ouvidos: Dia e noite, só escutam contínuos uivos, prantos e blasfêmias.

O olfato: Sofre enormemente pelo mau cheiro daquele enxofre e pez ardente que o sufoca.

A boca:  É atormentada por sede devoradora e fome canina: "Et Famem patiéntur ut canes".

               O mau rico no meio daqueles tormentos, ergueu o olhar ao Céu e pediu, como grande graça, uma pequena gota de água para mitigar a secura de sua língua e até essa gota de água Ihe foi negada. Por isso, aqueles infelizes, atormentados pelo fogo, choram, gritam e se desesperam. Oh! inferno, inferno! Como são infelizes os que caem nos teus abismos! - E tu que dizes, meu filho? Se agora não podes conservar um dedo sobre a pequena chama de uma vela, se não podes aguentar nem uma fagulha de fogo na mão sem gritar, como poderás agüentar-te então entre aquelas chamas por toda a eternidade?

               A Segunda Pena é a Pena nas potências da alma. Considera além disso, meu filho, o remorso que experimenta a consciência dos condenados. Eles padecerão um inferno na memória, na inteligência, na vontade.

MEMÓRIA: Recordarão continuamente ó motivo da sua perdição, isto é, por terem querido, secundar alguma paixão. Esta lembrança é o verme que nunca morre: Vermis eórum non móritur. Recordarão o tempo que Deus Ihes deu para evitar a perdição, os bons exemplos dos companheiros, os propósitos feitos e não cumpridos. Pensarão nos sermões ouvidos, nos avisos do confessor, nas boas inspirações para deixar o pecado; vendo que já não há remédio, lançarão gritos desesperados.

INTELIGÊNCIA: A inteligência conhecerá finalmente o grande bem que perdeu. A alma separada do corpo, ao apresentar-se no tribunal Divino, entrevê a beleza de Deus, conhece toda a sua bondade, chega quase a contemplar por um instante os cantos harmoniosíssimos dos Anjos e dos Santos. Que dor verificar que perdeu tudo isso para sempre! Quem poderá resistir a tais tormentos?

VONTADE: A vontade nada terá do que deseja, e ao contrário padecerá todos os males. Meu Filho, Tu que agora não te importas de perder o teu Deus e o Paraíso conheceras tua cegueira quando vires; tantos companheiros teus, mais ignorantes e mais pobres do que tu triunfarem e gozarem no reino dos Céus, ao passo que tu serás arrojado para longe daquela pátria feliz, do gozo do mesmo Deus, da companhia da Santíssima Virgem e dos Santos. Eia pois, faz penitencia, não esperes para quando não houver mais tempo: entrega-te a Deus. Quem sabe se não é este o último chamado, e se não correspondes, quem sabe se Deus não te abandona e não te deixa cair naqueles eternos suplícios! Oh! Meus Jesus, livrai-me do inferno: A Poenis inférni libera me, Domine. Dom Bosco teve outro sonho no qual era conduzido por um Anjo ao inferno. Assustado viu a condenação de varios alunos do seu oratório. Neste sonho existe uma verdadeira catequese sobre a condenação de uma alma.

 

256 . 2 - Aparição de Nossa Senhora de La Salete - França

               Um menino de nome Maximin Giraud, de onze anos, e Mélanie Calvat, de quinze, estavam cuidando do gado. Mélanie estava acostumada e treinada nesse tipo de trabalho desde os nove anos, mas tudo era novo para Maximin. Seu pai lhe havia pedido que fosse fazer esse serviço como ato generoso, para cooperar com o amigo que estava com o pastor adoentado.

               Relata Mélanie: No dia 18 de setembro de 1846, véspera da Aparição da Santíssima Virgem, eu estava sozinha, como sempre, cuidando do gado do meu patrão; por volta de onze horas vi um menino que se aproximava. Por um momento tive medo, pois achava que todos deviam saber que eu evitava todo tipo de companhia. O menino se aproximou e me disse: "Ei menina, vou contigo, sou de Corps". A estas palavras minha malícia natural se mostrou e lhe disse: "Não quero ninguém perto de mim. Quero ficar sozinha". Mas ele, seguindo-me, disse: "Meu patrão me enviou aqui para que cuide do gado contigo. Venho de Corps". Afastei-me dele, agastada, dando-lhe a entender que não queria ninguém por perto. Quando estava a certa distância, sentei-me na grama. Normalmente, dessa forma conversava com as florzinhas ou ao Bom Deus. Depois de um momento, atrás de mim estava Maximin sentado e diretamente me disse: "Deixa-me ficar contigo, me comportarei muito bem". Embora contra minha vontade e sentindo-me incomodada por Maximin, permiti que ficasse. Ao ouvir os sinos de la Salette para o Ângelus, disse-lhe para elevar sua alma a Deus. Ele tirou o chapéu e se manteve em silêncio por um momento. Logo comemos e brincamos juntos. Quando caiu a tarde descemos a montanha e prometemos voltar ao dia seguinte para levar o gado novamente. No dia seguinte, sábado, 19 de setembro de 1846, o dia estava muito quente e os dois jovenzinhos concordaram em comer seu almoço em um lugar sombreado. Contrariamente a seu costume, eles se estendem sobre a relva... e adormecem. O tempo passa! Mélanie foi a primeira a despertar: "Maximin, Maximin, vem depressa, vamos ver nossas vacas... Não sei onde andam!". Rapidamente sobem a ladeira. Voltando-se, têm diante de si toda a pradaria: as vacas lá estão ruminando calmamente. Os dois pastores se tranquilizam. Mélanie começa a descer. A meio caminho se detém imóvel e pergunta a Maximino se não vê o que ela estava vendo:

"Maximin, olha lá, aquele clarão!".

Maximin corre gritando:

"Onde? Onde?"

Mélanie estende o dedo para o fundo do vale onde haviam dormido. O clarão se mexia e se agitava, como dividindo-se ao meio.

"Oh, meu Deus!", exclamou Mélanie, deixando cair o cajado.

Algo fantasticamente inconcebível a inundava nesse momento e ela se sentiu atraída, com profundo respeito, cheia de amor e o coração batendo mais rapidamente. Viram uma Senhora sentada em uma enorme pedra. Tinha o rosto entre as mãos e chorava amargamente. Mélanie e Maximino estavam com medo e não se mexiam.

A Senhora, pondo-se lentamente de pé e cruzando suavemente seus braços, lhes chamou:

- Vinde, meus filhos, não tenhais medo, aqui estou para vos contar uma grande novidade!

               Então, as crianças foram até a Bela Senhora. Ela não parava de chorar. "Achávamos que era uma mamãe cujos filhos a tivessem espancado e que se teria refugiado na montanha para chorar". A Senhora era alta e toda de luz. Vestia-se como as mulheres da região: vestido longo, um grande avental, lenço cruzado e amarrado as costas, touca de camponesa. Rosas coroando sua cabeça, ladeando o lenço e ornando seu calçado. Em sua fronte a luz brilhava como um diadema. Em seus olhos havia lágrimas que rolavam pelas faces. Sobre os ombros carregava uma pesada corrente. Uma corrente mais leve prendia sobre o peito um crucifixo resplandecente, com um martelo de um lado, e de outro uma torquês.

               Ela disse: - Se meu povo não quer submeter-se, sou forçada a deixar cair o braço de meu Filho. É tão forte e tão pesado que não o posso mais suster. Há quanto tempo sofro por vós! Dei-vos seis dias para trabalhar, reservei-me o sétimo, e não mo querem conceder! É isso que torna tão pesado o braço de meu Filho. E também os carroceiros não sabem jurar sem usar o Nome de meu Filho. São essas as duas coisas que tornam tão pesado o braço de meu Filho. Se a colheita se estraga, e só por vossa causa. Eu vo-lo mostrei no ano passado com as batatinhas: e vós nem fizestes caso! Ao contrário, quando encontráveis batatinhas estragadas, juráveis usando o Nome de meu Filho. Elas continuarão assim, e neste ano, para o Natal, não haverá mais.

               A palavra "batatinhas" (em francês: 'pommes de terre'), deixa Mélanie intrigada. No dialeto da região, se diz "la truffa". E a palavra 'pommes' lembra-lhe o fruto da macieira. Ela se volta então para Maximino, para lhe pedir uma explicação. A Senhora, porém adianta-se dizendo:

- Não compreendeis, meus filhos? Vou dizê-lo de outro modo.

Retomando pois, as últimas frases no dialeto de Corps ('patois'), língua falada correntemente por Maximino e Mélanie, a Senhora prossegue sempre no dialeto:

- Se tiverdes trigo, não se deve semeá-lo. Todo o que semeardes será devorado pelos insetos, e o que produzir se transformará em pó ao ser malhado. Virá grande fome. Antes que a fome chegue, as crianças menores de sete anos serão acometidas de trevor e morrerão entre as mãos das pessoas que as carregarem. Os outros farão penitência pela fome. As nozes caruncharão, as uvas apodrecerão.

               De repente, a Senhora continuou a falar, mas somente Maximin a entendia. Mélanie percebia seus lábios se moverem, mas nada entendia. Alguns instantes depois, Mélanie por sua vez, pode ouvir, enquanto Maximin, que nada mais entende, faz girar o chapéu na ponta do cajado ou, com a outra, brinca com pedrinhas no chão. "Mas nenhuma sequer tocou os pés da Bela Senhora!", excusar-se-ia alguns dias mais tarde. "Ela me disse alguma coisa ao me dizer: “Tu não dirás nem isso”. Depois, não compreendia mais nada, e durante esse tempo, eu brincava.

Assim a Bela Senhora falou em segredo a Maximin e depois a Mélanie. E novamente, os dois em conjunto ouviram as seguintes palavras:

- Se se converterem, as pedras e rochedos se transformarão em montões de trigo, e as batatinhas serão semeadas nos roçados. Fazeis bem vossa oração, meus filhos?

- "Não muito, Senhora".

