MARIA DE ÁGREDA – DO LIVRO: MÍSTICA CIDADE DE DEUS
Do que
sucedeu nos nove meses da gravidez de Santa Ana, e o que fez Maria Santíssima
no ventre, e a Sua mãe, naquele tempo.
Para que fosse sempre crescendo na
contemplação e Amor Divino, renovou-Lhe o Senhor a Graça daquela manifestação
abstrativa de Sua Divindade mais duas vezes. Deste modo, antes de nascer, teve
três vezes aquele gênero de visão: uma no instante em que foi concebida, outra
pela metade dos nove meses, e a terceira um dia antes de Seu nascimento. Não se
pense que, por não lhe ser contínua esta espécie de visão, lhe haja faltado
outra inferior, mas altíssima, com a qual via a Deus pela Fé e por especial
iluminação. Este modo de contemplação foi incessante em Maria Santíssima,
superior à contemplação que tiveram todos os viadores juntos.
Para melhor entender o que sucedeu a esta
matrona santíssima, deve-se advertir que o demônio, depois de haver sido
precipitado do Céu com seus maus anjos nas penas eternas, andava sempre
solícito, observando e espreitando as mais santas mulheres da antiga Lei. Queria
encontrar aquela cujo sinal vira (Ap 12, 1; Gn 3, 15) e cujo pé o havia de
pisar, esmagando-lhe a cabeça. Tão ansiosa era a indignação de Lúcifer, que
nestas diligências não se fiava só de seus inferiores. Auxiliado por eles, ele
mesmo vigiava e rodeava dentre algumas mulheres virtuosas, as que mais se
distinguiam nas virtudes e Graça do Altíssimo. Procurou fazer desabar a casa de
São Joaquim e Santa Ana para alterá-la com o susto. Como, impedido pelos Anjos,
não o pôde conseguir, irritou umas mulherzinhas, conhecidas de Santa Ana, para
brigarem com ela. Assim o fizeram com grande ira, injuriando-a com palavras
descomedidas e contumeliosas. Entre estas, mofaram muito de seu estado de
gravidez, dizendo-lhe que tal coisa, depois de tantos anos de idade, não passava
de embuste do demônio. Minha filha, ouve
a resposta à tua dúvida. Ainda que na visão da Divindade, no primeiro instante
houvera conhecido minha inocência e que estava concebida sem pecado, estes
benefícios e dons do Altíssimo são de tal natureza que, quanto mais certeza e
conhecimentos comunicam, tanto maior cuidado e atenção despertam para
conservá-los e não ofender seu Autor que, unicamente por Sua bondade, os
concede às criaturas.
Usa, porém, do temor com medida e
excede-te mais no amor. Com estas duas asas eleva-te acima do que é terrestre e
de ti mesma. Procura afastar logo qualquer exagerado sentimento, que te leve ao
excessivo temor. Entrega teu interesse ao Senhor e assume o dEle como se fosse
o teu. Teme, até que sejas purificada de tuas culpas e ignorâncias: ama o
Senhor até seres toda transformada nEle, e em tudo seja Ele o dono e árbitro de
tuas ações, e tu de nenhuma. Não te fies de teu próprio juízo, nem sejas sábia
contigo mesma (Pr 3,7). O próprio ditame deixa-se facilmente cegar pelas
paixões que o arrastam consigo para arrebatar a vontade. Daqui se vem a temer o
que não se deveria temer, e empreender o que não convém. Não te deixes levar
por qualquer leve gosto interior; duvida e teme até que com solícita
serenidade, encontres em tudo o meio conveniente. Encontrá-lo-ás sempre, se te
sujeitares à obediência de teus prelados e ao que o Altíssimo te ensinar e
fizer contigo. Ainda que os fins desejados sejam bons, todos devem ser
conferidos com a obediência e conselho, pois sem esta orientação, costumam
terminar deformados e sem proveito. Em tudo hás de procurar o mais santo e
perfeito.
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