- Ah! Meus filhos, é preciso fazê-la bem, à noite e de manhã, dizendo ao menos um Pai Nosso e uma Ave Maria quando não puderdes rezar mais. Quando puderdes rezar mais, dizei mais. Durante o verão, só algumas mulheres mais idosas vão à Missa. Os outros trabalham no domingo, durante todo o verão. Durante o inverno, quanto não sabem o que fazer, vão à Missa zombar da religião. Durante a Quaresma vão ao açougue como cães. Nunca vistes trigo estragado, meus filhos?

- "Não Senhora".

- Mas tu, meu filho, tu deves tê-lo visto uma vez, perto de Coins, com teu pai. O dono da roça disse a teu pai que fosse ver seu trigo estragado. Ambos fostes até lá. Ele tomou duas ou três espigas entre as mãos, esfregou-as e tudo caiu em pó. Ao voltardes, quando estaveis a meia hora de Corps, teu pai te deu um pedaço de pão dizendo-te: "Toma, meu filho, come pão neste ano ainda, pois não sei quem dele comerá no ano próximo, se o trigo continuar assim".

Maximin respondeu: - "É verdade, Senhora, agora lembro. Há pouco não lembrava mais".

E a Bela Senhora concluiu, não mais em dialeto 'patois', e sim em francês:

- Pois bem, meus filhos, transmitireis isso a todo o meu povo.

               Então ela seguiu até o lugar em que haviam subido para ver onde estavam as vacas. Seus pés deslizavam, tocando apenas a ponta da grama, sem dobrá-la. Na colina, a Bela Senhora se deteve. Mélanie e Maximin correram até ela para ver onde ia. A Senhora se eleva rapidamente, permanecendo por uns minutos a alguns metros de altura (3 ou 5 m). Olhou para o céu, olhou à sua direita (na direção de Roma?), à sua esquerda (na direção da França?), olhou para os dois meninos, e se confundiu com o globo de luz que a envolvia. Este então subiu até desaparecer no firmamento. Um segredo importante foi dado pela Virgem a Mélanie, para revelá-lo anos mais tarde. Maximin assegurou que a Virgem disse algo a Mélanie, que ele não ouviu. Esse segredo, no entanto, não está incluído na aprovação dada pela Igreja à aparição, pois foi divulgado posteriormente. O segredo somente foi publicado em sua totalidade em uma brochura, em Lecce, no ano de 1879. Ao Papa da época, Pio IX, o texto do segredo foi entregue em 18 de julho 1851. Esta redação mais extensa, feita por Mélanie em 21 de novembro de 1878, considerada definitiva pela vidente.

               Diz Maria Santíssima: - Mélanie, o que eu te vou dizer agora não será um segredo para sempre. Tu podes publicá-lo em 1858.

Os Sacerdotes, ministros de meu Filho, por causa da sua vida má, pelas suas irreverências e pela sua impiedade ao celebrar os Santos mistérios, pelo amor ao dinheiro, o amor às honras e aos prazeres, os Sacerdotes converteram-se em cloacas de impureza. Sim, os Sacerdotes provocam a vingança e a vingança pende sobre suas cabeças. Ai dos Sacerdotes e pessoas consagradas a Deus que pelas suas infidelidades e más vidas crucificam meu Filho de novo! Os pecados das pessoas consagradas a Deus clamam ao Céu e atraem vingança, e eis que a vingança está às suas portas, porque já não se encontra ninguém para implorar misericórdia e perdão para o povo. Já não há almas generosas, já não há ninguém digno de oferecer a Vítima sem mancha ao Eterno, pelo mundo. Deus vai castigar de uma maneira sem precedentes. Ai dos habitantes da Terra! Deus vai esgotar a sua cólera e ninguém poderá fugir a tantos males juntos. Os chefes, os condutores do povo de Deus, descuraram a oração e a penitência, e o demônio obscureceu as suas inteligências. Tornaram-se naquelas estrelas errantes, que a antiga Serpente arrastará com a sua cauda para os fazer perecer. Deus permitirá que a antiga Serpente ponha divisões entre os soberanos, em todas as sociedades e em todas as famílias, sofrerá penas físicas e morais. Deus abandonará os homens a si mesmos e enviará castigos que se hão de suceder durante mais de trinta e cinco anos. A sociedade está às vésperas das mais terríveis calamidades e dos mais graves acontecimentos. Deverá esperar vir a ser governada com vara de ferro e beber o cálice da cólera de Deus.

            Que o Vigário de meu Filho, o Sumo Pontífice Pio IX, não saia de Roma depois de 1859; mas que seja firme e generoso, que combata com as armas da fé e do amor. Eu estarei com ele. Que desconfie de Napoleão (Napoleão III): o seu coração é falso, e quando ele ser, ao mesmo tempo, Papa e Imperador, Deus se retirará dele. Ele é aquela águia que, querendo sempre subir mais alto, cairá sobre a espada de que se queria servir para obrigar os povos à submissão. A Itália será castigada pela sua ambição, por querer sacudir o jugo do Senhor dos Senhores; também ela será entregue à guerra. O sangue correrá por todos os lados; as igrejas serão fechadas ou profanadas; os Sacerdotes e religiosos serão perseguidos; irão fazê-los morrer, e morrer de morte cruel. Muitos abandonarão a fé, e o número de Sacerdotes e religiosos que apostatarão da religião verdadeira será grande; entre estes haverá até mesmo Bispos. Que o Papa se acautele contra os fazedores de milagres, porque chegou o tempo em que se hão de operar os mais espantosos prodígios na terra e no ar. No ano de 1864, serão libertados do Inferno Lúcifer com um grande número de demônios; eles abolirão a fé pouco a pouco, mesmo nas pessoas consagradas a Deus. Irão cegá-las de tal forma que, salvo se elas forem abençoadas por uma graça especial, essas pessoas assimilarão o espírito desses anjos maus. Muitas casas religiosas perderão completamente a fé e muitas almas se irão perder. Os livros maus abundarão na Terra e os espíritos das trevas espalharão, por toda a parte, um relaxamento universal por tudo o que seja serviço de Deus; e terão um enorme poder sobre a natureza. Haverá igrejas dedicadas ao culto desses espíritos. Certas pessoas serão transportadas de um a outro lugar por esses maus espíritos, e até Sacerdotes, porque eles não serão conduzidos pelo bom espírito do Evangelho, que é um espírito de humildade, de caridade e de zelo pela glória de Deus. Em algumas ocasiões, os mortos e os justos serão trazidos de volta à vida, isto é, esses mortos tomarão a aparência das almas justas que viveram na Terra, para melhor seduzir os homens. Esses ditos mortos ressuscitados não serão mais do que o demônio sob as suas figuras, e pregarão outro evangelho, contrário ao do verdadeiro Jesus Cristo, negando quer a existência do Céu, quer ainda a existência das almas dos condenados. Todas essas almas aparecerão como que unidas aos seus corpos. E serão vistos, por toda a parte, prodígios extraordinários, porque a fé verdadeira se extinguiu e a falsa luz ilumina o mundo. Ai dos Príncipes da Igreja que se tenham apenas dedicado a acumular riquezas e salvaguardar a sua autoridade, e a dominar com orgulho! O Vigário do meu Filho terá muito que sofrer, porque por um tempo a Igreja será entregue a grandes perseguições, será o tempo das trevas. A Igreja terá uma crise medonha. Esquecida a Santa fé de Deus, cada indivíduo quererá governar-se por si mesmo e ser superior aos seus semelhantes. Serão abolidos os poderes civis e Eclesiásticos, toda a ordem e justiça serão calcadas aos pés. Só se verão homicídios, ódios, inveja, mentira e discórdia, sem amor pela pátria e pela família. O Santo Padre sofrerá muito. Estarei com ele, até o fim, para receber o seu sacrifício. Os malvados atentarão muitas vezes contra a sua vida, sem poder pôr fim aos seus dias; nem ele, porém, nem o seu sucessor verão o triunfo da Igreja de Deus.

            Todos os governantes civis terão o mesmo plano, que será o de abolir e fazer desaparecer todo o princípio religioso, para dar lugar ao materialismo, ao ateísmo, ao espiritismo e a toda espécie de vícios. No ano de 1865, será vista a abominação nos lugares santos. Nos conventos, as flores da Igreja estarão putrefatas, e o demônio se converterá no rei dos corações. Que os que estão à frente das comunidades religiosas vigiem as pessoas que irão receber, porque o demônio usará de toda a sua malícia para introduzir nas ordens religiosas pessoas dadas ao pecado, pois as desordens e o amor aos prazeres da carne estarão espalhados por toda a Terra. A França, a Itália, a Espanha e a Inglaterra estarão em guerra; o sangue correrá pelas ruas; o francês lutará contra o francês, o italiano contra o italiano, e depois haverá uma guerra geral, que será medonha. Por um tempo, Deus irá esquecer-se da França e da Itália, porque o Evangelho de Jesus Cristo já não é conhecido. Os malvados desenvolverão toda a sua malícia; os homens irão matar-se e assassinar-se, até dentro das casas. Ao primeiro golpe da sua espada fulminante, as montanhas e a natureza inteira estremecerão de espanto, porque as desordens e os crimes dos homens traspassam a abóbada do Céu. Paris será queimada e Marselha engolida. Várias grandes cidades serão abaladas e soterradas por terremotos. As pessoas acreditarão que tudo estará perdido. Não se verá mais do que homicídios, não se ouvirá senão os ruídos das armas e blasfêmias. Os justos sofrerão muito; as suas orações, a sua penitência e as suas lágrimas subirão ao Céu e todo o povo de Deus pedirá perdão e misericórdia, e implorará a minha ajuda e intercessão. Então, Jesus Cristo, por um ato da sua Justiça e da sua Misericórdia para com os justos, mandará os seus anjos dar morte e todos os seus inimigos. Num abrir e fechar de olhos, os perseguidos da Igreja de Jesus Cristo e todos os homens escravos do pecado perecerão, e a Terra ficará como um deserto. Então, será feita a paz, a reconciliação de Deus com os homens. Jesus Cristo será servido, adorado e glorificado. A caridade florescerá por toda a parte. Os novos reis serão o braço direito da Santa Igreja, que será forte, humilde e piedosa, pobre, zelosa e imitadora das virtudes de Jesus Cristo. O Evangelho será pregado por toda a parte e os homens farão grandes progressos na fé, porque haverá unidade entre os obreiros de Jesus Cristo e porque os homens viverão no temor de Deus. Essa paz entre os homens não será longa - 25 anos de abundantes colheitas farão esquecer que os pecados dos homens são a causa de todos os males que sucedem à Terra. Um precursor do Anticristo, com um exército composto de muitas nações, combaterá o verdadeiro Cristo, o único Salvador do mundo; derramará muito sangue e pretenderá aniquilar o culto de Deus, para que se considere a ele como Deus. A Terra será castigada com toda a espécie de pragas, além da peste e da fome, que serão gerais; haverá guerras, até à última, que será feita, então, pelos dez reis aliados do Anticristo, que terão, todos, o mesmo desígnio, e serão os únicos a governar o mundo. Antes que isso aconteça, haverá no mundo uma espécie de falsa paz. Não se pensará senão em divertimentos. Os malvados se irão entregar a todo o gênero de pecados. Porém, os filhos da Santa Igreja, os filhos da fé, os meus verdadeiros imitadores, crescerão no amor de Deus e nas virtudes que me são mais queridas. Ditosas as almas humildes, dirigidas pelo Espírito Santo! Eu combaterei com elas, até chegarem à plenitude dos tempos. A natureza clama por vingança contra os homens e treme de medo à espera do que deve acontecer à Terra, empapada de crimes. Tremei, ó Terra, e vós que fazeis profissão de servir a Jesus Cristo e que, dentro de vós, adorai-vos a vós mesmos. Tremei, porque Deus vos vai entregar ao seu inimigo, porque os lugares Santos estão na corrupção; muitos conventos já não são casas de Deus, mas pastos de Asmodeu e dos seus.

            Será durante este tempo que nascerá o Anticristo, de uma religiosa hebraica, de uma falsa virgem, que terá comunicação com a antiga Serpente, o mestre da impureza. O seu pai será bispo. Em seu nascimento, vomitará blasfêmias, terá dentes; numa palavra, será uma encarnação do Diabo. Soltará gritos medonhos, fará prodígios e só se alimentará de impurezas. Terá irmãos que, embora não sendo como ele diabos incarnados, serão filhos do mal. Aos doze anos, chamarão atenção sobre si mesmos pelas rudes vitórias que alcançarão. Bem depressa, irão colocar-se à frente de grandes exércitos, assistidos por legiões do Inferno.

            As estações mudarão. A Terra somente produzirá frutos maus. Os astros perderão os seus movimentos regulares. A Lua só refletirá uma débil luz avermelhada. A água e o fogo imprimirão ao globo terrestre movimentos convulsivos e horríveis terremotos, que tragarão montanhas e cidades inteiras. Roma perderá a fé e se converterá na sede do Anticristo.

            Os demônios do ar, junto com o Anticristo, farão grandes prodígios na terra e nos ares, e os homens se irão perverter cada vez mais. Deus cuidará dos seus fiéis servidores e dos homens de boa vontade. O Evangelho será pregado por toda a parte e todos os povos e todas as nações conhecerão a verdade! Eu dirijo um urgente apelo à Terra: chamo os verdadeiros discípulos do Deus Vivo, que reina nos céus; chamo os verdadeiros imitadores de Cristo feito homem - o único e verdadeiro Salvador dos homens; chamo os meus filhos, os meus verdadeiros devotos, os que se deram a mim, para que eu os conduza ao meu Divino Filho - aqueles que eu levo, por assim dizer, nos meus braços; chamo os que viveram do meu espírito; chamo, enfim, os Apóstolos dos Últimos Tempos, os fiéis discípulos de Jesus Cristo, que viveram no desprezo do mundo e de si próprios, na pobreza e na humildade, no desprezo e no silêncio, na oração e na mortificação, na castidade e na união com Deus, no sofrimento, e desconhecidos do mundo. Já é hora de saírem e virem iluminar a Terra. Ide e mostrai-vos como meus filhos queridos. Estou convosco e em vós, desde que a vossa fé seja a luz que vos ilumine nesses dias de infortúnio. Que o vosso zelo vos torne como que famintos da glória e da honra de Jesus Cristo. Combatei, filhos da luz, vós, pequeno número que ainda tendes vista; porque chegou o tempo dos tempos, o fim dos fins. A Igreja será eclipsada, o mundo estará em aflição. Porque, eis que chegam Enoque e Elias, cheios do Espírito de Deus; eles pregarão com a força de Deus, e os homens de boa vontade acreditarão em Deus, e muitas almas serão consoladas. Farão grandes progressos pela virtude do Espírito Santo e condenarão os erros diabólicos do Anticristo.

            Ai dos habitantes da Terra! Virão guerras sangrentas e fome, pestes e enfermidades; chuvas de uma terrível saraivada de animais, que abalarão cidades, terremotos que engolirão países; vozes serão ouvidas no ar; os homens baterão com a cabeça nos muros, pedirão a morte e, por outro lado, a morte será o seu suplício. O sangue correrá por toda a parte. Quem poderá vencer se Deus não diminuir o tempo da prova? Pelo sangue, as lágrimas e as orações dos justos, Deus se deixará aplacar. Enoque e Elias serão martirizados. Roma, pagã, desaparecerá. Cairá fogo do céu e consumirá três cidades. Todo o universo será presa de terror e muitos se deixarão seduzir, porque não adoraram o verdadeiro Cristo, que vivia entre eles.

Chegou o tempo; o sol está escurecendo; só a fé sobreviverá. Eis o tempo; abre-se o abismo. Eis o rei dos reis das trevas. Eis a Besta com os seus súditos, dizendo-se o salvador do mundo. Irá elevar-se com soberba, pelos ares, para subir até o Céu; será precipitado pelo sopro de São Miguel Arcanjo. Cairá, e a Terra, que há três dias encontrava-se em contínuas evoluções, abrirá o seu seio, cheio de fogo, e ele será precipitado, para sempre, com todos os seus, nos abismos eternos do Inferno. Então, a água e o fogo purificarão a Terra e consumirão todas as obras do orgulho dos homens, e tudo será renovado, Deus será servido e glorificado.

               Maximin teve seu calvário com perseguições de alguns prelados da própria Igreja, e na miséria entregou sua alma a Deus, na sua cidade natal de Corps, em primeiro de março de 1875, aos 39 anos de idade. Um exemplo de vida moral íntegra, uma indomável determinação em fazer a vontade de Nossa Senhora, acima da vontade dos homens. Seu coração foi depositado na Basílica de La Salete, e seu corpo no pequeno cemitério de Corps. Já Mélanie, assim como Maximin, foi aconselhada erroneamente por diversos religiosos da Igreja a silenciar-se a respeito das profecias recebidas por Maria. Foi até ameaçada de excomunhão por um Bispo adversário de La Salete, caluniando-a perante todos com mentiras. Faleceu em Altamura província de Bari, Itália, sozinha num quarto, com 72 anos de idade. Os vizinhos ouviram naquela noite um cântico angélico que ecoava em seu apartamento.

 

256 . 3 - Aparições de Nossa Senhora em Lichen

               Em 1850, ao aparecer a um humilde pastor de ovelhas, Mikolay Sikatka, morador de Lichen, a Santíssima Virgem pediu que ele divulga-se a todas as pessoas a Sua vontade: "Junto com a meditação a respeito da Paixão e morte de Nosso Senhor Jesus Cristo, deveria ser rezado o Rosário."

               Essa aparição aconteceu quando o filho devoto rezava em frente a um quadro da Virgem Santíssima, existente em uma capela de um bosque, na cidade polonesa. Na Aparição seguinte nossa Mãe não só insistiu para que fosse celebrada com amor e devoção, deixando orientações e recomendações para os padres, através de uma mensagem. Ao manifestar-se pela terceira vez, a Mãe de Deus alertou para uma epidemia que ocorreria em breve. Também falou de uma guerra que aniquilaria milhões de pessoas. Imaginamos que Nossa Senhora estava profetizando a 1ª grande guerra mundial que seria deflagrada após 64 anos.

               Falou ainda sobre o país, Polônia, e seu futuro, dizendo: “Os povos do mundo se maravilharão quando a sua esperança da paz depender da Polônia”. Como portador de tão importantes mensagens, o pastor Mikolay sentiu-se no dever de levar ao conhecimento das autoridades tendo o que tinha acontecido com ele. Ninguém acreditou, e ainda foi preso e espancado. O tempo passou, mas a Rainha do Céu e da terra não se engana, veio então uma grande epidemia de cólera que reviveu na memória de alguns a mensagem do humilde e simples homem do campo que tinha sido rejeitado. Enfim todas creram que as Aparições e as mensagens tinham sido de Nossa Senhora. Em 1897 quando foi feita a exumação do corpo de Mikolay Sikatka, uma grande surpresa, pois seu cadáver estava perfeito, incorruptível. A Igreja Matriz de Lichen recebeu a entronização da tela de Nossa Senhora, onde Mikolay rezava quando das Aparições, em 1852, conduzido por aproximadamente cem mil fiéis. O grande Cardeal Wyazinsky, polonês, quando jovem foi milagrosamente curado, quando rezava em frente a tela da Virgem de Lichen. Depois de construído o Santuário, já em 15 de setembro de 1967, o mesmo Cardeal, acompanhado por mais de cinqüenta mil devotos, entronizou o agraciado quadro da Mãe de Deus, na sua casa em Lichen.

 

256 . 4 - Aparição de Nossa Senhora em Lurdes – França

               Lourdes é uma pequena cidade localizada no sudoeste da França, nos montes Pireneus, pertencente à diocese de Tarbes; um dos Santuários marianos mais frequentados. No local das aparições passa o rio Gave; ao lado está o rochedo Massabielle. Esta rocha forma uma reentrância oval, que é a chamada gruta Massabielle, onde Nossa Senhora apareceu 18 vezes no ano de 1858. A vidente é Bernardete Soubirous, de 14 anos. Sua família era muito pobre. Esta jovem sofria de asma e tinha tendência à tuberculose. Foi uma moça quase sempre doente. As datas das aparições foram: No mês de fevereiro: Dias 11; 14; 18; 19; 20; 21; 23; 24; 25; 27; 28, no mês de março: Dias 01; 02; 03; 04; 25, no mês de abril: Dia 07, no mês de Julho: Dia 16. (Na festa de Nossa Senhora do Carmo).

História da Aparição

               1ª Aparição - 11 de fevereiro de 1858. Quinta Feira, um dia como outros. Era inverno; às 11 horas da manhã quando Bernadete observou que tinha acabado a lenha. Seu pai estava ainda deitado. Não tinha trabalho. Economizava as forças para outro dia. 0 tempo não era convidativo para sair de casa. Chuviscava e havia nevoeiro. Logo apanhou sua capa, chamou sua irmã Antonieta Peyret (companheira de Bernardette) e convidou Joana Abadie, uma moça robusta e forte, para acompanhá-las.

               A mãe proibiu: "Bernadete, não". Ela pensava no frio que fazia e que poderia trazer consequências à asma de sua filha. Mas ela insistiu carinhosamente, dizendo-lhe que teria cuidado para não se molhar e que iria com o capuz branco e o chale. A mãe concordou. Saem as três meninas no afã de cumprirem a tarefa, passam pela pradaria do Paraíso, a ponte do canal que movimenta o moinho Savy, entram na pradaria do senhor La Fitte e chegam na ponta de areia do rio Gave. À esquerda levanta-se uma rocha íngreme com uma gruta na base. É a chamada gruta Massabieille. Embora é chamada de gruta, na verdade ela é constituída de uma acentuada concavidade na rocha. A água do canal que movimenta os moinhos, banha-lhe o lado esquerdo e segue em direção ao Gave. Joana passa para o outro lado do canal com o pequeno feixe de lenha na cabeça. Antonieta faz o mesmo, levando a lenha na mão. Como já do outro lado as duas se manifestaram dizendo que a água do canal estava muito gelada, Bernadette permaneceu ali, sem saber o que fazer, com receios de pisar na água fria, por causa da asma, lembrando-se das recomendações de sua mãe. Enquanto as duas corriam pela praia do Gave a procura de lenha, ela depois de procurar sem êxito, um lugar melhor para atravessar, sentou-se na margem do canal, em frente à gruta, tirou uma das meias e preparava-se para tirar a meia do outro pé, quando de repente, ouviu um barulho, "como se fosse um sopro de vento". Não vê nada. Olhou para trás e observou que as folhas das árvores não se moviam. Apareceu uma "luz suave" que iluminou profusamente todo aquele lugar sombrio e no meio dela, surge uma senhora maravilhosa, aparentando a idade de 16 a 18 anos, estava de pé, vestida de branco; o véu que cobria a cabeça descia até os pés; em redor da cintura tinha uma estreita faixa azul; no braço direito levava um terço; mantinha as mãos juntas e, nos pés, via-se duas rosas douradas. Abre os braços num gesto de acolhimento, como quem convida à aproximar-se. Ela fica espantada. É como se tivesse medo, "não para fugir explica melhor, mas pela emoção do inusitado e adorável encontro". Esfregou os olhos diversas vezes, para inteirar-se que não era um sonho e que realmente estava diante de uma visão encantadora, que lhe sorria afetuosamente.

               Então conta, Bernadette: "Coloquei a mão no bolso e encontrei o terço. Queria fazer o Sinal da Cruz, mas não pude levar a mão até a cabeça. A mão caiu-me. 0 espanto apossou-se de mim mais fortemente, a minha mão tremia. A visão fez o Sinal da Cruz. Então tentei a segunda vez. E então pude. Logo que fiz o Sinal da Cruz, a grande comoção que sentia desapareceu. Pus-me de joelhos e rezei o terço na presença dessa linda Senhora. A visão fazia passar as contas do seu Terço com os dedos, mas não mexia os lábios. Quando acabei o terço, Ela fez um sinal para aproximar-me. Mas não ousei. Então desapareceu de repente". Depois do extraordinário acontecimento, Bernadete sentiu uma imensa felicidade que envolveu completamente a sua alma de uma deliciosa satisfação que lhe tirava todas as forças, para qualquer iniciativa. Atravessou o canal sem dificuldades, as águas estavam ligeiramente "aquecidas". Sentou-se numa das grandes pedras que se encontravam na entrada da gruta e permaneceu silenciosa e pensativa. Voltam suas companheiras com uma boa provisão de lenha e começam a dançar e pular na entrada da gruta, para comemorar o êxito da missão. Não gostando de vê-las assim, para distraí-las pergunta:

- "Não viram nada"?

- "E tu, que é que viste"?

Ela compreende o mistério que acabava de acontecer e sente que terá que guardar este segredo, e por isso muda de assunto:

- "Sois umas enganadoras. Vocês disseram que a água do canal estava fria, achei-a agradável, estava morna".

               Antonieta e Joana não a levaram a sério, porque quando atravessaram o canal, a água estava tão gelada, que do outro lado tiveram que esfregar os pés, fazendo massagem para aquecê-los. Bernadette sentindo necessidade de falar, de contar aquela maravilhosa experiência, em duas palavras narra tudo a Antonieta. Mas a irmã não acredita e pensa que Bernadette está querendo incutir-lhe medo. Pega a lenha e também acelera o passo para casa. Mas o caso dá para pensar, porque o acontecido é por demais singular. Antonieta apesar de ter prometido, em casa, na primeira oportunidade, "bate com a língua nos dentes" e conta tudo à sua mãe. Luiza fica assustada "e quer saber toda história e muito direitinho", por isso convoca a filha. Entre o susto e o medo, ela quase nada falou. Sua mãe a repreende por tal comportamento e o pai, que ainda estava deitado, acrescenta que não quer os olhares dos outros caçoando de ninguém da família. À noite, na hora das orações, chorou muito, estava bastante comovida com tudo o que lhe havia acontecido. Sua mãe faz-lhe outras perguntas, mas ela nada respondeu. Entretanto, no dia seguinte ela sente-se atraída a voltar à gruta. A mãe não lhe deixa e imperiosamente ordena: "Para o trabalho". Ela obedece. Na tarde de sábado, dia 13, decide ir confessar-se. Conta tudo ao padre Pomian, que silenciosamente ouviu o depoimento. Depois perguntou-lhe, se podia contar ao Abade Peyramale. Ela consentiu.

               2ª Aparição - 14 de fevereiro. No domingo dia 14, depois da Missa, as suas colegas resolvem ir a sua casa, pedir consentimento para que ela voltasse à Massabieille pois desejavam ver também o que ela tinha visto. A mãe não permitiu. Todavia depois de muita insistência das meninas, mandou que conversassem com o pai, que estava tratando dos cavalos de João Maria Cazenave. Com muito jeito conseguiram autorização para se ausentarem somente por um tempo de 15 minutos. E como tinham receios de ser alguma aparição maldosa, decidiram levar um frasco com água benta. Dividíram-se em dois grupos e foram para a gruta. Ela chegando primeiro com o seu grupo, ajoelhou-se e começou a rezar o terço, enquanto as suas companheiras ficaram de pé ao seu lado. Na segunda dezena sua face mudou. Seus olhos brilharam fortemente e ela falou para as colegas:

- "Hei-la! 0 terço está no braço... Ela olha para nós".

               As companheiras não viram nada. Rapidamente Bernadette apanha o frasco com água benta que estava nas mãos de Maria Hillo e asperge com vigor na direção do vulto, ao mesmo tempo em que o esconjurava: - "Se vem da parte de Deus, fique, se não, pode ir embora"

               Afirmou posteriormente: - "Quanto mais eu a regava, mais Ela sorria e gastei todo o frasco".

               A seguir entrou em êxtase. Empalidece, não ouve mais o que as outras dizem. As amigas assustadas observam as suas reações. Suas companheiras acabaram por ficar preocupadas e por isso chamaram Nicolau, o moleiro do moinho de Savy, para retirá-la dali. Mas não foi fácil, porque parecia que ela tinha uma barra de ferro amarrada ao corpo, porque o seu peso aumentou consideravelmente; com muito esforço transportou-a nos braços pelo caminho, enquanto ela mantinha um sorriso nos lábios e os olhos fixos num ponto do Céu. As meninas foram para as suas casas e as notícias chegaram até Lourdes. Segunda-feira dia 15, foi um dia terrível porque além de sofrer críticas, suas colegas caçoaram dela. Mas houve pessoas que se interessaram pelo caso da gruta como Madame de Millet. Decidida a conhecer a verdade, Madame de Millet conquistou Luiza, mãe de Bernadette, dando-lhe trabalho e convenceu-a deixar sua filha voltar à gruta, em sua companhia.

               3ª Aparição - 18 de fevereiro de 1858. As 5 horas da manhã de quinta-feira dia 18, Madame de Millet em companhia de Antonieta Peyret encontraram-se com Bernadette, que ainda estava dormindo. Depois participaram da primeira Missa e desceram para a gruta. Antonieta levou consigo caneta e tinteiro do pai, e também papel, para a Visão escrever o seu nome. Mal começaram a rezar o terço, a vidente murmurou:

- "Ela aí está"!

Terminado o terço, Antonieta entrega-lhe a caneta e o papel. Inocentemente Maria Bernarda leva aqueles instrumentos em direção à Aparição e lhe faz a solicitação combinada:

- "Quer ter a bondade de escrever o seu nome"? A Aparição aproximou-se dela, passando por uma fenda no nicho e da conversa de ambas, nunca se soube nada.

Mais tarde ela contou que, sorrindo, a Aparição lhe disse: “Não era preciso escrever" e pediu-lhe que voltasse ali: " Quer ter a amabilidade de vir aqui durante 15 dias"?

Foi a primeira vez que ouviu a maravilhosa voz da dama, e consentiu imediatamente em voltar à gruta para encontrá-la. Foi nesta mesma ocasião que a visão lhe falou:

- "Não prometo tornar-te feliz neste mundo, mas no outro".

No caminho de volta, pensativa Madame de Millet interrogou: "E se fosse a Santíssima Virgem Maria"? As notícias espalharam-se. São formuladas as mais diversas hipóteses sobre o que vai acontecer durante a quinzena de Aparições. A expectativa é coletiva.

               4ª Aparição - 19 de Fevereiro. - A vidente ouviu um tumulto de vozes selvagens que parecia saírem da terra e que foram estourar como uma grande explosão, sobre o rio Gave. As vozes mostravam muita revolta e raiva (eram demônios). Um deles gritou mais forte: "Bernardette, salva-te! Vai embora daqui! Vai embora daqui!" A jovem, assustada, pediu ajuda à Aparição. A Virgem Maria logo se virou para aquela direção, fazendo um semblante ameaçador e tudo cessou imediatamente.

               5ª Aparição - 20 de fevereiro - A Virgem Maria ensinou como fazer bem o sinal da Cruz. A partir deste momento, muitas testemunhas disseram que Bernadette fazia sempre o sinal da Cruz de modo digno, respeitoso e cheio de fé! Nossa Senhora ensinou pacientemente, palavra por palavra, uma oração só para Bernadette, que ela devia repetir todos os dias.

               6ª Aparição - 21 de fevereiro – A vidente escreve: “A Senhora desviou durante um instante de mim o seu olhar, que alongou por cima da minha cabeça. Quando voltou a fixá-lo em mim, perguntei-lhe o que é que a entristecia e Ela respondeu-me: "Reza pelos pecadores pelo mundo tão revolto."

               Depois da Aparição do domingo, dia 21, o comissário Jacomet, levou-a para um minucioso interrogatório no qual certificou-se da simplicidade e da sinceridade da menina e ficou sabendo de outros detalhes da Aparição, apesar de intencionalmente querer confundi-la e forçá-la a não voltar à gruta. Ela contou assim: "A Dama usava um vestido branco, apertado na cintura por uma fita Azul, um véu branco na cabeça que descia até a altura do busto. 0 vestido era longo e cobria os pés, deixando aparecer só as extremidades, com uma rosa amarela em cada pé, da mesma cor da corrente do terço que trazia na mão direita. Olhava com suavidade e tinha os olhos completamente azuis". 0 interrogatório terminou quando populares conseguiram colocar o pai Francisco Soubirous na sala do Comissário para proteger a filha.

               7ª Aparição - 23 de fevereiro.

A Vidente, caminhando de joelhos e beijando o chão, vai do lugar onde se encontrava até à gruta. Nossa Senhora comunica-lhe um segredo que a ninguém podia revelar.

               8ª Aparição - 24 de fevereiro.

Na quarta-feira, dia 24, a quantidade de pessoas era maior e já ofereceu uma certa dificuldade para ela chegar ao seu local na entrada da gruta. Haviam cerca de 300 pessoas ávidas de presenciarem algum fato novo. Algumas eram curiosas, mas a maior parte estava postada respeitosamente, em contrita oração, na certeza de que estavam na presença da Mãe de Deus. Terminada a reza do terço, Bernadete avançou dois passos, arrastando-se de joelhos e prostrando-se com a face na terra beija-a atendendo ao pedido da Aparição, num gesto de penitência. 0 povo não entendeu. Mas depois ela explicou que a Aparição tinha falado uma palavra nova.

A Santíssima Virgem disse estas palavras: “Reza a Deus pelos pecadores! Penitência! Penitência! Penitência! Beija a terra em penitência pela conversão dos pecadores!"

               9ª Aparição - 25 de fevereiro

No dia seguinte, a movimentação ao redor de Massabieille começou cedo. Desde as duas horas da manhã as pessoas procuravam localizarem-se nos melhoras lugares. No momento em que Maria Bernarda chegou, havia mais de 350 pessoas. Como de costume, rezou o terço em êxtase, depois entregou a Eléonore Pérard, que estava a seu lado, a vela acesa que sempre levou nos seus encontros com a Aparição, dando-lhe também seu capuz. A seguir, sobe de joelhos a pequena declividade até o fundo da gruta. De trecho em trecho faz uma parada e beija o chão. Bem em baixo do nicho, onde encontrava-se a visão, para e conversam.

A Senhora disse-me: “Vai beber à fonte e lavar-te nela”

A seguir arrasta-se de joelhos até o rio Gave. Lá, qualquer coisa a detém e ela volta, agora de pé, para o interior da gruta. Abaixa-se e arranha o chão com as mãos e depois cava, como se quisesse fazer um buraco. 0 orifício encheu-se de lama que ela recolhe e passa no rosto, tentou três vezes pegar água, na quarta vez conseguiu.

A Senhora também disse-me: “Come daquela erva que ali está!”

E comeu ervas de folhas cheias de amebinos que cresceram no fundo da gruta. Terminada a Aparição, volta com o rosto todo lambuzado de barro, causando de certa forma, consternação ao público. A todos que lhe perguntava explicou:

- "A Dama mandou eu beber água na fonte e lavar-me nela. Não vendo água, fui ao Gave. Mas Ela fez-me sinal com o dedo para ir debaixo da rocha. Depois de cavar, encontrei um pouco de água como se fosse lama, tão pouca que apenas pude tomar alguma na cova da mão. Três vezes a joguei fora, de tal modo estava suja. Na quarta vez pude. Depois recolhi e comi um pouco de ervas. Ela pediu-me que fizesse isto pelos pecadores". A tarde, algumas pessoas voltaram à gruta e entre elas Elèonore Pérard. Observaram o buraco que Bernadete cavou, estava uma poça de água lamacenta. No meio dela Eléonore espetou um pau. Apercebeu o ruído da água que corria. Algumas pessoas tentam bebê-la: a água jorra com mais força e vai ficando mais clara, à medida que cavam para recolhê-la. Começam então a compreender a mensagem: "uma fonte de água que lavará a alma suja dos pecadores, dos que se arrependem de seus desacertos, daqueles que têm fé em Deus, produzindo o milagre da conversão e da cura dos males". A notícia espalhou-se. Todos querem beber da água da fonte que brotou no terreno árido do fundo da gruta. Outros a recolhem e levam para seus parentes necessitados. Muitos comentários surgiram e as notícias de curas ouve-se por todas as partes. Neste mesmo dia é interrogada pelo Procurador Imperial, senhor Dutour, que a exemplo de Jacomet, tentou por todos os meios dissuadi-la a não voltar à gruta, dizendo que aquilo era ilusão. Tudo em vão, permaneceu tranqüila ao lado de sua mãe e até achou momentos para rir, quando o senhor Dutour mostrando-se nervoso, com a caneta na mão não achava o buraco do tinteiro. Em face do interrogatório, Bernadette responsavelmente antes de tomar qualquer iniciativa foi ouvir a opinião de seus parentes sobre a proibição imposta pelo senhor Dutour de voltar à Massabieille. Sua tia Bernarda falou: "Eu no seu lugar ia"! Sem dizer uma palavra, apanhou seu capuz e seguiu para a gruta. Lá encontravam-se mais de 600 pessoas. Foi rezado o terço e feito alguns exercícios de penitência, mas "Aquerò" como ela chamava a Aparição, não veio.

               10ª Aparição - 27 de fevereiro. Nesta visita, a Virgem Imaculada tornou a mandar beijar o chão em penitência pelos pecadores.

               11ª Aparição - 28 de Fevereiro. A Senhora sorriu e não respondeu quando a Vidente lhe perguntou o nome. Mais de 1.150 pessoas presenciaram diversas práticas de penitência e a reza do terço em êxtase. É como dizia: "É por penitência, por mim primeiro, pelos outros depois".

               12ª Aparição - 1º de março. Na Aparição manda a Bernadette rezar o terço pelas suas contas e não pelas duma companheira, Paulina Sans, que lhe tinha pedido para usar as suas. No dia seguinte, segunda-feira, 1º de março, a multidão foi calculada em 1.500 criaturas e viam-se pessoas de todas as classes. Para a curiosidade geral, desponta entre elas a batina preta do Padre Dêsirat. Ele não é de Lourdes e não sabe da proibição imposta ao clero pelo Abade Peyramale. Sua presença causa sensação e em poucos momentos vê-se na primeira fila, com sua miopia compensada por óculos de grossas lentes, numa posição bem próxima da vidente. Foi também neste mesmo dia, quando ocorreu o primeiro dos sete milagres escolhidos pelo Bispo e considerado realmente como "Obra de Deus".

"Catarina Latapié, proveniente de uma queda de um carvalho, na qual subira para tirar bolotas para os porcos, teve o braço deslocado e dois dedos da mão direita dobrados e paralisados. 0 fato aconteceu em outubro de 1856 e o médico só conseguiu consertar o seu braço, mas os dedos não tiveram jeito. E isto a impedia de fazer o seu trabalho, não a deixava tricotar e nem fiar, estava sendo a sua ruína. Apesar de encontrar-se grávida de 9 meses, saiu a pé de sua casa na noite do dia 28 de fevereiro, para Lourdes, distante 7 quilômetros, levando os seus dois filhos mais novos. Assiste a Aparição do dia 1º de março e faz fervorosas preces a Deus por intercessão de Nossa Senhora, pedindo a sua cura. Terminada a aparição, sobe até o fundo da gruta e mergulha a mão na fonte que tinha formado, cujas águas deslizavam mansamente formando um pequeno regato que corria para o Gave. Um estremecimento acompanhado de uma grande suavidade invadiu todo o seu ser. Ela sentiu de repente, voltar a flexibilidade aos seus dedos. Vibrou de alegria e chorou de satisfação. Emocionada iniciou os seus agradecimentos pela graça alcançada, quando subitamente sente uma violenta dor nas entranhas, como prenúncio do próximo nascimento de mais um filho. Num gesto ligeiro e contrito, ajoelha-se e com as mãos postas suplica: "Virgem Santa, Vós que acabais de me curar, deixai-me chegar em casa"! Levantou-se, pegou nas mãos de seus filhos e seguiu para sua casa em Loubajac. Assim que chegou, mal teve tempo de chamar a parteira, deu à luz um sadio garoto que recebeu o nome de João Batista e que mais tarde tornou-se sacerdote".

               13ª Aparição - 2 de março, eram mais de 1.650 pessoas em Massabieille. Com maior dificuldade Bernadete chegou ao "seu local".

Diz Maria:  "Vai dizer aos Sacerdotes que tragam o povo aqui em procissão e me construam uma Capela".

Por essa razão, mais tarde em companhia das tias Bernarda e Basília, foram encontrar-se com o Abade Peyramale, para levar-lhe a notícia. 0 Senhor Abade era um homem severo, de caráter íntegro e muito exigente na observância do direito e da ordem. Já tinha ouvido os comentários sobre Bernadette e as Aparições na gruta, assim como as notícias de curas e os comentários maldosos do jornal local. Não se decidira sobre os fatos, mesmo porque não dispunha de elementos que lhe oferecesse condições de optar. Intimamente aceitava com simpatia a possibilidade da Aparição ser verídica, em face dos muitos comentários favoráveis. Mas na sua posição, não podia considerar comentários e nem indícios, era preciso haver alguma coisa sólida, que se mostrasse de modo concreto, para que pudesse apreciar os acontecimentos. E apesar de possuir um coração bondoso e paternal, o momento exigia que procedesse com cautela, até com rudeza, se fosse necessário, para deixar aparecer a verdade transparente.

- "És tu que vais à gruta"?

- "Sim, Senhor Abade".

- "E dizes que vês a Santíssima Virgem"?

- "Eu não disse que era a Santíssima Virgem".

- "Então quem é essa Senhora"?

- "Eu não sei".

- "Ah, tu não sabes! Mentirosa! E no entanto esses que fazes correr atrás de ti dizem e o jornal imprime, que tu pretendes ver a Santíssima Virgem. Então o que é que tu vês"?

- "Qualquer coisa que parece uma Senhora".

- "Ora essa! Uma Senhora! Uma procissão"!

Aborrecido olha para as duas tias que a acompanha e lembra-se que elas conceberam antes de se casarem, e desabafa:

- "Que desgraça ter uma família destas que faz a desordem na cidade! Desapareçam daqui imediatamente"!

As três saíram o mais depressa que puderam e imaginem o tamanho do "apuro"... Disse Bernadete: - "Não me apanham mais a vir à casa do Senhor Abade"!

Mas, logo que caminharam alguns passos, lembrou-se que não tinha transmitido toda a mensagem ao Senhor Abade. Esquecera-se de falar da "Capela". Quis voltar, mas as tias protestaram: - "Não contes comigo! Tu põe-nos doentes"!

Depois de muito procurar, conseguiu que Dominiquette Cazenave a acompanhasse. Marcaram uma entrevista para às 19 horas. Estavam lá além do Abade Peyramale os Padres Péne, Serres e Pomian (o confessor dela). Transmite a segunda parte do recado:

 - "Vai dizer aos Sacerdotes para construírem aqui uma Capela".

- "Uma Capela? Como para a procissão? Estás certa disso"?

-"Sim, senhor Abade, estou certa".

- "Ainda não sabes como ela se chama"?

- "Não, Senhor Abade".

- "Pois bem, é preciso perguntar-lhe".

Depois de responder mais algumas perguntas dos outros padres, despediu-se, e com sua acompanhante voltou para casa. No dia seguinte mais de 3.000 pessoas a aguardavam na gruta. A multidão rezava ansiosa desde muito cedo. Mas a visão não apareceu. E como nos dias 22 e 26 de fevereiro, regressou perturbada. Todavia, neste mesmo dia, mais à tarde, voltou à gruta e desta vez encontrou-se com a visão. Ao regressar à cidade, foi conversar com Peyramale:

- "Senhor Abade, a Senhora sempre quer a Capela ".

- "Perguntaste-lhe o nome"?

_ "Sim, mas ela apenas sorriu".

- "Pois bem, se ela quer a Capela que diga o seu nome e faça florir a roseira da gruta. E então nós mandaremos construir uma Capela e não será muito pequena, será muito grande".

14ª aparição - 3 de março. A Senhora não aparece à hora habitual, mas sim ao entardecer e deu explicação.

“Não me viste esta manhã porque havia pessoas que desejavam examinar o que fazias enquanto eu estava presente. Mas elas eram indignas. Tinham passado a noite na gruta, profanando-a.”

               15ª Aparição - 4 de março. No segundo mistério do primeiro terço, Bernadette começa a ver Nossa Senhora. Acabou esse terço e rezou outros dois, refletindo ora alegria, ora tristeza. Durante esta quinzena, Nossa Senhora comunicou à menina três segredos e uma oração com esta ordem:

“Proíbo-te de dizer isto, seja a quem for.”

Era aguardado com grande expectativa porque era o último da quinzena de aparições. A polícia pediu reforço policial de d'Argelès e de Saint Pé, cidades vizinhas de Lourdes, para ajudar na manutenção da ordem, no sentido de evitar qualquer excesso. A estimativa era para mais de 8.000 pessoas ao redor da gruta. Para que Bernadette, pudesse chegar ao local, fizeram uma passarela de madeira, que lhe facilitou o acesso. Ela veio acompanhada de sua prima Joana Véderè, que tinha 30 anos de idade e ficaram juntas perante a Aparição. Ajoelharam e começaram a rezar o terço. Quando iniciavam a terceira Ave Maria da segunda dezena, entrou em êxtase. A multidão com o olhar acompanhava tudo e apreciava a beleza do Sinal da Cruz que ela fazia.

Maria Bernarda foi encontrar-se, com o Senhor Abade e dar-lhe notícias do "encontro".

- "Que te disse a Senhora"?

- "Perguntei-lhe o nome... Ela sorriu. Pedi-lhe para fazer florir a roseira, ela sorriu outra vez. Mas ainda quer a Capela".

- "Tu tem dinheiro para fazer essa Capela"?

- "Não, Senhor Abade".

- "Eu também não. Diz à Senhora que lhe dê".

               Peyramale estava desconsolado por não ter obtido nenhuma informação segura, sobre a Aparição. Ela também, mas sem poder fazer nada, voltou triste para casa. No dia 18 de março é submetida a um severo interrogatório e declara: "Não penso ter curado quem quer que seja e de resto não fiz nada para isso. Não sei se voltarei à gruta".

               Mas independentemente das aparições continuarem ou não, a afluência era cada vez maior. Diariamente muitas pessoas iam lá para rezar, para recolher água da fonte ou para bebê-la. Todos acreditavam que quem esteve lá foi a Santíssima Virgem. As velas multiplicavam-se no dia 18 eram 10; no dia 19 havia 21 velas; já no dia 23, colocaram no nicho das aparições, uma imagem de gesso da Virgem Maria, doada por um senhor, Felix Maransin. Do dia 4 de março quando ocorreu a última aparição, ou seja a 15ª, até o dia 25 do mesmo mês, Bernadete procurava levar uma vida normal, ao lado de seus familiares no "cachot". Mas foi impossível, porque era solicitada para interrogatórios, por visitantes que faziam filas intermináveis à porta de sua casa, querendo conversar, abraçá-la e pedir-lhe que tocasse com as mãos em objetos que levavam. Eram pessoas que buscavam graças e outras que vinham contar milagres alcançados pela bondade e o carinho intercessor de Nossa Senhora. Não tinha mais sossego. Às vezes quase perdia a paciência: - "Tragam-me todos ao mesmo tempo". Outras vezes, cansada, precisando de repouso queria isolar-se: - "Fechem a porta à chave"!

               E jamais aceitou e não deixou que nenhum de seus familiares aceitassem gratificações em dinheiro ou presentes, por qualquer razão que fosse: "Isso queima-me! Por favor, não façam isso"! Quando perguntavam-lhe se a Dama voltaria, simplesmente dizia que não sabia. Só podia afirmar que ela queria sempre uma Capela e que os Sacerdotes fossem em procissão à gruta.

               16ª Aparição - 25 de março. Na manhã da festa da Anunciação a Revelação:

No despertar daquele dia 25 de Março de 1858, Bernadette sentiu-se novamente impulsionada para ir à gruta. Era uma força estranha que nascia em seu interior, que não sabia explicar. Mas era muito cedo e seus pais lhe aconselharam esperar o dia clarear. Às 5 horas da manhã já pôs-se a caminho. Depois de rezar o terço em êxtase, levantou-se e caminhou em direção à Aparição e conversaram:

“Mademoiselle, quer ter a bondade de me dizer quem és, se faz o favor”?

Ela sorriu, não respondeu. Insiste na solicitação, a segunda e a terceira vez, obtendo como respostas um sorriso carinhoso e modesto da visão. Mas Bernadette tinha a necessidade de saber o nome dela, precisava levar esta notícia ao Senhor Abade, porque caso contrário, ele não construiria a Capela. Por isso, com mais amor e decisão insistiu uma quarta vez suplicando que ELA dissesse o seu nome. Desta vez a Aparição não sorriu mais, ficou séria. As mãos que estavam unidas afastaram-se estendendo sobre a terra e depois novamente juntas à altura do peito, levantou os olhos ao Céu em sinal de profunda humildade e obediência a Deus e disse:

“EU SOU A IMACULADA CONCEIÇÃO”.

Dito isto, desapareceu. Bernadette retornou a si e para não se esquecer das palavras, repetiu-as várias vezes em seguida, tropeçando nas letras que mal sabia pronunciar. Fugiu das perguntas de todos e correu para a casa do Senhor Abade Peyramale. Lá chegando, antes mesmo de cumprimentá-lo gritou:

- “Que soy era Immaculada Councepciou” (no seu dialeto patois de Lourdes) 'Eu sou a Imaculada Conceição'.

0 Abade ficou perplexo. Não sabia se sorria ou ocultava o seu júbilo, procurando num último esforço, certificar-se do óbvio:

- 'Pequena orgulhosa, tu és a Imaculada Conceição'!

- 'Não, não, não eu'.

Peyramale sente que está diante de uma grande revelação: 'A Virgem é concebida sem pecado'. O Abade explodia intimamente de satisfação e se preocupava em saber da realidade. Pela santíssima vontade de Deus, a partir daquele momento Nossa Senhora deixava realçar com todo brilho, a sua grandeza notável e ilimitada, porque ela própria confirmava que teve uma Conceição Imaculada. Por isso Peyramale se debatia: 'Uma Senhora não pode usar esse nome! Tu enganaste sabes o que isso quer dizer'?

Maria Bernarda diz que não, abanando a cabeça.

- 'Então como podes dizê-lo, se não compreendes o que é'?

- 'Repeti todo o caminho'.

No silêncio que se seguiu, Peyramale ficou pensativo com um suave sorriso nos lábios. Bernadete interrompe o silêncio e diz:

- 'Ela sempre quer a Capela'...

0 Abade no íntimo deve ter respondido que não só uma Capela, mas uma monumental Basílica. A partir daquele momento a Dama estava dispensada de fazer qualquer milagre, de fazer florir a roseira selvagem da gruta. Era Ela, a Mãe de Deus, a Nossa Querida Mãe que veio visitar-nos com o objetivo de revelar-nos um grande mistério divino e pedir penitência ao mundo, para que todos rezassem pela conversão dos pecadores e tivessem uma conduta responsável e digna. Peyramale estava emocionado. Tentava esconder sua alegria e por isso, para salvar as aparências, falou com ela:

- 'Vai para casa, falaremos outro dia'.

Os dias passaram e o clero com muita alegria e vibração comemorou a revelação do grande mistério. Dia 6 de abril Bernadette, sentiu-se novamente 'pressionada' para voltar à gruta. Aquela força estranha e agradável a impulsionava para Massabieille. Como já havia passado das 15 horas, foi encontrar-se com o Padre Pomian no confessionário. Algumas pessoas que a observava, se incumbiram de espalhar os boatos. A cidade ficou na expectativa de algum acontecimento.

               17ª Aparição - 7 de abril. Nossa Senhora nada disse, mas verificou-se nesta aparição o chamado milagre da vela.

No dia seguinte, quarta-feira da Páscoa, antes do sol nascer já encontrava-se na gruta, acompanhada inicialmente por uma centena de pessoas que logo aumentou para 1.000, quando iniciou a reza do terço. Nas primeiras Ave Maria da primeira dezena, entrou em êxtase. 0 Doutor Dozous, que vinha estudando o seu caso, surge no meio da multidão pedindo passagem, pois queria estar ao lado dela, para presenciar suas reações fisionômicas. E abrindo passagem entre o povo que contritamente rezava dizia:

- 'Não venho como inimigo, mas em nome da ciência. Corri e não posso me expor às correntes de ar. Só eu posso verificar o fato religioso que aqui se dá, deixem-me prosseguir este estudo'.

Neste dia, ela utilizava uma grande vela que se apoiava no chão. Foi fornecida por uma pessoa que tinha alcançado uma graça. Com sua mão tentava proteger a chama da vela, da corrente de ar. Mas no transe em que se encontrava, não posicionou corretamente a mão esquerda em forma de concha sobre o pavio aceso, de modo que a chama da vela passava por entre os seus dedos.

- 'Mas ela queima-se' - gritaram da multidão.

- 'Deixe estar' - pediu Dozous.

Ele não acreditava naquilo que seus olhos viam, os sorrisos de Bernadete, os Sinais da Cruz, feitos com tanta graça, sua fisionomia séria em vários momentos compartilhando duma tristeza da visão e a chama da vela que passava por entre seus dedos, sem queimá-los, sem provocar dores.

Terminado o êxtase, examinou as mãos da vidente e não encontrou o menor sinal de queimadura. Para testar a sua sensibilidade, acendeu a vela e sem que ela percebesse, aproximou a chama de sua mão. Ela gritou e protestou: 'Está querendo me queimar'? Dozous, homem de atitudes extremas, viu crescer repentinamente em seu coração uma fé gigantesca. Da mesma forma que seu caráter explosivo o levava muitas vezes a defender suas convicções abertamente e com decisão, espalhou a novidade com disposição, convencido que estava diante do sobrenatural na gruta de Massabieille.

0 Prefeito resolveu proibir o acesso a gruta. Mandou retirar todos os objetos religiosos que tinham sido colocados lá. Os pais e amigos de Bernadete, para evitar complicações, a enviaram para Cauterets, a titulo de tratar de sua asma. Contudo a sua ausência em nada influiu no fervor das almas piedosas, que se manifestavam claramente e todos os dias. Eram organizadas procissões, cânticos e orações com a maior participação possível. Por outro lado, alguns procuravam dotar a gruta de certo conforto, colocando na fonte de água um bacia com três torneiras, para facilitar a utilização. Pedreiros, carpinteiros e funileiros trabalhavam gratuitamente e com desprendimento, melhorando o acesso, colocando uma tábua furada para receber as velas, empregando os seus esforços com o objetivo de tornar a gruta um recanto aprazível de devoção mariana. As autoridades vendo que não conseguiam nem acabar e nem diminuir a freqüência das visitas à gruta, decidem fechá-la. No dia 15 de junho o Prefeito mandou fazer uma barreira constituída por uma paliçada de madeira, que isolava a área da gruta. O povo, no dia 17, destruiu a paliçada. As barreiras são reconstruídas no dia 18 e são demolidas pelo povo na noite do dia 27. Tornam a serem reconstruídas no dia 28 de junho, para novamente serem demolidas na noite do dia 4 de julho. No dia 8 de Julho a Igreja intervêm oficialmente, pela primeira vez, pedindo tranqüilidade ao povo e respeito às autoridades. No dia 10 foram levantadas as barricadas novamente. Bernadete mantinha-se distante e indiferente a toda esta movimentação. Nas oportunidades que surgiam, recomendava obediência e desaconselhava que arrebentassem a paliçada na gruta.

               18ª Aparição - 16 de julho. Como é festa de Nossa Senhora do Carmo, a Vidente assiste à missa e comunga na igreja. Ao entardecer sente que Deus a chama para a gruta, como das vezes anteriores, e lá chegou por um caminho que ninguém suspeitou. Foi em companhia de sua tia Lucilia, camuflada com um capuz emprestado; mas não pode aproximar-se devido à sebe, e aos soldados que, por malvada ordem do governo, cercam o recinto. Junto à cerca de tábuas que isolava a gruta, encontrava -se um grupo de pessoas, que de joelhos e silenciosamente rezavam. Ela ajoelhou e acendeu sua vela. Duas congregadas marianas que a reconheceram, juntaram-se a ela e à sua tia, em silêncio. Apenas começara o terço, as suas mãos afastaram-se comovidas, numa saudação de alegria e surpresa. Nossa Senhora estava lá. A sua face iluminou-se e suas feições adquiriram uma indescritível formosura. A menina contempla a Senhora, de além do rio e da sebe: Terminada a reza do terço, pelo seu rosto podia-se ver estampada a felicidade que brotava de seu íntimo, a alegria de mais uma vez ter-se encontrado com a Mãe de Deus. Ela não comentou nada. No caminho de regresso, apenas disse: “Não via o rio, nem as tábuas - explicará ela mais tarde. Parecia-me que entre mim e a Senhora, não havia mais distância que das outras vezes. Só via a Ela. Nunca a vi tão bela” Foi o último adeus da Senhora até ao céu. Aconteceu como se fosse uma visita de despedida, Nossa Senhora sempre bondosa, cheia de carinho e atenção, desceu à terra mais esta vez, para o derradeiro adeus à sua amiga.

 

256 . 5 - Aparição de Nossa Senhora de Champion – Nossa Senhora da Boa Ajuda

               Nossa Senhora de Champion, também conhecida como Nossa Senhora da Boa Ajuda, é um dos títulos com que a Santíssima Virgem Maria é invocada desde as aparições que ocorreram em outubro de 1859 à Adele Brise no vilarejo de Champion, Green Bay, nos Estados Unidos. É conhecida por ser a primeira aparição mariana aprovada pela Igreja Católica em terras americanas. Adele Brise nasceu na Bélgica, em 30 de janeiro de 1831. Junto de seus pais, Lambert e Catherine Brise, ela imigrou para os Estados Unidos, passando a residir em Champion, um vilarejo rural de Green Bay, estado de Wisconsin, no ano de 1855. No início de outubro de 1859, Adele andava pelo bosque do vilarejo para chegar a um moinho de trigo quando avistou uma mulher envolta em grande luminosidade, parada entre duas árvores. Estava vestida com uma túnica branca deslumbrante, com a cintura envolta em uma faixa dourada e com uma coroa de estrelas acima de seus cabelos loiros esvoaçantes. Assustada, a jovem Adele começou a orar até que a visão desaparecesse. Quando retornou para sua casa, ela contou aos pais o que tinha visto. Eles sugeriram que talvez fosse uma pobre alma em busca de orações Em 9 de outubro de 1859, domingo seguinte à primeira aparição, Adele caminhava pelo mesmo lugar para ir à missa na comunidade de Bay Settlement, em companhia de sua irmã e uma amiga quando, pela segunda vez, Adele avistou a mesma mulher entre as árvores. Apenas Adele conseguia enxergá-la. Ela, então, recorreu ao seu pároco em busca de conselhos. Ele lhe disse que se ela visse a aparição novamente, ela deveria perguntar: "Em nome de Deus, quem é você e o que deseja de mim?". Voltando da missa naquele mesmo dia, ela viu a aparição pela terceira vez, e desta vez fez a pergunta que o padre lhe disse para fazer. A aparição então respondeu: "Eu sou a Rainha do Céu, que reza pela conversão dos pecadores, e desejo que faças o mesmo. Recebeste a Sagrada Comunhão nesta manhã e isso é bom. Mas deves fazer mais. Faze uma confissão geral e oferece a Comunhão pela conversão dos pecadores. Se não se converterem e não fizerem penitência, meu Filho vai ser obrigado a castigá-los. O que fazes aqui, parada, enquanto tuas companheiras trabalham na vinha do meu Filho?"

 ─ "O que mais posso fazer, querida Senhora?", perguntou Adele.

"Reúna as crianças deste país selvagem e mostra-lhes o que deveriam saber para salvar-se."

─ "Mas como lhes ensinarei o que eu mesma sei tão pouco?", replicou a jovem.

"Ensina-lhes seu catecismo, como fazer o sinal da cruz e como se aproximar dos Sacramentos; isso é o que eu desejo que faças. Vai e não tenhas medo. Eu te ajudarei.”

               Dizendo isto, Maria ergueu as mãos em sinal de benção e desapareceu. A jovem começou, então, a fazer o que Nossa Senhora pediu, passando a se dedicar na educação e catequização das crianças do vilarejo. Ela inicialmente caminhava de casa em casa, mas depois fundou uma pequena escola com a ajuda de doações. Outras mulheres se juntaram a ela em seu trabalho e formaram uma comunidade de irmãs com a espiritualidade terciária franciscana, embora Adele Brise nunca tenha feito votos públicos como freira. Adele faleceu em 5 de julho de 1896, aos 65 anos de idade, estando sepultada próximo do Santuário.

               Milagre no Incêndio Peshtigo: No local da aparição, o pai de Adele construiu uma capela em madeira no ano de 1861, passando a se tornar um local de peregrinação. No entanto, na noite de 8 de outubro de 1871, uma tempestade de fogo se espalhou ao arredor da capela, chegando a atingir casas próximas. Adele iniciou, então, uma procissão suplicando a ajuda da Virgem Maria. O terreno em torno foi atingido mas a capela sobreviveu ilesa, bem como as pessoas que se refugiaram em oração em seu interior. Em 1880, uma capela de tijolos foi construída no lugar, também uma escola e um convento religioso. Em julho de 1942, foi inaugurada a atual igreja em estilo gótico Tudor pelo Bispo Paul Peter Rhode, contando agora com uma capela mariana no subsolo e uma sala para rememorar as graças alcançadas pela intercessão da Virgem Maria. No jardim, são apresentados para os peregrinos as estações da Via Sacra e os mistérios do Rosário. O maior encontro anual na igreja mariana de Champion acontece em 15 de agosto, data da solenidade da Assunção da Virgem Maria aos Céus, com missa campal e procissão nos jardins do Santuário.

               A aparição mariana em Champion, alegada por Adele Brise, começou a ser investigada em 9 janeiro de 2009 pelo Bispo diocesano de Green Bay, Dom David Ricken, que observou que seus predecessores endossaram implicitamente o Santuário ao realizar serviços religiosos lá ao longo dos anos. Em 8 de dezembro de 2010, as aparições de Champion foram reconhecidas como dignas de fé, fazendo com que se tornasse a primeira e única aparição mariana aprovada em terras americanas. Em 15 de agosto de 2016, a Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos designou a igreja mariana de Champion como Santuário Nacional de Nossa Senhora do Bom Socorro. Em 20 de abril de 2023, o nome do Santuário foi alterado para Santuário Nacional de Nossa Senhora de Champion, em conformidade com um pedido feito pelo Dicastério para o Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos. Também foi estabelecido que no local da aparição seja celebrado anualmente, em 9 de outubro, a solenidade da aparição de Nossa Senhora em Champion.

 

256 . 6 - Aparição de Nossa Senhora da esperança de Pontmain

               Em plena guerra franco-prussiana, quando a pequena cidade francesa de Pontmain estava prestes a ser invadida, uma belíssima Dama apareceu no céu. Naquela mesma noite, a aflição se tornou esperança. Naquele 15 de janeiro de 1871, o ano ainda estava em seu nascedouro, trazendo para a pequena cidade de Pontmain, situada a duzentas milhas de Paris, todas as esperanças e apreensões próprias da aurora. Nesta população de apenas quinhentos habitantes, o Pe. Guérin, grande devoto de Maria Santíssima e pároco da matriz havia trinta e cinco anos, procurava reunir o povo para rezar o Rosário. Os camponeses afluíam sempre com alegria para a oração, porém, naquela tarde, a situação era diferente: o medo e a incerteza assolavam os fiéis. Por mais que o Sacerdote tentasse animá-los com cânticos, só se viam lágrimas em seus rostos. Qual a razão de tamanha tristeza? A França e a Alemanha estavam em guerra. Corriam notícias de que o exército prussiano, tendo chegado às portas de Laval, já se aproximava de Pontmain.

               Naquela trágica semana de inverno, a neve cobria toda a cidade. Crostas de gelo revestiam as janelas e os telhados. Dois dias depois da cena que acabamos de narrar, as crianças da família Barbedette conversavam em casa sobre a ausência do irmão mais velho, convocado pelo exército para defender a pátria, quando o infantil colóquio foi subitamente interrompido pelo pai. Ele os levou para o celeiro, a fim de prepararem uma ração extra para os cavalos, que muito sofriam com as baixas temperaturas. Por volta de cinco e quarenta e cinco da tarde, Eugène Barbedette, de doze anos, e seu irmão Joseph, de dez, terminaram o serviço. Ao saírem do celeiro depararam-se, para sua surpresa, com uma extraordinária figura no céu: era uma Senhora de rosto indizivelmente amável, que permanecia no ar, em pé, frente a eles. Estava trajada com um longo vestido azul, adornado por estrelas douradas, e trazia na cabeça uma linda coroa de ouro. Pouco tempo depois juntaram-se a eles duas meninas: Françoise Richer, de onze anos, e Jeanne-Marie Lebossé, de nove. Elas também viam a esplendorosa Dama. As exclamações cheias de entusiasmo das crianças acabaram por chamar a atenção de quase todo o vilarejo, atraindo à propriedade da família Barbedette uma verdadeira multidão.

Mensagem escrita por mãos invisíveis

               Os camponeses que se avolumavam junto à casa dos Barbedette desejavam presenciar a aparição da nobre Dama. Entretanto, nem todos acreditavam no que as crianças diziam, pois somente elas a viam. Também o Pe. Guérin acorreu ao local. Embora nada visse, sentiu-se tomado pela graça e entoou o hino nascido dos lábios da própria Rainha do Céu: o Magnificat. Quando todos cantavam, as crianças viram aparecer uma flâmula abaixo dos pés de Nossa Senhora, na qual mãos invisíveis escreviam em letras de ouro: “Rezem, meus filhos”. E, enquanto a multidão prosseguia com o cântico, foi acrescentada mais uma misteriosa afirmação: “Deus logo vos ouvirá”.

               Em certo momento notaram uma grande luz, que brilhava mais que o sol e, quando se pensava que a Mãe de Deus partiria, uma derradeira frase foi desenhada a seus pés: “Meu Filho se comoveu com vossas súplicas”. Diante da misteriosa mensagem, todos mantiveram-se em silêncio, rezando.

               Nada se ouvia, até que uma voz se elevou da pequena multidão, entoando um hino local que louva Maria Santíssima enquanto Virgem Mãe da Esperança. Nesse exato instante, a majestosa Senhora ergueu suas mãos aos céus e, movimentando delicadamente os dedos, olhou para as crianças com muita ternura. Porém, uma sombra de tristeza se fez notar naquele suave e resplandecente semblante. No momento em que na música se dizia “Meu doce Jesus, agora é o tempo de dar o vosso grande perdão aos nossos corações endurecidos!”, a Virgem apontou para um sinal que portava sobre o peito. Era uma cruz vermelha, na qual se podia ver perfeitamente a Nosso Senhor. Acima dela, uma faixa branca trazia inscrito o nome de Jesus, também em vermelho. Os lábios da Senhora do Céu moviam-se em oração. Por ordem do pároco, todos permaneceram em vigília até o fim da aparição, que se prolongou por mais três horas. Além dos dois irmãos Barbedette e das duas meninas, relatos populares narram que mais três crianças viram Maria Santíssima no céu de Pontmain. Eram Eugène Friteau, de seis anos, Auguste Avice, dois anos mais novo, e a filhinha do sapateiro que, sendo ainda criança de colo, não parava de pular nas mãos da mãe, estendendo seus bracinhos para o ar como se quisesse ir para junto de Nossa Senhora.

               Ao mesmo tempo em que a Mãe de Deus infundia esperança nos corações dos moradores da pequenina cidade, parecia também intervir nos lances da guerra que tanto amedrontavam os habitantes da região. Naquela mesma noite, o comandante do exército alemão, o general Karl Von Schmidt, recebeu uma ordem inesperada de recuar. E, dez dias depois, França e Alemanha assinavam um tratado de paz. Acontecera o que muitos passaram a chamar de “o grande milagre de Pontmain”. As autoridades Eclesiásticas realizaram uma série de investigações a fim de confirmar a autenticidade do que as crianças afirmavam ter visto. Após entrevistá-las individualmente e submetê-las a exames médicos para provar que não sofriam de alucinação, puderam atestar a inteira veracidade dos relatos feitos pelos videntes, que durante todo o processo se comportaram com exímia calma e modéstia. A carta pastoral em que Dom Casimir-Alexis-Joseph Wicart, primeiro Bispo de Laval, dá seu parecer sobre esse fenômeno sobrenatural, ocorrido em território sob sua jurisdição, conclui da seguinte forma: “Tendo examinado os relatos de duas comissões de teólogos e uma de investigadores, tendo revisado os textos e os testemunhos dos médicos, julgo que a Imaculada Virgem Maria, Mãe de Deus, realmente apareceu no dia 17 de janeiro de 1871”.

               Constatada a veracidade da aparição, deram-lhe o nome de Nossa Senhora da Esperança de Pontmain. Uma igreja em sua honra foi construída no local, e em 1922 Pio XI instituiu sua festa litúrgica, a ser celebrada a cada 17 de janeiro. A devoção a Ela estendeu-se pela França e pelo mundo.